Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0106/16.4BEPDL 0224/18
Data do Acordão:10/14/2020
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ANÍBAL FERRAZ
Descritores:IVA
VALOR TRIBUTÁRIO
SUBVENÇÃO
PROGRAMA POSEIMA
Sumário:(ACÓRDÃO REMISSIVO)
Nº Convencional:JSTA000P26463
Nº do Documento:SA2202010140106/16
Data de Entrada:03/07/2018
Recorrente:A............, S.A.
Recorrido 1:AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: ***
Acórdão proferido no Supremo Tribunal Administrativo (STA), com sede em Lisboa;

# I.


A…………., S.A., com os demais sinais dos autos, recorre da sentença proferida, no Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Ponta Delgada, em 28 de novembro de 2017, que julgou improcedente impugnação judicial, dirigida a questionar o indeferimento de reclamação graciosa, visando atos, de liquidação adicional de IVA e juros compensatórios, referentes aos anos de 2011, 2012 e 2013.

A recorrente (rte) apresentou alegação, finalizada com as seguintes conclusões: «

A) Pela sua natureza e enquadramento jurídico face às normas que as instituíram e regulamentaram, as ajudas, aqui em causa, concedidas à recorrente ao abrigo do Programa Poseima, constituem subvenções que, contrariamente ao entendimento da douta sentença recorrida, não estão diretamente relacionadas com o preço das operações, na acepção do Artigo 73° da Diretiva IVA (nem do Artigo 11.°A, n.° 1, alínea a), da Sexta Diretiva).

B) Embora não seja conhecida jurisprudência especificamente sobre as ajudas do Programa Poseima, existe uma larga jurisprudência do TJUE sobre a interpretação da norma do art° 73° da Diretiva IVA (bem como do anterior art° 11°, A), n° 1, a), da Sexta Diretiva, com a mesma redação). E essa jurisprudência, do TJUE e também do STA, contrariamente ao julgamento feito pela sentença recorrida, vai, clara e uniformemente, no sentido de uma interpretação restritiva da norma, concretamente quanto aos pressupostos da noção normativa de “subvenções diretamente relacionadas com o preço das operações”. O que reforça a legítima conclusão de que as ajudas ao abrigo do Programa Poseima, de acordo com tal jurisprudência, não podem ser tratadas como subvenções diretamente relacionadas com o preço das operações, para efeitos da sua subsunção na norma do art° 73° da Diretiva e, consequentemente, não podem ser sujeitas a tributação em sede de IVA.

C) O legislador do art° 34°, n° 4, da Lei n° 127-B/97, de 20 de Dezembro, ao vir equiparar, formalmente, as ajudas do Poseima às subvenções contempladas no art° 16°, n° 5, alínea c), do CIVA, apenas para efeitos da sua tributação, veio reconhecer, expressamente, que tais ajudas, na sua substância e materialidade, não são subvenções diretamente conexas com o preço das operações.

D) Não sendo, materialmente, subvenções diretamente conexas com o preço das operações, as ajudas do Poseima não têm enquadramento no conceito de subvenções tributáveis em IVA previstas no art° 73º da Diretiva IVA, pelo que não podem ser sujeitas a este imposto.

E) Contrariamente ao decidido na douta sentença recorrida, o art° 34°, n° 4, da Lei n° 127-B/97, de 20 de Dezembro, ao equiparar as ajudas do Poseima às subvenções diretamente relacionadas com o preço das operações, para efeitos de tributação em IVA, é uma norma inválida face ao Direito Comunitário, por ilegalidade material, por violação do artigo 73° da Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de Novembro de 2006 (Diretiva IVA) e do anterior artigo 11.º A, n.° 1, alínea a), da Sexta Diretiva, bem como, contraria toda a jurisprudência do TJUE sobre a interpretação daquelas normas.

F) Por todo o exposto, a douta sentença recorrida enferma de erro de julgamento em matéria de direito, por erro de interpretação e determinação das normas jurídicas aplicáveis, pelo que deverá ser revogada e substituída por Acórdão que julgue a impugnação procedente, por provada e, consequentemente, determine a anulação da liquidação impugnada, por ilegalidade. Conforme peticionado.

G) Normas jurídicas violadas pela sentença recorrida:

- artigo 73° da Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de Novembro de 2006 (Diretiva IVA) e do anterior artigo 11.º A, n.° 1, alínea a), da Sexta Diretiva.

Colendos Juízes Conselheiros,

Ao contrário do julgamento que, desta questão, fez a douta sentença recorrida, entende a recorrente que a jurisprudência do TJUE aqui citada vai, claramente, no sentido de que as ajudas comunitárias em causa, concedidas à recorrente ao abrigo do Programa Poseima, não revestem a natureza de subvenções diretamente relacionadas com o preço das operações, pelo que não integram o valor tributável para efeitos de IVA, sendo essa a interpretação que deverá ser feita do art° 73° da atual Diretiva IVA.

No entanto, no caso de V. Exas., Colendos Juízes Conselheiros, entenderem que não existe uma resposta clara quanto à questão de saber se as ajudas concedidas ao abrigo do Programa Poseima são ou não subsumíveis no conceito de “subvenções diretamente relacionadas com o preço das operações”, para efeitos do disposto no art° 73° da Directiva IVA, entende a recorrente que deverá esse Supremo Tribunal proceder ao reenvio prejudicial da questão em análise, e de outras questões que entenda suscitar, para o TJUE, conforme previsto no artigo 19°, n.° 3, alínea b) e no artigo 267.°, do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia.

O QUE SE REQUER.

Nestes termos e nos melhores de Direito ao caso aplicáveis que V. Exas, Colendos Conselheiros, doutamente suprirão, comprovando-se que a douta sentença recorrida enferma de erro de julgamento, deverá o presente recurso ser julgado procedente por provado, não podendo a sentença recorrida manter-se na ordem jurídica, devendo ser revogada e substituída por Acórdão que julgue a impugnação procedente.

V. Exas., porém, melhor decidirão, julgando conforme for de JUSTIÇA! »


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O representante da Fazenda Pública (rFP) apresentou contra-alegação, que termina concluindo: «

A) A sentença recorrida - após aturada análise - sintetiza o seu exame nas seguintes premissas: os pagamentos efetuados à recorrente ao abrigo do programa POSEIMA, são provenientes de fundos da União Europeia; estes pagamentos destinam-se a minorar o impacto dos sobrecustos de abastecimento em produtos agrícolas essenciais para o consumo ou a transformação na região dos Açores; existe repercussão ao nível dos custos de produção e ao nível dos preços ao consumidor; e o benefício do regime específico de abastecimento fica subordinado à repercussão efetiva, até ao utilizador final, da vantagem económica resultante da isenção do direito de importação ou da ajuda, sendo que os Estados-Membros tomarão as medidas necessárias para assegurar o cumprimento do regulamento, considerando o pagamento das subvenções ao abrigo do programa Poseima subsumíveis a IVA.

B) Efetivamente, a norma introduzida no Orçamento de Estado para 1998 equiparou as ajudas POSEIMA a subvenções diretamente conexas com o preço das operações, pelo que os beneficiários daquelas ajudas são obrigados a liquidar o IVA referente às ajudas recebidas.

C) O facto de as normas comunitárias não terem enquadrado tais subvenções como ajudas à produção veio permitir que o legislador português enquadrasse e viesse a equiparar tais subvenções como diretamente conexas com o preço das operações.

D) A norma da citada Lei do Orçamento não contende com qualquer norma do Direito Comunitário a que, por força do primado do direito convencional, haja de ser dada prevalência.

E) Nesse sentido decidiu o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 15 de setembro de 2010, no âmbito do processo n.° 03740/10, da Secção de Contencioso Tributário, 2.° Juízo, consultável em www.dgsi.pt.

Nestes termos, e nos mais de Direito que V. Exas., Colendos Conselheiros, doutamente suprirão, deverá o presente recurso ser considerado totalmente improcedente, por inexistência de qualquer erro de julgamento em matéria de direito, assim se fazendo a costumada JUSTIÇA!»


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A Exma. Procuradora-geral-adjunta emitiu parecer, concluindo que deve ser negado provimento ao recurso e confirmada a sentença recorrida.

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Cumpridas as formalidades legais, compete conhecer e decidir.

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# II.


Na sentença, em sede de julgamento factual, expressou-se: «

1) A sociedade A……., S.A., tem sede na rua da ………, n.° …, 9500-…., Ponta Delgada, dedicando-se à atividade principal de “fabricação de alimentos para animais”, correspondente ao CAE 10.912 (cfr. fls. 19 e 21 verso do processo administrativo).

2) A sociedade A………., S.A., foi objeto de uma ação de fiscalização externa, de âmbito geral, incidente sobre o exercício de 2011, a qual se desenvolveu a coberto da ordem de serviço n.º OI201400244, da Direção de Finanças de Ponta Delgada, e teve início em 27 de janeiro de 2015 (cfr. fls. 12 do processo administrativo).

3) Em 12 de agosto de 2015, a divisão de inspeção tributária da Direção de Finanças de Ponta Delgada elaborou o relatório de inspeção, na qual se propôs a correção ao IVA do exercício de 2011, no valor de € 96.300,57, com fundamento no facto de a sociedade A…………., S.A., ter introduzido rações, na Região Autónoma dos Açores, que beneficiaram da ajuda estabelecida no Programa Comunitário de Opções Específicas para fazer face ao afastamento e à insularidade da Madeira e dos Açores (POSEIMA), sem que tivesse liquidado o IVA respeitante a essas ajudas (cfr. fls. 10 a 16 do processo administrativo).

4) A sociedade A………., S.A., foi objeto de uma ação de fiscalização externa, de âmbito geral, incidente sobre o exercício de 2012, a qual se desenvolveu a coberto da ordem de serviço n.° OI201400245, da Direção de Finanças de Ponta Delgada, e teve inicio em 27 de janeiro de 2015 (cfr. fls. 19 e 21 verso do processo administrativo).

5) Em 12 de agosto de 2015, a divisão de inspeção tributária da Direção de Finanças de Ponta Delgada elaborou o relatório de inspeção, na qual se propôs a correção ao IVA do exercício de 2012, no valor de € 121.356,26, com fundamento no facto de a sociedade A…………., S.A., ter introduzido rações, na Região Autónoma dos Açores, que beneficiaram da ajuda estabelecida no Programa Comunitário de Opções Específicas para fazer face ao afastamento e à insularidade da Madeira e dos Açores (POSEIMA), sem que tivesse liquidado o IVA respeitante a essas ajudas (cfr. fls. 19 a 26 do processo administrativo).

6) Os relatórios de inspeção referidos foram aprovados por despachos do Diretor de Finanças de 19 de agosto de 2015 (cfr. fls. 10 e 19 do processo administrativo).

7) Em consequência das ações inspetivas, o Serviço de Finanças de Ponta Delgada efetuou as seguintes liquidações adicionais do IVA e respetivos juros compensatórios, em nome da sociedade A………., S.A.,:

- período de 0311, liquidação n.° 15009029, no valor de € 12.257,34, e liquidação de juros compensatórios n° 15009030, no valor de € 2.170,72.

- período de 0311, liquidação n.° 15009031, no valor de €34.773,15, e liquidação de juros compensatórios n° 15009032, no valor de € 5.925,73.

- período de 0811, liquidação n.° 15009033, no valor de € 17.574,73, e liquidação de juros compensatórios n° 15009034, no valor de € 2.700,25 (cfr. fls. 44 e 45 do processo administrativo).

8) Em 31 de agosto de 2015, foi efetuada a compensação n.° 2015 19660118, relativo ao IVA do período de a 30 de novembro de 2012, da qual resultou um saldo a pagar pela sociedade A…………., S.A., no valor de € 31.415,80 (cfr. fls. 35 do processo administrativo).

9) Em 1 de setembro de 2015, foi efetuada a compensação n.° 2015 19774611, relativo ao IVA do período de a 30 de abril de 2012, da qual resultou um saldo a pagar pela sociedade A……..., S.A., no valor de € 40.908,83 (cfr. fls. 29 do processo administrativo).

10) Em 7 de setembro de 2015, foi efetuada a compensação n.° 2015 20107734, relativo ao IVA do período de a 30 de novembro de 2012, da qual resultou um saldo a pagar sociedade A…………., S.A., no valor de € 78.200,17 (cfr. fls. 32 do processo administrativo).

11) Em 8 de setembro de 2015, foram efetuada(s) as compensações n.° 2015 20219109, relativo ao IVA do período de 1 a 31 de março de 2013, da qual resultou um saldo a pagar pela sociedade A………., S.A., no valor de € 2.197,63; n.° 2015 20219110, relativo a juros de mora pela falta de pagamento do IVA do período de 1 a 31 de março de 2013, no valor de € 290,88; n.º 2015 12419781, relativo a juros de mora pela falta de pagamento do IVA do período de 1 a 30 de abril de 2013, no valor de € 41,83 (cfr. fls. 38, 40 e 41 do processo administrativo).

12) Em 10 de novembro de 2015, a sociedade A………., S.A., apresentou uma reclamação graciosa contra os atos de liquidação do IVA referenciados de 7) a 11) (cfr. fls. 4 a 9 do processo administrativo).

13) Em 13 de maio de 2016, o Diretor de Finanças de Ponta Delgada decidiu indeferir a reclamação graciosa (cfr. fls. 95 do processo administrativo).

14) A Direção de Finanças de Ponta Delgada enviou o ofício n.° 2003, dirigido à sociedade A…………., S.A., através da carta registada com aviso de receção n.° RD754017136PT, cujo talão de receção se mostra assinado a 30 de Maio de 2016 (cfr. fls. 104, 105 e 106 do processo administrativo).»


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Neste recurso jurisdicional, as questões pedintes de solução (incluindo a respeitante ao (eventual) reenvio prejudicial), presentes a alegação produzida pela rte e a síntese delimitadora das correspondentes conclusões, foram (todas) apreciadas, por este Supremo Tribunal Administrativo - em recurso jurisdicional plenamente idêntico, ao ponto de os quadros conclusivos das alegações e contra-alegações, nos dois casos, serem, ipsis verbis, iguais -, e decididas, por unanimidade, no acórdão de 27 de novembro de 2019, tirado no processo n.º 3/12.2BEPDL.
Posto isto, em obediência ao estatuído no artigo (art.) 8.º n.° 3 do Código Civil (CC) e porque concordamos, integralmente, com o que aí ficou decidido e respetivos fundamentos, usando da faculdade concedida pela 2.ª parte do n.° 5 do art. 663.° do Código de Processo Civil (CPC), ex vi do art. 281.° do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), remetemos para a fundamentação jurídica adotada no, supra convocado, acórdão do STA de 27 de novembro de 2019 (3/12.2BEPDL).
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# III.


Pelo exposto, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, acordamos negar provimento ao recurso.

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Custas pela recorrente.

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Não se procede à junção de cópia do acórdão remetido, porque se encontra disponível no sítio www.dgsi.pt
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[ Texto redigido em meio informático e revisto, com versos em branco ]


Lisboa, 14 de outubro de 2020. - Aníbal Ferraz (relator) – Francisco Rothes – Aragão Seia.