Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0145/22.6BCLSB
Data do Acordão:01/12/2023
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:TERESA DE SOUSA
Descritores:APRECIAÇÃO PRELIMINAR
CONTENCIOSO ELEITORAL
ASSOCIAÇÃO
ESTATUTOS
Sumário:Não é de admitir a revista se o acórdão recorrido se revela acertado ao decidir que a candidatura do recorrente ao ter sido liminarmente rejeitada pelo Presidente da Comissão Eleitoral com fundamento na violação do art. 20º, nº 2 dos Estatutos da Associação, segundo o qual: “a candidatura a Presidente só é admitida se acompanhada de candidaturas aos demais órgãos”, o foi correctamente, por se verificar que aquela candidatura apresentou listas aos órgãos Presidente da Direcção, Direcção, Conselho Fiscal e Conselho de Justiça, mas não o fez para os órgãos Conselho de Arbitragem, Conselho de Disciplina e Conselho Técnico, como aquele preceito exige.
Nº Convencional:JSTA000P30433
Nº do Documento:SA1202301120145/22
Data de Entrada:12/19/2022
Recorrente:AA
Recorrido 1:ASSOCIAÇÃO DE FUTEBOL DE ÉVORA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Formação de Apreciação Preliminar

Acordam no Supremo Tribunal Administrativo


1. Relatório
AA (Demandante) interpõe a presente revista, nos termos do art. 150º do CPTA, do acórdão do TCA Sul de 20.10.2022 que negou provimento ao recurso que o mesmo Demandante interpusera do acórdão do Tribunal Arbitral do Desporto (TAD) de 05.08.2022, que em sede de arbitragem necessária, julgou totalmente improcedente a acção arbitral intentada contra a Associação de Futebol de Évora (AFE), na qual é contra-interessado BB, e manteve o acórdão proferido em 18.09.2022 pelo Conselho de Justiça da Associação de Futebol de Évora, que não reconheceu legitimidade ao Demandante para impugnar as deliberações do Presidente do Conselho Eleitoral de não admissão da sua candidatura às eleições para a referida associação.
O Demandante interpõe a presente revista, alegando que esta visa a apreciação de questão com relevância jurídica fundamental, face à complexidade da questão a dirimir e por ser necessária para uma melhor aplicação do direito.

Não foram apresentadas contra-alegações.

2. Os Factos
Os factos dados como provados são os constantes do acórdão recorrido para onde se remete.

3. O Direito
O art. 150º, nº 1 do CPTA prevê que das decisões proferidas em 2ª instância pelo Tribunal Central Administrativo possa haver, excepcionalmente, revista para o Supremo Tribunal Administrativo “quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de uma importância fundamental” ou “quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito”.
Como resulta do próprio texto legal, e a jurisprudência deste STA tem repetidamente sublinhado, trata-se de um recurso excepcional, como, aliás, o legislador sublinhou na Exposição de Motivos das Propostas de Lei nºs 92/VIII e 93/VIII, considerando o preceito como uma “válvula de segurança do sistema”, que só deve ter lugar, naqueles precisos termos.

O Demandante impugnou no TAD o acórdão proferido em 18.09.2020 pelo Conselho de Justiça da AFE que não reconheceu ao Demandante legitimidade para impugnar as deliberações do Presidente da Comissão Eleitoral de não admissão da sua candidatura às eleições para a referida associação.

O TAD julgou totalmente improcedente a acção por ter entendido que o Recorrente não tinha legitimidade substantiva para impugnar as deliberações do Presidente da Comissão Eleitoral de não admissão da sua candidatura às eleições para a referida associação [que qualificou como excepção peremptória que determina a absolvição do pedido]. E, julgou ainda verificada a excepção dilatória de falta de interesse em agir, que determina a absolvição da instância, ficando prejudicada “a apreciação dos pedidos de anulação dos outros atos praticados no procedimento eleitoral, designadamente quanto ao modo de realização das eleições e à elegibilidade do Contrainteressado”.

O TCA Sul para o qual o aqui Recorrente apelou, negou provimento ao recurso, confirmando o acórdão do TAD.
Em síntese referiu que estava em causa o facto de a candidatura do recorrente ter sido liminarmente rejeitada pelo Presidente da Comissão Eleitoral com fundamento na violação do art. 20º, nº 2 dos Estatutos da Associação, segundo o qual: “a candidatura a Presidente só é admitida se acompanhada de candidaturas aos demais órgãos”, e, verificava-se que aquela candidatura apresentou listas aos órgãos Presidente da Direcção, Direcção, Conselho Fiscal e Conselho de Justiça, mas não o fez para os órgãos Conselho de Arbitragem, Conselho de Disciplina e Conselho Técnico.
E que: “Como sublinhado pelo TAD, a referida insuficiência não era suscetível de determinar um convite ao aperfeiçoamento, pela singela razão que se tratava de uma manifesta violação dos termos regulamentares aplicáveis, ao não terem sido apresentadas candidaturas a três dos órgãos da Associação de Futebol de Évora. (…). Para que não possam subsistir quaisquer dúvidas, reafirma-se que, nos termos do artigo 20.º, n.º 2, dos Estatutos da Associação: (…), sendo que a candidatura do Recorrente apenas apresentou listas para Presidente da Direção, Direção, Conselho Fiscal e Conselho de Justiça, não o tendo feito para o Conselho de Arbitragem, Conselho de Disciplina e Conselho Técnico, invalidade que se mostra incontornável.
O Recorrente questionou ainda a matéria de facto, no sentido de que não fora garantido o secretismo do voto, tendo quanto a essa matéria o acórdão referido que não lograra o Recorrente demonstrar a verificação de quaisquer irregularidades susceptíveis de determinar a invalidade do procedimento eleitoral, tendo sido garantido o secretismo do voto.

Alega o Recorrente na presente revista que a leitura que se fez do art. 20º dos Estatutos é inconstitucional por violar os arts. 17º e 18º da CRP. Mais questiona a matéria de facto provado, visando a conclusão de que não fora respeitado o secretismo do voto.
A tese do Recorrente não se mostra convincente.
Por um lado, respeita aos factos provados ou não provados, e, nos termos dos nºs 3 e 4 do art. 150º do CPTA, o erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa não pode ser objecto de revista, sendo que aos factos fixados nas instâncias o tribunal de revista aplica definitivamente o direito.
Por outro lado, a apreciação desta questão estava prejudicada pela solução dada pelas instâncias ao julgarem procedentes as excepções dilatória e peremptória nos termos acima referidos, expressos pelo TAD [cfr. ponto 6.] e pelo acórdão recorrido que apenas a apreciou como argumento suplementar (como se vê de fls. 12 do acórdão recorrido).
Assim sendo, e uma vez que as instâncias decidiram as questões submetidas à sua apreciação de forma convergente [nelas não se incluindo a inconstitucionalidade, só agora invocada], e, o acórdão recorrido parece ter decidido correctamente, no juízo sumário que a esta Formação cabe fazer, as questões submetidas à sua apreciação, não se justifica a admissão deste recurso para uma melhor aplicação do direito. Nem, por outro lado, se verifica qualquer especial relevância ou complexidade jurídicas nas questões submetidas à apreciação do Tribunal recorrido que demandassem a intervenção deste Supremo Tribunal, mormente a da interpretação a dar ao art. 20º, nº 2 dos Estatutos da Associação.
Quanto à alegada inconstitucionalidade do art. 20º de tais Estatutos por violar os arts. 17º e 18º da CRP (apenas invocada nesta sede de revista), tal como esta Formação Preliminar tem reiteradamente dito, é matéria que não constitui objecto típico da revista por poder ser colocada directamente ao Tribunal Constitucional.
Com efeito, como se assinalou, v.g., no ac. de 24.09.2020, Proc. nº 0902/19.0BEPNF-S1: «(…) não se justifica admitir a revista. Esta centra-se exclusivamente em inconstitucionalidades. Ora, e como temos repetidamente dito, os «themata» de inconstitucionalidade não são objecto próprio dos recursos de revista, já que podem ser separadamente colocados ao Tribunal Constitucional.».
Assim, deve prevalecer, no caso, a regra da excepcionalidade das revistas.

4. Decisão
Face ao exposto, acordam em não admitir a revista.
Custas pelo Recorrente.

Lisboa, 12 de Janeiro de 2023. – Teresa de Sousa (relatora) – Carlos Carvalho – José Veloso.