Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0579/12
Data do Acordão:10/10/2012
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:FERNANDA MAÇÃS
Descritores:PODERES DE COGNIÇÃO DO SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO
AMPLIAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
INTERRUPÇÃO DA PRESCRIÇÃO
Sumário:Tendo a primeira instância decidido a questão de direito suscitada pela Oponente sem antes estabelecer a precisa situação de facto subjacente, é de determinar a ampliação da matéria de facto, uma vez que o Supremo Tribunal Administrativo, como Tribunal de revista, carece de poderes de cognição em sede de facto.
Nº Convencional:JSTA00067827
Nº do Documento:SA220121010579
Data de Entrada:05/24/2012
Recorrente:FAZENDA PÚBLICA
Recorrido 1:A...
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF PENAFIEL
Decisão:PROVIDO
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - EXEC FISCAL.
Área Temática 2:DIR CIV - DIR OBG.
Legislação Nacional:CPTRIB91 ART34 N3.
LGT98 ART48 N1 ART49 N1 N2 N3 ART91.
L 53-A/2006 DE 2006/12/29.
L 100/99 DE 1999/07/26.
DL 124/96 DE 1996/08/10 ART5 N5.
CCIV66 ART297 N1 ART326 N1.
CPC96 ART684 N3 ART685-A N1 ART729 N2.
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC0591/10 DE 2010/08/11; AC STA PROC0174/11 DE 2011/06/08; AC STA PROC0720/10 DE 2010/10/20; AC STA PROC01038/10 DE 2011/03/02
Referência a Doutrina:JORGE DE SOUSA SOBRE A PRESCRIÇÃO DA OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA NOTAS PRÁTICAS PAG78.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo

I- RELATÓRIO

1. A……., identificada nos autos, apresentou, no Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel, oposição, na qualidade de responsável subsidiária, à execução fiscal nº. 3565-1998/01012592, instaurada pelo Serviço de Finanças de Valongo 2, contra o seu marido, B……, por dívidas de IVA, relativas aos anos de 1994, 1995 e 1996, no valor global de 42.315,30 euros.
1.1.Naquele Tribunal decidiu-se julgar a oposição totalmente procedente e extinta a execução, por as dívidas exequendas se encontrarem prescritas.

2. Notificada da sentença, a representante da Fazenda Pública veio dela interpor recurso para este Tribunal, apresentando as seguintes conclusões das suas alegações:
“A. Visa o presente recurso reagir contra a douta sentença que julgou extinta a execução relativamente às dívidas respeitantes ao IVA dos exercícios de 1994 e 1996, com fundamento na prescrição da obrigação tributária, na oposição deduzida pela oponente.
B. Dita a douta sentença que tendo a citação sido efectuada em 09.01.2006, o prazo de prescrição começou de novo a contar-se em 09.01.2007.
C. Acrescentando que, somando-se até essa data, o tempo que decorreu entre 1999 a 09.01.2006.
D. Ora, a lei nº 53-A/2006 revogou o nº 2 do art. 49º da LGT, no qual se consagrava o regime de a paragem do processo por período superior a um ano por facto não imputável ao sujeito passivo fazer cessar o efeito interruptivo transformando-o em suspensivo.
E. Assim, em conformidade com o art. 91º daquela Lei nº 53-A/2006, «a revogação do nº 2 do artigo 49º da LGT aplica-se a todos os prazos de prescrição em curso, objecto de interrupção, em que ainda não tenha decorrido o período superior a um ano de paragem do processo por facto não imputável ao sujeito passivo».
F. Porém, esta Lei (Orçamento do Estado para 2007) entrou em vigor em 01.01.2007, de harmonia com o seu art.°. 163° e, sendo aquela uma norma que estabelece os efeitos (ou não) de factos, ela só se aplica após a sua entrada em vigor, por força da regra do art. 12º, n.° 2, do CC.
G. Refira-se que, se não se completou um ano de paragem do processo até 01.01.2007, os efeitos do primeiro acto interruptivo (eliminação do período decorrido anteriormente e suspensão da prescrição enquanto se mantiver o processo) mantêm-se, para o passado e para futuro, mesmo que o processo venha parar por facto não imputável ao contribuinte (Juiz Conselheiro Jorge Lopes de Sousa, in Sobre a Prescrição da Obrigação Tributária” notas práticas, 2008, pág. 78.).
H. Deste modo, verificando-se que após a citação da oponente em 09.01.2006, não se completou um ano de paragem do processo não se aplicaria o regime previsto no n°2 do art°. 49º da LGT, não sendo relevante se antes da paragem do processo por mais de um ano por facto não imputável ao sujeito passivo não se tiver verificado qualquer facto interruptivo, neste sentido, se pronunciou o acórdão do STA de 04.02.2009, proc. 0488/08.
I. Desta forma, a citação enquanto facto interruptivo produz o efeito instantâneo de eliminar o período anterior e o efeito duradouro de obstar ao decurso da prescrição, ainda que, depois de 01.01.2007, venha a estar parada por mais de um ano por facto não imputável ao contribuinte (pois foi revogado nº 2 do art. 49º).
J. Pelo que deverá o presente recurso ser julgado procedente, revogando-se a decisão judicial recorrida por padecer a mesma de um erro de direito por violação dos artigos 48° e 49° da LGT.
K. Termos em que, concedendo-se provimento ao recurso, deve a decisão ser revogada, com as devidas consequências legais.
Termos em que, deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se a douta sentença recorrida, com as devidas consequências legais”.

3. Não houve contra-alegações.

4. O Magistrado do Ministério Público, junto deste Supremo Tribunal, pronunciou-se no sentido de ser anulada a sentença recorrida, baixando os autos à 1ª instância para ser ampliada a matéria de facto, conforme se dispõe no seu parecer:
“(…) Nos termos do artigo 49° a citação (após a entrada em vigor da Lei 100/99, de 26 de Julho), a reclamação, o recurso hierárquico a impugnação e o pedido de revisão oficiosa interrompem a prescrição.
De acordo com o nº 2, entretanto revogado pela Lei 53-A/2006, de 29/12, mas cuja revogação só aplica aos casos em que o ano de paragem do processo termina a partir de 2007.01.01, a paragem do processo por mais de 1 ano por facto não imputável ao sujeito passivo faz cessar o efeito interruptivo, somando-se neste caso, o tempo que decorrer após esse período ao que tiver decorrido até à data da autuação.
Nos termos do n° 3, na redacção anterior à referida Lei 53-A/2006, o prazo de prescrição suspende-se por motivo de paragem do processo de execução fiscal em virtude de pagamento a prestações legalmente autorizado ou de reclamação, impugnação ou recurso, com efeito suspensivo da execução fiscal em consequência de prestação de garantia, sendo certo que com a redacção introduzida pela citada Lei além da suspensão por pagamento em prestações a suspensão o prazo de suspensão suspende-se enquanto não houver decisão transitada que ponha termo ao processo, nos casos de reclamação, impugnação, recurso ou oposição quando determinem a suspensão da cobrança da dívida.
Nos termos do estatuído no artigo 5.°/5 do DL 124/96, de 10 de Agosto, o prazo de prescrição suspende-se durante o período de pagamento em prestações, ou seja, entre a data da adesão a esse regime e a data da exclusão.
Ora, a factualidade apurada é insuficiente para apurar a prescrição relativamente ao IVA de 1994 e 1995.
De facto, do probatório não consta a data da admissão do executado originário ao regime de pagamento em prestações constante do DL 124/96, apenas constando a data da exclusão.
Ora, sem esse dado de facto nem sequer é possível apurar qual o prazo de prescrição a aplicar, se o do CPT (10 anos), se o da LGT (8 anos), uma vez que, como já se referiu, ao abrigo do estatuído no artigo 297.° do CC, importa apurar se à data da entrada em vigor da LGT (1999.01.01) faltava menos tempo para se completar a prescrição ao abrigo do CPT, o que só é possível relevando o período de suspensão, entretanto, ocorrido.
Por outro lado, para uma correcta análise da problemática da prescrição, importa ainda apurar se o PEF esteve ou não parado por mais de um ano por facto não imputável ao contribuinte, facto que, também, não consta do probatório.
Note-se, aliás, que a falta de factualidade para análise da prescrição (e das outras questões suscitadas) já havia sido referida no douto acórdão do TCAN junto aos autos (fls. 163/164), sendo certo que o Tribunal recorrido se limitou a fixar, exactamente, a mesma factualidade, acrescida do facto constante do ponto 7.° do probatório e que havia sido acrescentado pelo TCAN ao abrigo do estatuído no artigo 712.° do CPC.
Termos em que, nos termos do disposto nos artigos 729.°/3 e 730.° do CPC deve anular-se a sentença recorrida, baixando os autos à 1ª instância, a fim de se proceder à ampliação da matéria de facto”.

5. Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

II-FUNDAMENTOS

1- DE FACTO

Na 1ª instância deram-se como provados os seguintes factos:
“1.º - Por dívidas de IVA de B……., referentes aos anos de 1994, 1995 e 1996, no valor global de 42.315,50 euros, foi instaurado o processo de execução fiscal n.°3565- 1998/701012592, em 20 de Julho de 1998, pelo Serviço de Finanças de Valongo-2.
2.° - A dívida estava incluída no Plano de Regularização Prestacional, previsto pelo Decreto-Lei n.° 124/96.
3.º - O Executado B…… foi excluído do referido Plano Prestacional por incumprimento em 21.01.2001.
4.º - Em face da exclusão do regime do Decreto-Lei n.° 124/96, foi proferido despacho em 26.12.2001 a ordenar o prosseguimento dos autos.
5.º - Em 23.10.2002, o referido Serviço de Finanças procedeu à penhora de imóvel pertença da cônjuge mulher do Executado.
6.° - A ora Oponente foi citada como executada em 9 de Janeiro de 2006.
7.° - As liquidações das dívidas referidas em 1.º, foram notificadas ao Executado B……., em 30.09.1997 - cfr. doc. de fls.64 dos autos.
8.° - A dívida exequenda diz respeito a IVA dos anos de 1994 a 1996.
9.° - A instauração da execução ocorreu em 20.07.1998.”

2- DE DIREITO

2.1. Das questões a apreciar e decidir

Vem o presente recurso da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel, em 29 de Fevereiro de 2012, que julgou procedente oposição deduzida contra a execução fiscal relativa a dívida de IVA de 1994, 1995 e 1996, no entendimento de que a mesma se encontra extinta por prescrição.
Para tanto ponderou a Mmª Juíza “a quo”:
“Face ao art. 48º, nº1, da LGT, as dívidas tributárias relativas ao IVA prescrevem no prazo de oito anos contados a partir do início do ano seguinte àquele em que se verificou a exigibilidade do imposto ou o facto tributário.
As dívidas exequendas são relativas ao IVA de 1994 a 1996.
A citação da oponente foi efectuada em 09.01.2006.
Ao caso concreto é aplicável o nº 2 do art. 49º da LGT, uma vez que a dívida, em 1 de Janeiro de 2007 (entrada em vigor da lei) tinha mais de um ano de existência.
Resulta do nº 2 do art. 49º, da LGT, aplicável ao caso concreto que: A paragem do processo por período superior a um ano por facto não imputável ao sujeito passivo faz cessar o efeito previsto no número anterior, somando-se neste caso o tempo que decorreu após esse período ao que tiver decorrido até à data da autuação.
Ora, tendo a citação sido efectuada em 09.01.2006, o prazo de prescrição começou de novo a contar-se em 09.01.2007.
E somando-se até esta data, o tempo que decorreu entre 1999 a 09.01.2006.
Assim, o prazo referido no nº 1 do art. 48º, já se encontra ultrapassado.
Pelo que, as dívidas estão prescritas.
Pelo que, procede a presente Oposição, ficando prejudicado o conhecimento das restantes questões suscitadas pela Oponente”.

Contra este entendimento se insurge a Fazenda Pública argumentando que a dívida não se encontra prescrita, porquanto:
· “(…) se não se completou um ano de paragem do processo até 01.01.2007, os efeitos do primeiro acto interruptivo (eliminação do período decorrido anteriormente e suspensão da prescrição enquanto se mantiver o processo) mantêm-se, para o passado e para futuro, mesmo que o processo venha parar por facto não imputável ao contribuinte (Juiz Conselheiro Jorge Lopes de Sousa, in Sobre a Prescrição da Obrigação Tributária” notas práticas, 2008, pág. 78.).
· (…) verificando-se que após a citação da oponente em 09.01.2006, não se completou um ano de paragem do processo não se aplicaria o regime previsto no n°2 do art°. 49º da LGT, não sendo relevante se antes da paragem do processo por mais de um ano por facto não imputável ao sujeito passivo não se tiver verificado qualquer facto interruptivo, neste sentido, se pronunciou o acórdão do STA de 04.02.2009, proc. 0488/08.
· (…) Desta forma, a citação enquanto facto interruptivo produz o efeito instantâneo de eliminar o período anterior e o efeito duradouro de obstar ao decurso da prescrição, ainda que, depois de 01.01.2007, venha a estar parada por mais de um ano por facto não imputável ao contribuinte (pois foi revogado nº 2 do art. 49º)”.

Em face das conclusões, que delimitam o âmbito e objecto do recurso, nos termos das disposições constantes dos arts. 684º, nº 3, e 685º-A/1, do CPC, a questão que cumpre averiguar é se a Mmª Juíza “a quo” incorreu em erro de julgamento ao julgar prescrita a dívida fiscal revertida contra a recorrente por IVA relativo aos anos de 1994 a 1996.

2.2. Da prescrição da dívida exequenda relativa a IVA dos anos 1994 a 1996

1. Dizendo a dívida em causa respeito a IVA relativo aos anos de 1994 a 1996, estava em vigor o CPT, desde 1 de Julho de 1991, cujo art. 34º previa um prazo de prescrição de dez anos, cujo termo inicial se desencadeava no início do ano seguinte aquele em que os factos tributários tivessem ocorrido e que se interrompia, designadamente, com a instauração da execução fiscal. Porém, esse efeito interruptivo cessava se o processo ficasse parado por mais de um ano por facto não imputável ao contribuinte, caso em que se passava a somar ao tempo que a partir daí transcorresse todo aquele que tivesse decorrido até à data da respectiva autuação, ocorrendo, assim a transformação do efeito interruptivo em mero efeito suspensivo da prescrição (Neste sentido, cfr., entre outros, o Acórdão do STA de 11/8/2010, proc nº 591/10.).
Porém, em 1999.01.01 entrou em vigor a LGT, que no artigo 48°/1, na redacção actual, estatui que as dívidas tributárias prescrevem no prazo de 8 anos contados, nos impostos periódicos a partir do termo do ano em que ocorreu o facto tributário e nos de obrigação única a partir da data em que ocorreu o facto tributário, excepto o IVA e nos impostos sobre o rendimento quando a tributação seja efectuada por retenção na fonte a título definitivo, caso em que o prazo se conta a partir do início civil seguinte àquele em que se verificou, respectivamente a exigibilidade do imposto ou o facto tributar.
Nos termos do fixado no artigo 297.° do Código Civil, a lei que estabelecer prazo mais curto que o fixado em lei anterior é, também, aplicável aos prazos que já estejam em curso, salvo se segundo a lei antiga faltar menos tempo para a prazo se completar, sendo certo que o novo prazo só se conta a partir da entrada em vigor da nova lei.
No caso em apreço, com a instauração da execução, em 20/7/1998, interrompeu-se a prescrição que, como vimos, à luz do art. 34º, nº 3, do CPT tinha um efeito interruptivo próprio instantâneo, de eliminar para a prescrição todo do tempo anteriormente decorrido (art. 326º, nº1, do Código Civil), bem como o efeito duradouro de obstar ao decurso do prazo de prescrição até ao termo do processo ou até à paragem deste por mais de um ano por facto não imputável ao contribuinte.
Acontece que à data da entrada em vigor da LGT (1/1/1999), que estabeleceu um prazo de oito anos para a prescrição, a execução ainda não estivera parada por um período superior a um ano, e todo o tempo de prescrição anteriormente decorrido foi inutilizado por força do evento interruptivo. O que significa que em 1/1/1999 ainda não tinha decorrido qualquer prazo para a prescrição, pelo que, sendo o prazo de prescrição previsto na LGT inferior ao do CPT, será aplicável o da LGT, uma vez que o novo prazo torna-se mais favorável, pelo facto de na data da entrada em vigor desta nova lei faltar menos tempo por esta que pela antiga (art. 297º do CC), contando-se o novo prazo a partir da data de entrada em vigor da nova lei. Este raciocínio é válido para as dívidas de 1995 e 1996.
Tendo em conta o início do prazo prescricional em 1/1/1999, a prescrição só se poderia efectivar se não existissem quaisquer outros factos suspensivos ou interruptivos, decorridos oito anos, isto é, em 2007, sendo a LGT a lei competente para determinar e reger os eventos interruptivos e suspensivos ocorridos na sua vigência.

2.Resulta do probatório que a dívida esteve incluída no Plano de Regularização Prestacional previsto no Decreto-Lei nº 124/96, de 10 de Agosto, cujo art. 5.°/5 dispõe que o prazo de prescrição suspende-se durante o período de pagamento em prestações, ou seja, entre a data da adesão a esse regime e a data da exclusão.
Acontece que o probatório é omisso quanto à data da admissão do executado originário ao regime de pagamento em prestações estabelecido no referido diploma, apenas constando do mesmo a data da exclusão do referido regime do executado originário (21/1/2001).
Além da suspensão do prazo da prescrição ocasionada por este facto, haveria ainda que considerar o efeito interruptivo decorrente da citação da executada revertida em 9 de Janeiro de 2006.
Segundo a Mmª Juíza “a quo”, apelando ao art. 49º, nº 2, da LGT, “A paragem do processo por período superior a um ano por facto não imputável ao sujeito passivo faz cessar o efeito previsto no número anterior, somando-se neste caso o tempo que decorreu após esse período ao que tiver decorrido até à data da autuação.
Ora, tendo a citação sido efectuada em 09.01.2006, o prazo de prescrição começou de novo a contar-se em 09.01.2007. E somando-se até esta data, o tempo que decorreu entre 1999 a 09.01.2006. Assim, o prazo referido no nº 1 do art. 48º, já se encontra ultrapassado”.
Por sua vez, alega a Fazenda Pública que a dívida não está prescrita porque se não se completou um ano de paragem do processo até 1/1/2007, os efeitos do primeiro acto interruptivo (eliminação do período decorrido anteriormente e suspensão da prescrição enquanto se mantiver o processo) mantém-se, para o passado e para o futuro, mesmo que o processo venha a parar por facto não imputável ao contribuinte.
Por conseguinte, segundo a Fazenda Pública, se após a citação da oponente em 09.01.2006, não se completou um ano de paragem do processo não se aplicaria o regime previsto no n°2 do art°. 49º da LGT.

Vejamos.

3. Considerando que à data da citação da ora recorrente (9 de Janeiro de 2006) ainda não decorrera o prazo de oito anos de prescrição iniciado em 1/1/1999, e que a interrupção inutiliza para a prescrição todo o tempo anteriormente decorrido, torna-se inquestionável que a prescrição só poderia ter ocorrido se aquele efeito interruptivo tivesse entretanto cessado por força da paragem do processo executivo por mais de um ano por facto não imputável ao executado e em data anterior à entrada em vigor da Lei nº 53-A/2006, de 29 de Dezembro.
Na verdade, de acordo com os números 1 e 2 do art. 49º da LGT, na redacção anterior à que lhe foi conferida pelo referido diploma, que revogou o nº 2, a citação em processo de execução fiscal interrompia a prescrição, mas esse efeito cessava se o processo ficasse parado por período superior a um ano por facto não imputável ao sujeito passivo, somando-se, neste caso, o tempo que decorrer após esse período ao que tiver decorrido até à data da autuação. O que significava que a interrupção da prescrição se transmutava em mera suspensão da prescrição em virtude da paragem do processo por facto não imputável ao contribuinte por período superior a um ano, fazendo reatar o curso do prazo de prescrição.
Com efeito, como ficou consignado no Acórdão de 8/6/2011, proc nº 174/11, no seguimento de jurisprudência uniforme deste Supremo Tribunal, “face ao nº 2 do art. 49º da LGT (na redacção da Lei 100/99, de 26 de Julho), a paragem do processo por período superior a um ano por facto não imputável ao sujeito passivo teria feito cessar o efeito previsto no nº 1 do mesmo preceito legal, somando-se, neste caso, o tempo que decorrer após esse período ao que tiver decorrido até à data da autuação”.
No mesmo sentido, pode ler-se no Acórdão deste Supremo Tribunal, “as causas de interrupção da prescrição que ocorreram antes da alteração ao nº 3 do art. 49º da LGT, introduzida pela Lei nº 53-A/2006, produzem os efeitos que a lei vigente no momento em que elas ocorreram associava à sua ocorrência: eliminam o período de tempo anterior à sua ocorrência e obstam ao decurso do prazo de prescrição, enquanto o respectivo processo estiver pendente ou não estiver parado por mais de um ano por facto não imputável ao contribuinte (cfr., entre outros, neste sentido, os acs. deste STA, de 20/10/2010 e 2/3/2011, nos procs. 720/10 e 1038/10, respectivamente)”.
“Face a este duplo efeito do facto interruptivo (um efeito instantâneo, que determina a inutilização para a prescrição do prazo decorrido até à sua verificação - cfr. o nº 1 do art. 326° do CCivil) e um efeito suspensivo (que determina que o novo prazo só começa a correr após a decisão que puser termo ao processo - cfr. Ibidem, p. 57)”.
Acresce que assiste razão à Fazenda Pública quando argumenta que a posterior revogação do nº 2 do art. 49º da LGT, operada pela Lei nº 53-A/2006, só é aplicável às situações em que ainda não tivesse decorrido mais de um ano de paragem do processo por facto não imputável ao sujeito passivo, pois o art. 91º daquele diploma determinou expressamente que “a revogação do nº 2 do art. 49º da LGT aplica-se a todos os prazos de prescrição em curso objecto de interrupção, em que ainda não tenha decorrido o período superior a um ano de paragem do processo por facto não imputável ao sujeito passivo”.
Em face do exposto, a resposta quanto à prescrição poderá ser diferente consoante o processo de execução esteve ou não parado, por período superior a um ano, por facto não imputável ao contribuinte.

4. No caso vertente, o problema resulta de não estar fixado no probatório se de facto o processo de execução esteve ou não parado e entre que datas por facto não imputável à recorrente revertida ou ao executado originário.
Como vimos, a Mmª Juíza “a quo” refere na douta sentença recorrida em abstracto que o processo esteve parado, sem adiantar em que datas, o que vem a ser posto em causa pela Fazenda Pública.
Assim sendo, como se defende no douto Parecer do Ministério Público, “(…) a factualidade apurada é insuficiente para apurar a prescrição relativamente ao IVA de 1994 e 1995).
De facto, do probatório não consta a data da admissão do executado originário ao regime de pagamento em prestações constante do DL 124/96, apenas constando a data da exclusão.
Por outro lado, para uma correcta análise da problemática da prescrição, importa ainda apurar se o PEF esteve ou não parado por mais de um ano por facto não imputável ao contribuinte, facto que, também, não consta do probatório”.
Além da omissão quanto à eventual paragem do processo de execução fiscal, também não se percebe qual a relação entre a penhora referida no probatório (pontos 5º) e a sua repercussão no processo de execução fiscal.
Em suma, se atentarmos nos factos dados como provados pela Mmª Juíza “a quo” verificamos que há, efectivamente, um défice na fixação dos elementos de facto pertinentes para a discussão da prescrição, não dispondo este Tribunal de recurso de base factual para o decidir.
Com efeito, tendo em conta o quadro jurídico atrás exposto, torna-se necessário apurar se após a citação da recorrente o processo de execução fiscal esteve parado por facto não imputável à contribuinte e, se a resposta for positiva, entre que datas. Importa também averiguar a data da admissão do executado originário ao regime do pagamento em prestações constante do Decreto-Lei nº 124/96, de 10 de Agosto, e, finalmente, qual a repercussão da penhora referida no ponto 5º do probatório no processo de execução fiscal.
Sobre todas estas questões se imporia que a sentença recorrida emitisse um juízo probatório fundamentado, na ausência do qual este Tribunal não dispõe de poderes para decidir o recurso por o mesmo pressupor uma realidade de facto que não está pré-estabelecida, nem aqui pode estabelecer-se, por carecer de poderes de cognição em sede de matéria de facto.
Há, assim, um défice na fixação dos elementos de facto pertinentes para a discussão do aspecto jurídico da causa, que impõe a necessidade de ampliação da matéria de facto.

III- DECISÃO

Nestes termos acordam, em conferência, os Juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo em, ao abrigo do disposto no nº 2 do art. 729º do CPC, revogar a sentença impugnada, para ser substituída por outra que decida após ampliação da base factual, de acordo com o que atrás se apontou, assim concedendo provimento ao recurso.

Custas pela recorrida.

Lisboa, 10 de Outubro de 2012. - Fernanda Maçãs (relatora) - Casimiro Gonçalves - Francisco Rothes.