Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01132/15
Data do Acordão:05/03/2018
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:TERESA DE SOUSA
Descritores:MAGISTRADO
CLASSIFICAÇÃO DE SERVIÇO
INSPECÇÃO
CONSELHO SUPERIOR DO MINISTÉRIO PÚBLICO
ERRO NOS PRESSUPOSTOS DE FACTO
PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE
Sumário:I - Numa inspecção de serviço efectuada a um Magistrado a apreciação tem que evidenciar o que de bom e menos bom se apura. O que se verifica no caso presente é que o negativo evidenciado é manifestamente superior aos pontos positivos também referenciados no Relatório.
II - Face ao que consta da fundamentação do acórdão impugnado e do acórdão da Secção e Relatório de Inspecção, tendo em conta todos os elementos constantes do Relatório de Inspecção que atestam um desempenho funcional claramente insuficiente, ao qual acrescem faltas de assiduidade, ausências ao serviço sem comunicação prévia e atrasos inaceitáveis na tramitação dos processos, é de se concluir que a prestação funcional da Autora deve ser classificada de Medíocre, de acordo com a previsão do art. 20º, al. e) do RIMP, tal como o fez o acórdão impugnado, tendo sido correctamente valorados os elementos a considerar, de acordo com o disposto no art. 113º do EMP, não tendo sido violado o princípio da proporcionalidade.
Nº Convencional:JSTA000P23256
Nº do Documento:SA12018050301132
Data de Entrada:09/21/2015
Recorrente:A......
Recorrido 1:CONSELHO SUPERIOR DO MINISTÉRIO PÚBLICO
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral:

21

Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo

1. Relatório
A recorrente A………, Procuradora-Adjunta, vem intentar Acção Administrativa Especial contra o Conselho Superior do Ministério Público (CSMP), impugnando o acórdão do Plenário do CSMP, datado de 28.04.2015, que indeferiu a reclamação do acórdão proferido respectiva 2ª Secção de Classificações, de 10.03.2015, e atribuiu à ora Autora a classificação de “Medíocre”, cumulando com o pedido de condenação à prática de todos os actos necessários reintegração da Autora no exercício de funções em que estaria se não fosse o acto impugnado.
Imputa ao acto impugnado erro manifesto por falta de valoração da prova apresentada pela A. e violação do princípio da proporcionalidade.

O Réu contestou, considerando que a deliberação impugnada não padece dos vícios invocados.

Foi proferido despacho que determinou o cumprimento do art. 91º, nº 4 do CPTA na versão original, aqui aplicável, e, a fls. 159, despacho indeferindo o requerimento de produção de prova da autora.

A A. apresentou alegações com conclusões do seguinte teor:
A. Vem a presente acção administrativa especial de impugnação do Acórdão do Plenário do Conselho Superior do Ministério Público, de 28.04.2015, que indeferiu a reclamação do Acórdão da respectiva 2.ª Secção de Classificações, de 10.03.2015, e manteve a atribuição da classificação de “Medíocre”.
B. A Autora mantém, integralmente, toda a argumentação produzida na sua petição inicial.
C. O Acórdão do CSMP é inválido por diversos motivos, devendo o mesmo ser anulado, bem como os demais actos subsequentes praticados em cumprimento daquele.
D. Em primeiro lugar, o acto impugnado enferma de erro manifesto ao sustentar que a Autora revela “definitiva incapacidade de adaptação às exigências da função”.
E. A Autora entende que não foram devidamente valorizadas as circunstâncias referidas ao longo do processo inspectivo, sobretudo no efeito que conjugadamente todas elas tiveram sobre o seu desempenho.
F. O CSMP deveria ter, no entender da Autora, valorado as circunstâncias (quer profissionais, quer pessoais) que rodearam o seu desempenho no período abrangido pelo processo inspectivo, uma vez que as mesmas se reflectiram significativamente no exercício das funções da Autora.
G. Ao invés, todas as circunstâncias invocadas pela Autora foram desvalorizadas pelo Acórdão do Plenário do CSMP (bem como pelo Acórdão da 2ª Secção de Classificações), sendo que, face à manifesta influência das mesmas no desempenho das funções da Autora, não o podiam ter sido.
H. Carece, assim, o Acórdão impugnado de 28.04.2015, quanto a este respeito, de falta de fundamentação, na medida em que o CSMP não faz qualquer demonstração sobre a forma como apreciou/valorou a prova aduzida pela Autora.
I. As alegadas anomalias no desempenho funcional da Autora em causa no processo inspectivo não representam, ao contrário do referido pelo Senhor Inspector no Relatório Final (que mereceu adesão total no Acórdão da 2.ª Secção de Classificações do CSMP, confirmado pelo Acórdão impugnado, de 28.04.2015), qualquer “desinteresse e alheamento com os valores que, como magistrada do Ministério Público, lhe cabe acautelar” nem tão pouco qualquer “incapacidade para o exercício do cargo”.
J. Devendo, antes, as mesmas ser entendidas e devidamente valoradas, no quadro conjuntural em que a Autora exerceu as suas funções no período inspeccionado, designadamente no ………. de ……….
K. No que diz respeito às ausências ao serviço da Autora, sublinha-se que tais ausências ocorreram por motivos de saúde da Autora, não previsíveis no dia anterior, motivo pelo qual não foi possível avisar as colegas e não, repita-se, por a Autora entender não avisar, não se podendo, por isso, falar, como faz o Relatório de Inspecção, em substituições de “forma abrupta”.
L. A situação de doença de diabetes (devidamente comprovada), conjugada com a depressão que a Autora sofria, bem como os elevados níveis de stress originavam enjoos matinais frequentes, vómitos, tensão baixa e, em geral, incapacidade de agir, os quais deveriam ter sido levados em conta.
M. Relativamente aos atrasos na tramitação dos processos que tinha a seu cargo, o Acórdão impugnado refere-se, particularmente, aos atrasos verificados no …..º Juízo do ………. de …………, atrasos esses que, de resto, a Autora não negou, ao longo do processo inspectivo.
N. No entanto, tais atrasos deveriam - conforme a Autora sempre procurou demonstrar - ter sido inseridos no quadro conjuntural das condições em que exerceu as suas funções no ……..º Juízo do ………. de ………, bem como no quadro de doença que a afectou.
O. Os atrasos que foram imputados à Autora resultaram, pois, de um conjunto de circunstâncias e não demonstram qualquer “desinteresse ou alheamento”, nem tão pouco qualquer “incapacidade para o exercício do cargo”.
P. Alegada incapacidade essa que carece de demonstração, quer no Acórdão impugnado, quer no Acórdão da 2.ª Secção de Classificações do CSMP e que se encontra plenamente afastada, em face do recente desempenho funcional da Autora.
Q. A Autora entende que deveria ter sido levado em consideração o seu quadro clínico, uma vez que a Autora sofre de diabetes tipo II, doença que, não a impedindo de trabalhar, todavia causa-lhe maior stress e debilidade física, pois provoca muito cansaço, o que não se coadunava com a natureza do serviço corrente num Tribunal com as características do ………..de ………, cujo ritmo de trabalho era, por vezes, frenético.
R. A Autora apresentava, ainda, um quadro depressivo agravado.
S. Também não foram tidas em conta as condições de trabalho que a mesma enfrentava, em particular as resultantes do facto de o Senhor Juiz de Direito Dr. …………., com quem a Autora trabalhava, demorar muito tempo em julgamentos (o qual foi, de resto, avaliado e suspenso de funções).
T. As condições de trabalho no ……….. supra referidas, designadamente, o excesso de trabalho, o stress, a pressão e as condições de trabalho, serviram, ao invés, para agudizar a depressão de que a Autora padecia e, consequentemente, diminuir a sua capacidade de resposta profissional, sendo tal facto do pleno conhecimento da hierarquia.
U. Assim, também no que diz respeito aos atrasos na promoção dos processos a cargo da Autora, o Acórdão impugnado não valorou correctamente para a atribuição da classificação ora em causa todos os factos invocados pela Autora, sendo, também por isso, ilegal, por erro de apreciação.
V. No que diz respeito ao aspecto qualitativo do desempenho funcional da Autora, e ao contrário do que parece resultar do que supra se transcreveu, a Autora fez muitos inquéritos e bem.
W. Não existem matérias “sem qualquer grau de dificuldade técnica”: tal é, salvo o devido respeito, desmerecer a actividade de investigação criminal e do Ministério Público.
X. No que diz respeito à existência de alguns alegados erros verificados nos processos tramitados pela Autora (referidos no Relatório do Senhor Inspector), a Autora sublinha que se trata da escolha, por parte da Autora, no sentido de uma determinada forma de investigação, mas que não é necessariamente a errada, apenas uma de muitas abordagens possíveis.
Y. A Autora fez, portanto, como o faz a maioria dos seus pares, não podendo, por isso, tal prática, seguida por todos, desfavorecê-la.
Z. O Relatório realça, também, diversos aspectos positivos do desempenho da Autora, ao contrário do que pode transparecer da leitura do Acórdão impugnado.
AA. A partir de Fevereiro de 2014, a Autora esteve colocada no ……..º Juízo de …………. de ……….., onde desempenhou sem quaisquer sobressaltos a representação do Ministério Público, conforme Ordem de Serviço n.º 3/2014, de 19.02.2014 da Coordenação, em substituição de uma colega, período durante o qual trabalhou com o Exmo. Sr. Dr. …………, inexistindo aí quaisquer anomalias.
BB. Ora, não poderão deixar de ser tidos em conta todos os factores positivos, entendendo a Autora que é de referir que algumas críticas que lhe são apontadas carecem de fundamento, pois resultam de comportamentos comuns aos magistrados do Ministério Público (a título de exemplo, a remissão da descrição dos objectos em causa nos processos para os relatórios periciais).
CC. Pelo que tudo o que a Autora relatou deveria ter sido devidamente ponderado na atribuição da classificação à Autora.
DD. Ao não ter valorado devidamente todos as circunstâncias invocadas pela Autora, o Acórdão impugnado enferma de erro manifesto de apreciação, sendo, por isso, ilegal.
EE. A atribuição da classificação de “Medíocre” nestas circunstâncias, afigura-se como manifestamente excessiva, desadequada e desproporcional face ao desempenho funcional da Autora, devendo a mesma ser substituída.
FF. Da leitura do Relatório e dos Acórdãos do CSMP, a Autora fica com a sensação clara que os problemas pessoais e de saúde que enfrentou no período inspeccionado não são referidos no Relatório e logo não foram tidos em conta na aferição das circunstâncias que levaram à sua prestação funcional.
GG. Com efeito, considerando a consequência automática da atribuição de tal classificação, a suspensão imediata de funções (conforme estabelecido no artigo 110.º n.° 2 do EMP) não se está a permitir que a Autora evolua ou melhore o seu desempenho.
HH. O que a Autora estava a demonstrar que era plenamente capaz de fazer, exercendo plena e cabalmente as suas funções no ………. de ………., onde colocada.
II. A Autora encontrava-se afecta, desde Setembro de 2014 ao …….. de …………, designadamente à ……….ª Secção de processos comuns e com o seu conteúdo funcional recortado à luz do consignado na Ordem de Serviço n.° 1/2014, emitida pela Coordenação do Ministério Público da Comarca de …………., datada de 04.09.2014.
JJ. A Autora tinha, ainda a seu cargo, para além do que é referido na Ordem de Serviço supra indicada, toda a distribuição do expediente que entra para a Secção Central do Tribunal e que precisa de ser Registado, Autuado e Distribuído como Inquérito (‘RDA’), isto é, despachava todo o expediente para RDA bem como todos inquéritos contra Desconhecidos.
KK. A Autora encontrava-se ainda, à data, a substituir a sua Colega, Magistrada ……………., exercendo as funções de representação do Ministério Público na unidade de competência genérica criminal, em virtude de aquela se encontrar de baixa médica desde 24.11.2014, conforme distribuição de serviço determinada pela Ordem de Serviço n.° 10/2014, de 28.11.2014, emitida pelo Magistrado Coordenador.
LL. Face ao conteúdo das funções atribuídas à Autora pelas Ordens de Serviço supra referidas, emitidas pela Coordenação da Comarca de …………., é manifesto que para a hierarquia do Ministério Público, a Autora não revela qualquer “incapacidade para o cargo” pois se assim o entendesse, não teria emanado aquelas Ordens de Serviço.
MM. Acresce que a atribuição da classificação de “Medíocre” à Autora e respectiva suspensão imediata de funções, está a impedir a plena produção de efeitos do Acórdão da 1.ª Secção do STA, de 07.05.2015, que deliberou a suspensão de eficácia da sanção de aposentação compulsiva aplicada à Autora, pois em virtude daquela, a Autora vê-se impedida de regressar ao desempenho das suas funções, que constitui um direito seu ao abrigo do Acórdão proferido pelo STA em 07.05.2015.
NN. A classificação de “Medíocre” afecta, ainda, a imagem e o prestígio pessoal e profissional da Autora.
OO. O Acórdão impugnado acarretará, ainda, para a Autora outro prejuízo irreparável: o decorrente da deterioração das suas condições psicológicas, já que é facto assente que a aplicação de uma classificação de “Medíocre” que implica a suspensão do exercício de funções e a instauração de inquérito por inaptidão para esse exercício a uma magistrada, afecta objectivamente a sua imagem e prestígio pessoal e profissional, o que a perturbará irremediavelmente.
PP. Em face do exposto, não restam quaisquer dúvidas que o Acórdão do Plenário CSMP de 28.04.2015 que, indeferindo a reclamação apresentada do Acórdão da respectiva 2 ª Secção de Classificações de 10. 03.2015, manteve a atribuição a Autora da classificação de “Medíocre” é inválido, devendo ser anulado e, consequentemente, deve o Conselho Superior do Ministério Público ser condenado a praticar todos os actos necessários à reintegração da Autora no exercício de funções em que estaria se não fosse o acto ora impugnado.
Termos em que, com o douto suprimento de V. Exas., deve ser anulado o Acórdão do Plenário do Conselho Superior do Ministério Público, de 28.04.2015, que indeferiu a reclamação apresentada pela Autora do Acórdão da 22 Secção de Classificações do Conselho Superior do Ministério Público de 10.03.2015 e manteve a atribuição da classificação de “Medíocre” à Autora e, consequentemente, deve o Conselho Superior do Ministério Público ser condenado a praticar todos os actos necessários à reintegração de funções em que estaria se não fosse o acto ora impugnado, assim se fazendo a acostumada e esperada JUSTIÇA! ”

Em alegações o CSMP formula as seguintes conclusões:
A. O impugnado acórdão do Plenário do CSMP de 28 de abril de 2015, que definitivamente atribuiu à Autora a classificação de “Medíocre” e ordenou a instauração de inquérito por inaptidão, bem como a suspensão do exercício de funções, não enferma de nenhum dos vícios que a Autora lhe atribui;
B. Contrariamente ao que vem alegado, a prova apresentada pela Autora sobre os seus problemas de saúde, foi devidamente apreciada, como o foram os demais elementos que integram o processo de inspeção;
C. O que sucede é que, feita essa apreciação, considerou-se que esses problemas de saúde da Autora de modo algum justificam ou sequer servem de explicação para o seu desempenho negativo;
D. Com efeito, em face dos elementos recolhidos no processo de inspeção relativamente ao desempenho da Autora, consubstanciados em atrasos e deficiências inadmissíveis, tudo devidamente demonstrado, o CSMP não teve quaisquer dúvidas acerca da incapacidade da Autora para o exercício do cargo;
E. E o acórdão impugnado, em si mesmo e na remissão para o acórdão da Secção para Apreciação do Mérito Profissional e para o processo de inspeção, contém fundamentação suficiente, que permite à Autora, designadamente, saber que as suas condições pessoais, mormente os problemas de saúde foram tidas em conta, mas não consideradas de justificativas do seu desempenho negativo;
F. No acórdão impugnado fez-se a ponderação das ausências justificadas de que fala a Autora, mas também das outras em que a Autora não apresentou justificação, e dos casos em não comunicava previamente as ausências, designadamente em dias de turno, só o fazendo depois por impulso do Exmo. Procurador Coordenador, em consequência do conhecimento por ele das mesmas, na sequência da intervenção de outros magistrados em substituição da Autora;
G. E também no que respeita aos atrasos na tramitação dos processos que a Autora tinha a seu cargo não podem ser justificados nem tão pouco explicados pelas circunstâncias que a Autora invoca, ou seja, o volume de tempo gasto em diligências/julgamentos e os seus problemas de saúde;
H. Contrariamente ao que a Autora afirma, quando deixou de exercer funções no ……….., o Exmo. Procurador em 16 de Setembro de 2013 elaborou uma informação hierárquica a dar notícia de que no dia 13 de Setembro de 2013, em visita a esse Tribunal, encontrou um rol de processos amontoados no gabinete da Autora, por despachar, com o respetivo prazo expirado, alguns dos quais com falhas graves de omissão de tramitação, bem como expediente por despachar;
I. E relativamente ao período em que a Autora exerceu funções no serviço de inquéritos, os elementos que foram recolhidos no processo de inspeção e a descrição dos mesmos, feita no respetivo Relatório mostram o seu desempenho negativo, podendo ver-se, a f 87 do Relatório de Inspeção, uma listagem de 9 inquéritos com atrasos de 48 a 111 dias;
J. Por outro lado, quando a Autora cessou funções, foram encontrados no seu gabinete 48 inquéritos, assim registados mas (apenas) destinados ao mero encaminhamento para processo sumário, sem que a Autora lhes tivesse dado o devido seguimento, alguns dos quais lhe tinham sido apresentados havia 4 ou 3 meses, conforme consta de fls. 88 do Relatório de Inspeção;
K. Em consequência desse desleixo da Autora, que já vinha de trás, não vieram os arguidos a ser julgados em processo sumário, como devia ter acontecido, frustrando a boa realização na justiça em ternos de celeridade e de se fazer uso das formas processuais mais expeditas, o que tudo não podia ser mais contrastante com a autoavaliação positiva que a Autora faz do seu próprio desempenho;
L. Pelo facto de no Relatório de Inspeção se terem referido alguns aspetos positivos, o que só demonstra a objectividade com que foi apreciado o desempenho funcional da Autora, esse desempenho nem por isso deixa de ter que ser classificado como negativo, como se propõe no Relatório de Inspeção;
M. E suma: está devidamente demonstrado no acórdão impugnado que se procedeu a uma correta e fundamentada valoração de todos os aspetos do desempenho funcional da Autora, e das circunstâncias envolventes, designadamente as invocadas pela Autora, incluindo os seus problemas de saúde, não tendo ocorrido qualquer omissão ou erro de apreciação que inquine o ato impugnado;
N. Por isso, a classificação de Medíocre que foi atribuída à Autora também não é ilegal por violação do princípio da proporcionalidade, pois mostra-se adequada e proporcional ao seu negativo desempenho funcional, que os elementos recolhidos no processo de inspeção demonstraram à saciedade;
O. Globalmente a prestação funcional da Autora só pode ser avaliada como extremamente negativa, ou seja, muito aquém do satisfatório, pelo que só pode ser classificado de Medíocre, nos temos do artigo 20.°, Alínea e) do RIMP;
P. Não tem qualquer correspondência com a realidade a argumentação da Autora centrada num pretenso bom desempenho funcional nos últimos tempos, posteriormente ao termo do período abrangido pela inspeção, e que por via disso a sua suspensão do exercício de funções “provoca um grave e manifesto prejuízo ao serviço junto do …….. da Comarca de …………..”;
Q. Pelo contrário, não há como deixar de se considerar que a manutenção da Autora em exercício de funções seria gravemente lesiva do interesse público, em termos de falta de qualidade e eficiência e rigor técnico do trabalho, acumulação e inércia processuais, que afetam gravemente a imagem o prestígio do Ministério Público e causam graves prejuízos aos cidadãos envolvidos nos processos pela não realização da justiça com qualidade e em tempo útil;
R. A atribuição da classificação de Medíocre à Autora resultou da criteriosa ponderação dos muitos aspetos negativos e dos poucos aspetos positivos do seu desempenho, bem como das condições de trabalho e das suas condições pessoais, tudo em conformidade com os pertinentes parâmetros de avaliação e aspetos a atender estabelecidos nos artigos 110.º e 113.° do EMP, 13.° e 14.° do RIMP;
S. Feita essa ponderação concluiu-se que o desempenho funcional da Autora se situa muito aquém do satisfatório, a que corresponde a classificação de Medíocre, nos termos do artigo 20.° Alínea e) do RIMP, o que inviabilizou a atribuição de classificação do desempenho funcional da Autora superior a Medíocre;
T. E assim, a classificação de Medíocre atribuída á Autora é aquela que se mostra justa, adequada e proporcional à sua prestação funcional no período inspecionado, pelo que também não lhe assiste a razão na sua alegação de que ocorreu a violação do princípio constitucional da proporcionalidade consagrado no artigo 266.° n.° 2 da Constituição e com expressão no artigo 7.° do CPA;
U. A atribuição de nota à prestação funcional dos Magistrados do Ministério Público inscreve-se na atividade classificativa do CSMP, que lhe está confiada pela norma do artigo 27.°, Alínea a), do EMP, e no exercício da qual dispõe de uma margem de liberdade para, segundo os seus critérios de justiça retributiva e relativa, iguais para o universo dos seus Magistrados, valorar a prestação funcional de cada um;
V. Esta atividade classificativa, por ser discricionária, só é jurisdicionalmente sindicável se existir erro manifesto ou se for ostensivamente admissível, o que manifestamente não ocorre no caso dos autos;
W. Portanto, o ato administrativo impugnado, consubstanciado na deliberação do Plenário do CSMP de 28 abril de 2015, não padece dos vícios que lhe vêm imputados, nem de quaisquer outros que o invalidem, pelo que devera ser mantido na ordem jurídica, na improcedência da alegação e do pedido formulado pela autora.
Nestes termos, deve a presente ação ser julgada totalmente improcedente e, consequentemente, absolvido o CSMP do pedido formulado pela Autora.”

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

2. Os Factos
Consideram-se provados os seguintes factos com interesse para a decisão, atendendo às posições das partes e ao constante do processo instrutor (p.i.):
1 – A Autora é magistrada do Ministério Público com a categoria de Procuradora-Adjunta e encontrava-se, até Fevereiro de 2015, a exercer funções na comarca de ………………, no …………. (……) – acordo das partes.
2 – No âmbito de inspecção ordinária, foi a Autora objecto de inspecção ao serviço prestado na comarca da …………….., a qual abrangeu o período compreendido entre 01.09.2011 e 17.07.2014 – acordo das partes e Relatório de Inspecção de fls. 338 a 480 do p.i..
3 – No Relatório do Processo de Inspecção Ordinária ao Serviço e Mérito da Autora (doravante Relatório), o Senhor Inspector propôs a atribuição à Autora da classificação de “Medíocre”, por avaliar “(…)globalmente, sua prestação funcional, no período compreendido entre 1 de Setembro de 2011 a 17 de Julho de 2014, como extremamente negativa – cfr. Relatório constante a fls. 338 a 480 do p.i., cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
4 – Não se conformando com a classificação proposta, a Autora apresentou resposta ao Relatório, nos termos constantes de fls. 484 a 507 do p.i., cujo teor aqui se dá por reproduzido.
5 – O Senhor Inspector, face a esta resposta, formulou Informação Final, nos termos do art. 17º, nº 2 do Regulamento de Inspecção do Ministério Público (RIMP), constante a fls. 519 a 542 do p.i., cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
6 – Por Acórdão da 2ª Secção de Classificações do CSMP, datado de 10.03.2014, foi atribuída à Autora a classificação de “Medíocre”, por referência ao seu desempenho enquanto Procuradora-Adjunta, no período indicado em 3, nos termos constantes de fls. 573 a 582 do p.i., que aqui se dão por reproduzidos.
7 – Em 08.04.2015, a Autora apresentou reclamação do referido acórdão da 2ª Secção para o Plenário do CSMP, conforme consta a fls. 584 a 611 do p.i., cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
8 - Por Acórdão datado de 28.04.2015 e notificado à Autora em 05.05.2015, o CSMP, reunido em Plenário, indeferiu a reclamação apresentada e confirmou o Acórdão da 2ª Secção de Classificações do CSMP e, em consequência, atribuiu à Autora a classificação de “Medíocre”, com a seguinte fundamentação:
«1. A não inquirição requerida pela I. na resposta ao RI., (fls. 507): O artº 17º nº 1 do RJMP prevê que o magistrado inspeccionado, no uso do direito de resposta, junte elementos que considere convenientes. «Em seguida às, diligências complementares que julgue úteis, o inspector prestará uma informação final sobre a resposta do inspeccionado, não podendo, contudo, referir factos novos que o desfavoreçam» - nº 2. Embora se possa defender que essa é uma das possibilidades deixada ao critério do Inspector («diligências complementares que julgue úteis») em nenhum preceito do EMP ou do RIMP se prevê a inquirição de testemunhas no âmbito de processo inspectivo (diferentemente do procedimento disciplinar). O Inspector não vislumbrou, e bem, a necessidade da inquirição, certamente porque a considerou desnecessária, por mais laudatória que fosse dos méritos da I., face ao acervo de outros elementos bastamente elucidativos para permitirem uma proposta classificativa conscienciosa. Sublinhe-se que no decurso da inspecção, além de informações orais e escritas recolhidas pelo Inspector junto de outros magistrados do Ministério Público, o Exº Inspector, «na sequência da informação apresentada pela I. e acolhendo a sugestão nela formulada» (v. fls. 377 dos autos, fIs. 41 do RI) contactou informalmente o Exº Juiz ……….., que informou «que durante o pouco tempo que trabalhou com a Inspeccionada, ficou com a convicção, a partir das suas intervenções nos processos tutelares educativos, que estava perante uma magistrada empenhada e que preparava convenientemente os processos, o que lhe permitia efectuar perguntas que, em regra, tinha como pertinentes para o completo esclarecimento dos factos». - Idêntica iniciativa junto da Juíza ………….., ou juntar informação escrita pela mesma, o que não fez. Os elementos recolhidos e juntos aos autos são mais que suficientes para uma decisão ponderada e consciente.

2. Quanto à restante matéria alegada pela I. na resposta ao RI., foi objecto de atenção no âmbito do Acórdão reclamado (v. fls. 11 a 14 v do Acórdão reclamado, fls 578 a 579 v do processo inspectivo), tal como o foi a informação final do Exº Inspector, em resposta àquela. No confronto da resposta da I. e da informação final do Exº Inspector, considerados os elementos recolhidos no processo inspectivo, e integrando-os no quadro jurídico estabelecido no EMP e no RIMP, considerou o Acórdão reclamado que «tendo em conta a forma como se pautou a sua conduta nos vários tribunais e em períodos distintos, sendo de sopesar as muito graves falhas apontadas ao seu desempenho em inquérito, qualitativamente muito negativo, bem como as condutas deontológicamente censuráveis por si adoptadas enquanto desempenhou funções no ………., que se espera não mais sejam repetidas no futuro profissional da magistrada», atribuindo-lhe a classificação de MEDÍOCRE

3. Analisemos o que de mais relevante se recolheu no âmbito de todo o processo inspectivo, relativo ao trabalho da I.

Classificações e registo disciplinar

- perfez 18 anos, 10 meses e 2 dias de tempo de serviço em 28.7.2014;

- O seu trabalho foi objecto de duas inspecções, tendo sido classificada com suficiente por Acórdão do CSMP, de 29.4.2002 e com medíocre por Acórdão do Plenário de 11.3.2005;

- Foi sancionada com as penas de 30 dias de multa por duas vezes, uma por Acórdão da Secção Disciplinar do CSMP de 17.10.2007 outra por Acórdão da mesma Secção de 6. 6. 2008,

- Na sequência da segunda classificação esteve suspensa de 13.10.2008 a 31.8.2009 e veio a cumprir a pena de 2 anos de inactividade aplicada por Acórdão de 16.4.2009;

- Iniciou o cumprimento desta pena em 1 de Setembro de 2009, vindo a terminá-la em 31 de Agosto de 2011;

- Regressou ao serviço em 1 de Setembro de 2011.

- Foi sancionada com a pena única de aposentação compulsiva por Acórdão do Plenário do CSMP de 27.1.2015.

Informações hierárquicas

Citam-se apenas algumas passagens, elucidativas (sublinhado da nossa, responsabilidade “tem evidenciado dificuldades em acompanhar a dinâmica de grupo e em desenvolver o espirito de equipa” “é possuidora de “qualidades de urbanidade e de colaboração”; “se relaciona bem com todos os operadores judiciários”; “nas reuniões de serviço demonstra interesse em compreender a temática em debate”; “demonstra possuir boa capacidade de ponderação”; “revela alguns sintomas de dificuldade ao nível de assiduidade e pontualidade”; “ graves sintomas de dificuldade ao nível de assiduidade e pontualidade em matéria de “preparação técnico-jurídica’ a evolução é “boa” no ano de 2011, “razoável”, em 2012 e “suficiente”, quanto ao ano de 2013; em relação ao ano de 2011 “revelava (...) muitas dificuldades em acompanhar de forma consistente o fluxo quotidiano de trabalho com que se confronta na área de inquéritos”; quanto ao ano de 2012, “ muitas dificuldades em acompanhar de forma consistente o fluxo quotidiano de trabalho com que se confronta na área de inquéritos (número residual de inquéritos permanecem a seu cargo para liquidação, nesta data) e, também, a nível de processos de secção”; relativamente ao ano de 2013, “ demonstrado (...) alguma dificuldade pessoal em desenvolver uma estratégia consistente conducente ao regular cumprimento das exigências do serviço que desenvolve e “ dificuldade pessoal em desenvolver uma estratégia consistente conducente ao regular cumprimento das exigências do serviço a seu cargo, a qualidade do serviço é “manifestamente boa”, no ano de 2011, “boa”, no ano de 2012 e “razoável” no ano de 2013”.

No âmbito desta inspecção foi recolhida informação do Ex° Procurador Coordenador. No essencial são confirmados os dados constantes dos boletins anuais, sem se deixar de evidenciar que a I. apresentou (sublinhado nosso)nível deficitário de produtividade/eficiência no exercido das suas funções, demonstrando tido estar plenamente integrada nas funções que lhe foram atribuídas” e de fazer referência à participação disciplinar que, em virtude desta prestação, teve de ser apresentada.

Atrasos

Foram verificados pela inspecção, nos processos do …………º. Juízo do Tribunal de ………….., sem promoção da I. ou com promoção lavrada mais de 30 dias depois da abertura do respectivo termo, 471 situações de atrasos, no período de 3.9.2012 a 1.9.2013, em que exerceu funções naquele tribunal.

Situações a que acresceram: - os dos 5 processos respeitantes ao não cumprimento atempado do artigo 62º., nº. 1, do Dec. Lei nº. 433/82, de 27 de Outubro; - os dos 26 processos a aguardarem a elaboração do requerimento executivo; - os dos 90 processos do …….º. Juízo da ………. a aguardarem a intervenção da I. - os dos 6 inquéritos a aguardarem despacho; e as das 5 notícias criminais a aguardarem a sua tomada de posição com vista aos ulteriores termos processuais.

Verifica-se, assim, que os casos de atraso (superiores a 30 dias) detectados foram de 602

Todos estes atrasos determinaram medidas tendentes a eliminá-los e a evitar a ocorrência de situações idênticas envolvendo a colaboração e esforço de outros magistrados, como é costume em situações desta natureza.

Os atrasos tiveram, entre outros, consequências ao nível do próprio processamento.

Em 4 de Setembro de 2013, 3 dias depois de a I. ter deixado de exercer funções no Tribunal de …………, foram encontrados no seu gabinete, por despachar, 48 conjuntos de diversos documentos registados como inquéritos, mas (apenas) destinados ao mero encaminhamento para julgamento em processo sumário. Entre eles, notícias criminais autuadas cerca de 4 ou 3 meses antes, mais precisamente em 20 e 24 de Maio, 3, 4, 17 e 20 de Junho e envolvendo situações de condução sem habilitação legal, condução sol a influência do álcool ou injúria agravada em função da qualidade do agente. As omissões da I. determinaram a impossibilidade de julgamento em Processo Sumário.

No RI. são referenciadas situações de ausências em dias de turno, nem todas justificadas, quase sempre só participadas por intervenção do Exº Procurador Coordenador. Registada a falta de assiduidade e pontualidade às diligências do Tribunal de ………...

A Inspecção detectou discrepâncias em dados estatísticos fornecidos pela I. e os reais.

Quanto às condições que envolveram o exercício profissional da I. diga-se que a inspecção ressalvou os períodos em que esteve ausente ao serviço, justificadamente, por doença.

Face aos atrasos e omissões detectados no desempenho da I. a hierarquia imediata interveio, através de várias ordens de serviço. Foi substituída por colegas nas tarefas que lhe estavam atribuídas e que não fez nos períodos em que esteve ao serviço. Como realça o RI., algumas dessas tarefas chegaram a ser assumidas por magistrada estagiária, que as desempenhou com desenvoltura.

Sempre a hierarquia levou em linha de conta as limitações da I. na distribuição de serviço. Apesar disso não teve capacidade de resposta à altura, conforme também demonstra o despacho, com atrasos relevantes, dos 33 inquéritos crime que lhe foram inicialmente distribuídos.

Não apresentou a nota curricular que lhe foi solicitada para efeitos de inspecção.

4. No aspecto qualitativo insuficiências de vária ordem transparecem de todos os elementos recolhidos, justificando-se a apreciação a propósito registada pelo Exº Inspector no RI.: «Efectivamente, apesar de ter desempenhado as suas funções num dos sectores mais fáceis da acção do Ministério Público, concretamente, no Tribunal de ……………, o seu trabalho, quando teve lugar, pecou, em geral, pela análise superficial das questões pela aquilatação indevida de outras e, em boa parte dos casos, pela falta de qualidade ou rigor técnicos. Esta falta de qualidade ou rigor, não obstante o pouco grau de dificuldade do escasso número de inquéritos em que, em período anterior, foi chamada a intervir durante um (outro) ano e, posteriormente, durante o referido desempenho, verificou-se igualmente no despacho deles...»,

5. Na classificação a atribuir à magistrada há que considerar todos os elementos recolhidos no processo inspectivo, incluindo a resposta da 1. ao RI., a informação final do Ex° Inspector e a reclamação da I., integrando-os nos critérios estabelecidos nos artigos 109.º, 110.º e 113.º EMP e art 20.º RIMP.

6. Os Procuradores da República e os Procuradores-Adjuntos são classificados pelo Conselho Superior do Ministério Público, de acordo com o seu mérito, de Muito Bom, Bom com Distinção, Bom, Suficiente e Medíocre, devendo ser considerados na classificação o modo como os magistrados desempenham a função, o volume e dificuldades do serviço a seu cargo, as condições do trabalho prestado, a sua preparação técnica, a categoria intelectual, eventuais trabalhos jurídicos publicados, a sua idoneidade cívica, os resultados de inspecções anteriores, inquéritos, sindicâncias ou processos disciplinares, tempo de serviço, relatórios anuais e quaisquer outros elementos complementares que estejam na posse do Conselho Superior do Ministério Público (artigos 109º, 110º e 113º EMP).

7. A concretização destes critérios mostra-se efectuada no art.º 20º RIMP, nos seguintes termos:

i. A classificação de Muito Bom será atribuída “a quem revele elevado mérito no exercício de cargo”;

ii. A classificação de Bom com distinção será atribuída “a quem demonstre qualidades que transcendam o normal exercício de funções”;

iii. A classificação de Bom será atribuída “a quem cumpra de modo cabal e efectivo as obrigações do cargo”;

Iv. A classificação de Suficiente será “atribuída a quem tenha um desempenho funcional apenas satisfatório

v. A classificação de Medíocre será atribuída “a quem tenha um desempenho aquém do satisfatório’

8. Integrando o desempenho funcional da Procuradora-Adjunta A…………, demonstrado no acervo de elementos do processo inspectivo, neste quadro jurídico, impõe-se concluir que a magistrada não interiorizou a necessidade de assumir os níveis de responsabilidade mínimos necessários ao exercício de funções de magistrada do Ministério Público.

9. Apesar dos alertas decorrentes dos processos inspectivos e disciplinares anteriores, a I. claramente desaproveitou as oportunidades que lhe foram sendo concedidas Manifesta desinteresse e alheamento com os valores que, como magistrada do Ministério Público, lhe cabe acautelar. Tem um desempenho reiterado caracterizado por índices quantitativos e qualitativos claramente insatisfatórios. Manifesta incapacidade para o exercício do cargo.»
- cfr. acórdão impugnado, constante a fls. 617 a 621 verso do p.i, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
9 – O acórdão impugnado ordenou, consequentemente, nos termos do art. 110º, nº 2 do EMP, a suspensão imediata do exercício de funções e a instauração de inquérito por inaptidão à Autora – cfr. acórdão a fls. 621 do p.i..
10 – A instrução do referido inquérito foi iniciada em 28.05.2015, sendo este convertido em processo disciplinar.
11 – O CSMP, através do acórdão do Plenário de 27.01.2015, aplicou à ora Autora, no âmbito do processo disciplinar indicado em 10, a sanção disciplinar de aposentação compulsiva.
12 – A Autora, não se conformando com a referida sanção disciplinar, requereu a suspensão da eficácia do acórdão supra referido bem como de todos os autos subsequentes praticados em cumprimento daquele (processo que correu termos com o nº 337/15, deste STA).
13 – Por Acórdão desta Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo, datado de 07.05.2015, a providência cautelar de suspensão de eficácia foi deferida.
14 – A Autora propôs, em 18.05.2015, acção administrativa especial de impugnação do acórdão do Plenário do CSMP de 27.01.2015 que lhe aplicou a sanção disciplinar de aposentação compulsiva, que se encontra a correr termos na 1ª Secção deste STA (P. nº 632/15).


3. O Direito
A autora na sua petição inicial elenca como ilegalidades em que o acto impugnado havia incorrido: i) «em erro manifesto na apreciação do desempenho funcional da Autora, designadamente ao sustentarem [o acórdão da 2 ª Secção e o acórdão do Plenário] que a Autora revela “incapacidade para o cargo”» (arts. 29º e 30º da p.i.), por não ter valorado a prova por si apresentada (arts. 31º a 107º da p.i.); e, ii) violação do princípio da proporcionalidade (arts. 108º a 148º da p.i.). Vícios cuja invocação mantém em alegações.

Comecemos por enunciar os preceitos legais do Estatuto do Ministério Público e do Regulamento de Inspecções do Ministério Público (RIMP) com interesse para a decisão.
Assim, no Estatuto do Ministério Público:
Artigo 110.º
Critérios e efeitos da classificação
1 – A classificação deve atender ao modo como os magistrados desempenham a função, ao volume e dificuldades do serviço a seu cargo, às condições do trabalho prestado, à sua preparação técnica, categoria intelectual, trabalhos jurídicos publicados e idoneidade cívica.
2 - A classificação de Medíocre implica a suspensão do exercício de funções e a instauração de inquérito por inaptidão para esse exercício
3 - Se, em processo disciplinar instaurado com base no inquérito, se concluir pela inaptidão do magistrado, mas pela possibilidade da sua permanência na função pública, podem, a requerimento do interessado, substituir-se as penas de aposentação compulsiva ou demissão pela de exoneração.
4 - No caso previsto no número anterior, o processo, acompanhado de parecer fundamentado, e enviado ao Ministério da Justiça para efeito de homologação e colocação do interessado em lugar adequado as suas aptidões.
5 - A homologação do parecer pelo Ministro da Justiça habilita o interessado para ingresso em lugar compatível dos serviços dependentes do Ministério.”

Artigo113.º
Elementos a considerar
1 - Nas classificações são considerados os resultados de inspecções anteriores, inquéritos, sindicâncias ou processos disciplinares, tempo de serviço, relatórios anuais e quaisquer elementos complementares que estejam na posse do Conselho Superior do Ministério Público.
2 - São igualmente tidos em conta o volume de serviço a cargo do magistrado, as condições de trabalho, e quanto aos magistrados com menos de cinco anos de exercício, a circunstância de o serviço inspeccionado ter sido prestado em comarca ou lugar de acesso.
3 - O magistrado é obrigatoriamente ouvido sobre o relatório da inspecção e pode fornecer os elementos que entender convenientes.
4 - As considerações que o inspector eventualmente produza sobre a resposta do inspeccionado não podem referir factos novos que o desfavoreçam e delas dar-se-á conhecimento ao inspeccionado.

Regulamento de Inspecções do Ministério Público:
«Artigo 13.º
Parâmetros de avaliação
1 - A inspecção que apreciar o serviço e mérito do magistrado deverá atender a sua capacidade para o exercício da profissão, a sua preparação técnica e a adaptação ao serviço inspeccionado.
2 - A capacidade para o exercício da profissão será aferida tomando em consideração, de entre outros, os seguintes factores:
a) Urbanidade;
b) Imparcialidade e isenção;
c) Bom senso, maturidade e sentido de justiça;
d) Relacionamento com os demais operadores judiciários;
e) Capacidade de articulação funcional com os órgãos de política criminal e demais entidades coadjuvantes;
f) Atendimento ao público.
3 – A análise da preparação técnica incidirá, nomeadamente, sobre:
a) Capacidade intelectual;
b) Modo de desempenho da função, nomeadamente em audiência;
c) Capacidade de recolha e apreciação da matéria de facto;
d) Qualidade técnico-jurídica do trabalho inspeccionado;
e) Trabalhos jurídicos apresentados.
4 - Na adaptação ao serviço serão tidos em conta, entre outros, os seguintes aspectos:
a) Condições de trabalho;
b) Volume e complexidade do serviço;
c) Produtividade e eficiência;
d) Organização, gestão e método;
e) Pontualidade no cumprimento e presença aos actos agendados;
f) Zelo e dedicação.
5 - Na avaliação aos magistrados com funções de chefia serão, ainda, apreciados os seguintes elementos;
a) Qualidade de chefia;
b) Eficiência na direcção, coordenação, orientação e fiscalização das funções do Ministério Público;
c) Nível de intervenção processual de cariz hierárquico.”

Artigo 20.º
Critérios classificativos
As classificações são atribuídas aos magistrados de acordo com os seguintes critérios;
a) A de Muito bom a quem revele elevado mérito no exercício do cargo;
b) A de Bom com distinção a quem demonstre qualidades que transcendam o normal exercício de funções;
c) A de Bom a quem cumpra de modo cabal e efectivo as obrigações do cargo;
d) A de Suficiente a quem tenha um desempenho funcional apenas satisfatório;
e) A de Medíocre aquém do satisfatório.”

i) Da falta de valoração da prova apresentada pela Autora
Neste aspecto alega a Autora que o CSMP devia ter valorado as circunstâncias quer profissionais, quer pessoais que rodearam o seu desempenho profissional no período abrangido pelo período inspectivo, visto terem-se reflectido significativamente no exercício das suas funções.
Refere-se, por um lado, aos seus problemas de saúde, e, por outro, ao facto de o Senhor Juiz com quem trabalhou no ……….º Juízo do ………de ……… prolongar demasiadamente as audiências de julgamento. Circunstâncias estas que, em seu entender, foram desvalorizadas quando não o podiam ter sido.
Diz ainda a Autora que as anomalias no seu desempenho funcional «em causa no processo inspectivo não representam, ao contrário do referido pelo Senhor Inspector no Relatório Final (que mereceu adesão total no Acórdão da 2.ª Secção de Classificações do CSMP, confirmado pelo Acórdão impugnado, de 28.04.2015), qualquer “desinteresse e alheamento com os valores que, como magistrada do Ministério Público, lhe cabe acautelar” nem tão pouco qualquer “incapacidade para o exercício do cargo”», «devendo, antes, as mesmas ser entendidas e devidamente valoradas, no quadro conjuntural em que a Autora exerceu as suas funções no período inspeccionado, designadamente no …….. de ……….», e que as ausências ocorreram por motivos de saúde não previsíveis no próprio dia (conclusões I, J e K).
E que os atrasos na tramitação dos processos deveriam igualmente “ter sido inseridos no quadro conjuntural das condições em que exerceu as suas funções no ……...º Juízo do ……….de ………., bem como no quadro de doença que a afectou”, não demonstrando qualquer “desinteresse ou alheamento” ou “qualquer incapacidade para o exercício do cargo” (conclusões M, N e O).
No que se refere ao aspecto qualitativo do desempenho funcional da Autora considera que não poderão deixar de ser tidos em conta todos os factores positivos, o que não se tendo verificado determina que o acórdão impugnado tenha incorrido em erro manifesto de apreciação, sendo por isso ilegal (conclusões V. a DD).

Vejamos.
Basta compulsar o Relatório nas suas págs. 13/14, 16 a 19, 44 e ss., 58 e ss. e 76 a 80, para se ver que os elementos respeitantes à saúde da Autora e à conjuntura de trabalho (nomeadamente duração das diligências de julgamento) foram valorados pelo Senhor Inspector, como o foram também no acórdão da 2ª Secção (cfr. págs. 13 e 14) e no acórdão impugnado (cfr. nº 8 do probatório, pontos 2. e 3. da “Fundamentação”).
No acórdão da 2ª Secção de Classificações diz-se a este propósito (após se fazer uma descrição circunstanciada da alegação da aqui A. – págs. 11 a 13 v), o seguinte: “3. Em resposta detalhada às críticas feitas pela inspecionada ao Relatório, o Senhor Inspetor acrescentou continuar a entender que a Magistrada inspecionada não teve uma prestação funcional, que justifique, em circunstância alguma, classificação superior à de Medíocre, nada havendo, assim, a alterar, quer, relativamente aos pressupostos, quer relativamente à classificação proposta e podendo mesmo dizer-se que a resposta, pelos seus diversos erros e pela falta de atenção e cuidado que revela na sua elaboração, é bem sugestiva da correção da mesma classificação”.
Igualmente o acórdão impugnado faz referência no já assinalado ponto 2. a esta matéria (transcrito no nº 8 do probatório), pelo que dúvidas não há de que o acto impugnado contém uma fundamentação suficiente sobre esta matéria em si mesmo e por remissão para o acórdão da Secção e Relatório de Inspecção.
E no ponto 3. do mesmo acórdão diz-se o seguinte:
«Quanto às condições que envolveram o exercício profissional da I. diga-se que a inspecção ressalvou os períodos em que esteve ausente ao serviço, justificadamente, por doença.
Face aos atrasos e omissões detectados no desempenho da I. a hierarquia imediata interveio, através de várias ordens de serviço. Foi substituída por colegas nas tarefas que lhe estavam atribuídas e que não fez nos períodos em que esteve ao serviço. Como realça o RI., algumas dessas tarefas chegaram a ser assumidas por magistrada estagiária, que as desempenhou com desenvoltura.
Sempre a hierarquia levou em linha de conta as limitações da I. na distribuição de serviço. Apesar disso não teve capacidade de resposta à altura, conforme também demonstra o despacho, com atrasos relevantes, dos 33 inquéritos crime que lhe foram inicialmente distribuídos.
Ou seja, as circunstâncias invocadas pela Autora tanto pessoais como funcionais foram ponderadas, não lhes foi dada, no entanto, a relevância que a Autora pretende para lhe ser atribuída diferente classificação, face ao seu desempenho extremamente negativo.
Também as ausências ao serviço justificadas foram ponderadas pelo Senhor Inspector, conforme a própria Autora reconhece (cfr. arts. 40º, 44º, 47º e 48º da petição), só que foram igualmente tidas em conta, como não podia deixar de ser, outras ausências em que a Autora não apresentou justificação.
Assim, no acórdão impugnado, por referência ao Relatório são estas referidas nos seguintes termos: «No RI. são referenciadas situações de ausências em dias de turno, nem todas justificadas, quase sempre só participadas por intervenção do Exº Procurador Coordenador. Registada a falta de assiduidade e pontualidade às diligências do Tribunal de ………..»
Com efeito, resulta dos elementos recolhidos no processo de inspecção e constantes do Relatório que a Autora muitas vezes não comunicava previamente as ausências, designadamente em dias de turno, só o fazendo após intervenção do Senhor Procurador Coordenador, em consequência do conhecimento por ele das mesmas, através dos Magistrados substitutos, em conformidade com o determinado na acta de reunião nº 4/2013. O mesmo se verificando no Tribunal de ………….., nos termos constantes no Relatório a págs. 61 a 64. O que obsta a que se possa concluir, como o faz a Autora na conclusão AA., de que naquele Tribunal, a partir de Fevereiro de 2014 “desempenhou sem quaisquer sobressaltos a representação do Ministério Público”.
Também os atrasos na tramitação dos processos que a Autora tinha a seu cargo, e que foram indicados no Relatório com grande minúcia, não encontram justificação nas circunstâncias que a Autora invoca.
Com efeito, no Relatório a fls. 65 a 76 faz-se referência ao volume e complexidade do serviço que nos diversos períodos temporais aí indicados esteve a cargo da Autora, indicando-se a fls. 80 e ss. a resposta ao volume de serviço nos referidos períodos, detectando-se inúmeros atrasos, alguns com consequências gravosas.
É o que claramente flui do acórdão impugnado ao fazer sobre esta matéria a seguinte explicitação:
« Atrasos
Foram verificados pela inspecção, nos processos do …….º. Juízo do Tribunal de …………, sem promoção da I. ou com promoção lavrada mais de 30 dias depois da abertura do respectivo termo, 471 situações de atrasos, no período de 3.9.2012 a 1.9.2013, em que exerceu funções naquele tribunal.
Situações a que acresceram: - os dos 5 processos respeitantes ao não cumprimento atempado do artigo 62º., nº. 1, do Dec. Lei nº. 433/82, de 27 de Outubro; - os dos 26 processos a aguardarem a elaboração do requerimento executivo; - os dos 90 processos do …….º. Juízo da …… a aguardarem a intervenção da I. - os dos 6 inquéritos a aguardarem despacho; e as das 5 notícias criminais a aguardarem a sua tomada de posição com vista aos ulteriores termos processuais.
Verifica-se, assim, que os casos de atraso (superiores a 30 dias) detectados foram de 602
Todos estes atrasos determinaram medidas tendentes a eliminá-los e a evitar a ocorrência de situações idênticas envolvendo a colaboração e esforço de outros magistrados, como é costume em situações desta natureza.
Os atrasos tiveram, entre outros, consequências ao nível do próprio processamento.
Em 4 de Setembro de 2013, 3 dias depois de a I. ter deixado de exercer funções no Tribunal de ………., foram encontrados no seu gabinete, por despachar, 48 conjuntos de diversos documentos registados como inquéritos, mas (apenas) destinados ao mero encaminhamento para julgamento em processo sumário. Entre eles, notícias criminais autuadas cerca de 4 ou 3 meses antes, mais precisamente em 20 e 24 de Maio, 3, 4, 17 e 20 de Junho e envolvendo situações de condução sem habilitação legal, condução sol a influência do álcool ou injúria agravada em função da qualidade do agente. As omissões da I. determinaram a impossibilidade de julgamento em Processo Sumário.».
Também relativamente ao seu desempenho em termos qualitativos os elementos recolhidos no Relatório não têm qualquer correspondência com a sua alegação de que o seu desempenho deveria ter sido ponderado mais favoravelmente.
Tal como se diz no acórdão impugnado quanto ao desempenho da Autora em termos qualitativos:
«No aspecto qualitativo insuficiências de vária ordem transparecem de todos os elementos recolhidos, justificando-se a apreciação a propósito registada pelo Exº Inspector no RI.: «Efectivamente, apesar de ter desempenhado as suas funções num dos sectores mais fáceis da acção do Ministério Público, concretamente, no Tribunal de ……….., o seu trabalho, quando teve lugar, pecou, em geral, pela análise superficial das questões pela aquilatação indevida de outras e, em boa parte dos casos, pela falta de qualidade ou rigor técnicos. Esta falta de qualidade ou rigor, não obstante o pouco grau de dificuldade do escasso número de inquéritos em que, em período anterior, foi chamada a intervir durante um (outro) ano e, posteriormente, durante o referido desempenho, verificou-se igualmente no despacho deles...»,
Ora, numa inspecção de serviço efectuada a um Magistrado a apreciação tem que evidenciar o que de bom e menos bom se apura. O que se verifica no caso presente é que o negativo evidenciado é manifestamente superior aos pontos positivos também referenciados no Relatório.
Assim, tendo em atenção o desempenho da Autora, circunstanciadamente descrito no Relatório de Inspecção, improcede o invocado erro manifesto na apreciação do desempenho funcional da Autora, do acórdão do Plenário (ao confirmar o acórdão da 2ª Secção), ao haver entendido que a Autora revela “incapacidade para o cargo”, e por não ter valorado a prova por esta apresentada (a qual foi valorada).

ii) Da violação do princípio da proporcionalidade
Defende a Autora que a classificação de Medíocre que lhe foi atribuída é ilegal por violação do princípio da proporcionalidade (art. 266º, nº 2 da CRP e art. 7º do CPA), sendo manifestamente excessiva, desadequada e desproporcional face ao desempenho funcional da Autora, devendo a mesma ser substituída.
O Acórdão do Plenário do CSMP de 28.04.2015 aqui impugnado indeferiu a reclamação da Autora e confirmou o acórdão da 2ª Secção de Classificações do CSMP, de 10.03.2015, referindo nos pontos 8 e 9:
«Integrando o desempenho funcional da Procuradora-Adjunta A……….., demonstrado no acervo de elementos do processo inspectivo, neste quadro jurídico, impõe-se concluir que a magistrada não interiorizou a necessidade de assumir os níveis de responsabilidade mínimos necessários ao exercício de funções de magistrada do Ministério Público.
9. Apesar dos alertas decorrentes dos processos inspectivos e disciplinares anteriores, a I. claramente desaproveitou as oportunidades que lhe foram sendo concedidas Manifesta desinteresse e alheamento com os valores que, como magistrada do Ministério Público, lhe cabe acautelar. Tem um desempenho reiterado caracterizado por índices quantitativos e qualitativos claramente insatisfatórios. Manifesta incapacidade para o exercício do cargo.»
E, consequentemente, delibera:
«Sopesados os muitos elementos disponíveis que caracterizam o seu desempenho, delibera-se indeferir a reclamação apresentada, confirmar o Acórdão da 2.ª Secção Classificativa deste CSMP e atribuir à Procuradora-Adjunta A………….. a classificação de “MEDÍOCRE”.
Mais se delibera, nos termos do artº 110º nº 2 do Estatuto do Ministério Público, a suspensão imediata do exercício de funções e a instauração de inquérito por inaptidão.»
Resulta do exposto que a Deliberação impugnada se fundou no acórdão da 2ª Secção que confirma e que, por sua vez, teve em conta o Relatório de Inspecção, cujos fundamentos adoptou, nos termos do art. 30º, nº 7 do EMP.
Considerou este Acórdão que «tendo em conta a forma como se pautou a sua conduta nos vários tribunais e em períodos distintos, sendo de sopesar as muito graves falhas apontadas ao seu desempenho em inquérito, qualitativamente muito negativo, bem como as condutas deontológicamente censuráveis por si adoptadas enquanto desempenhou funções no ………., que se espera não mais sejam repetidas no futuro profissional da magistrada», devia ser atribuída a classificação de MEDÍOCRE.
Considerou-se igualmente as anteriores classificações, a primeira de suficiente e a segunda de medíocre, na sequência da qual esteve suspensa de 13.10.2008 a 31.08.2009 e veio a cumprir a pena de 2 anos de inactividade, aplicada por Acórdão de 16.04.2009 (cfr. págs. 14 e 15 do acórdão) e a «(…) falta de qualidade ou rigor, não obstante o pouco grau de dificuldade do escasso número de inquéritos em que, em período anterior, foi chamada a intervir durante um (outro) ano e, posteriormente, durante o referido desempenho, verificou-se igualmente no despacho deles, despacho, por vezes, efectuado com o recurso a considerações tecidas por uma outra Colega.(…)
Daí que, como o Exmo. Sr. Procurador Coordenador, não se possa deixar de concluir que a Inspeccionada, a par de uma “manifesta incapacidade para acompanhar a dinâmica específica do trabalho quotidiano”, revelou um elevado “nível deficitário de produtividade/eficiência no exercício das (…) funções, demonstrando não estar plenamente integrada” nelas» (cfr. pág. 16 do acórdão).
Ora, face ao que consta da fundamentação do acórdão impugnado e do acórdão da Secção e Relatório de Inspecção, e, tudo o que já se deixou dito supra, tendo em conta todos os elementos constantes do Relatório de Inspecção que atestam um desempenho funcional claramente insuficiente, ao qual acrescem faltas de assiduidade, ausências ao serviço sem comunicação prévia e atrasos inaceitáveis na tramitação dos processos, não pode deixar de se concluir que a prestação funcional da Autora deve ser classificada de Medíocre, de acordo com a previsão do art. 20º, al. e) do RIMP, tal como o fez o acórdão impugnado. Isto é, foram correctamente valorados os elementos a considerar, de acordo com o disposto no art. 113º do EMP, não tendo sido violado o princípio da proporcionalidade.
Ora, conforme a Autora reconhece, de acordo com o disposto no art. 110º, nº 2 do EMP, a classificação de Medíocre implica a suspensão do exercício de funções e a instauração de inquérito por inaptidão para esse exercício.
No entanto, as considerações que tece nas conclusões GG. a OO., sobre prejuízos que sofrerá com tais consequências previstas na lei, são irrelevantes para a validade do acto impugnado, não a pondo em causa. Como também não interfere com a classificação aqui em causa, e as consequências automática que esta implica, a existência de uma providência cautelar na qual foi suspensa a eficácia de uma outra deliberação do Plenário do CSMP que aplicou à Autora uma pena disciplinar de aposentação compulsiva. São procedimentos distintos, o aqui em causa de cariz classificativo do serviço prestado, e o segundo com natureza disciplinar, não tendo qualquer interferência o deferimento de um pedido de suspensão de eficácia referente a este, nas consequências que a lei atribui à classificação prevista na alínea e) do art. 20º do RIPM.
Improcede, consequentemente, a acção, por o acto impugnado não padecer dos vícios que lhe são assacados.

Pelo exposto, acordam em julgar improcedente a acção.
Custas pela Autora.

Lisboa, 3 de Maio de 2018. – Teresa Maria Sena Ferreira de Sousa (relatora) – José Francisco Fonseca da Paz – Maria do Céu Dias Rosa das Neves.