Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0435/14
Data do Acordão:04/29/2014
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:VÍTOR GOMES
Descritores:RECURSO DE REVISTA EXCEPCIONAL
NÃO ADMISSÃO DO RECURSO
Sumário:Não estão preenchidos os requisitos exigidos pelo n.º 1 do art.º 150.º do CPTA para admissão de recurso de acórdão que não apresenta erro evidente ou aplicação de critério ostensivamente inadmissível e em que não é identificada uma questão de direito precisamente determinada que possa assumir importância fundamental.
Nº Convencional:JSTA000P17426
Nº do Documento:SA1201404290435
Data de Entrada:04/11/2014
Recorrente:A............
Recorrido 1:SERVIÇO DE ESTRANGEIROS E FRONTEIRAS
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo

1. A…………, que se identificou como cidadão da Nigéria, interpôs recurso, ao abrigo do art.º 150.º do CPTA, do acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 6 de Fevereiro de 2014 que negou provimento a recurso interposto de sentença do TAC de Lisboa que julgara improcedente acção administrativa especial em que impugnava o despacho do Director Nacional Adjunto do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras que lhe indeferiu liminarmente o pedido de asilo e de autorização de residência por razões humanitárias.

Alega que alegou factos credíveis para merecer a protecção conferida pela “lei de Asilo”, designadamente o risco de sofrer ofensa grave à sua integridade física por razões políticas, tendo o acórdão recorrido violado, entre outros, os artºs 7.º, 19.º e 34.º da Lei n.º 27/2008, de 20 de Agosto.

O recorrido sustenta que o recurso é manifestamente infundado.


2. As decisões proferidas pelos tribunais centrais administrativos em segundo grau de jurisdição não são, em regra, susceptíveis de recurso ordinário. Apenas consentem recurso nos termos do n.º 1 do art.º 150.º do CPTA, preceito que dispõe que das decisões proferidas em segunda instância pelo Tribunal Central Administrativo pode haver, a título excepcional, recurso de revista para o Supremo Tribunal Administrativo “quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental” ou “quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito”.
Como se refere na exposição de motivos do CPTA "num novo quadro de distribuição de competências em que o TCA passa a funcionar como instância normal de recurso de apelação, afigura-se útil que, em matérias de maior importância, o Supremo Tribunal Administrativo possa ter uma intervenção que, mais do que decidir directamente um grande número de casos, possa servir para orientar os tribunais inferiores, definindo o sentido que deve presidir à respectiva jurisprudência em questões que, independentemente de alçada, considere mais importantes. Não se pretende generalizar o recurso de revista, com o óbvio inconveniente de dar causa a uma acrescida morosidade na resolução dos litígios. Ao Supremo Tribunal Administrativo caberá dosear a sua intervenção, de forma a permitir que esta via funcione como válvula de segurança do sistema".

3. O acórdão recorrido, apoiando-se na sentença que confirma e na qual se procedeu a uma análise crítica e metódica das declarações do recorrente e das circunstâncias que acompanharam o pedido de asilo, concluiu ser manifesta a incongruência e a falta de credibilidade geral dessas declarações e a consequente falta de fundamento da sua pretensão, seja quanto a esse pedido, seja quanto à protecção subsidiária sob a forma de concessão de autorização de residência por razões humanitárias. Concluiu o acórdão que tudo indica “face às próprias declarações prestadas pelo recorrente perante o SEF, que este viajou para Portugal por razões meramente económicas e não por ser objecto de qualquer perseguição político-partidária na Nigéria, não envolvendo o seu regresso a esse país qualquer risco sério de violação da sua integridade física ou psicológica por motivos de perseguição política”.

Vistas as alegações do recorrente em confronto com o decisão contra que se insurge, não se consegue identificar nelas questões jurídicas precisamente determinadas sobre o direito de asilo e a concessão de residência por razões humanitárias e respectivo procedimento, com viabilidade de repercussão no caso concreto.
Efectivamente, com directa incidência sobre o acórdão recorrido, a crítica incide sobre matéria excluída do âmbito possível do recurso interposto. O erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa não pode ser objecto de revista, salvo havendo ofensa de uma disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força de determinado meio de prova (n.º 4 do art.º 150.º do CPTA). Ora, o que poderá estar em causa, face aos termos da alegação de recurso, é a concreta valoração das provas e não o critério jurídico da sua apreciação. Na verdade, as instâncias não negaram o critério do “benefício da dúvida” na determinação dos pressupostos de facto invocados pelo requerente do estatuto de refugiado. Mas afastaram criticamente a pretensão com fundamento nas inconsistências e contradições do relato do recorrente acerca do receio de sofrer perseguições no país da sua nacionalidade e no próprio reconhecimento quanto às razões últimas para não ter ficado a viver em Lagos, na Nigéria (“ … procurava uma vida melhor, um emprego melhor, uma casa melhor, mais independente e essa vida melhor passava fora de África”).
Trata-se inquestionavelmente de valoração global e concreta dos elementos de prova e não de uma questão de direito sobre a prova, ainda que se atribua – o que agora não importa averiguar – natureza de princípio juridicamente vinculante ao referido “benefício da dúvida”.

Assim, não incorrendo o acórdão, nos raciocínios lógicos e jurídicos que suportam a decisão proferida, em erro evidente ou em aplicação de critério ostensivamente inadmissível e não identificando o recorrente uma questão de direito precisamente determinada que possa assumir importância fundamental, não estão preenchidos os requisitos exigidos pelo n.º 1 do art.º 150.º do CPTA para admissão do recurso.

4. Decisão
Pelo exposto, decide-se não admitir a revista.
Sem custas.
Lisboa, 29 de Abril de 2014. – Vítor Gomes (relator) – São Pedro – Alberto Augusto Oliveira.