Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0303/12
Data do Acordão:10/23/2012
Tribunal:2 SUBSECÇÃO DO CA
Relator:ALBERTO AUGUSTO OLIVEIRA
Descritores:ENTIDADE REGULADORA DA COMUNICAÇÃO SOCIAL
IMPRENSA
DIREITO DE RESPOSTA
PRAZO
Sumário:O prazo previsto no artigo 59.º, n.º 1, dos Estatutos da ERC aprovados pela Lei n.º 53/2005, de 8 de Novembro, conta-se segundo as regras do artigo 279.º do Código Civil.
Nº Convencional:JSTA00067864
Nº do Documento:SA1201210230303
Data de Entrada:05/14/2012
Recorrente:ERC - ENTIDADE REGULADORA PARA A COMUNICAÇÃO SOCIAL
Recorrido 1:A...... E OUTRA
Votação:MAIORIA COM 1 VOT VENC
Meio Processual:REC REVISTA EXCEPC
Objecto:AC TCA SUL
Decisão:NEGA PROVIMENTO
Área Temática 1:DIR ADM CONT.
Legislação Nacional:CCIV66 ART279 ART296.
CPA91 ART72 ART2 N1.
L 53/2005 DE 2005/11/08 ART55 ART59 N1 ART60.
L 2/99 DE 1999/01/13 ART27 N1.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na 1ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo:

1. Relatório

1.1. ERC – ENTIDADE REGULADORA PARA A COMUNICAÇÃO SOCIAL recorre para este Supremo Tribunal Administrativo, ao abrigo do art. 150.º do CPTA, do acórdão do TCA Sul, de 07 de Dezembro de 2011, que confirmou «a decisão de 1.ª instância de anular a sua deliberação de 22.02.2007 pela qual considerou deficiente a publicação de um texto de resposta a uma notícia no Jornal ……… e ordenou nova publicação nos termos que delineou como adequados».

1.2. No recurso da referida decisão, a Recorrente – ERC – formulou as seguintes conclusões (quanto ao mérito):
«(…)
Y) Não pode deixar de ser refutado veementemente o entendimento do tribunal a quo de que o direito de resposta se reconduz a um litígio entre particulares;
Z) Tal entendimento desvirtua o direito de resposta - enquanto integrante do complexo de direitos em que se traduz a liberdade de expressão e informação, consagrada no art. 37° da CRP -, esquecendo o interesse público que lhe subjaz e o justifica, reconduzindo-o a um mero interesse privado;
AA) Daí decorre outra consequência, qual seja a de considerar aplicável ao recurso sobre denegação do direito de resposta o procedimento de queixa previsto nos art.s 55° a 58° dos Estatutos da ERC;
BB) Reservando o tribunal a quo a aplicação do disposto nos art.s 59° e 60° dos mesmos Estatutos para os casos em que esteja em causa o direito "de resposta ou réplica política".
CC) Ora, "Por direito de resposta e de réplica política entende-se o direito dos partidos políticos da oposição parlamentar de responder a qualquer declaração política do Governo e destina-se a permitir aos partidos da oposição parlamentar contrapor os seus argumentos e posições às do Governo. Pressupõe naturalmente que as declarações políticas do Governo, que são objecto de resposta ou réplica política, tenham sido veiculados na rádio ou na televisão";
DD) Na verdade, o recurso para a ERC relativo a questões emergentes do direito de resposta e de rectificação, consagrado no art. 37°, n.º 4 da CRP., ao contrário do defendido no acórdão recorrido, tem de ser enquadrado na Secção III do Capítulo V dos Estatutos da ERC, designadamente no art. 59°, n.º 1, e não nos art.s 55° a 58°;
EE) A clareza da norma é suficiente e, até à data, nenhum órgão de comunicação social pugnou pelo afastamento da sua aplicabilidade, invocando, em contrapartida, a aplicabilidade do procedimento previsto nos art.s 55° a 58° dos Estatutos da ERC aos casos em que estava em causa o recurso previsto no art. 27°, n.º 1 da Lei de Imprensa, no art. 62°, n.º 3 da Lei da Rádio (Lei n.º 54/2010, de 24/12) ou no art. 68°, n.º 3 da Lei da Televisão (Lei n.º 27/2007, de 30 de Julho, alterada pela Lei n.º 8/2011, de 11 de Abril);
FF) De realçar que a nova Lei da Rádio e as alterações introduzidas na Lei da Televisão vieram ajudar à separação sistemática dos dois direitos, com diferentes regimes jurídicos;
GG) O art. 60° dos Estatutos da ERC estabelece, por sua vez, a garantia de cumprimento do que vier a ser decidido pelo Conselho Regulador quanto aos diferentes direitos em causa: direito de resposta e de rectificação (art. 37°, n.º 4 da CRP.); direitos de antena, de resposta e de réplica política (art. 40° da CRP.);
HH) De referir - e este argumento, embora literal, não é de todo despiciendo - que o art. 60°, n.º 1 dos Estatutos da ERC expressamente determina: "A decisão que ordene a publicação ou transmissão de resposta ou de rectificação, de direito de antena ou de réplica política deve ser cumprida ... ", sendo certo que o direito de resposta ou de réplica política só pode ser exercido nos meios audiovisuais (rádio e televisão) e não na imprensa escrita, razão pela qual não pode ser objecto de publicação;
II) O procedimento a seguir pela ERC, no caso dos recursos relativos ao direito de resposta e de rectificação, tem de ser diferente do seguido nos demais procedimentos administrativos porque está obrigada a um dever de celeridade que não se compadece com as regras instituídas nos artigos 55° a 58° dos seus Estatutos;
JJ) Acresce que a interpretação normativa do art. 59°, n.º 1 dos Estatutos da ERC - que restringe a sua aplicação apenas aos recursos em que está em causa o direito de resposta ou de réplica política às declarações políticas do Governo (art. 40°, n.º 2 da CRP), excluindo o direito de resposta e de rectificação (art. 37°, n.º 4 da CRP) - é inconstitucional por violar o disposto nesta última disposição que assegura a todas as pessoas, singulares ou colectivas, o direito de resposta e de rectificação em condições e igualdade e de eficácia, consagrando o princípio da "equivalência comunicacional";
KK) O tribunal a quo incorreu em erro de julgamento ao considerar aplicável ao recurso sobre direito de resposta, apresentado junto da entidade reguladora, o procedimento de queixa previsto nos art.s 55° a 58°, quando lhe são aplicáveis os art.s 59° e 60° dos Estatutos da ERC;
LL) Equivoca-se o tribunal a quo quando afirma que a norma especial do art. 27°, n.º 1 da Lei de Imprensa não foi revogada pela norma geral do art. 55° dos Estatutos da ERC. E o equívoco é duplo: primeiro, o que é aplicável ao caso é o art. 59°, n.º 1 dos Estatutos da ERC; segundo, o art. 59°, n.º 1 derrogou, no que ao prazo de recurso para a entidade reguladora diz respeito, o art. 27°, n.º 1 da Lei de Imprensa, contendo ambos os artigos normas especiais;
MM) Apenas o legislador da Lei da Televisão teve a preocupação de explicitar que o recurso para a ERC deveria ser apresentado nos termos e prazos da legislação especificamente aplicável, ou seja, no prazo de 30 dias, mantendo o prazo de 10 dias de recurso para o tribunal judicial (art.68°, n.º3 da Lei n.º 27/2007, de 30 de Julho);
NN) É certo que a actual Lei da Rádio apresenta uma redacção semelhante à da Lei de Imprensa, não tendo o legislador sentido a necessidade de explicitar, como fez na Lei da Televisão, que o recurso para a ERC teria lugar nos termos e nos prazos da legislação especificamente aplicável (art. 62°, n.º3 da Lei n.º 54/2010, de 24 de Dezembro);
OO) Efectivamente, tal não era necessário porque ainda que a Lei da Televisão o não dissesse, assim teria de ser entendido após a entrada em vigor da Lei n.º 53/2005 já que o art. 59°, n.º 1 dos Estatutos da ERC se aplica ao incumprimento ou cumprimento deficiente do direito de resposta por "qualquer entidade que prossiga actividades de comunicação social", sem fazer qualquer distinção consoante os meios;
PP) A interpretação normativa do art. 27°, n.º 1, feita pelo tribunal a quo, que considera aplicável o prazo de 10 dias aí previsto aos recursos para a entidade reguladora por incumprimento ou cumprimento deficiente do direito de resposta, -é ainda inconstitucional por violação do princípio da igualdade previsto no art. 13°, n.º 1 da CRP;
QQ) Incorreu o tribunal a quo em erro de julgamento sobre matéria de direito ao considerar que o art. 27°, n.º 1 da Lei de Imprensa não foi derrogado, no que ao prazo de recurso para a ERC diz respeito, pela Lei n.º 53/2005 que aprovou os Estatutos da ERC e consignou, no art. 59°, n.º 1 destes, o prazo de 30 dias;
RR) O tribunal a quo considera que o prazo de recurso para a entidade reguladora, em caso de incumprimento ou cumprimento deficiente do direito de resposta, é um prazo de caducidade quer se entenda aplicável o art. 27°, n.º 1 da Lei de Imprensa, quer os art.s 55° ou 59°, n.º 1 dos Estatutos da ERC, contados nos termos dos art.s 279° e 296° do CC;
SS) A Recorrente sustenta que o prazo previsto no referido art. 59°, n.º 1 deve ser entendido como prazo adjectivo, contando-se nos termos previstos no art. 72° do C.P.A., atendendo a que a ERC é uma pessoa colectiva de direito público, entidade administrativa independente;
TT) Ao ser exercido tempestivamente o direito de resposta, o órgão de comunicação social a ele obrigado toma necessariamente uma decisão, que pode ser implícita ou explícita, e que se reconduz a: (i) acatar o direito; (ii) acatá-lo deficientemente; (iii) recusá-lo sem fundamento; (iv) recusá-lo fundamentadamente. Trata-se em qualquer caso de uma decisão tomada por um particular (órgão de comunicação social), sobre o qual impedem deveres de conteúdo público e garantístico, da qual é possível recorrer se lesiva dos interesses públicos e privados em jogo;
UU) Já existe, pois, um procedimento em curso, conduzido por entidades privadas, mas regulado por normas públicas de natureza garantística, que visam a salvaguarda de um direito fundamental direito de resposta - o qual integra a liberdade de expressão e de informação;
VV) É hoje aceite que existem procedimentos levados a cabo por sujeitos jurídicos privados, adoptados em obediência a disposições de direito público (v. caso do direito de resposta ou normas de protecção ambiental) que podem ser objecto de impugnação de um particular contra outros particulares (v. art. 10°, n.º 7, art. 37°, n.º 2, aI. c), e n.º 3 e art. 112°, n.º 2, aI. f), todos do CPTA);
WW) Nesse caso, os prazos a observar devem ter a mesma natureza daqueles que vigoram no âmbito do procedimento administrativo, como garantia de defesa mais alargada do particular, pelo que o prazo do art. 59°, n.º 1 deverá ser considerado um prazo adjectivo a que se aplicam as regras do CPA;
XX) Se assim se entender, forçoso é concluir que não se verificou a caducidade do direito a recorrer para a entidade reguladora por parte do contra-interessado;
YY) Acresce que, entre as suas atribuições constitucionalmente consagradas, encontra-se a de assegurar "o direito à informação e a liberdade de imprensa" e "o respeito pelas normas reguladoras das actividades de comunicação social" (art. 39°, n.º 1, al.s a) e e) da CRP), o que vem igualmente reproduzido no art. 8°, al.s a) e j) dos Estatutos da ERC;
ZZ) Compete-lhe, pois, assegurar o cumprimento do disposto nos art.s 24° a 26° da Lei de Imprensa, relativos ao direito de resposta;
AAA) Assim sendo, pode igualmente sustentar-se que, tendo o respondente exercido o seu direito potestativo dentro do prazo, a ERC pode assumir a defesa daquele direito pessoal (defesa do bom nome e reputação), determinando o cumprimento das normas que regulam o exercício do direito de resposta, independentemente da observância do prazo estabelecido no art. 59°, n° 1 dos seus Estatutos;
BBB) Não se substituiu "a um concreto interessado particular num litígio privado já existente", como pretende o tribunal a quo, antes agiu, por solicitação desse particular, na defesa do interesse público subjacente ao direito de resposta;
CCC) Nesta perspectiva, e porque se trata efectivamente de fazer respeitar o direito de resposta que integra o complexo de direitos em que se desdobra a liberdade de imprensa e de informação, a sua intervenção não está condicionada pela observância de um prazo de recurso».

1.3. A Recorrida – A………, S.A., que sucedeu a B………, S.A. – contra-alegou, concluindo, assim (quanto ao mérito do recurso):
«(…)
B) Os prazos presentes quer no artigo 55.°, quer no n.º 1, do artigo 59.°, ambos dos estatutos da recorrente, são prazos substantivos de caducidade e contam-se, respectivamente, a partir da data do conhecimento dos factos ou do dia seguinte em que se deu cumprimento deficiente ao exercício do direito de resposta;
C) A contagem dos referidos prazos deve, pois, observar o disposto nas alíneas b), c), e e), do artigo 279.°, e, ainda, no artigo 296.°, ambos do Código Civil;
D) Tendo a recorrida publicado o invocado texto de resposta no dia 30 de setembro de 2006, o prazo de 30 dias para o contra-interessado recorrer para o conselho regulador da entidade aqui recorrente, prazo a que se referem quer o artigo 55.°, quer o n.º 1, do artigo 59.°, ambos dos estatutos da ERC, iniciou-se em 1 de outubro de 2006 e terminou no dia 30 de outubro de 2006;
E) Tendo o recurso por cumprimento deficiente do exercício do direito de resposta do contra-interessado dado entrada na ERC apenas em 13 de novembro de 2006, já havia caducado o correspondente direito, por se ter esgotado o prazo para o seu exercício, pelo que à recorrente era vedado decidir no sentido da republicação do texto de resposta do visado, atenta a caducidade do direito que pretendia exercer, pressuposto determinante da inviabilidade ou extinção da instância procedimental nos termos dos art.ºs 83° b) e 112° do cpa;
F) A deliberação n.º 16/dr-i/2007 de 22.fev.07, do conselho regulador da recorrente, mostra-se inquinada por erro sobre os pressupostos de direito no tocante à posição jurídica substantiva activa do queixoso, na medida da caducidade do direito por este invocado;
G) Pelo que, a sentença recorrida deve ser integralmente mantida, por ter aplicado correctamente a lei aos factos, e, por isso mesmo, não merecer qualquer tipo de censura ou reparo».

1.4. Por acórdão deste STA foi a revista admitida, em apreciação preliminar sumária, nos termos do artigo 150.º, n.ºs 1 e 5 do CPTA, por a respectiva Formação ter entendido que a questão jurídica delineada na revista «apresenta dificuldades porque a lei é complexa em virtude de regular em simultâneo, na parte procedimental, diferentes direitos de resposta – na imprensa, de transmissão audiovisual de resposta ou rectificação e de réplica política». E, ainda, pela «elevada especialidade destes procedimentos que visam a maximização da celeridade e da eficácia». E, finalmente, porque «está em causa a interpretação conjugada de diversos princípios e diplomas, desde logo a efectividade da tutela e as normas constitucionais dos artigos 37.º e 40.º; depois os Estatutos da ERC e a Lei de Imprensa (art.º 27.º) e ainda com conteúdos eventualmente capazes de trazer algum contributo, a Lei da Rádio e a Lei da Televisão».

1.5. O Ministério Público foi notificado, nos termos e para os efeitos do disposto no art. 146º do CPTA.

Cumpre apreciar e decidir.

2. Fundamentação

2.1. Matéria de facto
O acórdão recorrido assentou na seguinte factualidade:
«A) A Autora é proprietária do Semanário" ………". (acordo)
B) No dia 23 de Setembro de 2006, foi publicada na primeira página naquele jornal uma notícia com o título “EPUL tem 15 directores vitalícios”, seguida do seguinte texto: “Incompetência ou nepotismo? C………, ex-presidente da empresa deixou ali mais de uma dezena de pessoas bem pagas e inamovíveis. O custo é de mais de 1 milhão.” (fls. 32 Anexo I junto ao p.a.)
C) A notícia referida na alínea que antecede foi desenvolvida na página 11 com o seguinte texto: “EPUL: um ‘tacho’ para toda a vida" e tendo o seguinte subtítulo "C……… nomeou 15 directores quando presidia á empresa, D………, então na CML nem soube.” (fls. 32 Anexo I junto ao p.a.)
D) Em face da notícia referida na al. B), o Contra-Interessado, C………, ao abrigo do Direito de Resposta, solicitou em 25 de Setembro de 2006, ao Director do Jornal ……… a publicação do seguinte texto:
“1. O Jornal ……… na sua edição de 23 de Setembro de 2006, n.o ………, publicou um título em primeira página em que acusa a EPUL de ter 15 ‘directores vitalícios’. O referido título qualifica ainda a actuação do antigo presidente da EPUL, C………, de incompetência ou nepotismo e atribui-lhe a responsabilidade por ter contratado esses 15 directores e pelo correspondente desperdício de cerca de um milhão de euros por ano.
Na página 11 do caderno principal, a Sra. jornalista E……… publica um artigo com o título EPUL: um tacho para toda a vida e reafirma a responsabilidade do antigo presidente da EPUL pela contratação de 15 ‘directores vitalícios’.
Tais títulos e notícia foram publicados sem que ao visado tenha sido concedida a oportunidade de se pronunciar previamente sobre os assuntos neles versados.
2. Em Portugal, existem mais de 3 milhões de directores e trabalhadores com contratos ‘vitalícios’. Os actuais directores e todos os demais trabalhadores do quadro da EPUL têm contratos ‘vitalícios’. O director do ………, Sr. F………, e todos os trabalhadores do quadro deste jornal têm contratos ‘vitalícios’. Todos estes milhões de contratos são classificados pelo jornal ……… como ‘tachos’! Qualquer trabalhador no quadro de uma empresa em Portugal tem um contrato ‘vitalício’ por força da lei, o qual só pode ser revogado por vontade do trabalhador, por mútuo acordo ou por despedimento com justa causa. Parece que o Sr. Director F……… não terá medido bem as consequências das afirmações divulgadas no seu jornal, dado que os accionistas do ……… poderão entender que, indirectamente, o Presidente da B……… estará igualmente a ser acusado de incompetência ou nepotismo por ter na sua empresa directores e trabalhadores com contrato ‘vitalício’, estando, desta forma, a oferecer ‘tachos’ a todos os seus colaboradores.
3. É falso que o antigo CA da EPUL, presidido por C………, seja responsável pela contratação de 15 ‘directores vitalícios’. À data da sua chegada à EPUL (Fevereiro de 2002) existiam nos quadros da empresa 10 ‘directores vitalícios’. Dos "directores vitalícios" contratados unanimemente pelo seu CA, subsistem 5, dos quais 2 substituíram antigos directores e 3 correspondem a funções essenciais a gestão moderna de uma empresa.
4. Tanto quanto é do seu conhecimento, após a sua saída da EPUL, a empresa já contratou mais 5 ‘directores ou assessores vitalícios’.
5.Manifesta-se ainda profunda estranheza pelas declarações do anterior presidente da CML, Dr. D……… relativamente às razões que levaram ao afastamento do então CA da EPUL, tanto mais que é do seu conhecimento a única razão que motivou a saída do antigo presidente da empresa.
6.Decorridos cerca de dois anos e meio sobre a saída do antigo presidente da EPUL, não se pode deixar de considerar muito estranha esta opção informativa do Sr. Director F……… quando nas últimas semanas têm sido noticiados factos gravíssimos alegadamente praticados pelos actuais administradores da EPUL, os quais incompreensivelmente não foram sequer referenciados por este jornal.
Será, assim, legítimo considerar a notícia publicada pelo Jornal ………, dirigido pelo seu director F………, como um caso exemplar de manipulação jornalística, de mentira jornalística grosseira e de grave despropósito, publicada com o eventual objectivo de desviar as atenções da opinião pública.
7. Com a magnífica equipa de dirigentes - integrada por antigos e novos directores e colaboradores com que o antigo presidente da EPUL pôde trabalhar, foi possível formular uma estratégia de desenvolvimento para a empresa, aprovada pela CML, adoptar medidas de saneamento económico e financeiro, promover no mercado uma imagem de modernidade e eficiência da EPUL e alcançar resultados significativos que permitiram a atribuição de dividendos à autarquia.
8. Ao longo de mais de 35 anos de exercício em cargos de administração pública e privada, o antigo presidente do Conselho de Administração da EPUL sempre mereceu o reconhecimento público da sua competência, da sua honestidade, lealdade e capacidade para dirigir equipas. Criou obra e deixou resultados em todos os lugares que desempenhou. As acusações gratuitas e não justificadas de Incompetência, de nepotismo e de fomento de "tachos " por parte do director F……… e do seu jornal só mancham e enxovalham os autores de tais acusações.” (fls. 8 a 9 do p.a.)

E) Na edição n. ………, de 30 de Setembro de 2006, o Jornal “………” sob o título “DIREITO DE RESPOSTA” publicou o seguinte texto:
“O Jornal ………, na sua edição de 23 de Setembro de 2006, n. ………, responsabilidade por ter contratado esses 15 directores e pelo correspondente publicou um título em primeira página em que acusa a EPUL de ter 15 ‘directores vitalícios. O referido título qualifica ainda a actuação do antigo presidente da EPUL, C………, de incompetência ou nepotismo e atribui-lhe a desperdício de cerca de um milhão de euros por ano( ... ).
Contrariamente ao que foi afirmado pelo ………, o visado não foi contactado para ter oportunidade de se pronunciar previamente sobre os assuntos versados na notícia publicada.
Em Portugal, existem mais de 3 milhões de directores e trabalhadores com contratos ‘vitalícios’. Os actuais directores e todos os demais trabalhadores do quadro da EPUL têm contratos ‘vitalícios’. O director do ………, Sr. F………, e todos os trabalhadores do quadro deste jornal têm contratos ‘vitalícios’. ( ... )
É falso que o antigo CA da EPUL, presidido por C………, seja responsável pela contratação de 15 ‘directores vitalícios’. À data da sua chegada à EPUL (Fevereiro de 2002) existiam nos quadros da empresa 10 ‘directores vitalícios’. Dos ‘directores vitalícios’ contratados unanimemente pelo seu CA, subsistem 5, dos quais 2 substituíram antigos directores e 3 correspondem a funções essenciais a gestão moderna de uma empresa.
Tanto quanto é do seu conhecimento, após a sua saída da EPUL, a empresa já contratou mais 5 ‘directores ou assessores vitalícios’.
Manifesta-se ainda profunda estranheza pelas declarações do anterior presidente da CML, Dr. D………, relativamente às razões que levaram ao afastamento do então CA da EPUL, tanto mais que é do seu conhecimento a única razão que motivou a saída do antigo presidente da empresa. (...) C………” (fls. 5 do p.a.)

F) C……… na sequência da publicação do texto referido anterior, interpôs recurso para o Conselho Regulador da Entidade Reguladora para a Comunicação Social em 13 de Novembro de 2006. (fls. 24 do p.a.)
G) Mediante oficio datado de 27 de Dezembro de 2006, o Director Executivo da ERC solicitou ao Director do Jornal “………" que, ao abrigo do disposto no n. 2 do art. 52° do Estatuto da ERC que se pronunciasse sobre o recurso a que alude a al. F). (fls. 11 do p.a.)
H) Sobre aquele recurso, veio a recair a Deliberação n. 16/DR-I/2007 tomada pelo Conselho Regulador da Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) na sessão realizada em 22 de Fevereiro de 2007, da qual resultou:
“1. O Conselho Regulador da ERC- Entidade Reguladora para a Comunicação Social, analisado o recurso apresentado por C………, por alegada publicação deficiente, pelo jornal "………", de um texto de exercício do direito de resposta relativo a um artigo publicado na página 11 da sua edição n. 1769, de 23 de Setembro de 2006, sob o título ‘EPUL: um tacho para toda a vida’, e precedido de manchete de 1ª página nessa mesma edição com o título ‘EPUL tem 15 directores vitalícios’, delibera dar-lhe provimento e determinar ao ……… a republicação do texto de resposta do recorrente, no cumprimento rigoroso dos princípios da integridade, equivalência, igualdade e eficácia, ou seja, em moldes que satisfaçam todas as exigências vertidas nos números 3 e 4 do artigo 26° da Lei de Imprensa (Lei n. ° 2/99, de 13 de Janeiro) (...) ";
2. A publicação deverá cumprir o prescrito pelo n. 4 do artigo 26° da Lei de Imprensa, quanto à inserção de uma nota de chamada na primeira página ( ... )";
5. A destinatária da presente decisão fica sujeita, por cada dia de atraso no cumprimento da mesma, à sanção pecuniária compulsória fixada no artigo 72° dos Estatutos da ERC". (fls. 35 a 43 do p.a.)

I) O jornal “………”, na pessoa do seu Director, foi notificado daquela Deliberação por ofício datado de 7 de Março de 2007. (fls. 45 a 46 do p.a.)».

2.2. Matéria de direito

2.2.1. A questão objecto da presente revista é a de saber se foi tempestivamente interposto o recurso para a ERC pelo interessado C……….
Na verdade na acção a autora, ora recorrida, apresentou como primeira causa do seu pedido de declaração de invalidade da deliberação da ERC o ela ter dado provimento ao recurso para ela interposto por aquele interessado, quando esse recurso lhe havia sido apresentado fora do prazo legal, por ser aplicável ao prazo de 30 dias previsto no artigo 59.º, 1, dos Estatutos da ERC aprovados pela Lei n.º 53/2005, de 8 de Novembro, a forma de contagem prevista no artigo 279.º do Código Civil e não a do artigo 72.º do CPA.

E o Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra acolheu essa causa de pedir, embora considerasse aplicável não o artigo 59.º, 1, dos Estatutos da ERC, mas, sim, o seu artigo 55.º.
Atendendo a que o direito de queixa previsto naquele preceito deve ser exercido no prazo máximo de «30 dias a contar do conhecimento dos factos», julgou que esse prazo era um prazo de caducidade, a contar nos termos do art. 279.º do C. Civil, e concluiu que, no caso, ele começara a correr em 1 de Outubro de 2006 e havia terminado no dia 2 de Novembro do mesmo ano. Ora, o pedido para o Conselho Regulador da Entidade Reguladora para a Comunicação Social havia sido apresentado em 13 de Novembro de 2006, pelo que fora extemporâneo.
Por esse motivo anulou a deliberação da ERC.

O Tribunal Central Administrativo Sul, no acórdão agora sob recurso, confirmou o julgamento do TAF de Sintra, com fundamentos parcialmente diversos.
Entendeu o TCA – tal como o TAF – que o referido prazo de 30 dias não havia sido respeitado. Mas entendeu, ainda, que o prazo aplicável era de 10 dias, nos termos do art. 27º, 1, da Lei n.º 2/99, de 13 de Janeiro (Lei de Imprensa). Daí que, por não ter respeitado este prazo caducara o «direito de queixa».
Refutou, ainda a tese de actuação oficiosa da ERC, sem dependência de prazo.

2.2.2 A ERC insurge-se contra o acórdão recorrido pondo em causa as três teses fundamentais do acórdão do TCA Sul. Alega:
(i) Não é aplicável o artigo 27º, 1, da Lei 2/99, por ter sido revogado pelo art. 59º, 1, dos Estatutos aprovados pela Lei 53/2005;
(ii) O prazo aplicável é o daquele artigo 59.º, 1, contando-se nos termos do CPA, isto é, suspende-se nos sábados, domingos e feriados;
(iii) Poderia agir oficiosamente para defesa dos interesses que lhe estão confiados e portanto seria irrelevante o decurso do prazo.

Apreciaremos cada uma das questões.

2.2.3 Recordem-se os artigos 27º, 1, da Lei n.º 2/99, e os artigos 55.º e 59.º, 1 dos Estatutos da ERC aprovados pela Lei n.º 53/2005, de 8 de Novembro.

Lei n.º 2/99:
«Artigo 27.º
Efectivação coerciva do direito de resposta e de rectificação
1 — No caso de o direito de resposta ou de rectificação não ter sido satisfeito ou haver sido infundadamente recusado, pode o interessado, no prazo de 10 dias, recorrer ao tribunal judicial do seu domicílio para que ordene a publicação, e para a Alta Autoridade para a Comunicação Social nos termos da legislação especificamente aplicável».

Estatutos da ERC:
«SECÇÃO II
Procedimentos de queixa
Artigo 55.º
Prazo de apresentação
Qualquer interessado pode apresentar queixa relativa a comportamento susceptível de configurar violação de direitos, liberdades e garantias ou de quaisquer normas legais ou regulamentares aplicáveis às actividades de comunicação social desde que o faça no prazo máximo de 30 dias a contar do conhecimento dos factos e desde que tal conhecimento não ocorra passados mais de 120 dias da ocorrência da alegada violação».

«SECÇÃO III
Direito de resposta, de antena e de réplica política
Artigo 59.º
Direito de resposta e de rectificação
1— Em caso de denegação ou de cumprimento deficiente do exercício do direito de resposta ou de rectificação por qualquer entidade que prossiga actividades de comunicação social, o interessado pode recorrer para o conselho regulador no prazo de 30 dias a contar da data da recusa da expiração do prazo legal para satisfação do direito».

A nosso ver, o artigo 59.º, 1, contém o prazo dentro do qual se pode recorrer para a ERC da denegação ou cumprimento defeituoso do direito de resposta.
Já o artigo 27.º, 1, da Lei 2/99 consagra duas formas de reacção contra a denegação ou insuficiência do exercício do direito de resposta: uma para os tribunais judiciais, no prazo de dez dias; outra para a (agora) ERC «nos termos da legislação especificamente aplicável». Ora, «nos «termos da legislação especificamente aplicável» é, também, no prazo especificamente previsto.

Afigura-se, ademais, que não tem sustentação a tese do segundo a qual o artigo 59.º, 1, dos Estatutos da ERC se aplica apenas aos casos de réplica política.
Na verdade, como decorre da epígrafe do preceito, o mesmo aplica-se ao «direito de resposta e de rectificação».
É certo que a Secção III (de que o art. 59º é o primeiro artigo) se intitula: «Direito de resposta, de antena e de réplica política». Tal significa que nessa Secção estão previstos três géneros de procedimentos: direito de resposta, direito de antena e direito de réplica política.
O artigo 59.º, 1, regula o direito de resposta, que era precisamente o que estava em causa nos autos.
E na relação que se estabelece entre o exercício do direito de queixa, em geral (Secção II artigo 55.º), e exercício do direito de resposta (Secção III, artigo 59), o que releva, no presente caso, é o que respeita a este último, por ser, como se disse, o que estava em discussão.

2.2.4 Contagem do prazo previsto no artigo 59.º, 1.

2.2.4.1 Convém deixar uma breve nota prévia.
Nem o TAF de Sintra nem o TCA Sul concluíram pela aplicação deste artigo. Consideraram o artigo 55.º.
Embora o prazo num e noutro preceito seja de 30 dias, a verdade é que no quadro da apreciação do presente recurso de revista a aplicação de um ou outro preceito não é inócua. É que se se tratasse dos 30 dias do artigo 55.º é a própria recorrente que alega que não teria razão de discordância da decisão. É o que resulta do que escreve no ponto I – c) do corpo das suas alegações:
«Põe-se aqui a questão de saber se o prazo estipulado no art. 59º é ou não um prazo adjectivo ao qual se aplica o disposto no artigo 72º do CPA, sendo certo que tal dúvida não se coloca no que respeita ao prazo do art. 55º que, por se referir ao início de um procedimento administrativo, é efectivamente um prazo substantivo, contado nos termos dos art.s 279º e 296 do CC».
Portanto, para a recorrente se estivesse correcta consideração de aplicação do artigo 55.º, aí, era prazo substantivo, o julgamento estaria certo.
Já o prazo do artigo 59.º, 1, sustenta, é adjectivo e o julgamento estará errado.
É o que vamos passar a analisar.

2.2.4.2 Conforme os termos do artigo 279.º do Código Civil, as suas regras são aplicáveis à fixação do termo, «em caso de dúvida».
E dispõe o artigo 296.º do mesmo compêndio que as regras constantes do artigo 279.º são aplicáveis, na falta de disposição especial em contrário, aos prazos e termos fixados por lei, pelos tribunais ou por qualquer outra autoridade.

É inquestionável, portanto, que se houver disposição especial em contrário deixa mesmo de existir a dúvida a que se reporta o artigo 279.º.
E o que a recorrente defende no recurso é que existe disposição especial em contrário, que é a do artigo 72.º do CPA.

Importa, por isso, saber se essa disposição especial é aplicável ao caso dos autos.

2.2.4.3 O artigo 2º do CPA regula o seu âmbito de aplicação.
Aí se diz, no n.º 1, que as disposições do Código do Procedimento Administrativo se aplicam a todos os órgãos da Administração no desempenho da actividade administrativa de gestão pública, mesmo nas relações que estabeleçam com os particulares, bem como «os órgãos do Estado que, embora não integrados na Administração Pública, desenvolvam funções materialmente administrativas».

A Entidade Reguladora para a Comunicação Social, abreviadamente designada por ERC, é uma pessoa colectiva de direito público, dotada de autonomia administrativa e financeira e de património próprio, com natureza de entidade administrativa independente, exercendo os necessários poderes de regulação e de supervisão – artigo 1º dos Estatutos.

O procedimento a que se reporta o art. 59º, 1, dos Estatutos tem como finalidade uma decisão no âmbito de poderes de «regulação e supervisão», cuja natureza pública é inquestionável, na medida que se trata de uma decisão de autoridade que se impõe aos interessados, nos termos do artigo 60º, dos mesmos.

Por isso, não oferecerá muita controvérsia que o regime do artigo 72.º do CPA é aplicável ao procedimento na ERC respeitante ao exercício do direito de resposta. De resto sempre será aplicável por estar em causa um procedimento especial e as regras aí previstas não envolverem a diminuição das garantias dos particulares.

Ainda assim, a questão não se esgota.
É que para se aplicar o disposto no artigo 72.º é necessário que na circunstância estejamos perante prazo procedimental.
Ora, os 30 dias previstos no artigo 59.º, 1, dos Estatutos da ERC respeitam a prazo para ser efectuado pedido de intervenção dessa entidade. Não existe, ainda, pois, qualquer processo ou procedimento em curso nessa entidade.
Afigura-se que até existir algum procedimento a contagem será de efectuar nos termos gerais, porque não se pode afirmar estar-se perante prazo procedimental, e é a esse que se dirige o artigo 72.º do CPA.
Só seria de outra maneira se se considerasse que desde que o problema do direito de resposta haja sido colocado pelo particular interessado ao particular órgão noticioso, e ainda que sem qualquer intervenção de entidade pública, se está já num procedimento administrativo. É o que essencialmente defende a ERC.
Afigura-se, no entanto, que o CPA não consegue cobrir essas situações, exactamente em função do seu âmbito subjectivo de aplicação, que não engloba os órgãos noticiosos enquanto tal – artigo 2.º.
E pelas mesmas razões, não será adequado equiparar o recurso do particular à ERC a uma impugnação de decisão administrativa, essa, sim, a dever seguir as regras do artigo 72.º do CPA.
Não estando a situação coberta, portanto, por aquele dispositivo, nem se descortinando outro dispositivo especial, a modalidade de contagem deve obedecer ao previsto no artigo 279.º do Código Civil.

2.2.5 Intenta finalmente a recorrente que poderia agir oficiosamente para defesa dos interesses que lhe estão confiados e, portanto, seria irrelevante o decurso do prazo.
Não está em causa nos autos que a ERC actuou no exercício das atribuições que lhe estão conferidas constitucional (artigo 39.º) e legalmente (artigo 8.º). Nem o acórdão recorrido identificou qualquer vício que pudesse ser decorrente de actuação exterior às suas atribuições.
Daí decorre, segundo a recorrente, como já sustentara, aliás, perante o tribunal a quo, que, independentemente dos problemas de contagem já analisados, a sua actuação não estaria dependente de prazo, pois, no fim de contas, sempre poderia ter uma intervenção oficiosa, não subordinada a prazo.
A recorrente acaba, assim, por colocar um problema que na ordem abstracta das coisas poderá ser interessante, mas que no quadro do caso concreto não terá de ser abordado mais do que se dirá a seguir.
Conforme resulta da matéria de facto, a deliberação que foi impugnada pela ora recorrida foi uma deliberação tomada em sede de apreciação de um recurso de particular.
Basta recordar para o efeito os seus termos, conforme H da matéria de facto:
“1. O Conselho Regulador da ERC - Entidade Reguladora para a Comunicação Social, analisado o recurso apresentado por C………, por alegada publicação deficiente, pelo jornal "………", de um texto de exercício do direito de resposta relativo a um artigo publicado na página 11 da sua edição n. ………, de 23 de Setembro de 2006, sob o título ‘EPUL: um tacho para toda a vida’, e precedido de manchete de 1ª página nessa mesma edição com o título ‘EPUL tem 15 directores vitalícios’, delibera dar-lhe provimento e determinar ao ……… a republicação do texto de resposta do recorrente, no cumprimento rigoroso dos princípios da integridade, equivalência, igualdade e eficácia, ou seja, em moldes que satisfaçam todas as exigências vertidas nos números 3 e 4 do artigo 26° da Lei de Imprensa (Lei n. ° 2/99, de 13 de Janeiro) (...) ";
2. A publicação deverá cumprir o prescrito pelo n. 4 do artigo 26° da Lei de Imprensa, quanto à inserção de uma nota de chamada na primeira página ( ... )";
5. A destinatária da presente decisão fica sujeita, por cada dia de atraso no cumprimento da mesma, à sanção pecuniária compulsória fixada no artigo 72° dos Estatutos da ERC". (fls. 35 a 43 do p.a.)”

A ERC agiu, assim, no âmbito de apreciação de um recurso ao qual deu provimento.
E aliás sempre a recorrente tem defendido nos autos que agiu exactamente em sede do procedimento aberto através da utilização do mecanismo do artigo 59.º dos seus Estatutos.
A ERC não agiu, assim, numa e noutra veste.
Por isso, não tem razão ao pretender que o seu acto seja também apreciado como se tivesse sido exterior a esse recurso, que seja analisado como se tivesse sido praticado por sua intervenção oficiosa.
Com efeito, o que foi impugnado pela autora, ora recorrida, e apreciado primariamente pelas instâncias e nomeadamente pelo acórdão recorrido, foi a possibilidade de ter sido aberto o procedimento de recurso no quadro do qual a ERC praticou o acto impugnado.
E a conclusão a que se chegou é que esse procedimento foi aberto já para além do prazo, exactamente porque o interessado particular tinha apresentado o respectivo requerimento para além dos 30 dias previstos no artigo 59.º, 1, dos Estatutos da ERC.
A transmutação do abrigo legal para o acto praticado pela ERC não tem razão de ser e contraria-o nos seus termos.

3. Pelos fundamentos expostos, nega-se provimento ao recurso.
Custas pela recorrente.
Lisboa, 23 de Outubro de 2012. – Alberto Augusto Andrade de Oliveira (relator por vencimento) – António Políbio Ferreira Henriques – António Bento São Pedro, vencido nos termos da declaração de voto que junto.

Declaração de voto 303/12


1. Votei vencido, pelas razões que constam do projecto de acórdão que, como relator inicial apresentei na Sessão e que, na parte relevante, são as seguintes:

“(…)
2.2.2 Análise dos fundamentos do recurso e da decisão recorrida
Para justificar o seu entendimento o TAF de Sintra considerou aplicável o 59º, n.º 1 da Lei 53/05, segundo o qual o recurso deve ser interposto no prazo máximo de “30 dias a contar do conhecimento dos factos”. Considerando que este prazo era um prazo de caducidade e contado nos termos do art. 279º do C. Civil, concluiu que o prazo, que começou a correr em 1 de Outubro de 2006, terminou no dia 2 de Novembro do mesmo ano.

O TCA para além daquele fundamento considerou ainda que tinha caducado o direito de queixa por terem decorrido 10 dias, considerando assim aplicável o art. 27º, 1 da Lei da Imprensa, concluindo ainda que a actuação oficiosa da ERC não poderia, neste caso, ocorrer.

A ERC insurge-se contra o acórdão recorrido pondo em causa as três teses fundamentais do acórdão do TCA Sul: (i) não é aplicável o art. 27º, 1 da Lei 2/99, por ter sido revogado pelo art. 59º, 1, da Lei 53/05; (ii) o prazo previsto no art. 59º, 1 da Lei 53/05, conta-se nos termos do CPA, isto é, suspende-se nos sábados, domingos e feriados; (iii) poderia agir oficiosamente para defesa dos interesses que lhe estão confiados e portanto seria irrelevante o decurso do prazo.

Apreciaremos cada uma das questões, sem prejuízo das inerentes relações de prejudicial idade.

(i) Aplicação do art. 27º, 1 da Lei 2/99.
Este preceito tem a seguinte redacção:

“Artigo 27.o
Efectivação coerciva do direito de resposta e de rectificação
1 — No caso de o direito de resposta ou de rectificação não ter sido satisfeito ou haver sido infundadamente recusado, pode o interessado, no prazo de 10 dias, recorrer ao tribunal judicial do seu domicílio para que ordene a publicação, e para a Alta Autoridade para a Comunicação Social nos termos da legislação especificamente aplicável.”

O art. 59º, 1 da Lei 53/05 – Estatutos da ERC – estabelece, por seu turno o seguinte:
“Artigo 59.o
Direito de resposta e de rectificação
1—Em caso de denegação ou de cumprimento deficiente do exercício do direito de resposta ou de rectificação por qualquer entidade que prossiga actividades de comunicação social, o interessado pode recorrer para o conselho regulador no prazo de 30 dias a contar da data da recusa da expiração do prazo legal para satisfação do direito”.

A nosso ver a articulação dos dois textos legais é, de resto, muito simples.

O art. 59º, 1 da Lei 53/05 de 8 de Novembro contém o prazo dentro do qual se pode recorrer para a ERC da denegação ou cumprimento defeituoso do direito de resposta.

O art. 27º, 1 da Lei 2/99 consagra duas formas de reacção contra a denegação ou insuficiência do exercício do direito de resposta: uma para os Tribunais judicias, no prazo de dez dias; outra para a (agora) ERC “nos termos da legislação especificamente aplicável”. Ora, nos termos da legislação especificamente aplicável é sem dúvida também no prazo especificamente previsto.

Não tem, por outro lado, qualquer explicação racional a tese do TCA segundo a qual o art. 59º, 1 da lei 53/05 se aplica apenas aos casos de réplica política, pois como decorre da epígrafe do preceito o mesmo aplica-se ao “direito de resposta e de rectificação”. É verdade que a Secção III (de que o art. 59º é o primeiro artigo) se intitula: “Direito de resposta, de antena e de réplica política”. Tal significa que nessa secção estão previstos três géneros de procedimentos: direito de resposta, direito de antena e direito de réplica política. O art. 59º, 1 da Lei 53/05, regula o direito de resposta, que era precisamente o que estava em causa nos autos.

Nesta parte a entidade recorrente tem toda a razão. O art. 27º, 1 da lei 2/99 não regulamenta o prazo dentro do qual deve ser interposto o recurso para a ERC no âmbito do direito de resposta.

A questão não fica totalmente resolvida, pois o TCA também entendeu que o recurso para esta entidade estava fora de prazo mesmo aplicando o art. 59º, 1, da Lei 53/05, questão que apreciaremos de seguida.

(ii) Contagem do prazo previsto no art. 59º, 1 da Lei 53/05.
O TCA Sul considerou que o prazo de 30 dias previsto no art. 55º, 1 da Lei 53/05 se contava nos termos do art. 279º do C. Civil. Em seu entender “este prazo é, necessariamente, de caducidade do (exercício) direito do interessado em recorrer à ERC no caso concreto” (fls. 17 do acórdão).

O prazo aplicável ao caso não é o do art. 55º, 1 da Lei 53/05, mas o do art. 59º, 1 da mesma Lei. Contudo a questão é a mesma: saber como se conta o prazo de 30 dias aí previsto, ou seja, se é aplicável o art. 279º do C. Civil, ou o art. 72º do CPA, designadamente a al. b) do n.º 1, segundo a qual “o prazo começa a correr independentemente de quaisquer formalidades e suspende-se nos sábados, domingos e feriados.”

Vejamos.

Os prazos previstos no art. 279º do C. Civil são aplicáveis, na falta de disposição especial em contrário, aos prazos e termos fixados na lei, como resulta do art. 296º do mesmo Código. Quer isto dizer que, importa averiguar se existe “disposição especial em contrário”, pois havendo-a é essa disposição legal que é aplicável.

Não há dúvida que existe disposição legal contrária ao art. 279º do C. Civil, mais concretamente o art. 72º do CPA.

Importa, por isso, saber se esta disposição especial é, ou não aplicável, ao caso dos autos.

O art. 2º do CPA regula o seu âmbito de aplicação. Aí se diz, no n.º 1, que as disposições do Código se aplicam a todos os órgãos da Administração no desempenho da actividade administrativa de gestão pública, mesmo nas relações que estabeleçam com os particulares, bem como “os órgãos do Estado que, embora não integrados na Administração Pública, desenvolvam funções materialmente administrativas.”

A ERC -Entidade Reguladora para a Comunicação Social, abreviadamente designada por ERC, é uma pessoa colectiva de direito público, dotada de autonomia administrativa e financeira e de património próprio, com natureza de entidade administrativa independente, exercendo os necessários poderes de regulação e de supervisão – art. 1º da Lei 53/05.

O procedimento regulado no art. 59º, 1 da mesma Lei tem como finalidade uma decisão no âmbito de poderes de “regulação e supervisão”, cuja natureza pública é inquestionável, na medida que se trata de uma decisão de autoridade que se impõe aos interessados, nos termos do art. 60º da mesma Lei 53/05.

De resto, o regime do art. 72º do CPA seria sempre aplicável, por estar em causa um procedimento especial, e as regras aí previstas não envolverem a diminuição das garantias dos particulares.

Entendemos, deste modo, não haver motivos para dúvidas, quanto à aplicação do regime de contagem do prazo do art. 72º do CPA ao prazo para interposição do recurso para a ERC, nos casos previstos no art. 59º, 1 da Lei 53/05. Nem se descortina qualquer razão válida para que os prazos das impugnações administrativas previstas no CPA (reclamação, recurso hierárquico e recurso tutelar) se contarem de modo diverso.

Com efeito, não se vê qualquer razão para que o “recurso” para a ERC não tenha a natureza de impugnação administrativa e, portanto, sujeito ao regime do CPA em tudo o que não estiver especialmente regulado na Lei 53/05. Com efeito, a nosso ver, o direito de acção não pode deixar de ter a mesma natureza que a relação jurídica que desencadeia e, portanto, salvo disposição da lei em contrário, o prazo do seu exercício é contado nos mesmos termos em que se contam os prazos na relação jurídica procedimental ou processual desencadeada. Daí que, no presente caso, o regime do CPA seja aplicável não só ao procedimento administrado (objecto do direito de acção) como ao exercício desse mesmo direito potestativo, incluindo a contagem do prazo.

Diga-se, finalmente, que não é relevante para a discussão do caso a circunstância de se tratar de um prazo de “caducidade”, isto é, de um prazo que, se não for cumprido, tem como consequência a perda do direito de recorrer – pois isso também acontece com o “direito” de reclamar e recorrer hierarquicamente previsto no CPA e, apesar disso, o prazo conta-se nos termos do art. 72º do CPA. Também não colhe o argumento de que o prazo tem natureza substantiva, pois em boa verdade o direito que caduca é o direito de recorrer para a ERC, portanto, um direito que tem natureza claramente adjectiva, instrumental e, nessa medida, garante, do direito de resposta.

Isto é, e concluindo, a ERC decidiu bem quando entendeu que o prazo de interposição do recurso se suspendia nos sábados, domingos e feriados.

Não tendo incorrido no erro de direito que lhe foi imputado a deliberação impugnada deve manter-se na ordem jurídica.

Fica, deste modo, prejudicada a terceira questão – isto é a possibilidade oficiosa de agir da ERC em defesa dos interesses gerais que lhe estão confiados.
(…)”.


2. Quanto à questão que ficou prejudicada no meu projecto e que o acórdão que logrou vencimento apreciou, estou de acordo.

Lisboa, 23 de Outubro de 2012

António Bento São Pedro

Segue acórdão de 9 de Janeiro de 2013:

Acordam na 1ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo:

1.

1.1. ERC – ENTIDADE REGULADORA PARA A COMUNICAÇÃO SOCIAL vem requerer a reforma do acórdão de 23.10.2012, no que se reporta à sua condenação em custas.
Invoca que atenta a revogação do Código das Custas Judiciais, a que se refere o art. 189º, 2, do CPTA, há que observar o disposto no Regulamento das Custas Processuais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26/02. Assim, haverá que atender à isenção prevista no seu art. 4.º, n.º 1, g).

1.2. A recorrida respondeu no sentido de que a ERC não estava abrangida pela isenção, nomeadamente porque actuou como parte passiva e não parte activa, bem como por a sua actuação não se ter inserido na defesa de direitos fundamentais dos cidadãos.

Vejamos.

2.1. Interessa começar por verificar que a acção em que foi proferido o acórdão foi instaurada em 8.6.2007. A ERC contestou em 26.7.2007.
Ora, o Código das Custas Judiciais, na redacção dada pelo DL n.º 324/2003, de 27 de Dezembro, não isentava a ERC (ver artigo 2.º).
Porém, quando a reclamante instaurou o presente recurso, em 30 de Janeiro de 2012, estava em vigor o Regulamento das Custas Processuais aprovado pelo Decreto-Lei 34/2008. Nos termos do artigo 27.º desse DL, na redacção do DL 181/2008 de 28 de Agosto, aquele Regulamento aplica-se aos processos iniciados a partir da sua entrada em vigor e também aos procedimentos, incidentes, recursos e apensos iniciados após essa entrada em vigor.
Por isso, impõe-se verificar se o Regulamento contempla a isenção de que se reclama a requerente

2.2. Dispõe-se no Regulamento:
«Artigo 4.º
Isenções
1 — Estão isentos de custas:
[…]
g) As entidades públicas quando actuem exclusivamente no âmbito das suas especiais atribuições para defesa de direitos fundamentais dos cidadãos ou de interesses difusos que lhe estão especialmente conferidos pelo respectivo estatuto, e a quem a lei especialmente atribua legitimidade processual nestas matérias»

No que respeita à qualificação do âmbito de actuação da ERC neste processo são aplicáveis as considerações tecidas no acórdão do Tribunal Constitucional n.º 499/2012, de 26.9, no processo n.º 744/11, que se reproduzem:
«Ora, conforme este Tribunal tem reiteradamente afirmado, a propósito da natureza jurídica da ERC – Entidade Reguladora para a Comunicação Social (cfr. Acórdão n.º 613/2008, sucessivamente reiterado pelos Acórdãos n.º 261/2009, n.º 315/2009 e n.º 361/2009):
“Da sua configuração constitucional, retira-se que aquela ‘entidade administrativa independente’ não se limita a integrar o leque de pessoas coletivas públicas dotadas de funções administrativas de mera regulação e supervisão de um determinado mercado económico, antes se configurando – e em principal medida – como uma entidade administrativa dotada de funções de defesa e salvaguarda de direitos fundamentais, maxime, dos direitos diretamente relacionados com o princípio do pluralismo político, com a liberdade de expressão e de informação e com a liberdade de imprensa. Tal resulta, desde logo, das várias atribuições que o legislador constituinte entendeu conferir-lhe. Porventura, com exceção da alínea e) do n.º 1 do artigo 39º da Constituição, todas as demais alíneas daquele preceito constitucional afastam a “entidade administrativa independente” da categoria das pessoas coletivas públicas, exclusiva ou predominantemente, vocacionadas para a mera regulação e supervisão de determinado mercado económico (reforçando esta função de defesa de direitos fundamentais, ver Gomes Canotilho / Vital Moreira, “Constituição da República Portuguesa Anotada”, Vol. I, Coimbra, 2007, págs. 598 e 599)”.
Nos autos que deram causa ao presente recurso de constitucionalidade, a recorrente agiu processualmente no âmbito exclusivo da prossecução das suas atribuições de defesa de direitos fundamentais, sendo que o procedimento cautelar administrativo que correu termos nos autos recorridos visou a suspensão de uma decisão administrativa que reconheceu legitimidade a B……… para exercício do direito de resposta e determinou que a recorrida procedesse à publicação daquela resposta. Ao longo da tramitação processual vertida nos presentes autos, a recorrida agiu sempre em prossecução das suas atribuições, com vista à defesa do referido direito fundamental de resposta a notícias ou opiniões publicadas em meio de comunicação social. Assim sendo, não há como negar que a recorrente goza, nos termos da alínea g) do n.º 1 do artigo 4º do RCP, de isenção de custas judiciais.
Assim, a ERC actuou no quadro previsto no artigo 4.º, 1, g) beneficiando da isenção ali prevista».

Assim, também aqui, a actuação da Entidade Reguladora para a Comunicação Social no quadro do artigo 59.º, n.º 1, dos seus Estatutos, para defesa do exercício do direito de resposta de interessado, direito fundamental inscrito no artigo 37.º, n.º 1, da Constituição da República, integra a previsão do artigo 4.º, n.º 1, g), do Regulamento das Custas Processuais.
E não se exige aqui outra legitimidade senão a que decorre de, sendo demandada enquanto autora da decisão visando, directamente, o exercício do direito de resposta, lhe caber a respectiva defesa.

3. Pelo exposto:
Defere-se o pedido de reforma do acórdão de 23.10.2012, julgando-se que a ERC, embora totalmente vencida, encontra-se isenta de custas do presente recurso.
Lisboa, 9 de Janeiro de 2013. – Alberto Augusto Andrade de Oliveira (relator) – António Políbio Ferreira Henriques – António Bento São Pedro.