Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo | |
Processo: | 0149/07.9BELRS 01950/13 |
Data do Acordão: | 02/17/2021 |
Tribunal: | 2 SECÇÃO |
Relator: | FRANCISCO ROTHES |
Descritores: | REVISTA APRECIAÇÃO PRELIMINAR CPTA |
Sumário: | O recurso de revista excepcional previsto no art. 150.º do CPTA não corresponde à introdução generalizada de uma nova instância de recurso, funcionando apenas como uma “válvula de segurança” do sistema, pelo que só é admissível se estivermos perante uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental, ou se a admissão deste recurso for claramente necessária para uma melhor aplicação do direito, incumbindo ao recorrente alegar e demonstrar os requisitos da admissibilidade do recurso. |
Nº Convencional: | JSTA000P27178 |
Nº do Documento: | SA2202102170149/07 |
Data de Entrada: | 01/27/2021 |
Recorrente: | A............ |
Recorrido 1: | AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA |
Votação: | UNANIMIDADE |
Aditamento: | |
Texto Integral: | Apreciação preliminar da admissibilidade do recurso excepcional de revista interposto no processo n.º 149/07.9BELRS Recorrente: A………… Recorrida: Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) 1. RELATÓRIO 1.1 A acima identificada Recorrente, não se conformando com o acórdão proferido em 11 de Abril de 2019 nos presentes autos pelo Tribunal Central Administrativo Sul (Disponível em «1- o acórdão recorrido errou na interpretação e aplicação do direito aos factos que fixou e incorreu em erro de julgamento: 2- a omissão da correcção da liquidação de IRS com o n.º 20045004115199, de 2003, de € 3.578,02, operada em 29.09.2004 e paga em 30.12.2004, que levou à apresentação da impugnação judicial, violou, vários princípios legais e fundamentais que integram o procedimento tributário – art. 54.º da LGT –, nomeadamente o princípio de inquisitório, de decisão, e de preservação do interesse público – arts. 58.º, 56.º e 55.º da LGT, respectivamente. 3- nos termos do art. 93.º do CIRS, quando por motivos imputáveis aos serviços tenha sido liquidado imposto superior ao devido, esses mesmos serviços procederão à revisão oficiosa da liquidação: art. 78.º da LGT: “a revisão dos actos tributários pela entidade que os praticou pode ser efectuada por iniciativa do sujeito, no prazo da reclamação administrativa e com fundamento em qualquer ilegalidade, ou, por iniciativa da Administração Tributária, no prazo de 4 anos após a liquidação ou a todo o tempo se o tributo ainda não estiver sido pago, com fundamento em erro imputável ao serviço”. 4- aquela revisão oficiosa, integra, o regime geral do procedimento tributário, cujos princípios inspiradores se encontram contidos no art. 55.º da LGT, que é, “o de exercer as suas obrigações de prossecução do interesse público, de acordo com os princípios da legalidade, da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da celeridade, no respeito pelas garantias dos contribuintes e demais obrigações tributárias”. 5- os serviços fiscais competentes, erraram juridicamente, quer quanto à apreciação, quer quanto ao enquadramento da situação em litígio, levando esse erro até aos dias de hoje, pelo seu não reconhecimento do pedido de revisão oficiosa, feito pela contribuinte, em 13.06.2006, qua tale o Tribunal a quo errou ao proferir Decisão sob clamoroso erro que urge reparar; 6- a liquidação de IRS do ano de 2004, relativa aos rendimentos de 2003, sujeita ao Princípio da Legalidade in art. 8.º - 2 - a) da LGT assentou em pressupostos inexistentes, de facto e de direito, na medida em que o quantum de € 159.615,00, declarado no campo 504, do quadro 5, do Anexo G (facto provado 5), da declaração de 2004, relativa aos rendimentos de 2003, ano esse o da alienação do imóvel, foi considerado para efeitos de tributação, como um valor efectivamente reinvestido, e não, como um valor meramente indicativo, da simples intenção de reinvestir. 7- tudo isto em desacordo com os próprios dizeres daquele quadro 504, que se refere ao “Valor de realização que se pretende reinvestir (sem recurso ao crédito)”; logo, o que se pretende reinvestir, não é o que se reinvestiu, por isso aqui também está subjacente uma simples previsão ou uma mera intenção, incerta e falível do quantum que irá ser reinvestido; uma “intenção”, não é um facto tributário que integre as normas de incidência – art. 8.º - n.º 1 da LGT: princípio da legalidade, aqui desde logo, desrespeitado; estamos perante presunção do que efectivamente virá a ser reinvestido, no prazo que a lei estabeleceu de 24 meses contados da data da realização. 8- é essa intenção, que o legislador refere no art. 10.º - nº 5- c) e reforça no art. 57.º - n.º 3 do CIRS, ligado à Secção do “Processo de determinação do rendimento colectável”; Intenção é sinónimo de intento, propósito, pensamento reservado in Dicionário de Francisco Torrinha, pag. 691, ed. Domingos Barreira, 1965…..Intenção, étimo oriundo do Latim “intentio” - onis, é a acção de estender, tensão, compressão, esforço…pelo que o TCAS errou ao confundir intenção com facto tributário secundando a primeira instância e a Autoridade Tributária !!! 9- com a errada interpretação e aplicação do direito à liquidação de IRS, de 2004, resultou uma tributação que se demitiu de aplicar a norma de incidência do art. 10.º - n.º 5 - a) do CIRS, e decidiu-se, por tributar, ilegalmente, um ganho de mais-valia, igualmente evitável, caso se aguardasse pelo reinvestimento efectivo do valor realizado, com a venda da habitação de 2003, no prazo de 24 meses; a ilegalidade da liquidação assume novos contornos, ao não excluir da tributação, um ganho que dele estava excluído legalmente; 10- a recorrente, adquiriu por compra em Dezembro de 1989, pelo valor de aquisição de € 9.975,96 – uma casa para habitação própria e permanente, onde já habitava, correspondente à letra F do prédio urbano inscrito na matriz predial urbana sob o art. 135, da freguesia de Lisboa, Sagrado Coração de Jesus (código 110614); 11- o referido imóvel foi comprado com recurso ao crédito hipotecário bancário, e foi vendido em 15.09.2003 (escritura notarial), pelo preço de € 187.050,00, preço que para efeitos de cálculo da mais valia, é considerado – valor de realização (art. 44.º, n.º 1, alínea f) do CIRS); a declaração m/3, tempestivamente apresentada, em 2004, relativa aos rendimentos de 2003, incluiu um Anexo G, onde nos campos 503 e 504, respectivamente, foi declarado o valor do crédito hipotecário, ainda em dívida ao banco de € 5.636,00, e € 159.615,00, a título de intenção ou pretensão de reinvestir; 12 - em 29.07.2005, adquiriu, por compra uma moradia, pelo preço de € 194.531,18, situada na Rua do ………, n.º ……, em Fonte Grada, do concelho de Torres Vedras, que destinou, também à sua residência própria e permanente, de forma imediata. Sendo que na declaração do ano de 2006, referente aos rendimentos de 2005, declarou ter reinvestido todo o valor da realização, como tal apurado nos termos da alínea a) do n.º 5 do art. 10.º do CIRS – € 181.414,00. 13- na senda das datas e valores, antes mencionados, das obrigações declarativas cumpridas; e da interpretação dada á alínea a) do n.º 5 do art. 10.º do CIRS, com o devido respeito, há que concluir pela totalidade do reinvestimento; portanto: 14- o evidente erro de direito em que incorreu a A. Tributária, ao proceder a liquidação indevida, tributou uma mais valia inexistente que veio onerar a situação fiscal da contribuinte, através do imposto indevidamente pago de 3.578,00 €; caso o rendimento tributável apenas tivesse levado em conta os rendimentos obtidos naquele ano e a correlativa dedução específica, ficaria reduzido a 36.316,42 €; de cuja liquidação, de acordo com os valores declarados, resultaria um imposto a reembolsar, o qual, após a revogação e anulação da mesma tributação, que se espera, deverá ser acrescido ao montante do imposto pago. Sem prejuízo da obrigação de indemnizar, nos termos dos arts. 94.º- n.º 1 do CIRS, 43.º- n.º 1 da LGT e 61.º do CPPT, indemnização essa que deverá ser paga à taxa de 4% ao ano- arts. 35.º- n.º 10 e 43.º- n.º 4 da LGT – contada desde a data do pagamento indevido – 30-12-2004 – até à data da emissão da respectiva nota de crédito – art. 61.º - n.º 3 do CPPT 15- no §4.º e no §5.º de fls.12, o acórdão dá conta de obrigação que a recorrente não cumpriu sob o art. 10.º - n.º 5 - d) CIRS; ora, após a revogação daquele mesma alínea d) pelo art. 1.º do Dec. Lei 211/2005 de 7/12, estava a recorrente impedida, nos termos da lei de o fazer, e a fazê-lo, a mesma não produziria efeitos em termos procedimentais, consubstanciando acto inútil; o sentido da não apresentação daquela declaração, sai reforçado naquele diploma legal que teve subjacente objectivos de simplificação e racionalização do cumprimento das obrigações por parte dos contribuintes e do funcionamento dos serviços da administração tributária; para além de evitar os custos de cumprimento do sector privado…. 16- no que concerne à figura da falsidade a fls. 12 e 13 do acórdão há que atender a que a interpretação da lei levada a cabo pela contribuinte, ainda que não consensual, nunca poderá conduzir a uma absoluta ou relativa falsidade; como factor acrescido há a relevar que face ao art. 75.º - nº 1 da LGT, aquela alegada falsidade não encontra, nem na letra nem no espírito da lei qualquer apoio, muito pelo contrário; aí se dispõe: “Presumem-se verdadeiras e de boa fé as declarações dos contribuintes apresentadas nos termos da lei…”, presunção de verdade, aceite pela Ad. Tributária, sem qualquer reparo. 17- muito bem andou o Ex.mo Procurador Geral Adjunto no Tribunal a quo ao emitir sábio Parecer concluindo “pela procedência do recurso pois comprovando-se que a Recorrente aplicou totalmente o valor da habitação antiga terá demonstrado o reinvestimento total. Para além disso, estando pendente impugnação subsequente (da segunda liquidação) deveria merecer despacho de apensação”. Assim, secundando o Parecer do Ex.mo Procurador-Geral-Adjunto no Tribunal recorrido, concedendo provimento ao recurso e revogando a decisão do TCAS, com a consequente anulação total da liquidação ilegalmente efectuada, por erro imputável aos serviços, procedendo-se ao reembolso de todo o imposto indevidamente liquidado e pago, acrescido do valor do reembolso a que a recorrente tinha direito, caso aquela liquidação tivesse sido correctamente efectuada, bem como ao pagamento de juros indemnizatórios, nos termos supra mencionados, Vossas Excelências farão a mais Lídima Justiça!». 1.2 O Desembargador relator no Tribunal Central Administrativo Sul, verificando a legitimidade da Recorrente e a tempestividade do recurso, ordenou a remessa dos autos ao Supremo Tribunal Administrativo. 1.3 Não foram apresentadas contra-alegações. 1.4 O Procurador-Geral-Adjunto neste Supremo Tribunal Administrativo emitiu parecer no sentido de que o recurso não deve ser admitido. Isto, após ter resumido os termos do recurso e ter enunciado os requisitos da admissibilidade do recurso de revista, elaborando em torno dos mesmos, com a seguinte fundamentação: «[…] a Recorrente não logra nas suas alegações e conclusões de recurso identificar qualquer questão jurídica que “pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental” ou que a admissão do recurso “seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito”. 1.5 Cumpre apreciar e decidir da admissibilidade do recurso, nos termos do disposto no n.º 6 do art. 150.º do CPTA (Apesar de, entretanto, na sequência da alteração do regime de recursos na jurisdição tributária efectuada pela Lei n.º 118/2019, de 17 de Setembro, o recurso de revista excepcional ter passado a merecer consagração no art. 285.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), o acórdão foi proferido antes da entrada em vigor desse novo regime (cf. art. 14.º da referida Lei), pelo que continuamos a aplicar-lhe o regime do CPTA, nos termos do disposto na alínea c) do n.º 1 do art. 13.º da mesma Lei.). * * * 2. FUNDAMENTAÇÃO 2.1 DE FACTO Nos termos do disposto nos arts. 663.º, n.º 6, e 679.º do Código de Processo Civil (CPC), aplicáveis ex vi do art. 281.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), remete-se para a matéria de facto constante do acórdão recorrido. 2.2 DE FACTO E DE DIREITO 2.2.1 DOS PRESSUPOSTOS DE ADMISSIBILIDADE DO RECURSO 2.2.1.1 Decorre expressa e inequivocamente do n.º 1 do art. 150.º do CPTA e do n.º 1 do art. 285.º do CPPT a excepcionalidade do recurso de revista. Em princípio, as decisões proferidas em 2.ª instância pelos tribunais centrais administrativos não são susceptíveis de recurso para o Supremo Tribunal Administrativo; mas, excepcionalmente, tais decisões podem ser objecto de recurso de revista em duas hipóteses: i) quando estiver em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, assuma uma importância fundamental ou ii) quando a admissão da revista for claramente necessária para uma melhor aplicação do direito. 2.2.1.2 A Recorrente interpôs o presente recurso do acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Sul para o Supremo Tribunal Administrativo sem indicar ao abrigo de que disposição legal o fazia. 2.2.1.3 No entanto, lida a motivação do recurso e respectivas conclusões, verificamos que, apesar da invocação do erro colossal do acórdão recorrido, a alegação da Recorrente não é apta ao preenchimento do referido requisito. Senão vejamos: 2.2.1.4 Finalmente, a alegação da Recorrente parece também imputar ao acórdão recorrido diversas nulidades por omissão de pronúncia. 2.2.2 CONCLUSÃO Preparando a decisão, formulamos a seguinte conclusão: O recurso de revista excepcional previsto no art. 150.º do CPTA não corresponde à introdução generalizada de uma nova instância de recurso, funcionando apenas como uma “válvula de segurança” do sistema, pelo que só é admissível se estivermos perante uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental, ou se a admissão deste recurso for claramente necessária para uma melhor aplicação do direito, incumbindo ao recorrente alegar e demonstrar os requisitos da admissibilidade do recurso. * * * 3. DECISÃO Em face do exposto, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo acordam, em conferência da formação prevista no n.º 6 do art. 150.º do CPTA, em não admitir o presente recurso, por não estarem preenchidos os pressupostos do recurso de revista excepcional previstos no n.º 1 do mesmo artigo. * Custas pela Recorrente. Lisboa, 17 de Fevereiro de 2021. – Francisco Rothes (relator) – Aragão Seia - Isabel Marques da Silva. |