Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01953/13
Data do Acordão:05/07/2014
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ASCENSÃO LOPES
Descritores:REGULAMENTO DAS CUSTAS PROCESSUAIS
DISPENSA DO PAGAMENTO
REMANESCENTE DA TAXA DE JUSTIÇA
Sumário:A norma constante do nº7 do art. 6º do RCP deve ser interpretada em termos de ao juiz, ser lícito, mesmo a título oficioso, dispensar o pagamento, quer da totalidade, quer de uma fracção ou percentagem do remanescente da taxa de justiça devida a final, pelo facto de o valor da causa exceder o patamar de €275.000, consoante o resultado da ponderação das especificidades da situação concreta (utilidade económica da causa, complexidade do processado e comportamento das partes), iluminada pelos princípios da proporcionalidade e da igualdade.
Nº Convencional:JSTA00068687
Nº do Documento:SA22014050701953
Data de Entrada:12/23/2013
Recorrente:FAZENDA PÚBLICA
Recorrido 1:A... SGPS, SA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF LISBOA
Decisão:PROVIDO
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT
Legislação Nacional:RCP08 ART6 N7.
CPC ART447-A N7.
Jurisprudência Nacional:AC STJ PROC1319/12 DE 2013/12/12.; AC TC PROC421/13 DE 2013/07/15.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam, em conferência, nesta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo

1 – RELATÓRIO

A………………., SGPS, S.A., contribuinte n.° …………., deduziu impugnação judicial do indeferimento da reclamação graciosa da autoliquidação de IRC, referente ao exercício de 2009, na parte relativa à derrama municipal, no montante de 1.930.686,39€.

Por sentença de 25 de Setembro de 2013, o Tribunal Tributário de Lisboa (TTL), julgou a impugnação procedente e condenou a Fazenda Pública no pedido de anulação do acto impugnado, restituição do imposto indevidamente pago, e ao pagamento dos respectivos juros indemnizatórios. Reagiu a Fazenda Pública interpondo o presente recurso cujas alegações integram as seguintes conclusões:

I. O presente recurso visa a decisão proferida, em 25/09/2013, no processo em referência, no segmento final, onde se indefere o pedido de dispensa de pagamento da taxa de justiça remanescente, prevista no n.° 7 do art.6° do RCP;
II. O presente recurso não se dirige à condenação da fazenda pública na obrigação de pagamento de custas, operada pelo dispositivo da douta sentença recorrida, mas tão só, à pronúncia e decisão da meritíssima juiz “a quo”, que deu resposta, individualizada e especificada, ao pedido de dispensa formulado pela Representante da Fazenda Pública em sede de contestação;
III. O valor da presente ação ascende a € 1.930.686,39;
IV. No processo “sub Judice” as questões apreciadas no presente processo para além de se traduzirem na sua maioria em questões de direito não exigiram o conhecimento de questões jurídicas de elevada especificidade/exigência técnica.
V. Foi apresentada a petição inicial, seguindo-se a contestação e posteriormente as alegações escritas, tendo sido, findos o articulados, proferida sentença;
VI. não houve prova adicional, tendo sido analisada apenas a prova efetuada por documentos;
VII. Não houve quaisquer incidentes nem audiência de julgamento com a produção de prova, pelo que não se pode dizer, em comparação com processos com centenas de testemunhas, uns, e, outros, com audiências de julgamento que se prolongam por vários meses, senão mesmo anos, que se esteja na presença dum processo de especial complexidade;
VIII. Porém, considerando o valor da acção, e a tabela anexa ao RCP (assim como o valor da UC), temos que o valor do remanescente da taxa de justiça a considerar in casu na conta final atinge o valor de cerca de € 20.000,00 (vinte mil euros).
IX. Pretendeu-se, com o RCP, que o valor da taxa de justiça deixasse de ser fixado com base numa mera correspondência com o valor da ação, procurando-se uma correspetividade entre a taxa de justiça e o serviço obtido do tribunal, e uma adequação, segundo consta do seu preâmbulo “(...) à efectiva complexidade do procedimento respectivo”.
X. Justificando a opção, explicou-se, no respetivo preâmbulo, que, se pretendeu uma repartição mais justa dos custos da justiça, a adopção de critérios de tributação mais objetivos, e a adequação do valor da taxa de justiça ao tipo de processo e aos seus custos concretos, numa filosofia de justiça distributiva e de repercussão dos custos da justiça nos seus utilizadores;
XI. Estatui o n.° 7 do art. 6.° do citado Regulamento que nas causas de valor superior a € 275.000,00 o remanescente da taxa de justiça é considerada na conta a final, salvo se a especificidade da situação o justificar e o juiz de forma fundamentada atendendo designadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes dispensar o pagamento;
XII. Dissecando o referido art. 6º do RCP, verificamos que, de acordo com o teor da norma do nº 1, conjugada com a do n.° 7, são dois os requisitos essenciais para a dispensa do pagamento do remanescente: a complexidade da causa e a conduta processual das partes;
XIII. Porém, o RCP, não fornece quaisquer critérios orientadores ou parâmetros que permitam aferir o que entender por complexidade ou simplicidade da causa;
XIV. A referência à complexidade da causa e à conduta processual das partes significará, em concreto, a sua menor complexidade ou simplicidade e a positiva atitude de cooperação das partes;
XV. pelo que, e uma vez que estará em causa justamente a ausência, ou menor grau dessa complexidade, se terá de recorrer ao Código de Processo Civil, numa interpretação “a contrario” do seu art°447-A, que, estabelece o que se deverá entender por “especial complexidade”;
XVI. Há assim que objetivar o grau de complexidade da causa recorrendo aos critérios indiciários constantes da supra referida disposição legal, na medida em que se mostrem em consonância com uma nova e adequada filosofia de justiça distributiva no âmbito da responsabilização/pagamento das custas processuais, obviando-se ao recurso ao subjetivismo e à arbitrariedade;
XVII. Pese embora o facto de o RCP o permitir, na prática parece-nos que da forma como está elaborada a norma, exigindo ao juiz o ónus da fundamentação da eventual dispensa que determine, acarretará que a sua não determinação/não aplicação se torne no regime-regra; O que nos parece flagrantemente contra a “ratio” das supra citadas normas;
XVIII. Acresce que, não se enquadrando determinada ação nos parâmetros enunciados no supra referido art. 447-A do CPC, ou seja, numa “especial complexidade”, daí não decorrerá, imediata e automaticamente a qualificação de “menor” complexidade, resultando, também, uma margem de discricionariedade ao juiz da causa, a qual se deverá pautar, entre outros, pelo principio da proporcionalidade;
XIX. Obstando assim a que a uma ação de elevado valor que fique aquém dum padrão médio de complexidade corresponda uma tributação desproporcionada e desadequada ao serviço efetivamente prestado;
XX. Para tal, deverão ser considerados, para além do valor da ação, os custos em concreto que o processo acarretou para o sistema judicial, visando um equilíbrio entre os dois binómios a considerar: pagamento de taxa “versus”serviço de administração de justiça;
XXI. Considerada toda a supra enunciada tramitação do processo aqui em questão, não vislumbramos em que medida os serviços prestados por este Douto Tribunal justificam um valor de custas de tal monta e sem qualquer limite;
XXII. A valer o entendimento que parece ter sido utilizado na douta sentença recorrida, de que: “(…) não estamos perante uma situação de simplicidade jurídica que importe a dispensa, pois foi apreciado o mérito da causa, e conhecido o pedido, (…)”, seria então suficiente a verificação da apreciação do mérito da causa para que se aplique unicamente o critério do “valor da ação”, sem que exista qualquer limite, desconsiderando-se assim a natureza bilateral da taxa de justiça, e a sua natureza de contrapartida pelo serviço prestado, ideia nuclear e central do legislador;
XXIII. No caso concreto “sub Júdice” um montante de cerca de € 20.000,00 de taxa de justiça (remanescente), é pois manifestamente desproporcional face ao “serviço prestado”, ultrapassando tal valor aquilo que seria aceite por razoável, não podendo obstar a tal consideração o facto de ter existido uma apreciação do mérito;
XXIV. No tocante à conduta das partes durante a tramitação destes autos considera-se ter sido uma conduta normal de litigantes sem qualquer conduta censurável;
XXV. É assim nosso entendimento de que não se verifica, no caso em apreço, nem a aludida complexidade da causa nem uma má conduta processual das partes;
XXVI. A norma do art. 11.º, conjugada com a do n.° 1 do art. 6.º, e correspondente Tabela, na medida em que não estabelecem qualquer limite máximo para a taxa de justiça, fazendo depender o seu montante, apenas do valor da acção, são inconstitucionais, por violação, nessa sua específica dimensão, dos princípios do Estado de Direito e do acesso à justiça (ao direito) e aos tribunais e à tutela jurisdicional efectiva (art. 20.° da CRP), da proporcionalidade (arts. 2.° e 18.º, n.° 2 da CRP) e da igualdade (art. 13.° da CRP), na medida em que não existe contrapartida ou correspectividade entre o valor da taxa de justiça devida, nos termos daquelas normas, e o serviço prestado pelo tribunal;
XXVII. O art. 20.º, n.° 1, da CRP consagra o princípio do acesso ao direito e aos tribunais ao estabelecer que a todos é assegurado o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos, não podendo a justiça ser denegada por insuficiência de meios económicos;
XXVIII. Como tal, sendo legítimo ao legislador exigir o pagamento de custas judiciais, a sua liberdade constitutiva tem, todavia, um limite, que é o de permitir o acesso à justiça à generalidade dos cidadãos sem necessidade de recurso ao sistema de apoio judiciário;
XXIX. No que concerne ao princípio da proporcionalidade, será de dizer, que o valor exigível a título de taxa de justiça num processo deste montante é muito superior aos serviços prestados pelo Tribunal, pecando por excessivo, desajustado e desproporcionado, sendo, por isso as normas aqui chamadas à colação, inconstitucionais por envolverem uma grave violação do princípio da proporcionalidade em sentido amplo, nas suas vertentes da adequação ou justa medida e da proibição do excesso; deixando de existir correspetividade entre os serviços prestados e a taxa de justiça apurada;
XXX. A aplicação rigorosa das normas em análise, é também susceptível de violar o princípio da igualdade, na medida em que processos com a mesma tramitação e com o mesmo dispêndio de recursos ao sistema judicial, podem acarretar montantes de taxa de justiça completamente díspares e desiguais em função dos valores das respetivas ações;
XXXI. Tais normas padecem ainda de inconstitucionalidade material, na medida em que fazem depender a taxa de justiça do valor da causa, sem qualquer limite máximo, ficando ao arbítrio do juiz a dispensa do pagamento do remanescente, tendo o mesmo de fundamentar adequadamente tal dispensa, ao invés, de comportar, como regra, um montante máximo e, como excepção, a possibilidade de tal montante ser agravado de acordo com a complexidade da causa e a conduta das partes, devendo, em consequência o juiz fundamentar adequadamente o motivo de tal agravamento;
XXXII. Sobre a mesma matéria, foi recentemente proferido pelo Tribunal Constitucional o Acórdão n.° 421/2012, e que julgou inconstitucionais “(…) por violação do direito de acesso aos tribunais, consagrado no artigo 20.° da Constituição, conjugado com o princípio da proporcionalidade, decorrente dos artigos 2º e 18.°, n.° 2, segunda parte, da Constituição (…)”, as normas contidas nos artigos 6° e 11º, conjugadas com a tabela I - A anexa, do RCP, na redação Introduzida pelo Decreto-Lei n.° 52/2011, de 13 de abril, quando interpretadas no sentido de que “(…) o montante da taxa de justiça é definido em função do valor da ação sem qualquer limite máximo, não se permitindo ao tribunal que reduza o montante da taxa de justiça devida no caso concreto, tendo em conta, designadamente, a complexidade do processo e o caráter manifestamente desproporcional do montante exigido a esse título, (…)
XXXIII. Apesar de na situação dos autos já vigorar uma norma que prevê a possibilidade da dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, as valorações constitucionais enunciadas em tal aresto valerão também na situação “sub Judice” em virtude de tal dispensa configurar, na prática, uma situação de excepção, a aplicar pela “negativa”, não impondo, nem exigindo, uma análise da situação concreta para aferir do seu grau de complexidade e correspetividade face ao serviço efetivamente prestado.
XXXIV. Deste modo, por todo o exposto, é nosso entendimento que deverá a sentença recorrida ser revogada no segmento em análise, e substituída por acórdão que decida no sentido de ser a Fazenda Pública dispensada do pagamento do remanescente da taxa de justiça.

Termos em que, concedendo-se provimento ao presente recurso, deve a sentença recorrida ser revogada, no segmento posto em crise, com as devidas consequências legais.
PORÉM V. EX.AS, DECIDINDO FARÃO A COSTUMADA JUSTIÇA

Não houve contra-alegações.

O EMMP pronunciou-se emitindo o seguinte parecer:
A recorrente acima identificada vem sindicar a sentença do Tribunal Tributário de Lisboa, exarada a fls. 86/98, em 25 de Setembro de 2012, no segmento em que indeferiu pedido de dispensa de pagamento do remanescente de taxa de justiça, ao abrigo do disposto 6.°/7 do RCP.
A sentença recorrida indeferiu tal pretensão, no entendimento de que não se verificaram os pressupostos de dispensa do pagamento do remanescente da taxa, uma vez que foi apreciado o mérito da causa e se conheceu do pedido.
A recorrente termina as suas alegações com as conclusões de fls. 141/145, que, como é sabido, salvo questões de conhecimento oficioso, delimitam o objecto do recurso, nos termos do estatuído nos artigos 684.°/3 e 685-A.°/1 do CPC, e que aqui se dão por inteiramente reproduzidas.
Não houve contra-alegações.
A nosso ver o recurso merece provimento.
Nos termos do disposto no artigo 6.°/7 do RCP “nas causas de valor superior a € 275.000,00, o remanescente da taxa de justiça é considerado na conta final, salvo se a especificidade da situação o justificar e o juiz de forma fundamentada, atendendo designadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes, dispensar o pagamento.
São dois os pressupostos de dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça:
-A menor complexidade ou simplicidade da causa;
-A positiva atitude de cooperação das partes.
Nos termos do disposto no artigo 447.°-A/7 do CPC “para efeitos de condenação no pagamento de taxa de justiça, consideram-se de especial complexidade as acções que:
- Digam respeito a questões de elevada especialização jurídica, especificidade técnica ou importem a análise combinada de questões jurídicas de âmbito muito diverso; e
- Impliquem a audição de um elevado número de testemunhas, a análise de meios de prova extremamente complexos ou a realização de várias diligências de produção de prova morosas.
Ora, no caso dos autos parece certo que a acção não é de especial complexidade.
De facto, apenas houve PI, contestação, alegações escritas, parecer do MP e decisão judicial, tendo sido, apenas, produzida prova documental com os articulados.
A questão decidenda consubstanciava-se em saber se a derrama incide sobre o lucro tributável do grupo de sociedades, sujeitas ao regime especial de tributação do grupo de sociedades (RETGS) ou sobre o lucro tributável de cada uma das sociedades que integram o grupo.
Tal questão foi tratada de forma uniforme pelo STA, no sentido da decisão recorrida, pelo que esta se limitou, praticamente, a transcrever um dos arestos do STA.
Daí que a acção tenha dado entrada em 20 de Dezembro de 2012 e tenha sido decidida em Setembro de 2013, portanto, em 9 meses.
Assim sendo, parece-nos que a presente acção tem de se considerar de menor complexidade, nos termos e para os efeitos do estatuído no artigo 6.°/7 do RCP.
Por outro lado, as partes limitaram-se a sustentar as suas posições nos articulados permitidos por lei, sem criar quaisquer entraves anormais ao desenrolar do processo, daí que tenha que se concluir que tiveram uma atitude positiva de cooperação.
A nosso ver verificam-se, assim, na situação em análise, os pressupostos de dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça.
A sentença recorrida merece censura, na parte recorrida.
Termos em que deve dar-se provimento ao presente recurso jurisdicional, revogar-se a sentença recorrida, na parte sindicada, e dispensar-se a recorrente do pagamento do remanescente da taxa de justiça

2 – FUNDAMENTAÇÃO

O Tribunal “a quo” deu como provada a seguinte factualidade:

A) A Impugnante é a sociedade dominante de um grupo de sociedades “Grupo A………” (cfr. fls. 22 e ss do Processo Administrativo).

B) A Impugnante, em sede de IRC, encontra-se enquadrada no regime geral de tributação e optou pelo Regime Especial de Tributação dos Grupos de Sociedades (RETGS) (cfr. fls. 22 e ss. do Processo Administrativo).

C) Em 28/05/2010 a Impugnante submeteu, via internet, a declaração de rendimentos (Modelo 22 de IRC), do exercício de 2009, relativa ao “Grupo A…….” (cfr. fls. 22 e ss do Processo Administrativo).

D) Na declaração mencionada na alínea anterior foi apurada derrama no montante de 3.634.294,88€ considerando para o efeito a soma das derramas individuais apuradas em cada uma das sociedades incluídas no “Grupo A…….” e abrangidas pelo RETGS, de acordo com o vertido no ofício circulado n.° 20132, de 14 de Abril de 2008 (cfr. fls. 22 e ss do Processo Administrativo).

E) Em 07/11/2011 a Impugnante apresentou junto da Administração Tributária (AT) um pedido de revisão do acto tributário, convolado pela AT em reclamação graciosa, peticionando a devolução do montante de 1.930.686,39€, acrescido de juros indemnizatórios (cfr. fls. 2 e ss, e 71 e ss do Processo Administrativo).

F) Em 22/11/2012 a Impugnante pronunciou-se, em sede de audiência prévia, sobre o projecto de indeferimento da reclamação graciosa apresentada (cfr. fls. 86 e ss do Processo Administrativo).

G) Em 30/11/2012 foi proferida decisão de indeferimento da reclamação graciosa mencionada na alínea E) (cfr. fls. 93 e ss do Processo Administrativo).

H) A decisão de indeferimento da reclamação graciosa foi levada ao conhecimento da Impugnante em 05/12/2012, por ofício da Direcção de Finanças de Lisboa com o n.° 095325, datado de 03/12/2012 (cfr. fls. 96 e ss do Processo Administrativo).

I) A Impugnação foi apresentada junto do Tribunal Tributário de Lisboa em 20/12/2012 (cfr. fls. 2 dos autos).

3 – DO DIREITO

A meritíssima juíza do TTL julgou a impugnação procedente e condenou a Fazenda Pública no pedido de anulação do acto impugnado, restituição do imposto indevidamente pago, e ao pagamento dos respectivos juros indemnizatórios, por entender que:
(Destacam-se apenas os trechos da decisão mais relevantes e com interesse para o presente recurso)
I. RELATÓRIO
A………….., SGPS, S.A., contribuinte n.° …………, com demais sinais nos autos, vem deduzir IMPUGNAÇÃO JUDICIAL do indeferimento da reclamação graciosa da autoliquidação de IRC, referente ao exercício de 2009, na parte relativa à derrama municipal, no montante de 1.930.686,39€.

A Impugnante alega, em síntese, e como causa de pedir erro na autoliquidação, porquanto o cálculo da derrama deve ter por base o lucro tributável onde se insere o grupo, e não o lucro tributável de cada uma das sociedades que integram o grupo tributado pelo RETGS, conforme entendimento veiculado por ofício-circulado pela Administração Tributária (AT) que foi seguido pela Impugnante na sua declaração de rendimentos (Modelo 22) do exercício de 2009.

Conclui, com o pedido de nulidade ou anulação do acto impugnado, e de condenação da AT à devolução da quantia indevida, bem como ao pagamento de juros indemnizatórios, nos termos do disposto no art. 43.° da LGT.

O Representante da Fazenda Pública apresentou contestação a fls. 28 e ss, alegando em síntese que a autoliquidação não enferma do vício imputado pela Impugnante.
Finaliza pugnando pela improcedência da impugnação.

O Representante da Fazenda Pública apresentou alegações de fls. 53 e ss pugnando pela improcedência da impugnação.
A Impugnante apresentou alegações de fls. 63 e ss, pugnando pela anulação da liquidação impugnada.

Subsequentemente, foram os autos com vista ao Magistrado do Ministério Público, que a fls. 82 e ss emitiu parecer, no sentido de que a impugnação deve ser julgada procedente.

II. SANEAMENTO
(…)

III. FUNDAMENTAÇÃO

1. Dos Factos
(…)

2. Do Direito

A questão a decidir nos presentes autos consiste em aferir se o cálculo da derrama deve ser efectuado tendo por base o lucro tributável de cada uma das sociedades que integram o grupo, conforme entendimento veiculado por ofício-circulado pela Administração Tributária (AT), ou, conforme defende a Impugnante, o cálculo deve ter por base o lucro tributável onde se insere o grupo.

I. A Impugnante invoca, desde logo, erro de cálculo na determinação da derrama do grupo, porquanto, aquela, na qualidade de sociedade dominante de um grupo societário tributado pelo Regime Especial de Tributação dos Grupos de Sociedades (RETGS), autoliquidou, relativamente ao exercício de 2009, a derrama nos termos apresentados pela Administração no Ofício-Circulado n.° 20132 de 14/04/2008 que estabelecia o entendimento de que “a derrama deverá ser calculada e indicada individualmente por cada uma das sociedades na sua declaração, sendo preenchido, também individualmente, o Anexo A, se for caso disso”.

E, consequentemente, de forma errada e em violação da lei, foi obrigada a autoliquidar e pagar o montante de 1.930.686,39€ de derrama.

Neste contexto, a Impugnante considera, que a derrama no caso dos grupos de sociedades sujeitos ao RETGS se deve aplicar ao lucro tributável apurado nos termos do então artigo 64.° do CIRC e não ao resultado individual apurado por cada sociedade do grupo.
Por conseguinte, a questão a decidir consiste em saber se o cálculo da derrama deve ser efectuado tendo por base o lucro tributável de cada uma das sociedades que integra o grupo, conforme entendimento veiculado por ofício-circulado pela Administração Tributária (AT), ou, conforme defende a Impugnante, o cálculo deve ter por base o lucro tributável onde se insere o grupo.

Sobre esta matéria já se pronunciou recentemente o STA no seu Acórdão de 02/05/2012, processo n.° 0234/12, no sentido de que a derrama deve incidir sobre o lucro tributável do grupo e não sobre o lucro individual de cada uma das sociedades, face à redacção do art.° 14.° da Lei das Finanças Locais anterior à Lei n.° 64-B/2011, de 30 de Dezembro (nesse mesmo sentido, v. também, Ac. do STA de 02/02/2011, processo n.° 909/10, e de 22/06/2011, processo n.° 22/06/2011).

Com efeito, escreveu-se naquele acórdão que “no âmbito do REGTS dispõe o art° 64°, n° 1 do CIRC, redacção em vigor à data dos factos (art° 70°, n° 1 da actual redacção) que o lucro tributável do grupo é calculado pela sociedade dominante, através da soma algébrica dos lucros tributáveis e dos prejuízos fiscais apurados nas declarações periódicas individuais de cada uma das sociedades pertencentes ao grupo. Ora existência da derrama está condicionada à existência do imposto principal (IRC). Trata-se assim de um imposto acessório que acresce ao imposto principal, de cuja existência prévia depende (...) É da sua natureza de imposto acessório que decorre a forma de cálculo da derrama. Assim os impostos acessórios ou são calculados sobre a colecta do imposto principal (os chamados adicionais) ou então calculam-se sobre a matéria colectável (...) No caso do novo regime do art° 14° da Lei das Finanças Locais a derrama passou a incidir, até ao limite máximo de 1,5% sobre o lucro tributável sujeito e não isento de imposto sobre o rendimento das pessoas colectivas deixando de incidir sobre a colecta, ou seja deixou de ser um adicional ao IRC para passar a ser um adicionamento (...) Mas não perdeu, por isso, a característica de imposto acessório, na medida em que carece de autonomia e depende do imposto principal (...) Assim mantendo a derrama contornos de imposto acessório do IRC, e não resultando da Lei das Finanças Locais (na redacção então em vigor) regras específicas de apuramento da respectiva base de incidência nos casos de aplicação do RGTDS, haverá que seguir para o respectivo cálculo as regras do imposto principal (IRC). (…) «não obstante a autonomização acima assinalada em relação à incidência, à colecta e à taxa do IRC, a derrama continua, todavia, a depender do regime do IRC em todos os outros campos que definem a sua relação jurídica tributária. Com efeito, além de remeter expressamente para o IRC na definição da sua base de incidência e dos seus sujeitos passivos, o regime da derrama é omisso quanto a regras próprias de determinação da matéria colectável, liquidação, pagamento, obrigações acessórias e garantias, para elencar apenas aquelas em que tradicionalmente se analisa a relação jurídica tributária. (...) só o CIRC nos permite concluir, por exemplo, que a derrama deve ser objecto de autoliquidação e paga até ao fim do 5.° mês seguinte ao fim do período de tributação. E o mesmo deverá, quanto a nós, suceder no caso de grupos de sociedades. Prevendo o CIRC, nos seus artigos 69.° a 71.°, um regime especial de tributação dos grupos de sociedades, situação em que se encontra a impugnante, ora recorrida, e tendo esta optado, como a lei lhe faculta, pela aplicação desse regime para determinação da matéria colectável em relação a todas as sociedades do grupo, a determinação do lucro tributável, para efeitos de IRC, é apurada através da soma algébrica dos lucros tributáveis e dos prejuízos fiscais apurados nas declarações individuais das sociedades que pertencem ao grupo. E, assim determinado o lucro tributável para efeito de IRC, está necessariamente encontrada a base de incidência da derrama. (...) Em face do exposto forçoso será concluir que nos casos em que esteja em causa a aplicação do RTGS a base de incidência da derrama para os efeitos do artigo 14.° n° 1 da Lei n.° 2/0007, de 15 de Janeiro (redacção então em vigor), será o lucro resultante da soma de lucros tributáveis e prejuízos fiscais individuais (resultado agregado), uma vez que apenas este se encontra sujeito a IRC (art° 64°, n° 1 do CIRC).”

Ou seja, de acordo com a jurisprudência supra citada, e com a qual concordamos na íntegra, quando seja aplicável o RETGS, como no caso dos autos, a derrama deve incidir sobre o lucro tributável do grupo e não sobre o lucro individual de cada uma das sociedades.

A este propósito há ainda que salientar que, conforme se escreveu no acórdão supra citado, “[o] art.° 14.°, n.° 8, da Lei das Finanças Locais, na redacção que lhe foi dada pelo art.° 57.° da Lei do Orçamento do Estado para 2012 (Lei n.° 64-B/2011, de 30 de Dezembro) é uma norma inovadora e não interpretativa.”, e nessa medida, não se aplica ao caso dos autos, em que está em causa derrama do exercício de 2009.
Face ao exposto, conclui-se que, assiste razão à Impugnante quanto ao invocado, e por conseguinte, a autoliquidação enferma de vício de violação de lei, por erro sobre os pressupostos de direito, e nessa medida deve ser anulada.
II. Conforme resulta dos autos, o imposto autoliquidado foi pago, e por conseguinte, deve ser restituído à Impugnante, por indevido.

Cumpre ainda conhecer do pedido de juros indemnizatórios formulado pela Impugnante.

Assim, quanto ao pedido indemnizatório, há que atender, desde logo, ao disposto no art.° 43.°, da LGT, segundo o qual:
1 - São devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido.
2 - Considera-se também haver erro imputável aos serviços nos casos em que, apesar de a liquidação ser efectuada com base na declaração do contribuinte, este ter seguido, no seu preenchimento, as orientações genéricas da administração tributária, devidamente publicadas...”.

Para que haja direito a juros indemnizatórios, é necessário que, atendendo ao disposto no art.° 43°, da LGT, se verifique a ocorrência de um erro-vício e que o mesmo seja imputável aos serviços, respeitando este último requisito a “falta do próprio serviço, globalmente considerado” (J. Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário Anotado e Comentado, Vol. I, 5ª Ed., Áreas Editora, Lisboa, 2006, p. 476).

“... [A] letra da lei, ao referir a imputabilidade do erro aos serviços, aponta manifestamente no sentido de poder servir de base à responsabilidade por juros indemnizatórios a falta do próprio serviço, globalmente considerado, como aliás, é admitido em geral. (...). A administração tributária está genericamente obrigada a actuar em conformidade com a lei [arts. 266°, n.° 1, da C.R.P., 17.°, alínea a), do C.P.T. e 55.° da L.G.T.], pelo que, independentemente da prova da culpa de qualquer das pessoas ou entidades que a integram, qualquer ilegalidade não resultante de uma actuação do sujeito passivo será imputável a culpa dos próprios serviços” — Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 12 de Novembro de 2009 (P.° n.° 681/2009).
Como referido no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 30 de Novembro de 2004 (P.° 01052/04): “O desaparecimento do acto tributário de liquidação, seja por força da satisfação da reclamação graciosa, seja por obra da procedência da impugnação judicial, impõe à Administração Fiscal que reconstitua a situação jurídica hipotética que existiria caso não tivesse sido praticado o acto tributário anulado. Tal inclui, necessariamente, a restituição da quantia que ao contribuinte foi indevidamente exigida e que ele satisfez. Mas também integra a reconstituição da situação o pagamento de juros indemnizatórios, uma vez que o contribuinte esteve, desde o pagamento que efectuou, até ao reembolso, privado da utilização do correspondente capital”.

Conforme resulta do supra exposto, o acto tributário em causa foi anulado por erro sobre os pressupostos de facto e de direito, e muito embora tenha resultado de autoliquidação efectuada pela Impugnante, ficou demonstrado que essa autoliquidação seguiu orientações genéricas da Administração Tributária, por conseguinte, declara-se o erro imputável aos serviços, e nessa medida a Impugnante tem direito a juros indemnizatórios nos termos do disposto no art. 43º, n.° 2 da LGT.

Por último, cumpre conhecer do pedido formulado pela Fazenda Pública na contestação de que fosse dispensada do pagamento do excedente de taxa de justiça nos termos do disposto no art. 6.°, n.° 7 do Regulamento das Custas Processuais (RCP).

Dispõe aquele preceito legal que “[n]as causas de valor superior a €275 000, o remanescente da taxa de justiça é considerado na conta a final, salvo se a especificidade da situação o justificar e o juiz de forma fundamentada, atendendo designadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes, dispensar o pagamento.”.

Do referido preceito legal resulta que, a regra geral é a seguinte:
considera-se, na conta final, o remanescente da taxa de justiça nas causas de valor a superior a 275.000€.
Só a assim não será se a especificidade da situação o justificar, nesse caso, o juiz pode dispensar o pagamento, desde que fundamente a sua decisão, atendendo à complexidade da causa e à conduta processual das partes. O legislador pretendeu deixar ao juiz a faculdade de dispensa do excedente, desde que o fundamentasse, e simultaneamente, desde que determinados pressupostos se verifiquem. Trata-se de um acto oficioso do juiz, não carece de requerimento das partes.

In casu, não obstante a oficiosidade da dispensa, a Fazenda Pública vem requere-la na contestação, e neste contexto, cabe emitir pronúncia sobre o requerido.

Considerado o caso dos autos, e o respectivo processado, entende-se não haver, in casu, situação que justifique a dispensa de pagamento, nos termos do preceito legal supra citado, sendo certo ainda que, a Fazenda Pública, apesar de ter requerido a aplicação do preceito legal, não alega os contornos específicos para a sua aplicação. Por outro lado, determinando o legislador que se atenda à complexidade da causa, considera-se que não estamos perante uma situação de simplicidade jurídica que importe a dispensa, pois foi apreciado o mérito da causa, e conhecido o pedido, e não se vislumbra razões específicas deste processo que justifique a dispensa, e por esta razão, indefere-se o pedido de dispensa formulado pela Fazenda Pública na contestação.

IV. DISPOSITIVO

Em face do exposto, e nos termos das disposições legais supra mencionadas, julgo a presente impugnação PROCEDENTE, e por conseguinte condeno a Fazenda Pública no pedido de anulação do acto impugnado, restituição do imposto indevidamente pago, e ao pagamento dos respectivos juros indemnizatórios.

Fixo o valor da acção em 1.930.686,39€ (art.° 306.° do CPC, aplicável ex vi art. 2°, alínea e) do CPPT, e art. 97.°-A, n.° 1 do CPPT).
Custas pela Fazenda Pública (artigos 527.°, n°s 1 e 2, do CPC, aplicável ex vi art. 2°, alínea e) do CPPT).”


DECIDINDO NESTE STA:
Por lhe ter sido requerido logo na contestação pela Fazenda Pública a meritíssima juíza de 1ª Instância apreciou na sentença, questão relacionada com o remanescente da taxa de justiça a que se refere o artº 6º nº 7 do actual Regulamento das Custas Processuais, entendendo não ser de operar a isenção com o que a Fazenda Pública não concorda, nos termos supra expostos.

É suscitada a este STA, a verificação da existência dos pressupostos para a impetrada dispensa do pagamento da taxa de justiça sobre o remanescente (relativo ao valor superior a Euros 275.000,00).
O objecto do presente recurso circunscreve-se, assim, a determinar se deve ter cabimento, face à concreta e específica situação processual, o exercício do poder-dever conferido ao juiz pelo nº7 do art. 6º do RCP, aprovado pela Lei 7/2012, de flexibilizar o valor remanescente da taxa de justiça, a liquidar adicionalmente, na parte em que o valor da causa exceda o montante de €275.000.

O teor do artº 6º nº 7 do RCP em vigor é o seguinte:
Nas causas de valor superior a (euro) 275 000, o remanescente da taxa de justiça é considerado na conta a final, salvo se a especificidade da situação o justificar e o juiz de forma fundamentada, atendendo designadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes, dispensar o pagamento.
Análise do preceito:
A regra geral do nº 7 do artº 6º do RCP nas causas de valor superior ao referido montante é a de considerar o remanescente da taxa de justiça na conta a final, salvo se houver requerimento do interessado na dispensa ou a especialidade da situação o justificar e o Juiz, de forma oficiosa e fundamentada, dispensar o pagamento. Nos casos em que nada foi requerido e quando o Juiz nada diz devemos presumir que na sua análise do caso concreto (não exteriorizada) entendeu não fazer uso da excepção contemplada no dispositivo legal a que nos vimos referindo.
Para esta dispensa, a situação em concreto deverá assumir contornos particulares, específicos justificativos da dispensa requerida. E, tais contornos particulares e específicos têm de ser analisados caso a caso (Vai neste sentido o Ac. do STJ de 12/12/2013 da 7ª Secção tirado no recurso nº 1319/12.3TVLSB-B.L1.S1, o qual aborda também, exaustivamente, as alterações que sofreu o Regulamento das Custas Processuais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26 de Dezembro – que sucedeu ao Código das Custas Judiciais (CCJ), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 224-A/96, de 26 de Novembro)
Assim os pressupostos legais para que se justifique que o Juiz intervenha e aplique a dispensa prevista no aludido preceito do RCP são os seguintes:
A especificidade da causa;
A complexidade da causa;
A conduta processual das partes.
Como muito bem explica o Mº Pº no seu parecer, supra destacado, o preceito introduzido pela Lei 7/2012 de 13/02 (que não é inovador porque já anteriormente era prevista a situação de dispensa a que nos vimos referindo nos artºs 27º e 73-B do CCJ) não suscita na actual formulação quaisquer problemas de constitucionalidade por respeitar a doutrina constante do acórdão do TC de 15/07/2013 expressa no acórdão nº 421/2013 (O TC julgou inconstitucionais, por violação do direito de acesso aos tribunais, consagrado no artigo 20.º da Constituição, conjugado com o princípio da proporcionalidade, decorrente dos artigos 2.º e 18.º, n.º 2, segunda parte, da Constituição, as normas contidas nos artigos 6.º e 11.º, conjugadas com a tabela I-A anexa, do Regulamento das Custas Processuais, na redacção introduzida pelo DL 52/2011, de 13 de Abril, quando interpretadas no sentido de que o montante da taxa de justiça é definido em função do valor da acção sem qualquer limite máximo, não se permitindo ao tribunal que reduza o montante da taxa de justiça devida no caso concreto, tendo em conta, designadamente, a complexidade do processo e o carácter manifestamente desproporcional do montante exigido a esse título.) e, o poder que é cometido ao Juiz tem como contraponto a aplicação pelo mesmo de valores agravados de taxa de justiça nos casos de especial complexidade a que se referem os artºs 6º nº 5 do RCP e 447-A nº 7 do CPC.
A parte final do n° 7 do art° 6º do Regulamento das Custas Processuais deve ainda ser entendida como atribuindo ao juiz o poder-dever (mesmo a título oficioso - como também refere o Ac. da Relação de Coimbra de 03/12/2013 tirado no rec. 1394/09.8TBCBR.C1) de formular um juízo de proporcionalidade quanto ao montante das custas calculado segundo as regras do RCP e de reduzir, total ou parcialmente, aquele montante na medida necessária para garantir aquela proporcionalidade.

Nessa aferição da proporcionalidade deve atender-se, também, à correlação entre o montante das custas e a utilidade económica da causa, ao princípio da igualdade e ao particular circunstancialismo dos autos. Ou seja, no dizer do Ac. do já citado ac. do STJ de 12/12/2013 interpreta-se tal regime normativo em termos de estar facultado ao juiz, quando entenda justificada a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, graduar a proporção dessa dispensa, em função da apreciação casuística da especificidade da situação em causa;
DECIDINDO sobre o julgado quanto à impetrada dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça:

No caso dos autos visou-se sindicar a legalidade do despacho de indeferimento tácito que se formou no âmbito da reclamação graciosa apresentada pela impugnante, a qual por sua vez, visava sindicar a legalidade do acto de autoliquidação de IRC e derrama do exercício de 2009.
Pediu-se a anulação de acto tributário no valor de 1.930.686,39 Euros e suscitavam-se questões respeitantes à legalidade da autoliquidação da Derrama discutindo-se se devia incidir sobre o lucro tributável do grupo a que pertence a sociedade impugnante ou sobre o lucro individual de cada uma das sociedades que o constituem. Questionava-se, ainda no âmbito da mesma matéria, se o artº 14º nº 8 da Lei das Finanças Locais, na redacção que lhe foi dada pelo artº 57º da Lei do Orçamento do Estado para 2012 era uma norma inovadora e não interpretativa.
Ora, sobre esta matéria este STA já se havia pronunciado inúmeras vezes, como nos dá conta a sentença recorrida que cita e transcreve parte do Ac. do STA de 02/05/2012 tirado no recurso nº 0234/12. A sentença seguiu este aresto exprimindo que a derrama deve incidir sobre o lucro tributável do grupo e não sobre o lucro individual de cada uma das sociedades e que o artº 14º nº 8 da Lei das Finanças Locais na redacção daquela LOE era uma norma inovadora que não se aplica ao caso dos autos em que está em causa a derrama de 2009. Também se abordaram na sentença questões relativas a aceitação de determinados custos para obtenção de proveitos e sobre o pagamento de juros indemnizatórios ao abrigo do artº 43º nº 2 da LGT tendo a sentença citado extractos dos Ac. do STA de 12/11/2009 e de 30/11/2004 respectivamente nos Recs. 681/2009 e 01052/04.
Do exposto, patenteia-se que a sentença não afrontou questões de grande complexidade e que fossem inovadoras e resulta também que a causa embora tendo uma especificidade própria no que respeita às questões em causa as mesmas surgem de modo generalizado na relação da Administração Fiscal com muitas empresas que as suscitaram anteriormente junto dos tribunais obtendo respostas esclarecedoras e sedimentadas na jurisprudência. Finalmente, a conduta das partes foi a normal (uma vez que se trata de uma autoliquidação e a Fazenda Pública tem a posição de contraparte à Autora, tendo requerido a referida “dispensa” exactamente na contestação) não tendo suscitado quaisquer incidentes susceptíveis de provocar dilação na prolação da sentença, apenas se registando como nota menos positiva a extensão dos articulados de ambas as partes numa expressão de falta de síntese ainda assim de alguma forma contida por comparação com outros casos idênticos.
Nestas circunstâncias a nosso ver e ao invés do decidido, que considerou não estarmos numa situação de simplicidade jurídica, reafirmamos, também por atenção ao disposto no artº 447-A nº 7 do CPC (actualmente artº 530º nº 7), a não complexidade da(s) questão (ões), pelo que estão reunidos os pressupostos para a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça nos termos impetrados, ficando prejudicado o conhecimento das demais questões suscitadas nos autos.

4- DECISÃO:
Pelo exposto acordam os Juízes deste STA em conceder provimento ao recurso revogando-se a sentença na sua parte decisória quanto a custas que vinha questionada e determinando-se a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça nos termos requeridos.
Sem custas.

Lisboa, 7 de Maio de 2014. – Ascensão Lopes (relator) – Dulce NetoFrancisco Rothes.