Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:045160
Data do Acordão:10/03/2002
Tribunal:PLENO DA SECÇÃO DO CA
Relator:PAIS BORGES
Descritores:RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL.
ACTO DE GESTÃO PÚBLICA.
AUTARQUIA LOCAL.
PRESUNÇÃO DE CULPA.
Sumário:É aplicável à responsabilidade civil extracontratual das autarquias locais por factos ilícitos praticados no exercício de gestão pública a presunção de culpa prevista no art. 493º, nº 1 do C.Civil.
Nº Convencional:JSTA00058086
Nº do Documento:SAP20021003045160
Data de Entrada:05/09/2001
Recorrente:MUNICÍPIO DE GONDOMAR
Recorrido 1:A...
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC OPOS JULGADOS.
Objecto:AC 1 SUBSECÇÃO DO CA - AC 1 SUBSECÇÃO DO CA PROC38158 DE 1998/02/19.
Decisão:NEGA PROVIMENTO.
Área Temática 1:DIR ADM CONT - RESPONSABILIDADE EXTRA.
Área Temática 2:DIR CIV - DIR OBG.
Legislação Nacional:CCIV66 ART493 N1.
Jurisprudência Nacional:AC STAPLENO PROC36463 DE 1998/04/29.; AC STAPLENO PROC45831 DE 2002/03/20.; AC STAPLENO PROC37510 DE 2000/10/25.; AC STAPLENO PROC41712 DE 1999/04/27.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam, em conferência, no Pleno da 1ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo:
(Relatório)
I. O MUNICÍPIO DE GONDOMAR interpôs recurso para o Pleno da Secção, por oposição de julgados, nos termos do disposto no art. 24º, b) do ETAF, do acórdão de fls. 111 e segs., proferido no recurso jurisdicional interposto da sentença do TAC do Porto que, em acção para efectivação de responsabilidade civil extracontratual, condenou o recorrente a pagar à A. a quantia de 525.990$00, alegando existência de oposição sobre a mesma questão jurídica, e no domínio da mesma legislação, com o decidido no acórdão desta Secção, de 19.02.98, proferido no Rec. nº 38.158, já transitado em julgado, e publicado em Internet, STA, nº convencional JSTA00049545, junto a fls. 144 e segs. dos autos.
Por acórdão interlocutório de fls. 154 e segs., foi julgada existente a invocada oposição de julgados, e ordenado, em consequência, o prosseguimento do recurso.
Na sua alegação, formula as seguintes
CONCLUSÕES:
No regime de responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais pessoas colectivas públicas por actos de gestão pública, não há inversão do ónus da prova decorrente da presunção de culpa prevista no n° 1 do art° 493° do Código Civil, pelo que é ao lesado que cabe a prova dessa culpa que será aferida nos termos do art° 487° do Código Civil, devendo entender-se a remissão feita pelo art° 4°, n° 1 do DL 48.051 para o art° 487° do Código Civil arredada de qualquer presunção legal, pelos fundamentos seguintes:
1º- porque o artº 1° do DL 48.051, de 21-11-1967 refere expressamente que "a responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais pessoas colectivas públicas no domínio dos actos de gestão pública rege-se pelo disposto no presente diploma, em tudo que não esteja previsto em leis especiais" .
2º - porque o artigo 90º do DL 100/84, de 29-3, por seu lado, estatui que, " as autarquias locais respondem civilmente perante terceiros por ofensa de direitos destes ou disposições legais destinadas a proteger os seus interesses, resultante de actos ilícitos culposamente praticados pelos respectivos órgãos ou agentes no exercício das suas funções ou por causa desse exercício".
3° - porque o art° 4°, n° 1 do DL 48.051 estabelece que " a culpa dos titulares do órgão ou dos agentes é apreciada nos termos do artigo 487° do Código Civil".
4° - porque, o artº 48º do Código Civil refere: " É ao lesado que incumbe provar a culpa do autor da lesão, salvo havendo presunção legal de culpa. A culpa é apreciada, na falta de outro critério legal, pela diligência de um bom pai de família, em face das circunstâncias de cada caso."
5° - porque o DL 48.051, prevê apenas um caso específico de presunção legal de culpa - no seu artigo 8° -, não tendo previsto mais nenhum caso.
6° - porque o DL 48.051 não remete genericamente para o Código Civil, mas apenas em casos concretos.
7º - porque o DL 48.051 é lei especial, prevalecendo sobre a lei geral (Código Civil), tendo o legislador tido oportunidade de incluir uma presunção de culpa relativamente ao caso sub judice, se o tivesse querido, e, manifestamente, não quis.
8° - porque o artº 493° do Código Civil, para o qual o DL 48.051 não remete, prevê uma regra excepcional de apreciação da culpa, dado que estabelece uma presunção legal de culpa. Mas, tal presunção legal, é notoriamente uma regra excepcional, e não um princípio geral que possa ser aplicável subsidiariamente ao regime legal especial previsto no DL 48.051.
9º - porque, quando no artº 4°, n° 1 se faz a remissão para o artº 487º do Código Civil, pretende-se estabelecer um critério de apreciação da culpa, e não do ónus da prova.
10º - porque o diploma em análise - DL 48.051 - foi elaborado apenas um ano após a entrada em vigor do Código Civil, pelo que, interpretar o artº 4° , n° 1, no sentido de este remeter para o artº 493°, n° 1, é dar ao preceito em causa uma extensão que este não comporta, dado que, embora o interprete não se deva cingir à letra da lei, também é verdade que deve reconstituir a partir do texto o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada – artº 9º , n° 1 do Código Civil.
II. Contra-alegou a recorrida, formulando as seguintes
CONCLUSÕES:
1. A responsabilidade civil extracontratual dos entes públicos está constitucionalmente consagrada e ainda hoje especialmente prevista no DL n° 48 051.
2. A jurisprudência é quase unânime no sentido de que o DL n° 48 051 não regulamenta exaustivamente o instituto da responsabilidade civil extracontratual dos entes públicos por actos de gestão pública, uma vez que não se desenha o quadro normativo completo da responsabilidade civil dos entes públicos, incluindo o das Autarquias Locais.
3. Em matéria de apreciação da culpa dos titulares órgãos ou agentes públicos, o referido DL, art. 4°, n° 1, remete para o art. 487° do Código Civil.
4. A culpa dos órgãos ou agentes da Administração é apreciada segundo a diligência de um bom pai de família, em face das circunstâncias de cada caso, ou seja, segundo a diligência exigível a um funcionário ou agente típico, zeloso e respeitador da lei e dos regulamentos.
5. Uma das situações que o DL não prevê é a contemplada no art. 493° do Código Civil, onde se estabelece uma presunção de culpa do lesante.
6. A não aplicação deste preceito à responsabilidade civil extracontratual das Autarquias Locais por acto ilícito de gestão pública suscitaria desigual tratamento, em matéria de prova, no caso de se tratar de entes públicos ou de entes privados, o que não tem qualquer fundamento ou justificação.
7. Não se pode aceitar que o princípio da presunção da legalidade dos actos administrativos conduza à inaplicabilidade da presunção legal de culpa do lesante, o que implicaria o desrespeito pelos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos e uma situação de claro favor relativamente ao regime geral da responsabilidade civil.
8. Admitindo o carácter unitário do instituto da responsabilidade civil justifica-se a aplicação, em tais matérias, do disposto no Código Civil, uma vez que não têm qualquer paralelo no DL n° 48 051.
9. Os pressupostos da responsabilidade extracontratual são os mesmos tratando-se quer de actos de gestão pública, quer de actos de gestão privada, ou seja, são sempre aplicáveis os pressupostos da lei civil.
10. A tese que o Recorrente pretende ver consagrada como jurisprudência uniformizada colide com uma grande maioria de jurisprudência do Supremo tribunal Administrativo que é no sentido da aplicação do art. 493°, n° I do Código Civil, no âmbito da responsabilidade civil extracontratual dos entes públicos por facto ilícitos, tal como foi decidido em desfavor do Município de Gondomar.
III. O Exmo magistrado do Ministério Público neste Supremo Tribunal pronunciou-se pela confirmação do acórdão recorrido, referindo que o mesmo segue orientação já definida por este Pleno, sustentando pois que deve ser negado provimento ao recurso.
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Colhidos os vistos, cumpre decidir.
(Fundamentação)
OS FACTOS
O acórdão impugnado teve em consideração os seguintes factos:
1- A rua David Afonso Mouzinho, na freguesia de Rio Tinto, do concelho de Gondomar, apresenta uma ligeira inclinação ascendente, atento o sentido de quem segue em direcção ao vídeo clube existente ao cimo da mesma (al. A).
2- Nessa rua, o trânsito pode ser feito em ambos os lados da via (al. B).
3- E o estacionamento é permitido em ambos os lados da via (al.C).
4- Na rua referida em A), em frente do prédio com o número de polícia 121, existe uma tampa de saneamento (al.D).
5- A qual não se encontrava sinalizada (al.E).
6- No exercício da sua actividade, a autora celebrou com a Sociedade "..., S.A.", proprietária do AC, um contrato de seguro do ramo automóvel, titulado pela apólice nº ..., para cobertura, entre ambos, dos riscos de choque, colisão, capotamento e incêndio (onde se incluíam os danos próprios do veículo), conforme apólice de seguro junta a fls. 16 e 17, aqui dada por reproduzida (al.F).
7- No dia 12 de Novembro de 1995, pelas 23,30 horas, ... conduzia o veículo de passageiros, marca Volkswagen Golf, com a matrícula n° ..., propriedade de "..., SA" (resposta ao quesito 1°).
8- Circulava na rua referida em A) em sentido ascendente (resposta ao quesito 2°).
9- A velocidade inferior a 50 Km/hora (resposta ao quesito 3°).
10- Era noite e a iluminação pública existente no local era escassa e de fraca intensidade (resposta aos quesitos 4° e 5°).
11- Em ambas as faixas laterais, ascendente e descendente, encontravam-se estacionados vários veículos automóveis, designadamente na faixa ascendente, em frente ao prédio como número de polícia 121 (resposta ao quesito 6°).
12- A largura da rua referida em A) é, pelo menos, de 7 metros (resposta ao quesito 7°).
13- Ao chegar ao local referido em D), o condutor do AC, em virtude do referido na resposta aos quesitos 6° e 7°, viu-se obrigado a desviar a viatura um pouco para a esquerda (resposta ao quesito 8°).
14- Passou a circular pelo eixo da via, mas ainda pela direita da faixa de rodagem, atento ao sentido que seguia (ascendente) - (resposta ao quesito 9°).
15- Inopinadamente, e sem que nada o fizesse prever, bateu violentamente com a parte de baixo do AC na tampa de saneamento referida em D) - (resposta ao quesito 10°).
16- E que apresentava uma saliência de cerca de 20 cm (resposta ao quesito 12°).
17- Essa saliência era directamente provocada por um aluimento do pavimento circundante à tampa de saneamento referida em D) (resposta ao quesito 12°-A).
18- Nesse local, o pavimento encontrava-se em muito mau estado (resposta ao quesito 13°).
19- Na sequência do embate referido no quesito 10°, o AC sofreu diversos danos, nomeadamente, no carter, caixa de velocidades, suspensão, charriot, manga de eixo, conforme os descritos no relatório de peritagem junto a fls. 7 e aqui dado como reproduzido (resposta ao quesito 14°).
20- Cuja reparação ascendeu a 553.990$00 (resposta ao quesito 15°).
21- Quantia que ao abrigo do contrato de seguro referido em F) a autora liquidou à sua segurada, após deduzida a franquia contratual, ou seja, o montante de 525.900$00, em 28 de Novembro de 1995 (resposta ao quesito 16°).
22- A autora interpelou a ré para liquidar a quantia referida no quesito 16° (resposta ao quesito 17°).
O DIREITO
A questão que se coloca no presente recurso, sobre a qual recaíram pronúncias divergentes, é a de saber se é aplicável à responsabilidade civil extracontratual das autarquias locais por factos ilícitos praticados no exercício de gestão pública a presunção de culpa prevista no art. 493º, nº 1 do C.Civil.
O acórdão recorrido deu resposta positiva a esta questão, louvando-se, aliás, em jurisprudência largamente dominante deste STA, designadamente do Pleno.
O recorrente Município de gondomar defende, por seu lado, a inaplicabilidade daquela presunção de culpa à responsabilidade extracontratual das autarquias locais por facto ilícito praticado no exercício de gestão pública, sustentando que a remissão feita pelo art. 4º do DL nº 48051 para o disposto no art. 487º do C.Civil não contempla qualquer remissão para a norma contida no art. 493º, entendimento igualmente sufragado pelo acórdão fundamento.
Acompanha-se, sem qualquer reserva, a orientação já sufragada por este Pleno, designadamente no Ac. de 29.04.98 – Rec. 36.463, cuja fundamentação, no essencial, se reproduz:
Como se sabe, a responsabilidade civil extracontratual dos entes públicos, constitucionalmente consagrada no artigo 22.º da Constituição da República Portuguesa, está ainda hoje especialmente prevista no Decreto-Lei n.º 48 051.
Este diploma, em relação às autarquias locais, deu nova redacção aos artigos 366.º e 367.º do Código Administrativo, substituídos depois pelos artigos 90.º e 91.º do Decreto-Lei n.º 100/84, de 29 de Março.
«E ressalvados casos excepcionais de responsabilidade da Administração por factos casuais e actos ilícitos {artigos 8.º e 9.º do Decreto-Lei n.º 48 051), entende-se que a responsabilidade daquela Administração por factos ilícitos e culposos no exercício da gestão pública se encontra consagrada nos artigos 2.º a 6.º do citado decreto-lei e nos artigos 90.º e 91.º do Decreto-Lei n.º 100/84.
Deste regime resulta, para além da ilicitude, com maior amplitude do que a definida no Código Civil, artigo 8.º do referido Decreto-Lei n.º 48 051 e artigo 483.º deste Código – a remissão expressa para o dito Código, tanto no concernente à culpa dos titulares do órgão ou agentes {artigo 487.º) como no respeitante à solidariedade da responsabilidade entre vários responsáveis (artigo 497.º) e à prescrição do direito de indemnização e direito de regresso (artigo 498.º, n.ºs I, 2 e 3).
Assim, os pressupostos da responsabilidade extracontratual, por actos de gestão pública, são os mesmos que a lei civil consagra para aquela responsabilidade decorrente de actos de gestão privada.
Nada se refere sobre o relevo da omissão (artigo 486.º) imputabilidade (artigo 488.º), indemnização por pessoa não imputável (artigo 489.º) dos autores instigadores e auxiliares (artigo 490.º), das pessoas obrigadas à vigilância de outrem (artigo 491.º), dos danos causados por edifícios ou outras obras (artigo 492.º), danos causados por coisas, animais ou actividades (artigo 493.º), limitação da indemnização no caso de mera culpa (artigo 494.º), indemnização a terceiros em caso de morte ou lesão corporal (artigo 495.º) e danos não patrimoniais (artigo 496.º) – tudo rubricas que o Código Civil contempla na secção V, subsecção I, na «responsabilidade por factos ilícitos».
E idêntica omissão se verifica sobre o nexo de causalidade entre o facto e o evento (artigos 483.º a 563.º), sobre o ónus da prova da culpa e presunções legais desta (artigos 493.º, n.º I, 342.º e 350.º), obrigação de indemnização (artigos 562.º e seguintes) etc.» (Cfr. acórdão de 13 de Março de 1986, Acórdãos Doutrinais n.º 305, pág. 624).
Assim, na regulamentação do Decreto-Lei n.º 48 051 não se desenha o quadro normativo completo da responsabilidade civil dos entes públicos, incluindo o das autarquias locais.
E embora se admita a especificação do regime da obrigação emergente da gestão pública através dos preceitos legais expressos no Decreto-Lei n.º 48 051, no mais a responsabilidade por actos ilícitos é um instituto unitário (cfr. o citado acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 13 de Janeiro de 1986).
Daí que na falta de disposições especiais e não obstante não haver no Decreto--Lei n.º 48 051 uma norma geral remissiva para o Código Civil, se dever aplicar à responsabilidade por gestão pública as normas constantes do Código Civil que não colidam com o que directa ou indirectamente emerge do Decreto-Lei n.º 48051.
Conclusão, aliás, a que não poderia deixar de se chegar, mercê, também, do recurso à integração de lacunas nos termos do artigo 10.º do Código Civil.
De resto e no que respeita à aplicação do disposto no artigo 493.º, n.º I, do Código Civil à responsabilidade civil extracontratual por gestão pública, tal como se diz no acórdão fundamento, resulta do próprio Decreto-Lei n.º 48 051 que no seu artigo 4.º, n.º I, remete para o artigo 487.º do Código Civil em matéria de apreciação de culpa dos titulares dos órgãos e agentes.
E não obstante, como se diz no acórdão recorrido, só o n.º 2 daquele artigo 487.º se referia à apreciação da culpa, a verdade é que a remissão é feita para todo o artigo 487.º pelo n.º I do artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 48 051, como de igual modo o n.º 2 do mesmo artigo 4.º se reporta a todo o artigo 497.º
Assim, há que convir que a remissão do artigo 4.º, n.º I, do Decreto-Lei n.º 48 051 abrange também o n.º I do artigo 487.º do Código Civil.
Daí que, no âmbito da responsabilidade civil extracontratual dos entes públicos por acto ilícito de gestão pública, incumba ao lesado provar a culpa do autor da lesão, salvo havendo presunção legal.
Presunção legal esta que será não só a que eventualmente vier expressa no Decreto-Lei n.º 48 051, como a que constar do Código Civil, em matéria não regulada por aquele diploma e que não colida com os princípios nele acolhidos.
Assim não se vislumbram no caso da responsabilidade civil extracontratual por acto ilícito de gestão pública razões justificativas para a não aplicação do regime que se consagra no artigo 493.º, n.º I, para o caso das coisas públicas, a sua guarda e vigilância caber nas atribuições da pessoa colectiva pública, como é o caso dos autos (...).
É que no artigo 493.º, n.º 1, do Código Civil não se consagra um regime para «coisas especialmente perigosas» mas um «princípio gera1» de que pelos danos causados por coisas (móveis ou imóveis) a responsabilidade é mais rigorosa do que segundo as regras gerais dessa mesma responsabilidade.
Estabelece-se uma presunção de culpa por parte de quem tem a seu cargo a vigilância das coisas, com excepção à regra do n.º I do artigo 487.º do Código Civil, mediante a inversão do ónus da prova, porquanto o dono da coisa deve saber, como ninguém, se foi cauteloso na guarda e na vigilância dessa mesma coisa, sendo certo, que, assim, se não afasta o princípio de que se está perante responsabilidade por culpa e não objectiva ou por risco.
«Não se aplicar este preceito, como se diz no acórdão fundamento, aos casos de responsabilidade civil extracontratual dos entes públicos suscitaria sempre o reparo de se não ver razão para desigual tratamento, em matéria de prova, relativamente aos danos causados por coisas móveis ou imóveis que os entes públicos ou privados têm em seu poder com o dever de as vigiar.»
No mesmo sentido, e sufragando idêntica fundamentação, veio este Pleno a decidir nos Acs. de 20.03.2002 – Rec. 45.831, de 25.10.2000 – Rec. 37.510 e de 27.04.99 – Rec. 41.712.
Improcedem, pois, as alegações do recorrente.
(Decisão)
Com os fundamentos expostos, acordam em negar provimento ao recurso, confirmando a decisão impugnada.
Sem custas.
Lisboa, 3 de Outubro de 2002.
Pais Borges – Relator – António Samagaio – Azevedo Moreira – Gouveia e Melo - Isabel Jovita – Adelino Lopes – Abel Atanásio – João Cordeiro – Pamplona de Oliveira