Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01806/12.3BEPRT
Data do Acordão:07/13/2021
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ISABEL MARQUES DA SILVA
Descritores:RECURSO DE REVISTA EXCEPCIONAL
PRESSUPOSTOS
ADMISSÃO
Sumário:Justifica-se a admissão da revista, para “melhor aplicação do direito”, sobre a questão de saber quem é o sujeito passivo da taxa municipal prevista no artigo 100.º do Regulamento Municipal de Taxas e Compensações Urbanísticas do Município de Vila Nova de Gaia - em concreto se é proprietária do posto de abastecimento de combustíveis (a Petrogal) ou a impugnante (que explora comercialmente o posto de abastecimento em causa) -, porquanto há decisões das instâncias que se louvam em jurisprudência deste STA sem que este Supremo Tribunal tenha já tomado inequívoca posição sobre a questão, sendo que esta tem inegável relevo social e a complexidade jurídica decorrente da pouca clareza das normas regulamentares em causa.
Nº Convencional:JSTA000P28043
Nº do Documento:SA22021071301806/12
Data de Entrada:06/07/2021
Recorrente:CÂMARA MUNICIPAL DE VILA NOVA DE GAIA
Recorrido 1:A.........,LDA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

- Relatório –

1 – O Município de Vila Nova de Gaia, vem, ao abrigo do disposto nos artigos 144.º e 150.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA) interpor para este Supremo Tribunal recurso de revista do acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte de 11 de março de 2021, que negou provimento ao recurso por si interposto da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto que julgara procedente a impugnação judicial deduzida por A……….., Lda, com os sinais dos autos, contra acto de liquidação de taxa de instalação de postos de abastecimento de combustíveis relativo ao ano de 2021 no valos de €5.000,00.

O recorrente termina as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões:

1- A nosso ver, e resultando o impacto ambiental negativo do funcionamento do posto de abastecimento, o responsável pela referida taxa de impacto ambiental negativo é quem efetivamente exerce essa atividade que normalmente é o comercializador dos produtos, entidade que a maior parte das vezes não coincide com o titular da licença de exploração nem com o proprietário do referido posto de abastecimento.

2- No Regulamento Municipal de Compensações Urbanísticas do Município de Vila Nova de Gaia a definição de sujeito passivo para todas e cada uma das taxas nele previstas é a de o ser quem está vinculado ao cumprimento da prestação tributária e o Regulamento elenca várias situações que são sujeitas a taxa e na Tabela Anexa fixa a taxa para cada uma dessas situações.

3 - Por isso, o sujeito passivo da taxa vai variando em conformidade com a incidência objetiva da taxa.

4 - O artigo 100° do Regulamento Municipal de Compensações Urbanísticas de Vila Nova de Gaia, publicado no DR., 2ª serie, nº 140, de 22 de julho de 2011, foi introduzido pelas Alterações constantes do Aviso nº 27475/2010, publicadas no D.R., 2ª serie, nº 250 de 28 de dezembro de 2010, e integra-se na Parte III, do referido Regulamento, sob a epígrafe "Actividades geradoras de impacto ambiental negativo"

5 - Assim, sendo a incidência objetiva da taxa a atividade das instalações de postos de abastecimento como atividade geradora de impacto ambiental, e não o seu licenciamento, o sujeito passivo não pode ser o titular da licença de exploração/promotor do licenciamento mas quem exerce a atividade, que é o comercializador dos produtos.

6 - O D.L. 267/2002, na sua versão do D.L. 195/2008 de 6 de outubro, em vigor à data da liquidação das taxas impugnadas, estabelece os procedimentos e competências do licenciamento das instalações de armazenamento de produtos de petróleo e de postos de abastecimento de combustíveis e assume que o promotor é o proprietário da instalação e que o titular da licença de exploração é o promotor do licenciamento, o qual não coincide com o titular da licença de comercialização.

7- Além disso, a licença de exploração é um título que atesta que as instalações estão habilitadas para funcionarem como postos de abastecimento e não é uma licença atribuída a uma entidade de modo a habilitá-la a exercer a atividade naquele local (artigo 3º, alíneas e), j) e s) e artigo 14º).

8 - Assim, existindo, duas entidades distintas o titular da licença de exploração, que é o promotor do licenciamento, e o comercializador retalhista que é a pessoa singular ou coletiva que comercializa produtos de petróleo em instalações de venda a retalho (cfr. Artigo 3°, alínea j) do D.L. 31/2006, de 15/02/2006), atendendo à incidência objetiva das taxas, não suscita dúvidas que o sujeito passivo pela taxa de pedido de licenciamento das instalações de postos de abastecimento será o promotor do licenciamento/proprietário das instalações e que o sujeito passivo pala taxa de impacto ambiental negativo da atividade das instalações de postos de abastecimento é o comercializador retalhista, independentemente de poderem ser, ou não ser, a mesma entidade.

9 - Com efeito, como consta da Nota Justificativa da proposta de alteração submetida a Apreciação Pública do referido Regulamento a previsão da referida taxa surge na sequência do disposto no nº2 do artigo 6º do Regime Geral de Taxas das Autarquias Locais (Lei n° 53-E/2006, de 29 de dezembro) que dispõe que as taxas municipais podem incidir sobre a realização de atividades dos particulares geradoras de impacto ambiental negativo.

10 - Aliado à circunstância de existirem certos domínios das atividades económicas que foram considerados como o maior exemplo de atividades geradoras de impacto ambiental negativo onde consta a existência de postos de abastecimento de combustíveis junto aos eixos rodoviários e vias estruturantes mas também a instalação de infraestruturas de radiocomunicações, a ocupação do solo com parques de estacionamento a descoberto e os stands de exposição para saída de veículos automóveis ou outros objetos ao ar livre.

11 - Também na fundamentação da liquidação da taxa impugnada fazendo-se referência ao artigo 6º nº2 da Lei nº 53-E/2006, de 29 de dezembro, se diz que a instalação de postos de abastecimento de combustíveis na área do concelho integra atividade privada suscetível de causar impacto ambiental negativo, encontrando-se, por isso, sujeita ao pagamento de uma taxa anual, variável em função da localização e cujo valor se encontra previsto no n° 1.1 do artigo 29° da Tabela de taxas constante do Anexo Ido mesmo Regulamento.

12 - Assim, considerando a periodicidade da taxa, a sua inserção na Parte III do RMTCU relativa às "Actividades geradoras de impacto ambiental negativo e ainda a sua fundamentação constante da Nota justificativa ter-se-á, de concluir que a taxa em apreciação tem por referência a atividade desenvolvida na "instalação", no posto de abastecimento, e que é suscetível de provocar uma atuação por parte dos serviços municipais ou danos no meio ambiente de modo que o que está em causa no artigo 100° do RMTCU não é o licenciamento da instalação de um posto de abastecimento mas a sua atividade, o seu funcionamento.

13 - Ora, dos autos resulta que pese embora as Licenças de Exploração tenham sido emitidas em nome da Petróleos de Portugal - Petrogal, S.A., é a impugnante "A……….., Ld.ª" quem explora e exerce a atividade no posto de abastecimento.

14 - Com efeito, uma coisa é a licença de exploração que foi concedida à Petróleos de Portugal - Petrogal, S.A pela DREN, pelo prazo nela fixado, permitindo-lhe durante esse período explorar da forma que bem entenda o Posto de Combustível e outra bem diferente são as taxas devidas pelo impacto ambiental negativo que o funcionamento de tais postos acarreta, as quais são da responsabilidade de quem desenvolve a atividade nos postos de abastecimento/ in casu, a impugnante, conforme artigo 6º n°2 da Lei n° 53-E/2006 de 29/12.

15 - Efetivamente, estando em causa a atividade de abastecimento de combustíveis e o seu exercício através do funcionamento dos postos de abastecimento, atividade esta que independentemente de estar instalada em propriedade particular, pela natureza do efeito útil pretendido, contende necessariamente com o espaço público, cuja gestão e disciplina compete à entidade municipal tutelar (como melhor consta do Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, proferido no Processo n.º 5256/11 de 10/07/2012), quem deve ser responsável pelas taxas devidas pelo impacto ambiental negativo é quem exerce essa atividade, no caso quem comercializa os produtos.

16 - Assim, se a entidade que exerce a atividade de comercialização dos produtos traduzida no abastecimento de combustíveis é que é a causadora do impacto ambiental negativo, então essa entidade é o sujeito passivo da taxa devida pelo impacto ambiental negativo prevista no artigo 100° do RMTCU de Vila Nova de Gaia.

17 - Refira-se ainda que a isenção constante do n°2 do artigo 100º é uma isenção objetiva e refere-se à não tributação da atividade dos postos de abastecimento que estejam licenciados há menos de 10 anos e, por isso, não pode servir de fundamento ou de explicação para se entender que o sujeito passivo da taxa em questão seja o titular do licenciamento do posto de abastecimento.

18 - ln casu como consta da matéria provada e assente, a atividade de comércio a retalho de combustíveis no posto de abastecimento identificados nos autos é efetuada pela impugnante, na sequência de contrato de cessão junto aos autos, pelo que é a impugnante o sujeito passivo da taxa devida pelo impacto ambiental negativo.

19 - Por último refira-se que o Tribunal Constitucional pelo seu Acórdão nº 623/2019, de 23 de Outubro de 2019 já se pronunciou sobre a constitucionalidade do artigo 55º do Regulamento Municipal da Defesa da Paisagem, Publicidade e Ocupação do Espaço Público de Vila Nova de Gaia e artigo 25º n°3 da Tabela de Taxas do Regulamento de Taxas e Outras Receitas do Município, norma que sucedeu ao artigo 100º do Regulamento de Taxas e Compensações Urbanísticas, em causa e cujo teor é igual, tendo decidido por não julgar inconstitucional tais normas, que foram aplicadas ao comercializador retalhista e não ao titular da licença de exploração.

20 - Em face de todo o exposto o Acórdão sob recurso, ao decidir como decidiu, violou o disposto no nº 2 do artigo 6º do RGTAL, bem como o artigo 100º do RMTCU de Vila Nova de Gaia, o D.L. 267/2002 e o D.L. 31/2006, de 15 de fevereiro, pelo que deve ser revogado e substituído por outro que julgue a entidade impugnante parte legítima e a impugnação improcedente.

Termos em que, admitido o presente recurso de revista, deverá o mesmo ser julgado procedente, revogando-se o Acórdão recorrido e substituindo-o por outro que julgue a impugnante parte legítima e improcedente a impugnação, assim se fazendo JUSTIÇA

2 – Contra-alegou a recorrida, concluindo nos seguintes termos:

A. Vem o presente recurso de revista interposto pelo Município de Vila Nova de Gaia, contra o Acórdão proferido pelo TCA Norte, que manteve a sentença proferida em primeira instância pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, que julgou procedente a impugnação apresentada contra o indeferimento da reclamação graciosa apresentada contra a liquidação da taxa devida pela instalação de postos de abastecimento de combustível, referente a 2012, no montante global de € 5.000.

B. O Recorrente considera que o presente recurso é ‘claramente necessário para uma melhor aplicação do direito’, nos termos do disposto no artigo 285.º, n.º 1 do CPPT e no artigo 150.º, n.º 1 do CPTA, o que requer a intervenção deste STA.

C. Todavia, na medida em que o STA já se pronunciou sobre a questão relativamente à qual o Recorrente pretende a sua intervenção, não se vislumbra em que medida poderá nova intervenção do STA contribuir para uma melhor aplicação do direito.

D. Foi, de resto, com base na posição firmada por este STA, em Acórdão proferido nos presentes Autos no dia 27 de setembro de 2017, proferido no processo n.º 138/17, com origem na impugnação n.º 1800/12.4BEPRT que, quer o TAF do Porto, em primeira instância, quer o TCA Norte, em sede de recurso, decidiram no sentido em que o fizeram.

E. Do citado Acórdão, decorre com clareza que, perante o quadro normativo vigente à data dos factos a sociedade que detém a titularidade do licenciamento é que é a responsável pelo exercício da atividade, independentemente de poder ceder a exploração do posto de abastecimento a outra pessoa ou entidade.

F. A mera discordância com as soluções de direito preconizadas pelos Tribunais não pode, ao contrário do que pretende o Recorrente, abrir uma nova instância de recurso, sobretudo no que respeita ao recurso de revista, cujo caráter se pretende excecional.

G. Tal é o entendimento que resulta da jurisprudência consolidada deste STA a respeito da admissibilidade do recurso de revista, plasmada, designadamente, e a título meramente exemplificativo, nos Acórdãos proferidos em 10 de março de 2021, no processo n.º 0270/11.9BEMDL, em 3 de fevereiro de 2021, nos processos n.º 087/20.0BECTB e n.º 0128/20.0BECTB e em 16 de setembro de 2020, nos processos n.º 0859/18.5BEALM, n.º 01854/19.2BELRS.

H. Pelo que, nos termos do disposto no artigo 285.º, n.º 6 do CPPT e no artigo 150.º, n.º 6 do CPTA, deve o presente recurso ser objeto de decisão sumária de não admissão, por não se encontrarem reunidos os pressupostos que fundamentam a sua apresentação.

I. Mesmo que assim não se entenda, deve, ainda assim, ser negado provimento ao recurso de revista interposto na medida em que a interpretação da Lei preconizada pelo Recorrente não é a que resulta do quadro normativo aplicável.

J. As conclusões do Recorrente no sentido de que quem exerce a atividade de exploração dos postos de abastecimento subjacentes às taxas em crise é quem deve ser responsável por elas não podem ser extraídas das normas regulamentares que preveem a incidência subjetiva do tributo.

K. De acordo com o artigo 3.º do Regulamento Municipal de Taxas e Compensações Urbanísticas do Município de Vila Nova de Gaia, apenas se estabelece que o sujeito passivo da taxa é a pessoa singular e coletiva que está vinculada ao cumprimento da prestação tributária, não contribuindo a norma de incidência da taxa, contida no artigo 100.º, n.º 1 do mesmo Regulamento, com qualquer esclarecimento adicional a esse respeito, limitando-se aquele dispositivo a informar serem devidas as taxas previstas em Tabela Anexa pela ‘instalação de postos de abastecimento de combustível’.

L. Por sua vez, o artigo 29.º da dita Tabela Anexa ao Regulamento, determina que a taxa seja calculada ‘nos termos do n.º 3, do artigo 58 do Regulamento’, o qual respeita às compensações ao município por projetos de loteamento e pedidos de licenciamento de operações urbanísticas de impacto relevante.

M. Em suma, o Regulamento é totalmente omisso na identificação do sujeito passivo da taxa em crise pelo que, tendo-se demonstrado ser a ‘Petrogal’ a titular do direito de exploração dos competentes postos de abastecimento, e nada havendo no Regulamento que faça presumir ser outra a entidade que se encontra vinculada ao cumprimento da prestação tributária, conforme prescrito no artigo 3.º do Regulamento, é também a ‘Petrogal’ a única entidade que pode ser considerada como sujeito passivo da taxa em crise, nos termos do disposto nos artigos 18.º, n.º 3 da LGT, 9.º do CPPT e 7.º, n.º 2 do RGTAL.

N. As lacunas apresentadas pelo Regulamento Municipal a este respeito não são suscetíveis de serem sanadas por meio das ‘explicações’ apresentadas pelo Recorrente nas suas alegações, ou integradas com recurso aos instrumentos contratuais utilizados por e entre privados, designadamente pelo contrato de concessão junto aos Autos; ou seja, o que quer que tenha sido acordado entre as partes no âmbito da repartição dos encargos derivados da exploração não legitima, nem pode servir de base, para que o Recorrente emita liquidações ilegais!

O. Com relevância para a correta interpretação do Direito aplicável, resultaram provados ao longo do presente processo que i) a cessão da exploração contratada com a Recorrida não abrangeu a transmissão da propriedade dos postos ou da respetiva licença de exploração; e que ii) a titular originária da licença de exploração se mantém responsável pelo exercício da atividade, embora não a exerça de motu próprio, conforme decorre do artigo 15.º, do Decreto-Lei n.º 267/2002, de 20 de outubro – cfr., a título de exemplo, os artigos 2.4., 4.5., 5., 7.2 e 15.1 do contrato, que evidenciam que a ‘Petrogal’ se mantém no comando dos destinos da exploração.

P. Estes sim, são factos relevantes, não só pelo que, por si só, evidenciam, mas também pela sua função no âmbito do presente processo. Isto porque, em sede de recurso apresentado da primeira sentença proferida pelo TAF do Porto, a qual considerou a impugnação improcedente, o STA determinou a baixa dos Autos à primeira instância com vista à ampliação da matéria de facto no sentido de apurar, com base no contrato de cessão de exploração celebrado entre a Recorrida e a ‘Petrogal’, um único facto: se a titularidade da licença de exploração dos postos de abastecimento em causa foi ou não transmitida à Recorrida.

Q. No entendimento do STA, no Acórdão proferido em 27 de setembro de 2017, nos presentes Autos «face ao regime jurídico instituído no n.º DL 267/2002 (considerando as sucessivas alterações e a Portaria n.º 1188/2003, de 10/10), a sociedade que detém a titularidade do licenciamento é que é a responsável pelo exercício da atividade, independentemente de poder ceder a exploração do poso de abastecimento a outra pessoa ou entidade» – cfr. Acórdão de fls. 188 a 202 dos Autos, p. 15, sublinhado nosso, cit.).

R. E, com efeito, nos termos do artigo 15.º daquele diploma legal, nomeadamente dos seus n.ºs 3 a 5, é à titular da licença de exploração que cabe a responsabilidade pelo exercício da atividade licenciada, a qual fica patente na obrigatoriedade, em certos casos, de designar um técnico concretamente responsável – em nome e por conta da entidade licenciada – pela exploração. Ora, na ausência dessa obrigação de designação de técnico responsável pela exploração, essa responsabilidade mantém-se, naturalmente, com entidade licenciada para o efeito.

S. Por tudo o exposto, e na medida em que a cessão da exploração não opera a transmissão dos direitos e obrigações inerentes à titularidade do respetivo direito à exploração, da ampliação da matéria de facto ordenada apenas poderia resultar um de dois desfechos: ou a prova de que foi transmitida a titularidade da licença de exploração, caso em que a Recorrida seria o sujeito passivo da taxa em crise; ou a prova de que não foi transmitida a titularidade da licença de exploração, mantendo-se a titular originária como sujeito passivo da taxa em crise.

T. Verificando-se este segundo cenário, a interpretação que decorre, quer do Regulamento, quer da Lei, e também a que ficou plasmada no Acórdão do STA de 27 de setembro de 2017 já citado, é que é a titular da licença de exploração dos relevantes postos de abastecimento de combustíveis – e não a ora Recorrida – o sujeito passivo da taxa em crise.

U. Devendo, por isso, ser negado provimento ao recurso de revista interposto, mantendo-se na íntegra a interpretação da Lei efetuada no Acórdão recorrido e, bem assim, na sentença sobre a qual aquele aresto versou, com as demais consequências legais.

Termos em que o presente recurso deve ser objeto de decisão sumária de não admissão, em virtude de não se verificarem os pressupostos previstos nos artigos 285.º, n.º 1 do CPPT e 150.º, n.º 1 do CPTA ou, caso assim não se entenda, deve ser negado provimento ao recurso interposto, sendo o Acórdão recorrido integralmente mantido, com as demais consequências legais, designadamente a anulação das liquidações em crise e a devolução dos montantes ilegalmente liquidados à ora Recorrida, acrescida dos competentes juros indemnizatórios, nos termos do disposto o artigo 43.º da LGT.

Só nestes termos será respeitado o DIREITO e feita JUSTIÇA!

3 – O Excelentíssimo Magistrado do Ministério Público junto deste STA emitiu douto parecer no sentido da não admissão do recurso com a seguinte fundamentação específica:

No caso, afigura-se-nos que não estão verificados os apontados requisitos de admissibilidade do recurso de revista excepcional.

Na verdade, a Recorrente discorda do decidido pelo Tribunal Central Administrativo Norte, por considerar que o sujeito passivo da taxa em apreço é a entidade que explora comercialmente a actividade e que a desenvolve e exerce através do funcionamento dos postos e abastecimento de combustíveis,

In casu, a Impugnante, ora Recorrida, A………., Lda.

Por isso, sustenta que o Acórdão recorrido enferma de erro de julgamento e, em consequência, pede que o mesmo seja revogado e julgada improcedente a impugnação por deduzida por A…………, Lda.

Acontece, porém, que o Recorrente se dispensou de qualquer alegação no sentido de demonstrar os requisitos de admissibilidade da revista; limitando-se a referir que a intervenção deste Tribunal é necessária para a melhor aplicação do Direito,

Uma vez que a questão em causa é de extrema relevância para o concelho de Vila Nova de Gaia e já foi objecto de decisões, transitadas em julgado, que consideram que o sujeito passivo da taxa é que explora comercialmente e exerce a actividade em apreço.

Ora, apesar de identificar tais decisões não comprovou o seu trânsito em julgado, sendo certo que, em relação a uma delas (02142/14.6BEPRT), foi interposto recurso para este Venerando Tribunal cujo resultado foi a sua revogação.

Ora, não cumpre ao Supremo Tribunal Administrativo substituir-se ao Recorrente nessa demonstração, ainda que perfunctória desses requisitos.

Ademais, o decidido no Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte mostra-se de acordo com a jurisprudência deste Supremo Tribunal (cf., entre outros o Acórdão da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 6/05/2020, proc. n.º 02142/14.6BEPRT 0373/18,

O qual por sua vez se sustenta em outro Acórdão de 28/11/2018, proferido no processo n.º 02146/14.9BEPRT,

E ainda o Acórdão de 27/09/2017, proferido no proc. nº 138/17, que deu origem ao Acórdão do TCAN, de 11/03/2021, proferido no proc. nº 1800/12.4BEPRT, todos disponíveis em www.dgsi.pt)

Assim sendo, a douta sentença recorrida extraiu a conclusão, em conformidade com a jurisprudência do acórdão do STA, que sendo a Petrogal a sociedade detentora das licenças de exploração,

É ela a responsável pelo exercício da actividade, independentemente de ter cedido a exploração do posto à Impugnante/Recorrida.

Consequentemente, não tendo o Recorrente alegado o que quer que seja em ordem a demonstrar ou que a questão cuja reapreciação pretende assume uma relevância jurídica ou social de importância fundamental

Ou que o recurso é claramente necessário para uma melhor aplicação do direito, não se mostram reunidos os pressupostos de admissibilidade do recurso de revista previstos no art. 285.º do CPP,

Que, recorde-se não constitui mais um grau de recurso que o legislador tenha posto à disposição da parte que considera que o acórdão recorrido enferma de erro de julgamento.

Consequentemente, entendemos que o presente recurso de revista não deve ser admitido.

4 – Dá-se por reproduzido o probatório fixado no acórdão recorrido (fls. 9 a 11 da respectiva numeração autónoma).

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir da admissibilidade do recurso.


- Fundamentação -


5 – Apreciando.

5.1 Dos pressupostos legais do recurso de revista.

O presente recurso foi interposto e admitido como recurso de revista, havendo, agora, que proceder à apreciação preliminar sumária da verificação in casu dos respectivos pressupostos da sua admissibilidade, ex vi do n.º 6 do artigo 285.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT).

Isto porque não obstante o recurso ter sido interposto ao abrigo das normas do CPTA que preveem o recurso de revista, atenta a data em que foi proferido o acórdão do TCA Norte sob escrutínio e o meio processual especificamente tributário em causa (impugnação judicial) é à luz do disposto no artigo 285.º do CPPT - que hoje consagra expressamente o recurso de revista no contencioso tributário –, que a admissão do recurso deve ser apreciada.

Dispõe o artigo 285.º do CPPT, na redacção vigente, sob a epígrafe “Recurso de Revista”:

1 – Das decisões proferidas em segunda instância pelo Tribunal Central Administrativo pode haver, excecionalmente, revista para o Supremo Tribunal Administrativo, quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental ou quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito.

2 – A revista só pode ter como fundamento a violação de lei substantiva ou processual.

3 – Aos factos materiais fixados pelo tribunal recorrido, o tribunal de revista aplica definitivamente o regime jurídico que julgue adequado.

4 – O erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa não pode ser objeto de revista, salvo havendo ofensa de uma disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força de determinado meio de prova.

5 – Na revista de decisão de atribuição ou recusa de providência cautelar, o Supremo Tribunal Administrativo, quando não confirme a decisão recorrida, substitui-a por acórdão que decide a questão controvertida, aplicando os critérios de atribuição das providências cautelares por referência à matéria de facto fixada nas instâncias.

6 – A decisão quanto à questão de saber se, no caso concreto, se preenchem os pressupostos do n.º 1 compete ao Supremo Tribunal Administrativo, devendo ser objeto de apreciação preliminar sumária, a cargo de uma formação constituída por três juízes de entre os mais antigos da Secção de Contencioso Tributário.

Decorre expressa e inequivocamente do n.º 1 do transcrito artigo a excepcionalidade do recurso de revista em apreço, sendo a sua admissibilidade condicionada não por critérios quantitativos mas por um critério qualitativo – o de que em causa esteja a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental ou quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito – devendo este recurso funcionar como uma válvula de segurança do sistema e não como uma instância generalizada de recurso.

E, na interpretação dos conceitos a que o legislador recorre na definição do critério qualitativo de admissibilidade deste recurso, constitui jurisprudência pacífica deste Supremo Tribunal Administrativo - cfr., por todos, o Acórdão deste STA de 2 de abril de 2014, rec. n.º 1853/13 -, que «(…) o preenchimento do conceito indeterminado de relevância jurídica fundamental verificar-se-á, designadamente, quando a questão a apreciar seja de elevada complexidade ou, pelo menos, de complexidade jurídica superior ao comum, seja por força da dificuldade das operações exegéticas a efectuar, de um enquadramento normativo especialmente intricado ou da necessidade de concatenação de diversos regimes legais e institutos jurídicos, ou quando o tratamento da matéria tem suscitado dúvidas sérias quer ao nível da jurisprudência quer ao nível da doutrina. Já relevância social fundamental verificar-se-á quando a situação apresente contornos indiciadores de que a solução pode constituir uma orientação para a apreciação de outros casos, ou quando esteja em causa questão que revele especial capacidade de repercussão social, em que a utilidade da decisão extravasa os limites do caso concreto das partes envolvidas no litígio. Por outro lado, a clara necessidade da admissão da revista para melhor aplicação do direito há-de resultar da possibilidade de repetição num número indeterminado de casos futuros e consequente necessidade de garantir a uniformização do direito em matérias importantes tratadas pelas instâncias de forma pouco consistente ou contraditória - nomeadamente por se verificar a divisão de correntes jurisprudenciais ou doutrinais e se ter gerado incerteza e instabilidade na sua resolução a impor a intervenção do órgão de cúpula da justiça administrativa e tributária como condição para dissipar dúvidas – ou por as instâncias terem tratado a matéria de forma ostensivamente errada ou juridicamente insustentável, sendo objectivamente útil a intervenção do STA na qualidade de órgão de regulação do sistema.».

Vejamos, pois.

O acórdão cuja revista é requerida pelo Município de Vila Nova de Gaia negou provimento ao recurso por este interposto de sentença do TAF do Porto que julgara procedente a impugnação deduzida por A…………, LDA contra acto de liquidação de taxa municipal prevista no artigo 100.º do Regulamento Municipal de Taxas e Compensações Urbanísticas do Município de Vila Nova de Gaia, no entendimento de que se afigura correcto, em face da jurisprudência deste STA, o julgado no sentido de que o sujeito passivo da taxa é a proprietária do posto de abastecimento de combustíveis (a Petrogal) e não a impugnante (que explora comercialmente o posto de abastecimento em causa).

O recorrente requer revista do assim decidido alegando que a intervenção do Supremo Tribunal Administrativo é necessária para uma melhor aplicação do direito, tanto mais que a questão em causa de identificação do sujeito passivo da taxa é de extrema relevância para o concelho de Vila Nova de Gaia e já foi objeto de decisões, transitadas em julgado, que consideraram que o sujeito passivo da taxa é quem explora comercialmente e exerce a atividade em apreço e o presente Acórdão que considera que o sujeito passivo é o titular da licença de exploração e do posto de abastecimento mesmo que não exerça em concreto a atividade taxada, que se reveste de crucial importância para a aplicação da referida taxa que se defina quem é o seu sujeito passivo evitando-se até situações diferenciadas para quem impugna ou não a liquidação bem como para quem pode recorrer ou não das decisões, mais acrescentando que existem várias decisões que fundamentadamente já consideraram parte legitima a entidade que explora comercialmente o posto de abastecimento por ser o responsável pelo seu funcionamento, a título de exemplo, refere-se as sentenças proferidas nos processos 2142/14.6BEPRT, 1904/15.lBEPRT, 2132/16.4BEPRT, 2722/17.BBEPRT, 2496/17.2BEPRT e 2497/17.0BEPRT.

Não parece, porém, que no actual estádio da jurisprudência – em que se louva as decisões das instâncias -, o STA tenha já definido quem é o sujeito passivo da referida taxa, pois que as decisões proferidas por este Supremo Tribunal ordenam, todas elas, a ampliação da matéria de facto para posterior decisão da questão, sendo que a questão tem inegável relevo social e a complexidade jurídica decorrente da pouca clareza das normas regulamentares em causa.

É também conhecida por este STA a existência de decisões contraditórias de primeira instância, podendo a intervenção deste STA contribuir para a melhor aplicação do Direito, tanto mais que as decisões favoráveis à pretensão dos impugnantes têm invocado a jurisprudência deste STA, que importa claramente definir, para “melhor aplicação do direito”.

Entende-se, pois, estarem reunidos os pressupostos de que depende a admissão do recurso, pelo que este será admitido.


- Decisão -

6 - Termos em que, face ao exposto, acorda-se em admitir o presente recurso de revista.

Custas a final.

Assinado digitalmente pela Relatora, que consigna e atesta que, nos termos do disposto no art.15.º-A do Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de Março, aditado pelo art. 3º do Decreto-Lei n.º 20/2020, de 1 de Maio, têm voto de conformidade com o presente Acórdão os restantes integrantes da formação de julgamento.

Lisboa, 13 de Julho de 2021. - Isabel Marques da Silva (relatora) - Francisco Rothes - Aragão Seia.