Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01192/13
Data do Acordão:09/17/2014
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ARAGÃO SEIA
Sumário:
Nº Convencional:JSTA000P17919
Nº do Documento:SA22014091701192
Data de Entrada:07/01/2013
Recorrente:FAZENDA PÚBLICA
Recorrido 1:A..., SL
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

A Fazenda Pública, notificada do acórdão proferido nos autos em 21/5/2014 (fls. 1361 a 1390), vem requerer, invocando o disposto no nº 1 do art. 616º e nº 1 do art. 666º, ambos do CPC, a respectiva reforma quanto a custas.
Alega, em suma, que, tendo em conta o valor da causa (€ 1.481.262,65) e impondo-se o pagamento (em ambas as instâncias) do remanescente da taxa de justiça, em cumprimento do disposto na anotação à TABELA I anexa ao RCP, de acordo com a 1ª parte do n° 7 do art. 6° deste diploma legal, entende que adoptou, neste processo, um comportamento processual de colaboração com a justiça e os Tribunais, não promovendo quaisquer expedientes de natureza dilatória, abstendo-se da prática de actos inúteis e fornecendo todos os elementos necessários à boa decisão da causa, pelo que, a fixação de custas em valor superior a 8.000,00€, a que acrescem as custas em primeira instância e ainda o valor destinado a compensar a recorrida face às despesas, viola, em absoluto, os princípios da proporcionalidade, do excesso, da justiça e do acesso ao direito, devendo, por isso, ser julgada inconstitucional, por violação desses princípios constitucionais, constantes dos arts. 2º, 18º, nº 2 e 20º da CRP, a norma que se extrai da conjugação do disposto no art. 6º nºs. 1 e 2 e Tabelas I A e B, anexas do RCP, na parte em que delas resulta que as taxas de justiça devidas sejam determinadas exclusivamente em função do valor da acção, sem o estabelecimento de qualquer limite máximo.
Requer que, em consequência, se faça uso da faculdade prevista na segunda parte do nº 7 do art. 6° do RCP, por forma a dispensá-la (a ela, requerente) do pagamento do remanescente das taxas de justiça, reformando-se, nessa parte, o acórdão (quanto a custas - em ambas as instâncias), ao abrigo do nº l do art. 616° do CPC, tendo-se em conta o máximo de € 275.000,00 fixado na TABELA I do RCP e desconsiderando-se o remanescente aí previsto.

A recorrida, notificada do pedido de reforma, nada disse.
O Ministério Público pronunciou-se pela procedência do pedido.
Com dispensa de vistos dos Ex.mos Conselheiros Adjuntos, dir-se-á, decidindo, o seguinte:

Nestes autos (Impugnação Judicial), o Tribunal, em 1ª instância decidiu pela procedência da impugnação (anulou as liquidações em causa e condenou no pagamento dos juros indemnizatórios) e condenou a Fazenda Pública em custas.
Interposto, por parte da Fazenda pública, recurso para o STA veio a ser proferido acórdão em que se negou provimento ao recurso, confirmando-se a sentença recorrida, e se condenou a Fazenda Pública nas respectivas custas.
E atentando no presente pedido de reforma do acórdão, vemos que a Fazenda Pública pretende a alteração da condenação em custas em ambas as instâncias.
Ora, no âmbito do pedido de dispensa do remanescente da taxa de justiça, tem-se entendido que cabe a este STA apreciá-lo tão só no que respeita ao recurso (processo autónomo, na acepção do nº 2 do art. 1º do RCP) que a ele foi dirigida.
Por outro lado, de acordo com o disposto no nº 7 do art. 537º do actual CPC (art. 447º-A do CPC 1961), para efeitos de condenação no pagamento de taxa de justiça, consideram-se de especial complexidade as acções e os procedimentos cautelares que: (a) contenham articulados ou alegações prolixas; (b) digam respeito a questões de elevada especialização jurídica, especificidade técnica ou importem a análise combinada de questões jurídicas de âmbito muito diverso; ou (c) impliquem a audição de um elevado número de testemunhas, a análise de meios de prova complexos ou a realização de várias diligências de produção de prova morosas.
Assim, a simplicidade ou a menor complexidade não se confundem com a simples regularidade do processo ou com a ausência de anomalias e incidentes processuais, sendo que também no que se refere à conduta das partes, não obstante a possibilidade de relevância negativa do que seja de considerar desnecessário, impertinente ou dilatório, tudo o mais cairá, em regra, no âmbito da normalidade da intervenção das partes no processo judicial.
No caso, constatamos que a tramitação processual foi, no essencial, uma tramitação regular:
-no presente recurso, “rectius”, no recurso que veio a ser decidido no acórdão cuja reforma ora se pede, ocorreu a seguinte tramitação:
-foi interposto recurso da decisão da primeira instância, tendo a recorrente formulado 12 conclusões que culminaram 11 páginas de alegações;
-foram apresentadas contra-alegações com 61 conclusões;
-foi emitido parecer pelo Ministério Público com extensa fundamentação ao longo de 6 páginas;
-a elaboração do acórdão, porque contendia com aplicação do direito nacional e comunitário e ainda com a interpretação de acórdãos do Tribunal de Justiça e acórdãos deste Supremo Tribunal não pode ser considerada de menor complexidade ou simples.

Se não é de concluir que estejamos perante uma acção de especial complexidade, precisamente porque a matéria em causa já não era nova, também não pode concluir-se que estejamos, para efeitos desta dispensa de taxa, perante uma causa simples ou de menor complexidade.
Neste contexto, não se nos afigura, que estejam preenchidos os requisitos exigidos pelo mencionado nº 7 do art. 6º do RCP, para que possa dispensar-se o pagamento do remanescente da taxa de justiça.
Acresce que, dado o aditamento (operado pelo art. 2º da Lei nº 7/2012, de 13/2) deste nº 7 ao art. 6º do RCP, passa precisamente a poder (e a dever) atender-se ao falado limite máximo de 275.000,00 Euros e a poder dispensar-se o pagamento do remanescente da taxa de justiça, não se vendo, portanto, que ocorra, nesta vertente, violação dos invocados princípios constitucionais. (1 - No acórdão nº 421/2013, de 15/7/2013, processo nº 907/2012, in DR, 2ª série - Nº 200, de 16/10/2013, pp. 31096 a 31098, o Tribunal Constitucional havia julgado inconstitucionais, por violação do direito de acesso aos tribunais, consagrado no art. 20º da CRP, conjugado com o princípio da proporcionalidade, decorrente dos arts. 2º e 18º, nº 2, segunda parte, da CRP, as normas contidas nos arts. 6º e 11º, conjugadas com a tabela I-A anexa, do Regulamento das Custas Processuais, na redacção introduzida pelo DL nº 52/2011, de 13/4, (anteriormente, portanto, à alteração introduzida pela Lei nº 7/2012, de 13/2) quando interpretadas no sentido de que o montante da taxa de justiça é definido em função do valor da acção sem qualquer limite máximo, não se permitindo ao tribunal que reduza o montante da taxa de justiça devida no caso concreto, tendo em conta, designadamente, a complexidade do processo e o carácter manifestamente desproporcional do montante exigido a esse título. N este mesmo sentido se decidira já nos acs. desta Secção do STA, de 31/10/12 e de 26/4/2012, nos procs. nºs. 0819/12 e 0768/11, respectivamente.)

Ponto é que se verifiquem os também apontados requisitos para tal dispensa: (i) especificidade da situação que justifique a dispensa; (ii) valoração e ponderação (por parte do juiz, e de forma fundamentada) no sentido de que, atendendo designadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes, é de dispensar o pagamento do dito remanescente.
Requisitos que, como acima se disse, não se verificam no presente caso.

Face ao exposto, decide-se indeferir o pedido de reforma, quanto a custas, do acórdão proferido nos autos a fls. 1361 a 1390.

Custas incidentais pela recorrente, com taxa de justiça que se fixa em uma UC.

D.N.

Lisboa, 17 de Setembro de 2014. – Aragão Seia (relator) – Pedro Delgado – Casimiro Gonçalves.