Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0853/17
Data do Acordão:07/04/2018
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ISABEL MARQUES DA SILVA
Descritores:RECURSO DE REVISTA EXCEPCIONAL
PRESSUPOSTOS
Sumário:O recurso de revista excepcional previsto no artigo 150º do CPTA não corresponde à introdução generalizada de uma nova instância de recurso, funcionando apenas “como uma válvula de segurança do sistema”, pelo que só é admissível se estivermos perante uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental, ou se a admissão deste recurso for claramente necessária para uma melhor aplicação do direito.
Nº Convencional:JSTA000P23488
Nº do Documento:SA2201807040853
Data de Entrada:07/10/2017
Recorrente:A............
Recorrido 1:AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
- Relatório -
1 – A…………, com os sinais dos autos, vem, ao abrigo do disposto no artigo 150.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), interpor para este Supremo Tribunal recurso excepcional de revista do acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 11 de Maio de 2017, que negou provimento ao recurso por si interposto da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra que julgara improcedente a reclamação judicial deduzida o despacho do Chefe do Serviço de Finanças de Amadora – 3 que, por extemporaneidade do requerimento, lhe indeferiu incidente de anulação de venda executiva.
O recorrente termina a sua alegação de recurso formulando as seguintes conclusões:
a) o art. 257.º n.º 1 e 2 do CPPT não define de forma exclusiva os fundamentos da declaração de nulidade ou ineficácia da venda em processo executivo, apenas abrangendo as situações em que a mesma é passível de ser declarada anulável, pelo que os prazos nele previstos apenas se direcionam a situações em que a mesma venda é anulável, como decorre da sua própria letra textual;
b) fora do seu âmbito de aplicação situam-se todos os casos em que a venda é nula ou ineficaz, o que pode ser invocado a todo o tempo, sendo, inclusivamente, do conhecimento oficioso, nos termos determinados pelo art. 286.º do Cod. Civil, o qual estabelece um inderrogável princípio de defesa da segurança jurídica e do direito de propriedade, princípios fundamentais esses que não cedem face à estabilidade da venda realizada no âmbito executivo fiscal;
c) salvaguardando-se, completamente, o princípio da igualdade, de consagração constitucional, tal como plasmado no art. 13.º da Constituição da República Portuguesa;
d) ao decidir diferentemente, o Acórdão recorrido, salvo melhor opinião, violou os comandos legais invocados nas presentes conclusões, em termos decisivamente perturbadores da prossecução e manutenção dos princípios da segurança e da defesa da propriedade privada.
Termos em que deve o presente recurso ser recebido e, a final, ser o mesmo julgado procedente, revogando-se o Acórdão recorrido, com as legais consequências, por ser de JUSTIÇA!

2 – Não foram apresentadas contra-alegações.

3 - O Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto junto deste Tribunal emitiu o parecer de fls. 299/300 dos autos, concluindo no sentido da inadmissibilidade do recurso, por não se encontrarem preenchidos os pressupostos do recurso de revista a que alude o n.º 1 do artigo 150.º do CPTA.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir da admissibilidade do recurso.
- Fundamentação -
4 – Matéria de facto
É do seguinte teor o probatório fixado no acórdão recorrido:
A. Em 11 de Março de 2013, o Serviço de Finanças de Amadora-3, penhorou o imóvel inscrito na matriz predial urbana, sob o artigo 2639 – fracção G, pertencente ao Reclamante, A…………, com o NIF n.º ………, para garantia da quantia exequenda de €42.658,46, referente ao PEF n.º 3611201201074253. – cf. Ap. 2629, de 11 de Março de 2013, inscrita na certidão predial referente à ficha nº 953/19901210-G, da freguesia do ………, de fls. 334 a 336 do PEF apenso – vol. II.
B. Em 2 de Julho de 2013, o Reclamante recebeu duas cartas remetidas pelo Serviço de Finanças de Amadora-3, informando-o que havia designado o dia 12 de Agosto de 2013, para venda da “Fracção Autónoma designada pela letra “G”, destinada a habitação (…) inscrita na matriz predial urbana da freguesia do ………, concelho de lisboa sob o artigo n.º 2639” - cfr. ofícios n.ºs 5164 e 5165, ambos de 16 de Junho de 2013, e respectivos avisos de recepção, de fls. 274 a 277 do PEF apenso – vol. 1.
C. Em 31 de Julho de 2013, por sentença proferida no processo nº 719/13.6YXLSB, do 8.º Juízo Cível de Lisboa, o Reclamante, A…………, com o n.º ........., foi declarado insolvente. – cf. sentença de fls. 432 a 439, do PEF apenso – vol. II.
D. Em 12 de Agosto de 2013, o imóvel descrito nas alíneas A) e B) supra, precedentes foi vendido, pelo Serviço de Finanças de Amadora- 3, a B…………, pelo valor de 210.200. – cf. auto de adjudicação, a fls. 320, do PEF apenso – vol. II.
E. Em 20 de Novembro de 2013, o Administrador de Insolvência do Reclamante, pediu esclarecimentos ao Serviço de Finanças de Amadora-3, relativamente à venda das fracções “G” e “H” do prédio inscrito na matriz predial urbana do ………, com o artigo 2639, informando que “as fracções em apreço eram pertença do insolvente”, e pediu que o produto dessa venda fosse transferido para a conta da massa insolvente. – cf. mensagem de correio electrónico, de fls. 79.
F. Em 12 de Dezembro de 2013, o Reclamante recebeu uma carta remetida pelo Serviço de Finanças de Amadora -3, identificando como assunto “ENTREGA DO BEM AO ARREMATANTE – ART. 859.º do CPC”, e de cujo teor se extrai:
“Fica por este meio citado (…) para (…) proceder à entrega do Rés do Chão, correspondente à fracção autónoma designada pela letra (s) “G”, do prédio urbano sito no Largo ………, n.º ……, ………, Lisboa, inscrito na matriz predial urbana da freguesia do ………, o qual foi objecto de venda judicial, realizada em 12-08-2013 (…).
Mais fica notificado, que deverá proceder à entrega das chaves neste serviço de Finanças da Amadora-3”. – cf. ofício n.º 9719, de 2 de Dezembro de 2013, e respectivo aviso de recepção, de fls. 393 e 394 do PEF apenso – vol. II
G. Em 8 de Janeiro de 2014, a Massa Insolvente de A…………, apresentou no Tribunal Tributário de Lisboa, uma acção administrativa especial, pedindo a anulação da venda das fracções autónomas “G” e “H”, acima identificadas. – cf. petição de fls. 442 a 448 do PEF apenso – vol. II.
H. Em 16 de Janeiro de 2014, o Reclamante recebeu uma carta remetida pelo Serviço de Finanças de Amadora-3, identificando como assunto “ENTREGA DO BEM (ARROMBAMENTO) ”, e de cujo teor se extrai:
“Fica V. Exª., por este meio notificado, na qualidade de executado e ocupante do R/Chão – Bloco 2 – apartamento 007 do prédio urbano sito no Largo ………, n.º …… – ……… – Lisboa, inscrito na matriz predial urbana da freguesia do ………, concelho de Lisboa sob o artigo n.º 2639, o qual foi objecto de venda judicial, realizada em 12-08-2013, de que (…) foi designado o próximo dia 26/2/2014 pelas 10 horas, para ser concretizada a diligência de entrega do bem (Arrombamento) do imóvel do adquirente”. – cf. ofício n.º 343, de 13 de Janeiro de 2014, e respectivo aviso de recepção, de fls. 398 e 399 do PEF apenso – vol. II.
I. No dia 22 de Janeiro de 2014, na sequência da sua notificação para entregar as chaves de um imóvel, a massa insolvente do reclamante remeteu por correio dirigido ao serviço de Finanças de Amadora – 3, uma petição de reclamação, invocando a ilegalidade das penhoras e da venda de imóveis efectuada no PEF n.º 3611201201074253 e apensos, pedindo, além do mais, a anulação da venda e a suspensão da entrega do imóvel – cf. petição, de fl. 71 a 77.
J. A petição descrita na alínea anterior deu origem ao processo de reclamação de actos do órgão de execução fiscal, que tramitou no Tribunal Tributário de Lisboa, sob o n.º 692/14.3BELRS. – cf. ofício de fls. 87.
K. Em 24 de Julho de 2014, foi proferida sentença no processo identificado na alínea anterior, que concluiu que “tendo decorrido mais de um mês sobre a notificação do despacho reclamado é manifesta a extemporaneidade da presente reclamação” e julgou improcedente a reclamação por “caducidade do direito de reclamar”. – cf. sentença de fls. 103 a 107.
L. Em 30 de Janeiro de 2015, o Administrador de Insolvência do Reclamante, recebeu uma carta remetida pelo Serviço de Finanças de Amadora – 3, identificando como assunto “ENTREGA DO BEM AO ADJUDICATÁRIO”, e de cujo teor se extrai:
“Fica por este meio citado (…), na qualidade de Administrador de insolvência do executado, A…………, para (…) proceder à entrega do R/Chão – Bloco 2 – apartamento 007 do prédio urbano sito no Largo ………, n.º …… – ……… – Lisboa, inscrito na matriz predial urbana da freguesia do ………, concelho de Lisboa sob o artigo n.º 2639, o qual foi objecto de venda judicial, realizada em 12-08-2013, (…). Mais fica notificado, que deverá proceder à entrega das chaves neste Serviço de Finanças da Amadora – 3”. – cf. ofício n.º 430, de 29 de Janeiro de 2015, e respectivo aviso de recepção, de fls. 479 e 480 do PEF apenso – vol. II.
M. Em 2 de Fevereiro de 2015, o Reclamante, recebeu uma carta remetida pelo Serviço de Finanças de Amadora – 3, identificando como assunto “ENTREGA DO BEM AO ADJUDICATÁRIO”, a dar-lhe conhecimento, “na qualidade de executado” da “notificação e despacho enviado ao Administrador de Insolvência, referente à entrega efectiva do bem vendido judicialmente (…) em 12/08/2013, correspondente ao R/Chão – Bloco 2 – Apartamento 007 do prédio sito no Largo ………, n.º …… – ……… – Lisboa”. – cf. ofício nº 432, de 29 de Janeiro de 2015, e respectivo aviso de recepção, de fls. 481 e 488 do PEF apenso – vol. II.
N. No dia 6 de Fevereiro de 2015, na sequência da sua notificação para entregar as chaves do imóvel correspondente ao “rés-do-chão – apartamento 008 – fracção H”, o Reclamante remeteu por correio dirigido ao Serviço de Finanças de Amadora – 3, a petição de reclamação, invocando a ilegalidade das penhoras de imóveis efectuadas no PEF n.º 3611201201074253 e apensos, pedindo, além do mais, a suspensão da entrega do imóvel. – cf petição com vinheta postal aposta, de fls. 50 a 55.
O. A petição descrita na alínea anterior, deu origem ao processo de reclamação de actos do órgão de execução fiscal, que tramitou neste Tribunal Administrativo e Fiscal, sob o n.º 1317/15.5BELRS. – cf. ofício de fls 62.
P. Em 25 de Março de 2015, na sequência da sua notificação para entregar a “fracção autónoma a que corresponde o (…) apartamento 007 do prédio sito no Largo ………, n.º ……, ……”, o Reclamante apresentou um requerimento no Serviço de Finanças de Amadora – 3, pedindo a revogação da decisão de entrega do imóvel. – cf. requerimento de fls. 536 a 541 do PEF apenso – vol. II.
Q. Em 13 de Outubro de 2015, foi proferida sentença no processo identificado na alínea O) supra, que decidiu “pela verificação da excepção dilatória atípica, ou inominada, de erro na forma do processo” e determinou “a convolação dos autos em requerimento de anulação de venda, com a consequente baixa dos autos ao Serviço de Finanças de Lisboa – 3, para o devido encaminhamento do (…) requerimento ao órgão periférico regional”. – cf. sentença de fls. 63 a 67.
R. Em 21 de Março de 2016, a Directora de Finanças Adjunta de Lisboa, indeferiu o pedido de anulação de venda apresentado pelo Reclamante, com a seguinte fundamentação:
" (...) II-ANÁLISE: (...)
Tendo por base tais considerações e retomando o caso em apreço, resulta dos factos supra descritos e da prova documental junta que:
1. O executado A………… foi notificado através do ofício nº 9719, com data de 02.12.2013, remetido por correio registado (identificado com a referência RD338598989P1), por si recepcionado em 12.12.2013, para proceder à entrega das chaves do imóvel que foi objecto da venda judicial realizada em 12.08.2013 pelo Serviço de Finanças de Amadora-3;
2. Contra o despacho de entrega do bem reagiu a MASSA INSOLVENTE de A…………, tendo intentado acção administrativa especial que correu termos sob o n.º 35/14.6BELRA, pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria e, simultaneamente, apresentado reclamação judicial que correu termos sob o n.º 692/14.3BELRS, pelo Tribunal Tributário de Lisboa;
3. Em resultado das decisões (improcedentes) proferidas em ambos os processos judiciais (transitadas em julgado), veio o adquirente requerer novamente a entrega do bem, o que foi determinado por despacho da Chefe do Serviço de Finanças da Amadora 3, em 28.01.2015;
4. Do teor do referido despacho foi notificado o administrador de insolvência para proceder em conformidade, o qual informou que não poderia concretizar o solicitado, pelo facto de não ter apreendido, nem ter tomado a posse do bem;
5. Tal despacho foi também levado ao conhecimento do executado e fiel depositário, através do ofício n.º 432, o qual veio a ser recepcionado em 02.02.2015;
6. Na sequência da tomada de conhecimento do teor do referido despacho, vem o executado A………… em 06.02.2015, por si só, apresentar reclamação judicial com os mesmos fundamentos que a MASSA INSOLVENTE de A…………., já havia invocado na reclamação judicial supra referida em 2, sendo certo que ambas as referidas reclamações contemplam, precisamente, a mesma matéria de facto e de direito e encontram-se subscritas pelo mesmo mandatário;
7. A reclamação judicial apresentada pelo próprio executado, em 06.02.2015, então convolada em incidente de anulação de venda, correu os seus termos sob o n º 1317/15.5BELRS, no Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra.
Basta atentar ao intróito da sentença que decidiu convolar a reclamação judicial (que o executado então Insolvente remeteu ao serviço de Finanças de Amadora 3, no dia 06.02.2015) em incidente de anulação da venda e aos factos invocados e comprovados para se concluir que, in casu, a convolação se verifica prejudicada, na medida em que entre a data em que o Executado apresentou a reclamação (06.02.2015) e aquela (12.12.2013) em que tomou conhecimento do acto lesivo decorreram mais que os 15 dias a que se refere o n º 1 al c) do Art.º 257º do CPPT, atento o fundamento invocado pelo executado, então insolvente, para fazer valer a sua pretensão.
Com efeito, a infundada causa de anulação da venda alegada pelo executado (a venda ter sido efectuada em detrimento da massa insolvente e o valor obtido, desproporcional em relação ao valor comercial) faz-nos reverter para o prazo de 15 dias, previsto no art. 257º, nº 1 alínea c), do CPPT.
Tal prazo contar-se-á da data da venda ou da que o requerente tome conhecimento do facto que serviu de fundamento à anulação, neste caso, competindo-lhe provar a data desse conhecimento (vd. art.º 257º, nº 2 do CPPT).
Acresce que, o prazo para deduzir o incidente de anulação de venda é um prazo judicial atento o disposto no art. 20.º, n.º 2 do CPPT. E, por isso, tratando-se, como se trata, de um prazo de natureza judicial (Art° 103, 1 da LGT), aplica-se-lhe o regime do CPC, pelo que ele corre continuamente, suspendendo-se, no entanto, em férias judiciais (vd. Art.º 20º, n.º 2 do CPPT e Art.º 138º do CPC).
Ora, no caso, acha-se demonstrado pelo elenco dos factos descritos e comprovados que a venda em processo de execução fiscal se concretizou em 12.08.2013. Como, também, se acha demonstrado que em 12.12.2013, quando foi notificado para proceder à entrega das chaves do bem imóvel, o executado, então insolvente, tomou conhecimento que o mesmo havia sido vendido, o que nos permite concluir que, pelo menos, nesta data, tomou conhecimento dos factos que invoca para fundamentar o incidente de anulação de venda.
Assim sendo, se tivermos presente, aquelas duas referidas datas (12.08 e 12.12 de 2013) ter-se-á que concluir que, em 06.02.2015, quando deu entrada a reclamação judicial que o Tribunal decidiu convolar em incidente de anulação de venda, há muito se mostravam ultrapassados os prazos legais para suscitar tal incidente, conforme adiante melhor se demonstrará a propósito da tempestividade. (...) B - DA TEMPESTIVIDADE:
Ora quanto à tempestividade do pedido haverá que se atender ao disposto no Art.º 257º, nº 1, al. a), b) c) do CPPT. Com efeito, o prazo em que pode ser requerida a anulação d venda, com o fundamento invocado, é de 90, 30 ou 15 dias. O cômputo do mesmo prazo tem o seu início na data da venda ou naquela em que o requerente tomou conhecimento do facto que serviu de fundamento à anulação, neste caso, competindo-lhe provar a data desse conhecimento (vd. Art. º, nº 2 do CPPT).
Considerando os prazos para requerer a anulação e a prova documental carreada para o processo, importa analisar as datas em confronto:
a venda em processo de execução fiscal ocorreu a 12.08.2013;
o conhecimento da venda ocorreu a 12.12.2013. Com efeito, o executado, então insolvente, A…………, foi notificado através do oficio n.º 9719, com data de 02.12.2013, recepcionado em 12.12.2013, para proceder à entrega das chaves do imóvel no Serviço de Finanças de Amadora 3, pelo que, pelo menos, nesta data tomou conhecimento da venda;
a data da entrada da reclamação judicial então convolada em requerimento de anulação de venda, ocorreu a 06.02.2015.
Tomando como referência a data mais recente em que o executado, então insolvente, tomou conhecimento da venda (12.12.2013), rapidamente se concluirá que em 06.02.2015, já havia decorrido o prazo mais longo (90 dias) para requerer a anulação da venda, sendo certo porém que atento o fundamento infundado, invocado pelo executado, sempre seria de apocar, no caso em apreço, o prazo mais curto de 15 dias.
Com efeito, retira-se da matéria de facto alegada pelo executado, então insolvente, e da prova documental junta que a causa de anulação da venda não se subsume, nem na alínea a), nem na alínea b) do supra citado Art. 257º do CPPT.
Todavia, ainda que se viesse a entender - o que, não se aceita e apenas se concede por hipótese de raciocínio - que o executado, então insolvente, poderia apresentar o pedido de anulação de venda, este seria, eventualmente, susceptível de integrar a previsão da alínea c) do n.º 1 do artigo 257.º do CPPT, face ao fundamento por si invocado. Portanto, a vislumbrar-se a sua admissibilidade, o incidente de anulação da venda sempre teria que ser suscitado no prazo de 15 dias.
Acresce que, como supra se evidenciou, o prazo para suscitar o incidente de anulação de venda, contar-se-á da data da venda ou da que a requerente tome conhecimento do facto que servir de fundamento à acção, competindo-lhe provar a data desse conhecimento (vd. Art. 257.º, n.º 2 do CPPT).

Ora, no caso, acha-se demonstrado que a venda em processo de execução fiscal se concretizou em 12.08.2013. Acresce que, como supra se evidenciou, o prazo para suscitar o incidente de anulação de venda, contar-se-á da data da venda ou da que a requerente tome conhecimento do facto que servir de fundamento à acção, competindo-lhe provar a data desse conhecimento (vd. Art. 257º, nº 2 do CPPT).
Ora, no caso, acha-se demonstrado que a venda em processo de execução fiscal se concretizou em 12.08.2013. Como, também, se acha demonstrado que em 12.12.2013, o executado, quando foi notificado para proceder à entrega das chaves do bem imóvel tomou conhecimento que o mesmo havia sido vendido, o que nos permite concluir que, pelo menos, nessa data, tomou conhecimento dos factos que invoca para fundamentar o incidente de anulação de venda.
Assim sendo, se tivermos presente, quer a data (12.08.2013) em que se concretizou a venda, quer a data (12.12.2013) em que o executado tomou conhecimento dos factos que servem de fundamento ao incidente de anulação de venda (a venda foi efectuada em detrimento da massa insolvente e o valor obtido, desproporcional em relação ao valor comercial), ter-se-á que concluir que, em 06.02.2015, quando deu entrada a reclamação judicial que o Tribunal decidiu convolar em incidente de anulação de venda, há muito se mostravam ultrapassados os prazos para suscitar tal incidente.
Vejamos:

(i) se, se atender à data da venda o identificado prazo de 15 dias, teve o seu início em 13.08.2013, ocorrendo o seu termo final em 15.09.2013, o qual se transferiu para 16.09.2013 em virtude de o dia 15 ter sido num domingo e o prazo ter estado suspenso até 31.08.2013, por motivo de férias judiciais, (ii) se, se atender à data em que o executado, então insolvente, tomou conhecimento do facto que serve de fundamento ao incidente de anulação da venda, o identificado prazo de 15 dias, teve o seu início em 13.12.2013, ocorrendo o seu termo final em 09.01.2014, uma vez que esteve suspenso de 21.12.2013 até 03.01.2014, por motivo de férias judiciais.
Tal determina que à data do envio postal da presente petição para efeito da sua entrada em juízo (06.02.2015) e atendendo aos fundamentos invocados, ainda que se mostrasse admissível o presente incidente de anulação da venda, sempre o pedido seria considerado intempestivo, uma vez que já se havia esgotado há muito, o citado prazo de 15 dias que se encontra legalmente previsto.
Considerando o supra exposto, afigura-se-nos que o incidente de anulação de venda não deve prosseguir para conhecimento do mérito do pedido, por se mostrar manifestamente extemporâneo o recurso a esse meio processual. O prazo fixado para a dedução do incidente de anulação de venda, porque aparece como extintivo do respectivo direito de pedir judicialmente o reconhecimento de uma certa pretensão, é um prazo de caducidade. E sendo, como é, um prazo de caducidade, significa que o direito de acção é de conhecimento oficioso, razão pela qual se encontra excluída da disponibilidade das partes, atento o disposto no Art. 333º, n° 1 do Código Civil
Em conclusão, mostrando-se, como se mostra, inequivocamente, intempestivo a apresentação do pedido de anulação de venda em apreço, verifica-se a caducidade do direito de acção, o que constitui excepção peremptória, com a consequente absolvição do pedido, nos termos previstos no artigo 576.º n.º 3, do CPC, aplicável ex vi do artigo 2.º alínea e), do CPPT.
Não obstante o dever de resolução de todas as questões que as partes coloquem à apreciação do julgador, encontram-se “exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras” (vd n.º 2 do Art. 608º CPC, aplicável por força do disposto no Art. 2.º, al. e), do CPPT).

Face ao que antecede e considerando que a extemporaneidade do pedido de anulação de venda em apreço determina, respectivamente, a absolvição do pedido, fica objectivamente prejudicada a apreciação do mérito do mesmo.
III - CONCLUSÃO

Em face do exposto, resulta amplamente demonstrado que o pedido de anulação de venda se mostra intempestivo, razão pela qual se INDEFERE O PEDIDO e se mantém, consequentemente, válida e eficaz a venda do prédio urbano nos seus precisos termos.
Nestes termos, remeta-se a presente informação ao Serviço de Finanças de Amadora 3, para efeitos do disposto no n° 6 do Art.257° do CPPT". - cf Despacho, Informação, Análise e Conclusão, de fls. 36 a 42
S. Em 21 de Abril de 2016, o Reclamante, recebeu uma carta remetida pelo Serviço de Finanças de Amadora-3, identificando como assunto ''NOTIFICAÇÃO - ANULAÇÃO DE VENDA", a dar-lhe conhecimento da decisão de indeferimento descrita na alínea anterior. - cf ofício nº 2061, de 20 de Abril de 2016 e respectivo aviso de recepção, a fls. 638 e 639 do PEF apenso - vol. II
T. No dia 29 de Abril de 2016, o Reclamante remeteu por correio dirigido ao Serviço de Finanças de Amadora-3, a petição de incidente de anulação da venda n.º 3611.2013.36, realizada no PEF nº 3611201201074253 e apensos, que instrui os presentes autos. - cf petição com vinheta postal aposta, a fls . 6.


5 – Apreciando.
5.1 Da admissibilidade do recurso
O presente recurso foi interposto e admitido como recurso excepcional de revista, ao abrigo do disposto no artigo 150.º do CPTA, havendo agora que proceder à apreciação preliminar sumária da verificação in casu dos respectivos pressupostos da sua admissibilidade, ex vi do n.º 5 do artigo 150.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA).
Dispõe o artigo 150.º do CPTA, sob a epígrafe “Recurso de Revista”:
1 – Das decisões proferidas em segunda instância pelo Tribunal Central Administrativo pode haver, excepcionalmente, revista para o Supremo Tribunal Administrativo quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental ou quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito.
2 – A revista só pode ter como fundamento a violação de lei substantiva ou processual.
3 – Aos factos materiais fixados pelo tribunal recorrido, o tribunal de revista aplica definitivamente o regime jurídico que julgue mais adequado.
4 – O erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa não pode ser objecto de revista, salvo havendo ofensa de uma disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força de determinado meio de prova.
5 – A decisão quanto à questão de saber se, no caso concreto, se preenchem os pressupostos do n.º 1 compete ao Supremo Tribunal Administrativo, devendo ser objecto de apreciação preliminar sumária, a cargo de uma formação constituída por três juízes de entre os mais antigos da secção de contencioso administrativo.

Decorre expressa e inequivocamente do n.º 1 do transcrito artigo a excepcionalidade do recurso de revista em apreço, sendo a sua admissibilidade condicionada não por critérios quantitativos mas por um critério qualitativo – o de que em causa esteja a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental ou quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito – devendo este recurso funcionar como uma válvula de segurança do sistema e não como uma instância generalizada de recurso.
E, na interpretação dos conceitos a que o legislador recorre na definição do critério qualitativo de admissibilidade deste recurso, constitui jurisprudência pacífica deste Supremo Tribunal Administrativo - cfr., por todos, o Acórdão deste STA de 2 de abril de 2014, rec. n.º 1853/13 -, que «(…) o preenchimento do conceito indeterminado de relevância jurídica fundamental verificar-se-á, designadamente, quando a questão a apreciar seja de elevada complexidade ou, pelo menos, de complexidade jurídica superior ao comum, seja por força da dificuldade das operações exegéticas a efectuar, de um enquadramento normativo especialmente intricado ou da necessidade de concatenação de diversos regimes legais e institutos jurídicos, ou quando o tratamento da matéria tem suscitado dúvidas sérias quer ao nível da jurisprudência quer ao nível da doutrina. Já relevância social fundamental verificar-se-á quando a situação apresente contornos indiciadores de que a solução pode constituir uma orientação para a apreciação de outros casos, ou quando esteja em causa questão que revele especial capacidade de repercussão social, em que a utilidade da decisão extravasa os limites do caso concreto das partes envolvidas no litígio. Por outro lado, a clara necessidade da admissão da revista para melhor aplicação do direito há-de resultar da possibilidade de repetição num número indeterminado de casos futuros e consequente necessidade de garantir a uniformização do direito em matérias importantes tratadas pelas instâncias de forma pouco consistente ou contraditória - nomeadamente por se verificar a divisão de correntes jurisprudenciais ou doutrinais e se ter gerado incerteza e instabilidade na sua resolução a impor a intervenção do órgão de cúpula da justiça administrativa e tributária como condição para dissipar dúvidas – ou por as instâncias terem tratado a matéria de forma ostensivamente errada ou juridicamente insustentável, sendo objectivamente útil a intervenção do STA na qualidade de órgão de regulação do sistema.».

No caso dos autos, contrariamente ao alegado, julgamos que não se mostram preenchidos os pressupostos do recurso de revista excepcional.
O acórdão do TCA em relação ao qual o recorrente solicita revista confirmou a sentença de 1.ª instância que julgara improcedente a reclamação judicial deduzida pelo executado contra despacho que julgara improcedente pedido de anulação da venda executiva, no entendimento de que tendo o conhecimento da venda ocorrido em 12 de Dezembro de 2013, em 2 de Fevereiro de 2015, data da entrega da petição convolada em requerimento, já havia decorrido o prazo mais longo para requerer a anulação da venda (90 dias, se o fundamento da anulação se subsumir à alínea a) do n.º 1 do art. 257.º do CPPT). Mais considerou o acórdão do TCA-Sul sindicado que “A invocação de que está em causa um fundamento de nulidade da venda, o qual não estaria sujeito aos limites temporais do artigo 257.º do CPPT, contende com a disposição em causa. A mesma não encerra apenas regras sobre prazos de dedução do incidente de anulação de venda, mas prevê também as situações e os motivos em que a venda em execução fiscal pode ser anulada, com exclusão de quaisquer outras. Neste sentido, V. Jorge Lopes de Sousa, CPPT, anotado, Vol. IV, 6.ª Edição, pp. 175/176. Delimitação que tem na sua base a estabilidade do acto de venda. Donde decorre a asserção de que a anulação da venda pode ter lugar a qualquer momento não tem arrimo no ordenamento jurídico.” – cfr. acórdão recorrido, a fls. 268 dos autos.
Alega o recorrente que, contrariamente ao decidido, o art. 257.º n.º 1 e 2 do CPPT não define de forma exclusiva os fundamentos da declaração de nulidade ou ineficácia da venda em processo executivo, apenas abrangendo as situações em que a mesma é passível de ser declarada anulável, pelo que os prazos nele previstos apenas se direcionam a situações em que a mesma venda é anulável, como decorre da sua própria letra textual e que fora do seu âmbito de aplicação situam-se todos os casos em que a venda é nula ou ineficaz, o que pode ser invocado a todo o tempo, sendo, inclusivamente, do conhecimento oficioso, nos termos determinados pelo art. 286.º do Cod. Civil, o qual estabelece um inderrogável princípio de defesa da segurança jurídica e do direito de propriedade, princípios fundamentais esses que não cedem face à estabilidade da venda realizada no âmbito executivo fiscal.
O TCA decidiu, porém, em plena conformidade com a jurisprudência e doutrina mais qualificada, de que dá, aliás, nota, não se afigurando a sua decisão como “manifestamente errada”, juridicamente insustentável ou insustentada, a permitir a admissão da revista para uma “melhor aplicação do direito”. Nem parece que os fundamentos e prazo para requerer a anulação de venda em processo de execução fiscal seja questão que justifique a admissão da revista em razão da importância jurídica ou social fundamental da questão, pois que se trata de questão abundantemente tratada na jurisprudência, designadamente dos tribunais superiores, em sentido não desconforme com o decidido pelo TCA-Sul.
Acresce que, embora o recorrente tenha alegado que em causa nos autos está a “venda de bem alheio”, ferida de nulidade, sendo tal vício invocável a todo o tempo e inclusive de conhecimento oficioso, não é, manifestamente, esse o caso dos autos, em que o bem vendido era propriedade do executado, embora este tenha sido declarado insolvente em momento posterior à penhora do bem na execução fiscal e anterior à venda (cfr. as alíneas A), C) e D) do probatório fixado).

A revista não será, pois, admitida, por não verificação dos respectivos pressupostos legais.

- Decisão -
6 - Termos em que, face ao exposto, acorda-se em não admitir o presente recurso, por se julgar não estarem preenchidos os pressupostos do recurso de revista excepcional previstos no n.º 1 do artigo 150.º do CPTA.

Custas pelo recorrente.

Lisboa, 4 de Julho de 2018. - Isabel Marques da Silva (relatora) – Dulce Neto - António Pimpão.