Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo | |
Processo: | 034/03.3BTCTB |
Data do Acordão: | 02/17/2021 |
Tribunal: | 2 SECÇÃO |
Relator: | FRANCISCO ROTHES |
Descritores: | REVISTA APRECIAÇÃO PRELIMINAR CPPT |
Sumário: | I - O recurso de revista excepcional, previsto no art. 285.º do CPTT, visa funcionar como “válvula de segurança” do sistema, sendo admissível apenas se estivermos perante uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental, ou se a admissão do recurso for claramente necessária para uma melhor aplicação do direito. II - Por expressa disposição legal, «[o] erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa não pode ser objecto de revista, salvo havendo ofensa de uma disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força de determinado meio de prova» (cf. art. 285.º, n.º 4, do CPPT). |
Nº Convencional: | JSTA000P27175 |
Nº do Documento: | SA220210217034/03 |
Data de Entrada: | 01/25/2021 |
Recorrente: | A…………… |
Recorrido 1: | AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA |
Votação: | UNANIMIDADE |
Aditamento: | |
Texto Integral: | Apreciação preliminar da admissibilidade do recurso excepcional de revista interposto no processo n.º 34/03.3BTCTB Recorrente: A……………. Recorrida: Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) 1. RELATÓRIO 1.1 O acima identificado Recorrente, inconformado com o acórdão de 9 de Julho de 2020 do Tribunal Central Administrativo Sul ( Disponível em «I- Da admissibilidade do recurso de revista: a) O recorrente considera que se encontram reunidos os pressupostos legalmente exigidos no art. 285.º do CPPT para a admissibilidade do presente recurso de revista, devendo nesta medida ser o mesmo admitido. Com efeito, b) A questão de saber se o Tribunal Recorrido se encontra ou não obrigado a conhecer da prescrição invocada, em que termos, e com que exigências, assume sem dúvida uma relevância jurídica de importância fundamental, na medida em que, o não conhecimento da prescrição, constituirá uma situação violadora do direito constitucionalmente consagrado de acesso ao direito e tutela jurisdicional efectiva, contido no art. 20.º da CRP, do qual decorre como corolário a proibição da indefesa, atentas as consequências da apreciação da prescrição em sede de dívida tributária, com a consequente inexigibilidade da dívida e impossibilidade de cobrança coerciva, pelo que, a impugnação judicial em que se visa a apreciação da legalidade da liquidação que lhe deu origem deixa de ter utilidade. c) O processo em causa contém os elementos indispensáveis ao conhecimento da questão da prescrição, pelo que, sempre estaremos perante uma situação em que, a admissão do recurso será claramente necessária para uma melhor aplicação do direito. d) Com efeito, ainda que a questão do conhecimento da prescrição invocada em sede de impugnação judicial, enquanto fundamento de declaração da inutilidade superveniente da lide, tenha já sido analisada em sede jurisprudencial, releva-se como essencial, a discussão de saber em que medida, e com que limites ou extensão, pode o Tribunal acabar por não conhecer dessa mesma prescrição, “escudando-se” no argumento de que o processo não contém todos os elementos indispensáveis ao conhecimento da questão da prescrição, o que, a final se traduz na não apreciação da prescrição invocada, e) O presente recurso tem como fundamento a violação de lei substantiva e processual (nomeadamente: o art. 20.º da CRP, as disposições legais referentes à prescrição – arts. 48.º e 49.º da LGT e disposições processuais referentes a causa de extinção da instância – 277.º, al. e) do CPC), pelo que, preenche igualmente a exigência legal plasmada no n.º 2 do art. 285.º do CPPT. f) Constitui também fundamento do presente Recurso a questão de saber se a quantia recebida pelo ora Recorrente, a título de sinal, deverá ser considerada, face ao incumprimento do promitente-comprador, a título indemnizatório e por isso tendo perdido a natureza de preço, modificando-se estruturalmente para indemnização fixada à partida (ao abrigo do disposto no art. 442.º, n.º 2 do C.C.), face ao que, consideramos estar perante uma situação em que, a admissão do recurso será claramente necessária para uma melhor aplicação do direito, e atenta a relevância jurídica que assume a discussão em torno da questão supra exposta, em sede de dinâmica e regime do contrato-promessa, tanto mais, com reflexos, em sede de tributação ou não, consoante a qualificação jurídica a atribuir ao valor recebido pelo Recorrente. g) E, no que a esta segunda questão a decidir se refere, o presente recurso tem como fundamento a violação de lei substantiva, nomeadamente, o regime do contrato-promessa, mormente, o art. 442.º, n.º 2 do C.C., e o art. 13.º do CIRS, pelo que, preenche igualmente nesta sede, a exigência legal plasmada no n.º 2 do art. 285.º do CPPT. II – Do vício de violação de lei do Acórdão ora recorrido h) O Acórdão recorrido, apesar de acompanhar a posição do Recorrente de que, a prescrição poderá ser conhecida, em impugnação judicial, incidentalmente, como eventual causa de inutilidade superveniente da lide, da dívida subjacente ao acto tributário impugnado, por alegadamente o processo não conter todos os elementos indispensáveis ao conhecimento da questão da prescrição. i) Constam dos autos todos os elementos necessários para efectuar um juízo seguro sobre a verificação da prescrição da dívida em apreço, e, o próprio Tribunal Recorrido solicitou o esclarecimento nos autos de questões que para si constituíam questões essenciais à apreciação da invocada prescrição (e tendo obtido tais esclarecimentos junto da Fazenda Pública – cf. supra nos arts. 23 a 27), não faz qualquer sentido que, a posteriori venha invocar que, “não se encontrando apenso o PEF, difícil se torna aferir, com segurança se ocorrem, ou não, factos suspensivos ou interruptivos do decurso do prazo de prescrição”. j) A dívida tributária em causa nos autos, e respeitante a IRS do ano 1999 encontra-se prescrita, desde pelo menos 5 de Abril de 2011, uma vez que já decorreram pelo menos (oito) anos, estando esgotado o prazo de prescrição previsto no art. 48.º da LGT, de acordo com a sequência de factos detalhadamente relatados e expostos supra nos arts. 31.º a 46.º para os quais se remete. k) Verificando-se a prescrição da dívida tributária em causa, deverá ser revogado o Acórdão Recorrido, e, consequentemente, declarada extinta a instância por inutilidade superveniente da lide, em virtude de ter ocorrido a prescrição da dívida tributária relativa a IRS. l) Ao não decidir deste modo, o Acórdão recorrido incorreu em vício de violação de lei, quer lei substantiva, mais precisamente o art. 20.º da CRP e as disposições legais referentes à prescrição da obrigação tributária – arts. 48.º e 49.º da LGT, quer lei processual, respeitante às causas de extinção da instância - o art. 277.º, al. e) do CPC. m) Estando considerado como provado nos autos que: n) Ter-se-á de concluir que, o promitente-comprador (B…………….), entrou em incumprimento culposo do contrato-promessa de compra e venda, tanto mais que, na cláusula 7.ª do acordo, considerado como provado no facto assente sob a alínea c), ficou estabelecido que a “violação de qualquer das cláusulas – leia-se a data de celebração da escritura – constante da presente transacção gera desde logo incumprimento total”, pelo que, o) Tal incumprimento determina, nos temos da lei civil (art. 442.º, n.º 2 do C.C.), que o promitente-vendedor (in casu o ora Recorrente) possa fazer seu o sinal já recebido, a título indemnizatório – foi, de facto, o que linearmente, sucedeu. p) Assim, contrariamente ao preconizado no Acórdão Recorrido, a quantia recebida pelo ora Recorrente, a título de sinal, deverá ser considerada, face ao incumprimento do promitente-comprador, a título indemnizatório e por isso tendo perdido a natureza de preço, modificando-se estruturalmente para indemnização fixada à partida (ao abrigo do disposto no art. 442.º, n.º 2 do C.C.), e nessa medida, não concorre para a fixação do valor de realização enquanto elemento essencial para a determinação do valor tributável e, q)Tendo sido recebida a título de indemnização pelo incumprimento do contrato promessa, constitui verdadeira e própria indemnização, a qual não é tributável em sede de IRS (cf. art. 13.º, n.º 1 do CIRS). r) Ao não considerar desta forma incorreu o Acórdão Recorrido em vício de violação de lei, nomeadamente por violação de lei substantiva, nomeadamente, o regime do contrato-promessa, mormente, o art. 442.º, n.º 2 do C.C., e o art. 13.º do CIRS s) Nestes termos, atentas as razões alegadas, deverá ser admitido e concedido provimento ao presente recurso, e em consequência: - Ser revogado o acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Sul, e, substituído por outro que: 1.2 Não foram apresentadas contra-alegações. 1.3 A Desembargadora relatora no Tribunal Central Administrativo Sul, verificando a legitimidade do Recorrente e a tempestividade do recurso, ordenou a remessa dos autos ao Supremo Tribunal Administrativo. 1.4 Recebidos os autos neste Supremo Tribunal e dada vista ao Ministério Público, a Procuradora-Geral-Adjunta emitiu parecer no qual, após enunciar os termos do recurso e os requisitos da admissibilidade do recurso de revista, com amplas referências doutrinais e jurisprudenciais, considerou que estes se não verificam. Da fundamentação que expendeu em suporte da sua posição, permitimo-nos salientar os seguintes excertos: «[…] A análise das questões suscitadas pelo Recorrente passa, pela emissão de um juízo sobre a insuficiência da matéria levada ao probatório (no que respeita ao conhecimento e verificação da prescrição) bem como pela emissão de um juízo sobre a prova produzida de molde a concluir se a factualidade levada ao probatório permite as ilações de facto extraídas e, consequentemente, apreciar se o douto Acórdão Recorrido errou na apreciação da prova produzida e, consequentemente na sua subsunção jurídica», «[n]o caso em apreço, não está em causa ofensa de uma disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força de determinado meio de prova, excepções que permitiriam a revista», «resulta do teor das Alegações de Recurso e dos seus termos conclusivos é que o Recorrente entende padecer a decisão recorrida de erro de julgamento pretendendo, na verdade, a reapreciação de questões na vertente factual e jurídica, como se de um recurso ordinário se tratasse», «[a]s questões suscitadas não se mostram de elevada complexidade, exigindo a aplicação e concatenação de diversos regimes legais, princípios e institutos jurídicos, antes se apresentando com um grau de dificuldade comum, nem resulta que o tratamento da matéria tenha suscitado dúvidas sérias quer ao nível da jurisprudência quer ao nível da doutrina», «não revestem as questões suscitadas uma especial relevância social ou indício de interesse comunitário significativo que extravase os limites do caso concreto e a sua singularidade», e as questões não foram decididas de forma ostensivamente errada ou juridicamente insustentável. 1.5 Cumpre apreciar e decidir da admissibilidade do recurso, nos termos do n.º 6 do art. 285.º do CPPT. * * * 2. FUNDAMENTAÇÃO 2.1 DE FACTO Nos termos do disposto nos arts. 663.º, n.º 6, e 679.º do Código de Processo Civil (CPC), aplicáveis ex vi do art. 281.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), remete-se para a matéria de facto constante do acórdão recorrido. 2.2 DE FACTO E DE DIREITO 2.2 DE DIREITO 2.2.1 Decorre expressa e inequivocamente do n.º 1 do art. 285.º do CPPT e do n.º 1 do art. 150.º do Código de Processo dos Tribunais Administrativos (CPTA) a excepcionalidade do recurso de revista. Em princípio, as decisões proferidas em 2.ª instância pelos tribunais centrais administrativos não são susceptíveis de recurso para o Supremo Tribunal Administrativo; mas, excepcionalmente, tais decisões podem ser objecto de recurso de revista em duas hipóteses: i) quando estiver em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, assuma uma importância fundamental ou ii) quando a admissão da revista for claramente necessária para uma melhor aplicação do direito. 2.2.2 O Recorrente interpôs o presente recurso de revista, pretendendo que este Supremo Tribunal se pronuncie sobre duas questões: primeira, se, em sede de impugnação judicial, o tribunal se pode escusar a conhecer da prescrição da dívida exequenda que teve origem na liquidação impugnada, como causa de inutilidade superveniente da lide, com o fundamento de que o processo não fornece todos os elementos que permitam aferir da prescrição; segunda, se, em face da matéria de facto provada, se deverá concluir que o montante por ele recebido e que deu origem à liquidação adicional impugnada é, não parte do preço, mas uma indemnização, em que foi convertido o sinal, ao abrigo do disposto no n.º 2 do art. 442.º do Código Civil (CC), pelo incumprimento pelo promitente-comprador de um contrato-promessa de compra e venda de bens imóveis com ele celebrado e, por isso, não sujeito a tributação, atento o disposto no n.º 1 do art. 13.º do CIRS. 2.2.3 Vejamos agora se é admissível a revista, relativamente a cada uma das questões. 2.3 CONCLUSÕES Preparando a decisão, formulamos as seguintes conclusões: I - O recurso de revista excepcional, previsto no art. 285.º do CPTT, visa funcionar como “válvula de segurança” do sistema, sendo admissível apenas se estivermos perante uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental, ou se a admissão do recurso for claramente necessária para uma melhor aplicação do direito. II - Por expressa disposição legal, «[o] erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa não pode ser objecto de revista, salvo havendo ofensa de uma disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força de determinado meio de prova» (cf. art. 285.º, n.º 4, do CPPT). * * * 3. DECISÃO Em face do exposto, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo acordam, em conferência da formação prevista no n.º 6 do art. 285.º do CPPT, em não admitir o presente recurso. Custas pelo Recorrente. * |