Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01060/13.0BELSB 0214/16
Data do Acordão:05/10/2019
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:COSTA REIS
Sumário:
Nº Convencional:JSTA000P24538
Nº do Documento:SA12019051001060/13
Data de Entrada:03/26/2019
Recorrente:A.............
Recorrido 1:ESTADO PORTUGUÊS
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: ACORDAM NA SECÇÃO DE CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO DO STA:

I. RELATÓRIO

A………………. intentou, no TAC de Lisboa, contra o Estado Português, recurso de revisão da sentença, de 14.5.2014, do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa.

O TAC rejeitou o recurso.

E o TCA Sul, para onde o Autor apelou, negou provimento ao recurso mantendo a decisão recorrida.

É desse Acórdão que o Autor vem recorrer (artigo 150.º/1 do CPTA).

II. MATÉRIA DE FACTO
Os factos provados são os constantes do acórdão recorrido para onde se remete.

III. O DIREITO
1. As decisões proferidas pelos TCA em segundo grau de jurisdição não são, por via de regra, susceptíveis de recurso ordinário. Regra que sofre a excepção prevista no art.º 150.º/1 do CPTA onde se lê que daquelas decisões pode haver, «excepcionalmente», recurso de revista para o STA «quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental» ou «quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito». O que significa que este recurso foi previsto como «válvula de segurança do sistema» para funcionar em situações excepcionais em que haja necessidade, pelas apontadas razões, de reponderar as decisões do TCA em segundo grau de jurisdição.
Deste modo, a pretensão manifestada pelo Recorrente só poderá ser acolhida se da análise dos termos em que o recurso vem interposto resultar que a questão nele colocada, pela sua relevância jurídica ou social, se reveste de importância fundamental ou que a sua admissão é claramente necessária para uma melhor aplicação do direito.
Vejamos, pois, se tais requisitos se verificam in casu socorrendo-nos da matéria de facto seleccionada no Acórdão recorrido.

2. O Autor intentou, no TAC de Lisboa, contra o Estado Português, acção administrativa comum pedindo a condenação deste a pagar-lhe uma indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais.
Por sentença de 14.5.2014, foi julgado prescrito o direito que o Autor pretendia exercer uma vez que sendo de 3 anos o prazo de prescrição, que esse prazo se iniciou em Fevereiro de 2008 e que aquela acção só entrou em juízo em 26.4.2013, era seguro que aquele prazo já havia expirado aquando dessa apresentação. Por essa razão decidiu: “nos termos do art.º 699º, nº 1, do CPC ex vi art.º 140º do CPC, rejeita-se o recurso."

O Autor apelou para o TCA aceitando que o mencionado prazo era de 3 anos e que, quando a acção foi instaurada, ele já se havia esgotado no tocante aos danos patrimoniais e a parte dos danos não patrimoniais. Contudo, sustentou que o mesmo ainda não havia decorrido no tocante a parte dos danos não patrimoniais.
Sem sucesso já que, por Acórdão de 12.11.2015, aquele Tribunal negou provimento ao recurso e confirmou a sentença recorrida.
Inconformado, o Autor interpôs recursos para o STA, que não foi admitido, e para o Tribunal Constitucional, que dele não tomou conhecimento.
E em 3.1.2018, fundado no disposto no art. 696°, al.ª c), do CPC, interpôs, no TAC de Lisboa, recurso de revisão da sentença de 14.5.2014 alegando que só obteve o documento em que fundava o seu pedido em 20.10.2017 e ele era, por si só, suficiente para modificar em sentido favorável aquela sentença visto dele resultar que o prazo de prescrição previsto no art. 498° n.º 1, do Código Civil, só começou a correr em 18.6.2010.

O TAC rejeitou esse recurso com fundamento na sua inadmissibilidade por o “… o documento junto pelo autor, com o requerimento de interposição de recurso extraordinário, na parte que importa à economia do processo nº 1060/13, já está nos autos principais desde 30.5.2013, podendo, pelo menos, desde então, o autor fazer uso desse documento.
O que evidencia, ainda, que o teor da referida certidão do processo nº 206/14.5T8OLH-G, por si só, não se mostra suficiente para modificar a decisão em sentido mais favorável à parte vencida.
Ou seja, o recurso interposto pelo autor, em 3.1.2018, de revisão da sentença de 14.5.2014, transitada em julgado a 24.11.2016, não obstante ser tempestivo, nos termos do art. 697º, nº 2, do CPC ex vi art. 140º do CPTA, é inadmissível nos termos do art. 696º, al.ª c), do CPC, por o documento junto pelo autor – a certidão do processo judicial donde resulta o deficiente funcionamento do Tribunal – não preencher nenhum dos tipos de documentos enunciados no preceito, nem o valor probatório ali exigido."

O Autor apelou para o TCA e confirmou a decisão recorrida com um discurso de que se destaca o seguinte:
“Ora, esses cinco documentos [de Janeiro de 2010, 9.3.2010, 19.3.2010, 14.4.2010 e 7.5.2010] já constavam do proc. n.º 1060/13.0 BELSB, concretamente estavam inseridos na certidão referente ao processo n.º 15-G/98 que foi junta com a contestação apresentada pelo Estado Português, tendo os mesmos sido notificados a A……………… (cfr. alíneas J), K) e U), dos factos provados).
Assim sendo, tais documentos não podem fundamentar o presente pedido de revisão.
Os únicos documentos que A……………… considera como suficientes para modificar em sentido mais favorável a sentença revidenda e que constam da certidão passada em 20.10.2017 (junta com o requerimento de interposição do recurso de revisão), relativamente aos quais se encontra preenchido o requisito acima enunciado sob o ponto i), são os seguintes:
6) - despacho proferido em 14.6.2010 a determinar a notificação da B……….., Lda., na pessoa do respectivo liquidatário judicial, da admissão do recurso interposto por A……………., em 19.3.2010, e para, querendo, contra-alegar;
7) - ofício de 18.6.2010, a notificar o liquidatário judicial da B……….., Lda., da admissão do recurso interposto por A…………….., em 19.3.2010, e para, querendo, contra-alegar, no prazo de 15 dias.
Ora, relativamente a estes dois documentos verifica-se, no entanto, que não se encontra preenchido o requisito acima enunciado sob o ponto ii), dado que A…………….. tinha conhecimento deles e podia ter feito uso dos mesmos no proc. n.°1060/13.0 BELSB, nomeadamente aquando da apresentação da réplica - descrita em W), dos factos provados - como se passa a demonstrar.
.....
Só se poderia atender aos referidos dois documentos no presente recurso de revisão caso A…………….. tivesse alegado - e provado -, como era seu ónus, que não pôde obter a certidão em causa antes de 2017 por motivo que não lhe é imputável, o que não fez, pois limitou-se a alegar que "não pôde fazer uso da mesma anteriormente" por ter sido "extraída em 20 de Outubro de 2017".
.....
Conclui-se, assim, que, sendo imputável a A……………… a não apresentação oportuna dos referidos dois documentos no proc. n.º 1060/13.0 BELSB, antes da prolação da sentença revidenda, não podem os mesmos fundamentar o presente pedido de revisão.
Mesmo que, por mera hipótese, assim, não se entendesse, a verdade é que os referidos dois documentos ...... não são suficientes para contrariar a sentença revidenda de 14.5.2014, ou seja, não se encontra preenchido o requisito acima enunciado sob o ponto iii) ....
..........
Aliás, o que se verifica é que o ora recorrente, A……………., utilizou o presente recurso (extraordinário) de revisão como um sucedâneo de um segundo recurso (ordinário) de apelação da sentença de 14.5.2014, invocando novos fundamentos para impugnar essa sentença ... .
Ora, o recurso de revisão não se mostra vocacionado para facultar uma nova discussão sobre o erro de julgamento em que alegadamente incorreu a sentença revidenda de 14.5.2014, ou seja, não se destina a suprir eventuais omissões existentes no recurso de apelação oportunamente interposto por A…………… em Julho de 2014 dessa sentença.”

3. O Autor não se conforma com tal decisão pelo que pede a admissão desta revista para a qual formula, entre outras, as seguintes conclusões:
“4.ª A certidão com base na qual o ora Recorrente instruiu o recurso extraordinário de Revisão foi emitida em 20/10/2017, constituindo, in se, um documento autónomo e distinto dos documentos enumerados na alínea A) do n.º 5 supra e que não existia na data da prolação da sentença revidenda.
6.ª Por outro lado, a certidão com base na qual o ora Recorrente interpôs o recurso extraordinário de Revisão é, por si só, manifestamente suficiente para modificar a decisão revidenda em sentido favorável ao ora Recorrente ..... .
9.ª Consequentemente, foi só com a notificação do d. Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 2 de Fevereiro de 2011 (proferido no processo n.º 206/14.5T8OLH-G) que o ora Recorrente tomou conhecimento de que sofreu um dano em consequência da violação, pelo Tribunal Judicial de Vila Real de Santo António, do dever de notificação pessoal, ao mesmo Recorrente, das datas das sessões da audiência de julgamento que teve lugar no processo n.º 15-G/1998, pois foi apenas com a prolação e a notificação daquele referido Acórdão do TRE que ficou definitiva e irreversivelmente estabelecida a não repetição daquela mesma audiência de julgamento.

4. Conforme se acaba de ver o Autor/Recorrente interpôs recurso de revisão da sentença do TAC de Lisboa, de 14.5.2014 - que julgou prescrito o direito indemnizatório que aquele pretendia exercer por o prazo de prescrição já estar esgotado quando a respectiva acção foi instaurada – fundado na alegação de que só pudera tomar conhecimento dos documentos que justificavam esse pedido em 20/10/2017 e que dos mesmos constavam factos que, por si só, obrigavam a diferente decisão.
As instâncias foram unânimes em considerar que essa alegação era factualmente errada uma vez que o Autor, desde 30.5.2013, conhecia os referidos documentos e fazer uso dos mesmos. Sendo assim, concluíram que quando, em 3.1.2018, interpôs recurso de revisão da sentença de 14.5.2014 já o respectivo direito havia prescrito. Com efeito, como se lê no Acórdão recorrido “Só se poderia atender aos referidos dois documentos no presente recurso de revisão caso A……………. tivesse alegado - e provado -, como era seu ónus, que não pôde obter a certidão em causa antes de 2017 por motivo que não lhe é imputável, o que não fez, pois limitou-se a alegar que "não pôde fazer uso da mesma anteriormente" por ter sido "extraída em 20 de Outubro de 2017".
Nesta conformidade, a questão fundamental que separa o Recorrente do Acórdão recorrido é uma questão de facto.
Ora, o julgamento da M.F. não pode ser sindicado nesta sede, atenta a circunstância desta se destinar a julgar apenas de direito (art.º 150.º/3 do CPTA).
Acresce que as instâncias decidiram de forma convergente e tudo indica que decidiram bem, uma vez que esse julgamento foi feito com uma adequada ponderação das leis em vigor e da matéria de facto provada.
Não estão, assim, preenchidos os requisitos de admissão do recurso.
DECISÃO.

Termos em que os Juízes que compõem este Tribunal acordam não admitir a revista.
Custas pelo Recorrente.

Porto, 10 de Maio de 2019. – Costa Reis (relator) - Madeira dos Santos – São Pedro.