Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0869/13
Data do Acordão:03/15/2017
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:PEDRO DELGADO
Descritores:IRC
CUSTOS
PERDA POTENCIAL OU LATENTE
Sumário:I - De acordo com o CIRC as mais valias e as menos valias passaram a estar incluídas no conceito de lucro tributável, ainda que, por motivos de índole económica, limitadas às que tivessem sido realizadas - arts. 17º, nº1 e 23º, al. i) do CIRC, na redacção anterior a 31.12.2009.
II - Existindo uma mera possibilidade de perda, ou uma perda potencial ou latente, não pode a mesma ser considerada na determinação do lucro tributável por força do princípio da realização.
Nº Convencional:JSTA00070078
Nº do Documento:SA2201703150869
Data de Entrada:05/16/2013
Recorrente:A..., SA
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF LEIRIA
Decisão:NEGA PROVIMENTO
Área Temática 1:DIR FISC - IRC.
Legislação Nacional:CIRC ART3 ART17 ART21 ART23 ART24 ART65 ART75.
CIRE ART158.
CSC ART146.
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC01145/09 DE 2011/02/24.; AC STA PROC01079/03 DE 2003/10/29.
Referência a Doutrina:A. MOURA PORTUGAL - A DEDUTIBILIDADE DOS CUSTOS NA JURISPRUDENCIA FISCAL PORTUGUESA PAG62 PAG142.
SALDANHA SANCHES - A QUANTIFICAÇÃO DA OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA PAG245.
RUI DUARTE MORAIS - APONTAMENTOS AO IRC PAG64.
ANA CRISTINA DOS SANTOS ARROMBA DINIS E CIDÁLIA MARIA DA MOTA LOPES - A FISCALIDADE DAS SOCIEDADES INSOLVENTES , UMA PRIMEIRA ABORDAGEM PAG145.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo


1 – A…………………….., S.A., com os demais sinais dos autos, vem recorrer da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria de 21-12-2012, que julgou improcedente a liquidação adicional de IRC e respectivos juros compensatórios referente ao exercício do ano de 2005, no valor de € 16.791,73.

Termina as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões:
«A) – O princípio geral de custo e perda do exercício encontra-se consignado no art.º 23º do CIRC.
B) A declaração judicial de insolvência de uma sociedade, configurando uma situação em que o activo se torna insuficiente para pagamento do passivo implica para o titular do próprio capital social uma perda extraordinária do próprio valor do capital, traduzindo por isso uma perda para o próprio titular do capital social.
C) Por sua vez, o regime consignado nos artigos 73º e ss. do CIRC apenas tem aplicação nos casos de liquidação não judicial de sociedades, tanto mais que no processo de insolvência, todo o activo e passivo para a ser da titularidade da massa insolvente, a qual passa a ser titular de todas as relações jurídicas, incluindo as tributárias.
D) A douta decisão recorrida fez incorrecta interpretação e aplicação do nº1 do artigo 75º do CIRC e violou o nº1 do artigo 23º do CIRC.»

2 – A Fazenda Publica não apresentou contra alegações.

3 – O Exmº Procurador Geral Adjunto emitiu parecer, com a seguinte fundamentação que, na parte relevante, se transcreve:
«(…..)A nosso ver o recurso não merece provimento.
A questão controvertida consiste em saber se a alegada perda de participação social por via da declaração de insolvência da empresa participada deve ser relevado como custo fiscal do exercício nos termos do estatuído no artigo 23.° do CIRC ou se, pelo contrário, haverá que ter em conta o resultado da partilha nos termos e para os feitos do estatuído no artigo 75.° do CIRC (redacção vigente à data do facto tributário).
Efectivamente, como se refere na Informação prestada pelos SIT da DF de Leira constante do PA apenso, a cujo discurso fundamentador se adere,
“1. As correcções efectuadas pela inspecção tributária baseiam-se no facto de esta ter entendido que a ora impugnante reconheceu em 2005 um custo efectivo relacionado com a perda da participação social, quando se trata de uma perda apenas potencial. De acordo com o disposto no artigo 75.º, n.º 1 do CIRC, as eventuais menos — valias que vierem a ser apuradas, só poderão ser reconhecidas no exercício em que for posto à disposição, o valor que for atribuído aos sócios em resultado da partilha;
2. Contabillisticamente e em ordem ao cumprimento do princípio da prudência, a ora impugnante poderia provisionar a depreciação das partes de capital de que é titular efectuando no exercício de 2005 o registo da diferença entre o custo de aquisição da participação e o respectivo preço de mercado;
3.Contudo, apesar de provisionáveis, tais depreciações nunca seriam aceites como custo fiscal à luz do disposto no artigo 34.º do CIRC;
4.Mesmo que se utilizasse o critério da equivalência patrimonial, os resultados seriam neutros em termos fiscais, de acordo com a previsão normativa ínsita no n.º 7 do artigo 18.º do CIRC.
5.De acordo com o invocado princípio contabilístico da continuidade “considera-se que a empresa opera continuadamente, com duração ilimitada. Desta forma, entende-se que a empresa não tem intenção nem necessidade de entrar em liquidação ou de reduzir significativamente o volume das suas operações”. Ora, tal princípio seria válido para a inscrição da participada, mas já não da participante.
6.O mesmo sucede com o princípio da substância sobre a forma, que tem aplicabilidade diferente da reclamada pela impugnante. Veja-se a título de exemplo, o caso dos contratos promessa com tradição, cujo efeitos contabilísticos se produzem de imediato, ou a locação financeira, em que o bem é reconhecido de imediato como imobilizado do locatário.
7.Acresce ainda o facto da sociedade insolvente se encontrar cessada em IVA não releva em sede de IRC. Efectivamente, no lapso de tempo que medeia entre a sentença do processo que decreta a insolvência e a posterior liquidação do património da empresa insolvente, está inerente a realização de operações abrangidas pelo campo de incidência quer do IVA quer do IRC, bem como assunção de certas despesas e encargos, tudo isto com susceptibilidade de contribuir para o apuramento de resultado em sede de IRC (neste sentido vide artigo 73.º do CIRC).
8.Nos termos da alínea e) do n.º 1 do artigo 141.º do Código das Sociedades Comerciais (CSC), a declaração de falência é causa imediata de dissolução da sociedade, entrando esta, por força do n.º 1 do artigo 146.° do mesmo diploma, em fase de liquidação do seu património, com vista à realização do activo e ao pagamento do passivo. Por esta razão o n.º 2 do artigo 146.º do CSC estabelece que “a sociedade em liquidação mantém a personalidade jurídica e, salvo quando outra coisa resulte das disposições subsequentes ou da modalidade de liquidação, continuam ser-lhe aplicáveis, com as necessárias adaptações, as disposições que regem as sociedades não dissolvidas”. Mantendo a sociedade a sua personalidade jurídica e tributária (nos termos do artigo 15.º das LGT) continua a ser-lhe aplicável, com as necessárias adaptações, as disposições que regem as sociedades não dissolvidas:
9. O processo de insolvência não implica necessariamente que se venha a verificar a liquidação integral do património do devedor; este pode terminar quer com a liquidação e repartição do produto pelos credores, quer com a aprovação de um plano de insolvência que assegure outra forma de satisfação dos credores, nomeadamente, a recuperação da empresa incluída na massa insolvente.
10.Também ao arrepio do que afirmou a impugnante, o critério principal utilizado pelo legislador português para a definição da situação de insolvência (artigo 3.°, n.º 1 do CIRE) é o critério do fluxo de caixa, pelo qual “a insolvência corresponde à impossibilidade de cumprimento pontual das obrigações e não à mera insuficiência patrimonial, correspondente a uma situação liquida negativa - Cfr. Luís Manuel Teles de Menezes Leitão, Direito de Insolvência (2009), pp. 77 e ss.
11. Pelo que, somente a final, depois da liquidação, quando houver ou não partilha pelos sócios, se poderá concluir pela existência de menos — valias efectivamente apuradas. Não pode pois considerar-se um custo efectivo o que constitui apenas perda potencial ou latente.”.
A tese da recorrente de que o regime consignado nos artigos 73.º e seguintes do CIRC apenas tem aplicação nos casos de liquidação não judicial de sociedades, não tem, pois, qualquer apoio na letra e espírito da lei.
A sentença recorrida não merece, assim, censura
Termos em que deve ser negar-se provimento ao presente recurso jurisdicional, mantendo-se a sentença recorrida na ordem jurídica.»

4 - Colhidos os vistos legais, cabe decidir.

5 - Em sede factual apurou-se em primeira instância a seguinte matéria de facto:
1. A impugnante foi sujeita a fiscalização externa referente ao exercício de 2005 no âmbito da qual foi elaborado o relatório junto a fls. 11 e segs. dos autos cujo conteúdo se dá por reproduzido.
2. A ação de fiscalização apurou que:
3. O sujeito passivo deduziu ao Q07 a importância de € 748.196,84, referente à perda total do valor da participação financeira na empresa A…………, LDA e assim registado contabilisticamente através do Documento nº 12.002 de 31/12/2005: -participação na escrita de 1996 – valor ajustado à equivalência patrimonial: Conta Débito 59 – resultados transitados e Conta a Crédito 5518 – Ajustamento de partes de capital pelo valor de € 748.096,84, correspondente às entradas em numerário para aumento do capital social através de escritura realizadas em 01.08.1996. (fls.13 e documento de fls. 16 cujo conteúdo se dá por reproduzido).
4. Efectuou ainda através do mesmo documento o seguinte registo: Participação na escritura de 1996 – valor que ficou na conta, conta débito 6948-Perdas Extraordinárias: e Contas Crédito – 411 Investimentos Financeiros, pelo valor de € 100,00.
5. A sociedade A…………. Lda, foi declarada insolvente por sentença transitada em julgado em 08.03.2005.
6. Notificada para o exercício do direito de audição, nada disse.
7. Pelo que foi efectuada a liquidação adicional de IRC no montante de €16.791,73 (fls.9 cujo conteúdo se dá por reproduzido).

6. Do objecto do recurso
Da análise do segmento decisório da sentença e dos fundamentos invocados pelo recorrente para pedir a sua alteração, podemos concluir que o objecto do recurso consiste em saber se, como alega a recorrente, padece de erro de julgamento a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida da liquidação adicional de IRC de 2005, no entendimento de que não pode ser relevado como custo fiscal do exercício a perda da participação da recorrente na empresa A…………, LDA, por via da declaração de insolvência desta, uma vez que haverá que ter em conta o resultado da partilha nos termos e para os feitos do estatuído no artigo 75.° do CIRC (redacção vigente à data do facto tributário).

Resulta dos autos que a impugnante e ora recorrente, A……………., S.A detinha uma participação social desde 1 de Agosto de 1996, no valor de € 748.196, 84, na sociedade A………….. Ldª.
Por sentença do Tribunal Judicial da Marinha Grande, transitada em julgado em 8 de Março de 2005, foi aquela sociedade declarada insolvente.
Nesse ano a impugnante registou na conta de perdas extraordinárias o valor daquela participação social subscrita em 1996, contabilizando aquela perda extraordinária como custo fiscal do exercício de 2005.
E a Administração Fiscal não aceitou tal dedução por considerar que «a empresa reconheceu em 2005 um custo efectivo relacionado coma perda da participação social, quando se trata de uma perda potencial (Cf. fls. 12 do relatório dos Serviços de Inspecção Tributária, em apenso.)» invocando ademais o disposto no artº 75º nº 1 do CIRC e concluindo que «as menos valias apuradas só poderão ser reconhecidas no exercício em que for posto à disposição o valor que lhes for atribuído em resultado da partilha», procedendo à respectiva correcção técnica da matéria tributável no referido montante de € 748.196, 84.
Tendo a recorrente deduzido impugnação judicial daquela liquidação adicional foi a mesma julgada improcedente na sentença ora recorrida.

Considerou a primeira instância que o artº 75º do CIRC (Na redacção vigente à data dos factos - DL 198/2001- 3 de Julho.) está inserido na Subsecção V daquele compêndio normativo, referente às sociedades em liquidação.
E que, entrando a sociedade declarada insolvente em liquidação, por força do disposto nos arts. 158º do CIRE e 146º, nº 1 do CSC, a norma do artº 75º, nº 1 do CIRC tem inteira aplicação no caso em apreço.
Prosseguindo concluiu a decisão sindicada, invocando o artº 75º, nº 2, al. b) do CIRC, que os créditos resultantes de participações sociais apenas podem ser contabilizados no fim da partilha e em função do valor que for atribuído a cada sócio, podendo então serem considerados menos valias quando a diferença entre o valor atribuído a cada sócio em resultado da partilha e o valor da participação social for negativa.

Não conformada com o assim decidido alega a Recorrente que a perda da participação na empresa A……….., declarada insolvente, deve ser relevada como custo fiscal do exercício nos termos previstos no art.º 23º do CIRC, não integrando nenhuma das excepções elencadas naquele normativo.
Mais argumenta que decisão recorrida fez uma incorrecta aplicação do nº1 do artigo 75º do CIRC, porque este aplica-se à liquidação não judicial ou seja aquela que é promovida pelos próprios sócios, o que não aconteceu nos autos.

Vejamos.
A questão sub judice haverá de ser analisada e enquadrada com base no conceito de rendimento adoptado pelo CIRC.
O conceito de lucro tributável adoptado no CIRC acolheu uma noção extensiva de rendimento de acordo com a teoria do rendimento acréscimo ou do incremento patrimonial, a qual se se baseia no princípio de que tudo o que faça aumentar o património líquido inicial é rendimento tributável de uma empresa, nele se incluindo também os ganhos fortuitos, ocasionais ou irregulares.
Assim de acordo com o nº 2 do artº 3º do CIRC o lucro consiste na diferença entre os valores do património líquido no fim e no início do período de tributação, com as correcções estabelecidas naquele Código.
E ao artº 17º, nº 1 do CIRC completa o afirmado no nº 2 do artº 3º precisando que o lucro tributável é constituído pela soma algébrica do resultado líquido do período e das variações patrimoniais positivas e negativas verificadas no mesmo período e não reflectidas naquele resultado, determinados com base na contabilidade e eventualmente corrigidos nos termos do referido Código.
Ora, com a alteração legal introduzida pelo CIRC as mais valias e as menos valias passaram a estar incluídas no conceito de lucro, ainda que, por motivos de índole económica, limitadas às que tivessem sido realizadas (Sobre a teoria do incremento patrimonial e sobre o princípio da realização cf. A. Moura Portugal, A Dedutibilidade dos Custos na Jurisprudência Fiscal Portuguesa, Coimbra Editora, pag. 62 e 142.) .
Com efeito, da não inclusão das mais e menos valias não realizadas ou latentes no conceito de lucro adoptado, a par de outros desvios ou exclusões determinados por razões de praticabilidade ou insegurança na respectiva determinação, é seguro concluir que a lei fiscal não adopta o conceito pleno de acréscimo patrimonial, mas apenas o de acréscimo patrimonial realizado (Saldanha Sanches, A quantificação da obrigação tributária , Editora Lex, pag. 245 e A. Moura Portugal, ob. cit., pag. 62.).
Por isso de entre as variações patrimoniais negativas não reflectidas no resultado líquido do exercício o legislador excluiu as menos valias latentes (arts. 21º, nº 1, al.b) e 24º, nº 1. Al. b) em razão do princípio da realização, a que, em geral, obedece a sua sujeição a imposto. (Também neste sentido, Rui Duarte Morais, apontamentos ao IRC, ed. Almedina, pag. 64.)
E também por esse motivo o artº 23º, al. i) daquele diploma legal (Redacção anterior a 31.12.2009.) considera apenas como gastos ou perdas dedutíveis as menos valias realizadas.
Em suma no que respeita às mais e menos valias limitou-se a sua inclusão no lucro tributável às que tiverem sido realizadas.
No caso vertente o recorrente alega que a declaração de insolvência da A……….., Ldª teve como consequência a perda total de valor do próprio capital da falida e nessa medida o investimento financeiro que o referido capital representava para a recorrente passou a ter a natureza de uma perda do exercício de 2005, ano em que foi declarada a insolvência da A…………, Ldª.
Mas de facto não é bem assim.
Como bem nota a Fazenda Pública, na realidade, apenas no fim do processo de insolvência, com propriedade, se conhecerá o destino final da sociedade insolvente: a sua extinção, por via da integral liquidação do seu património ou a sua inclusão num plano de insolvência, nomeadamente, de recuperação.
Daí que, só após o registo do encerramento da liquidação da sociedade insolvente participada, se poderá aquilatar da existência, ou não, de menos-valias geradas e da respectiva quantificação.
Até lá, como sucede no caso vertente, existe uma mera possibilidade de perda, ou seja, uma perda potencial ou latente, que, como vimos, não pode ser considerada na determinação do lucro tributável por força do princípio da realização.

É certo que a Administração Fiscal invocou também o artº 75º nº 1 do CIRC, de acordo com o qual é englobado para efeitos de tributação dos sócios, no exercício em que for posto à sua disposição, o valor que for atribuído a cada um deles em resultado da partilha, abatido do preço de aquisição das correspondentes partes sociais.

E na mesma linha de argumentação navegou a sentença recorrida.

A jurisprudência sobre a matéria divide-se.

No Acórdão desta Secção de Contencioso Tributário de 24.02.2011, proferido no recurso 1145/09, considerou-se não haver «motivo para que a liquidação derivada da dissolução em processo de falência tenha um tratamento diferenciado das demais liquidações de patrimónios societários»

E que «O facto de a sociedade ser declarada falida não obsta, pois, a que se mantenham, com as necessárias adaptações e em tudo o que não for incompatível com o regime processual da massa falida, as disposições que regem as sociedades não dissolvidas, designadamente as regras previstas no CIRC para a tributação do lucro tributável das sociedades em liquidação».

Mas não sem que antes se desse, naquele aresto, a devida nota das dúvidas suscitadas pelo facto do processo de falência não estar vocacionado para a observância do prazo de três anos a que alude a parte final do n.º 4 do artigo 65(Artº 73º na redacção do DL 198/2001- 3 de Julho) do C.I.R.C, nomeadamente porque «os acréscimos patrimoniais porventura ocorridos no processo de falência não podem ser temperados por pagamentos por conta nem pela dedução de custos, gerando resultados provisórios verdadeiramente distorcidos na óptica da anualidade» e porque, por outro lado, «a maior parte das falências acolhem diversos litígios com tempos processuais autónomos que se furtam à gestão temporal do liquidatário e podem mesmo retardar a liquidação, não estando, assim, o processo de falência vocacionado para a observância do aludido prazo de três anos»

Porém, já no Acórdão 01079/03 de 29.10.2003 se entendeu que «os arts. 65º e segts (actuais artºs 73º e segts) do CIRC regulam a "liquidação de sociedades e outras entidades", não fazendo, todavia, qualquer referência expressa à falência, parecendo todavia não a englobar já que prevêem a partilha dos bens pelos sócios.»

Consideramos também duvidoso que o processo de liquidação das sociedades na sua acepção geral, visando a venda do património da empresa e subsequente partilha do resultado pelos sócios, deva ser considerado para efeitos de determinação do lucro tributável da sociedade insolvente.

Com efeito a liquidação de uma sociedade, com deliberação pelos sócios, tem em vista a extinção da sociedade, situação que é inversa no processo de insolvência, pois não é esse o seu objectivo, mas sim efectuar pagamentos aos credores à custa do património societário (Neste sentido também Ana Cristina dos Santos Arromba Dinis e Cidália Maria da Mota Lopes, A Fiscalidade das Sociedades insolventes, uma primeira abordagem, ed. Almedina, pag. 145.).

Como quer que seja, independentemente da posição que se tome sobre a questão de saber se o regime de determinação do lucro tributável das sociedades em liquidação se aplica à liquidação derivada do processo de insolvência, o certo é que, como atrás se referiu, o princípio da realização implica que apenas serão de incluir no lucro tributável as mais e menos valias, que tiverem sido realizadas.
Ora o processo de insolvência poderá terminar quer com a liquidação e repartição do produto pelos credores, mas também com a aprovação de um plano de insolvência que assegure outra forma de satisfação dos credores, nomeadamente, a recuperação da empresa incluída na massa insolvente.
Acresce que, como se evidenciou no referido Acórdão 1145/09, relativamente às sociedades em liquidação em processo de falência, não é o facto de se tratar de uma execução universal de bens e de se estar em presença de uma situação económica deficitária que impede que se possam verificar ganhos fortuitos e inesperados, vendas de bens por valores que podem não só solver todas as dívidas como gerar sobras, incrementos patrimoniais. (Embora se admita que, previsivelmente, nem sempre assim sucederá.).

Em suma só a final, depois da liquidação, se poderá concluir pela existência e quantificação das menos - valias efectivamente apuradas.

Nesta perspectiva as correcções efectuadas pela Administração Tributária, que fundamentaram também no princípio da realização, - pois que se entendeu que a empresa reconheceu em 2005 um custo efectivo relacionado com a perda da participação social, quando se trata de uma perda potencial - não merecem censura já que não pode considerar-se como custo efectivo o que constitui apenas perda potencial ou latente.
Daí que se conclua que, por essa razão, improcede desde logo a argumentação da recorrente, sendo de confirmar, com esta fundamentação, o julgado de primeira instância, no sentido de improcedência da impugnação.

7. Decisão

Termos em que, face ao exposto, acordam os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em negar provimento ao recurso.
Custas pela recorrente.

Lisboa, 15 de Março de 2017. - Pedro Delgado (relator) - Dulce Neto - Ascensão Lopes.