Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01198/15
Data do Acordão:05/03/2018
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:ANA PAULA PORTELA
Descritores:ACÇÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL
Sumário:
Nº Convencional:JSTA000P23257
Nº do Documento:SA12018050301198
Data de Entrada:11/13/2015
Recorrente:IFAP - INSTITUTO DE FINANCIAMENTO DA AGRICULTURA E PESCAS, IP
Recorrido 1:A... LDA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo
I. RELATÓRIO

1. A…………. instaurou, no TAF de Viseu, acção administrativa especial de pretensão conexa com actos administrativos, contra o IFAP - INSTITUTO DE FINANCIAMENTO DA AGRICULTURA E PESCAS, IP., impugnando a Decisão do seu Presidente, que determinou a modificação unilateral do Contrato de Atribuição de Ajuda ao abrigo dos Programas Operacionais de Âmbito Regional, invocando a exceção de prescrição da dívida alegada e requerendo a declaração de nulidade do acto impugnado ou se assim não se entender a anulação do mesmo.

2. Por Acórdão de 24.7.2014, o TAF de Viseu julgou a acção procedente, com fundamento na prescrição da dívida resultante de quantias recebidas indevidamente, “... anulando o acto impugnado, consubstanciado na decisão final de reposição de montante de EUR 29.927,87, acrescida de juros legais, num total do EUR 43.197,80 ...

3. Notificado deste acórdão, o IFAP, inconformado, dele interpôs recurso para o TCAN.

4. Sobre este recurso, o Acórdão do TCAN, em 24.4.2015, confirmou a decisão do TAF de Viseu.

5. O IFAP interpõe recurso de revista para este STA, ao abrigo do art. 150º CPTA, do identificado acórdão proferido em 24.10.2015, pelo TCAN, concluindo as suas alegações da seguinte forma:

“A. o presente recurso vem interposto de acórdão proferido em 24/04/2015, através do qual, entendeu o Tribunal a quo, que o ato impugnado desrespeitou as regras de prescrição previstas no artigo 3° do Regulamento (CE, EURATOM), nº 2988/95, fundamentando a sua decisão à luz da jurisprudência constante de Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 8/10/2014, proferido no âmbito do Processo nº 0398/12, após pronúncia do TJUE através de acórdão de 17/09/2014 no âmbito do Processo nº C-341/13, onde consta o entendimento que os atos de concessão de ajudas financeiras ilegais só podem ser revogados no prazo de quatro anos a contar da data em que foi praticada a irregularidade.

B. O presente recurso, salvo melhor opinião, preenche os requisitos de admissibilidade previstos no artigo 150° do CPTA, pelo que deve ser admitido, para uma melhor aplicação do Direito, pois a interpretação do Tribunal a quo sobre a prescrição do procedimento, manifestamente viola o teor da segunda parte do segundo parágrafo do artigo 3º do Regulamento (CE, EURATOM) nº 2988/95, porque a medida Agricultura e Desenvolvimento Rural dos PO Regionais (designada por medida AGRIS), é uma ajuda ao investimento paga no âmbito de um programa plurianual.

C. Por outro lado, a admissão do presente recurso assume a maior relevância jurídica pois a controvérsia acarretada a entendimento, é suscetível de extravasar os limites da situação singular em apreço, como aliás já sucede, pois tem-se assistido a uma aplicação indiscriminada pelos Tribunais, da mais recente jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo sobre a regra da prescrição (num acórdão em que é analisada uma ajuda direta), sem atender à natureza específica das ajudas ao investimento (como a dos presentes autos).

D. O recurso de revista revela-se também da maior utilidade jurídica, na medida em que, a posição a adotar por este Venerando Tribunal irá assumir um ponto obrigatório de referência, que servirá de linha orientadora para os demais casos análogos, na medida em que irá esclarecer os exatos termos em que será aplicável o disposto no artigo 3º do Regulamento nº 2988/95, no âmbito de ajudas ao investimento, pagas no âmbito de programas plurianuais.

E. Salvo melhor entendimento, na situação em apreço nos autos, o Tribunal a quo não parece ter feito uma correta aplicação do direito, pois a ajuda em apreço nos autos é uma ajuda ao investimento paga ao abrigo da Subação 7.2 – Conservação do Ambiente e dos Recursos Naturais da medida Agricultura e Desenvolvimento Rural dos PO Regionais (AGRIS), que se encontra regulado pelo Regulamento (CE) nº 1257/99, do Conselho, de 17 de maio, pelo Decreto-Lei nº 163-A/2000, de 27 de julho e pela Portaria nº 48/2001, de 26 de janeiro, logo, com natureza distinta, da ajuda direta analisada pelo Acórdão do STA de 8/10/2014, proferida no âmbito do Proc. nº 0398/12 (que serve de fundamento para o acórdão recorrido).

F. O ato impugnado não desrespeitou as regras de prescrição previstas no artigo 3º do Regulamento (CE, EURATOM), nº 2988/95, uma vez que a Medida AGRIS, enquanto programa plurianual, ou enquanto integrado num programa plurianual, ainda estava em vigor aquando da notificação da decisão final impugnada nos presentes autos.

G. Nos termos do artigo 3° do Regulamento (CE, EURATOM), nº 2988/95, é expressamente prevista uma exceção/derrogação à regra geral da prescrição do procedimento (quatro anos a contar da prática da irregularidade), estipulando-se que havendo um programa plurianual o prazo de prescrição corre até ao encerramento do programa e recorde-se que apenas foi encerrado no dia 20 de dezembro de 2013, através de decisão da Comissão Europeia.

H. Dada a complexidade da situação em apreço, cabendo a interpretação do direito comunitário ao Tribunal de Justiça da União Europeia, subsistindo dúvidas quanto à correta aplicação da norma do Regulamento (CE) nº 1260/1999 (programa plurianual), requer o recorrente que sejam colocadas a esse Tribunal em sede de reenvio prejudicial, as seguintes questões:

i. A medida Agricultura e Desenvolvimento Rural dos PO Regionais (designada por medida AGRIS), deve ser considerada um «programa plurianual» na aceção do artigo 14º do Regulamento (CE) nº 1260/1999 do Conselho, de 21 de Junho de 1999?

ii. Deverá a Medida AGRIS ser considerada como programa plurianual para efeitos de aplicação do disposto na 2ª parte do 2º parágrafo do nº 1 do artº 3º do Regulamento (CE, EURATOM) nº 2988/95 (segundo o qual “O prazo de prescrição no que se refere aos programas plurianuais corre em todo o caso até ao encerramento definitivo do programa”)?

iii. Sendo a Medida AGRlS considerada um «programa plurianual» para efeitos de aplicação do disposto na 2ª parte do 2º parágrafo do nº 1 do Artº 3º do Regulamento (CE, EURATOM) nº 2988/95,

□ a prescrição dos procedimentos administrativos abertos no seu âmbito está sujeita ao prazo de 4 anos prescrito no nº 1 do artigo 3º?

ou

□ ao prazo previsto na 2ª parte do 2º parágrafo do nº 1 do artº 3º do Regulamento (CE, EURATOM) nº 2988/95, ou seja: “até ao encerramento definitivo do programa” [plurianual]?

iv. A Medida AGRIS, enquanto programa plurianual, encontra-se encerrada desde o dia 20 de dezembro de 2013 (conforme notificação remetida pela Comissão Europeia ao IFAP, I.P., em 16 de janeiro de 2014)?

I. Concluindo-se que a ajuda em causa nos presentes se enquadra num programa PLURIANUAL, que não se encontrava encerrado, então e quanto à prescrição do procedimento teremos que aplicar o segundo parágrafo, segunda parte do artigo 3, nº 1 do Regulamento (CE, Euratom) nº 2988/95 do Conselho, de 18 de dezembro, que refere “O prazo de prescrição no que se refere aos programas plurianuais corre em todo o caso até ao encerramento definitivo do programa.”.

J. Face ao exposto temos que o acórdão do Tribunal a quo não fez uma correta interpretação dos factos e da legislação aplicável ao caso, em clara violação do disposto nos artigos 8º e 9º do Código Civil e do disposto no 2º parágrafo do nº 1 do artigo 3º do Regulamento (CE, Euratom) nº 2988/95 do Conselho, pelo que, deve o presente recurso ser julgado procedente por provado e em consequência ser proferido acórdão revogando o acórdão ora impugnado.

Nestes termos e nos mais de direito, sempre com o douto suprimento de V. Exas., deve o presente recurso ser admitido e julgado procedente por provado e em consequência ser proferido acórdão revogando a decisão recorrida, considerando-se válida a decisão final proferida pelo IFAP-IP, o qual deverá ser objeto de reenvio prejudicial ao Tribunal da Justiça da União Europeia, com todas as legais consequências, assim se fazendo ...”

5.1. A fls 359 a autora identifica as questões a serem suscitadas perante o Tribunal de Justiça da União Europeia.

6. A…………., LDA. conclui as suas alegações da seguinte forma:

“a. A matéria sub judice nestes Autos foi objecto do Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo nº1/2015, Processo 173/13, Pleno da 1ª Secção de 26-02-2015 o qual,

b. Em resposta a recurso interposto para efeito de fixação de jurisprudência conclui que o prazo de prescrição para a reposição de quantias indevidamente recebidas é fixado em quatro anos, contados da data da prática dos factos imputados ao infractor.

c. Tal conclusão resulta da aplicação na ordem jurídica interna do disposto no artigo 3º, nº1, do Reg. nº 2988/95, dado não existir qualquer norma na legislação nacional que preveja a aplicação de prazo superior.

d. Tal conclusão decorre também do entendimento que tem sido sufragado pelo Tribunal de Justiça da União Europeia, com destaque para o Acórdão de 17-09-2014, o qual concluiu de forma inequívoca que:

· Não existe na ordem jurídica nacional qualquer norma aplicável que preveja um prazo de prescrição superior a quatro anos.

· O legislador europeu definiu uma regra geral de prescrição reduzindo/fixando para quatro anos o período para as autoridades dos estados membros recuperarem as quantias indevidamente recebidas.

· A Administração tem um dever geral de diligência na verificação da regularidade dos pagamentos que efectua em obediência ao dever imposto pelo artigo 4º, nº3 do Regulamento.

· Não existindo na legislação nacional prazo de prescrição mais longo do que o previsto no artigo 3º, nº1 Reg., é o prazo de quatro anos previsto neste normativo que se deverá aplicar.

· O qual deverá ser contado a partir da data em que a eventual irregularidade foi praticada.

e. Nesta circunstância, face a posição ora dominante de conformidade da legislação e jurisprudência nacional com a europeia, a questão a dirimir neste recurso não apresenta relevância ou importância jurídica necessária a uma melhor aplicação de direito.

f. Sendo certo que, a matéria em causa, não oferece neste momento qualquer controvérsia jurídica que justifique a sua reapreciação de forma a garantir uma decisão mais justa e / ou equilibrada face aos interesses e regulamentos em causa.

g. O mesmo se podendo concluir da exigível relevância social do presente recurso, face ao seu âmbito restrito aos intervenientes da decisão que vier a ser proferida, sem qualquer consequência para terceiros ou com estes relacionados.

h. Circunstâncias que deverão justificar a não admissão do presente recurso, por não estarem verificados os requisitos legalmente exigíveis pelo artigo 150º, nº1 CPTA para admissão do recurso de revista.

i. Acresce que, sem prescindir, também se dirá conforme melhor consta do douto Ac. proferido pelo Tribunal “a quo”, a irregularidade imputada à recorrida, ter-se-á consubstanciado com a apresentação/entrega da candidatura com inclusão de despesas que o recorrente então considerou não elegíveis.

j. Entrega que se traduziu num único acto o qual coincidiu com a apresentação do projecto que ocorreu em 16-04-2001.

k. Não tendo sido praticado por parte da recorrida, no âmbito do projecto de candidatura em causa, qualquer acto, por acção ou omissão, além ou posterior àquele.

I. O que permite concluir da justeza da decisão proferida pelo Tribunal “a quo”, que não considerou a irregularidade imputada à recorrida como “continuada” ou “repetida”, dado tratar-se de um acto único.

m. Quanto ao requerido reenvio prejudicial deverá o mesmo ser indeferido, face ao douto acórdão de fixação de jurisprudência referido em a) e seguintes, o qual se pronunciou em conformidade com o que sobre esta matéria tem sido legislação e jurisprudência dominante do TJUE, não apresentando por isso a matéria em causa qualquer controvérsia a necessitar de clarificação sobre o seu alcance ou âmbito de aplicação ...”

7. A revista foi admitida em 20.10.2015, por acórdão proferido pela Formação deste STA a que alude o nº 5 do artº 150º do CPTA, donde se extrai:

“(...) No presente recurso discute-se se o caso se identifica com aqueles que foram apreciados na referida jurisprudência deste Supremo, ou se do disposto no segundo parágrafo do referido art.º 3.º, n.º 1, do Regulamento n.º 2988/95 – “o prazo de prescrição no que se refere aos programas plurianuais corre em todo o caso até ao encerramento definitivo do programa” – resulta uma solução diferente quanto ao prazo de prescrição do direito de exigir a restituição de ajudas comunitárias que lhe seja aplicável.

Trata-se de uma questão de alcance geral, susceptível de colocar-se repetidamente perante situações do tipo da presente e cuja apreciação não parece esgotada, na perspectiva agora apresentada pela recorrente, pela jurisprudência de que o acórdão recorrido se serviu.

Assim, por se tratar de uma questão jurídica de importância fundamental, justifica-se a admissão do recurso excepcional de revista.”

8. Notificado o EMMP, ao abrigo dos art.º 146º, 1, CPTA, foi emitido parecer donde se extrai:

“(…) Mostra-se pacífica a pronúncia de que a irregularidade que suscitou a determinação da reposição, traduzindo-se num único ato de apresentação de despesas não elegíveis, não é uma irregularidade continuada ou repetida.

Ora, o prazo previsto na segunda parte do 1º parágrafo do nº 1 daquele art.º 3º é de natureza excecional, reportando-se às irregularidades continuadas ou repetidas, não sendo aplicável às irregularidades, de natureza diferente, consubstanciadas num só ato.

Por outro lado, é o facto de a irregularidade se traduzir numa pluralidade de atos ou omissões que violem a mesma disposição de direito comunitário, durante um período de tempo mais longo de execução do programa, que justificará o alargamento do prazo da prescrição “até ao encerramento definitivo do programa”, no caso de programas plurianuais, aparentemente em razão do seu maior impacto e da maior dificuldade de deteção e controlo dessa prolongada plúrima violação.

Já no que concerne às irregularidades únicas não se vislumbra razão para um alargamento dos prazos previstos de prescrição do procedimento: as condições de exercício do direito à reposição dos montantes indevidamente recebidos prefiguram-se como essencialmente idênticas, quer se trate de programas plurianuais ou não.

Sendo certo que a irregularidade imputada à ora recorrida é uma irregularidade instantânea, não lhe é aplicável o prazo de prescrição previsto na segunda parte do parágrafo 1º do nº 1 do art.3º do Regulamento (CE EURATOM) nº 2988/95, mas o prazo de quatro anos previsto no corpo do mesmo nº 1, como bem decidiu o douto acórdão recorrido.

9. Notificado deste parecer veio o IFAP responder, invocando o art. 146º, nº 2, CPTA, fls. 430/5.

10. A instância foi suspensa nos termos do despacho de fls 463 verso por já ter sido suscitado no processo 912.15 deste STA o reenvio prejudicial.

11. Dá-se aqui por reproduzida a decisão do Tribunal de Justiça, entretanto junta aos autos de fls 467 a 478.

12. Cumpre decidir, tendo os autos já ido a vistos.


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II. FUNDAMENTAÇÃO

O Tribunal recorrido considerou a seguinte factualidade, que se dá aqui por reproduzida.

“1) A sociedade ora A. foi constituída em 1979 tendo designadamente, como objeto, a exploração dum lagar de azeite sito em ………, freguesia de ………, concelho de Viseu, ……….., que labora há mais de 50 anos – cfr. doc. n.º 2 junto com a petição inicial.

2) Em 29.12.1999, no âmbito da “Medida 5 - Transformação e Comercialização de Produtos Agrícolas e Silvícolas, Ação 5.1, Regulamento (CE) 951/97”, a A. entregou no Serviço Regional de Viseu do, então, IFADAP, um processo de candidatura para a instalação de sistemas de tratamento de águas ruças do lagar de azeite da sua exploração, a que foi dado o número de entrada 4792 - cfr. doc. n.º 3 junto com a petição inicial e pa.

3) Por ofício de 11.01.2000, dirigido à A., o IFADAP solicitou a apresentação de elementos diversos. - doc. n.º 4 junto com a petição inicial e pa.

4) Por carta de 20.01.2000, dirigida à Direcção Regional de Viseu do IFADAP a A. enviou todos os elementos solicitados, com excepção de 3, entregues posteriormente.

- cfr. doc.s n.ºs 5 e 6 juntos com a petição inicial.

5) Por ofício de 26.01.2000, o IFADAP acusou a recepção do Projecto tendo-lhe sido atribuído o n.º 1999.33.0056955, com o seguinte teor:

Este recebimento não representa o reconhecimento imediato de uma total e correcta formalização do projecto uma vez que esta candidatura não tem possibilidade de ser aprovada no âmbito do QCA II que termina a 31 de Dezembro de 1999.

No entanto, informa-se que a candidatura de V. Exa (s) poderá transitar para o próximo Quadro Comunitário de Apoio (QCA III), submetendo-se, contudo às regras de enquadramento que entretanto forem estabelecidas e que oportunamente serão publicitadas.” – cfr. doc. n.º 7 junto com a petição inicial.

6) Por ofício de 10.10.2000 do IFADAP, foi a A. informada da possibilidade de transição da candidatura por si anteriormente apresentada para a Medida 2 do Programa Agro - cfr. doc. n.º 8 junto com a petição inicial.

7) A A…………, LDA., ora A., apresentou, em 16/04/2001, projecto de investimento que recebeu no ex-IFADAP o nº 2001300015755 e candidatou-se a subsídio atribuído ao abrigo do Programa AGRIS - Medida Agricultura e Desenvolvimento Rural, Acção 7: Valorização do Ambiente e do Património Rural, Subacção 7.2: Conservação do Ambiente e dos Recursos Naturais - Reg. (CE) n.º 1257/1999 – Art. 33.º § 5 (Co-financiado pelo FEOGA-Orientação) - cfr. documentos juntos ao PA a fls. 116 a 274.

8) Em 31.08.2001, através dum ofício da DRABL, foi a A. informada que o seu projecto tinha sido aprovado, nos termos e nas condições aí expressas, tendo-lhe sido atribuído o n.º 200.13.000.15.755 – cfr. doc. n.º 9 junto com a petição inicial e pa.

9) Por ofício de 23.10.2001 do IFADAP, foi remetido à ora A o contrato de atribuição de ajuda que veio a ser assinado em 08.11.2001 - cfr. doc.s nºs 10 e 11 juntos com a petição inicial e fls. 94 a 97 do pa.

10) Tendo em vista a execução do referido projeto foi concedido, à A., um incentivo financeiro ao investimento, sob a forma de subsídio não reembolsável no montante de EUR 29.927,87 (6.000.000$00), com início em 01/09/2001 e conclusão em 30/11/2001 (cfr. cláusulas 4ª e 8ª das cláusulas Específicas do Contrato Celebrado - cfr. fls. 93 a 97 do pa), cujo teor se considera integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.

11) Em 03.01.2002 a A. apresentou na DRABL o Pedido de Pagamento 1/2002 acompanhado de vários documentos, numerados de 1 a 9, respeitantes à construção da ETAR, que foram devidamente verificados, carimbados, datados e rubricados pelo Técnico responsável que os recebeu:

» Documento n.º 1

- Factura n.º 0068 de 03.12.2000, e Recibo n.º 081 de 10.12.2000, da ……….., Ld.ª, no valor de 1.203.000$00 [6.000,54€] (s/ IVA) / 1.407.510$00 [7.020,63€] (c/ IVA 17%), – (doc.s nºs 12 e 13);

» Documento n.º 2

- Facturas n.º 110 e 111, e Recibos nºs 110 e 111, de 28.12.2000, de ………., no valor total de 174.700$00 [871,40€] (s/ IVA) / de 204.399$00 [1.019,54€] (c/ IVA 17%) - (doc.s nºs 14, 15, 16 e 17);

» Documento n.º 3

- Facturas n.º 853, 857, 859, 862, todas de 16.10.2000, no valor individual 29.230$80 [145,80€] (s/ IVA) / de 34.200$00 [170,59 €] (c/ IVA 17%), e factura n.º 883, de 25.10.2000, no valor 21.709$40 [108,29€] (s/ IVA) / 25.400$00 [126,69 €] (c/ IVA 17%) e respectivo recibo n.º 20000402, de 02.11.2000, de ………. - (doc.s nºs 18, 19, 20, 21, 22 e 23);

» Documento n.º 4

- Venda a Dinheiro n.º 22862, de 30.11.2000, no valor 357.513$00 [1.783,27€] (s/ IVA) / 418.290$00 [2.086,42€] (c/ IVA 17%), de …………, Ld.ª – (doc. n.º 24);

» Documento n.º 5

- Venda a Dinheiro n.º 22742, de 24.11.2000, no valor 357.513$00 [1.783,27€] (s/ IVA) / 418.290$00 [2.086,42€] (c/ IVA 17%), de …………., Ld.ª – (doc. n.º 25);

» Documento n.º 6

- Venda a Dinheiro n.º 103638, de 28.10.2000, no valor 357.513$00 [1.783,27€] (s/ IVA) / 418.290$00 [2.086,42€] (c/ IVA 17%), de ………., Ld.ª (doc. n.º 26);

» Documento n.º 7

- Factura n° 213 e Factura n.º 214 de 22.12.2000 e Recibo 146 de 15.01.2001, de ……………., Ld.ª (doc.s n.ºs 27, 28 e 29);

» Documento n.º 8

- Factura n.º 25 e Recibo 25 de 30.12.2000, de …………., Ld.ª (doc. n.º 30 e 31);

» Documento n.º 9

- Factura n.º 554 e Recibo n.º 621, de 23.11.2000, no valor de 1.139.000$00 [5.681,31€] (s/ lVA) 7.839.000$00 [39.100,77] (c/ IVA 17%), da ……….., Ld.ª - doc.s nºs 32 e 33 e pa.

12) Em 28.01.2002, a DRABL por Ofício n.º 1374 de 30.01.2002, remeteu o referido Pedido de Pagamento ao IFADAP - cfr.doc. n.º 34 junto com a petição inicial.

13) Em Março de 2002, o valor correspondente à ajuda financeira, sob a forma de subsídio a que a Autora tinha direito nos termos do contrato assinado, foi creditado na sua conta. – cfr. doc. n.º 35 junto com a petição inicial.

14) Em 06/12/2006 foi efectuada uma inspecção ao lagar e no decurso dessa inspecção foram solicitados alguns documentos, uns foram facultados no momento, outros entregues por carta datada de 27.12.2006 e recebida em DRABL de Viseu em 03.01.2007 – cfr. doc. n.º 36 junto com a petição inicial.

15) Na sequência da acção de controlo realizada pelo Instituto ao projecto em apreço, no âmbito da certificação de despesa relativas aos 4º, 8º, 11º e 14º Pedidos de Pagamento de Reembolso, foram verificadas não conformidades no valor de 39.903,83€ - “Sendo a totalidade da despesa apresentada na facturação anterior à data de receção da candidatura (16.04.2001) e ocorrendo esta mais de 60 dias após a entrada em vigor da Portaria nº 48/2001, de 26 de Janeiro, não se verifica a elegibilidade temporal definida no artigo 32º deste normativo” (anexo 1) – cfr. fls. 24 a 41 do pa cujo teor se considera integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.

16) As conclusões do referido controlo foram comunicadas à A. através de ofício nº 102426, datado de 25/11/2011 – cfr. fls. 33 e 34 do pa, cujo teor se considera integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.

17) A A. foi notificada em sede de audiência prévia, através do ofício nº 102442, datado de 5/12/2011, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 100º e ss. do Código de Procedimento Administrativo (CPA), da intenção de, face às conclusões transmitidas pelo ofício 102426 de 25/11/2011, proceder à «reposição de 29.927,87€», com as consequências financeiras aí inerentes - cfr. fls. 41 do pa, cujo teor se considera integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.

18) Em resposta a A. alegou, em suma, que o “processo de candidatura para a execução e construção da ETAR foi apresentado em 29.12.1999” - fls. 42 a 48 do pa, cujo teor se considera integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.

19) A Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Centro, através da INF CTR/06/2012, considerou que «o teor do contraditório apresentado em nada altera a fundamentação da correção financeira proposta. Somos pois a manter as conclusões da auditoria efetuada pelo IFAP:

“Sendo a totalidade da despesa apresentada na faturação anterior à data de receção da candidatura (16/04/2001) e ocorrendo esta mais de 60 dias após a entrada em vigor da Portaria nº 48/2001, de 26 de Janeiro, não se verifica a elegibilidade temporal definida no artigo 32º deste normativo.

O beneficiário foi informado no ofício 83200.537/00, de 26/01/2000, do IFADAP, que “informa-se, que a candidatura de V. Exa (s) poderá transitar para o próximo Quadro Comunitário de Apoio (QCAIII), submetendo-se contudo às regras de enquadramento que entretanto forem estabelecidas e que oportunamente serão publicadas”.

Da cláusula 8ª do Contrato de Atribuição de Ajuda ao abrigo dos programas operacionais de âmbito regional (medida AGRIS), conta que “A execução material do projeto a que respeita o presente contrato deve ter início e deve terminar nas datas a seguir indicadas”

Data/início: 01/09/2001, Data/fim: 30/11/2001

(…) considerando-se a despesa no montante de 39.903,83 € como não elegível”. - cfr. fls. 24 a 48 do pa, cujo teor se considera integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.

20) De acordo com a decisão proferida pelo Gestor do PO Centro, e em conformidade com o disposto nos artigos 11º e 12º do Decreto-Lei nº 163-A/2000, de 27 de julho, o Instituto notificou a A. da decisão final, através do ofício nº 9576/2012, com registo de saída nº 08687/2012, de 11/05/2012, da decisão final de reposição do montante de EUR 29.927,87, acrescida de juros legais, num total de EUR 43.197,80 - cfr. doc. n.º 1 junto com a petição inicial e fls. 1, 12 e 13 do pa, cujo teor se considera integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.


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III. O DIREITO

1.Reenvio Prejudicial

Invoca o autor a fls 359 as seguintes questões a serem suscitadas perante o Tribunal de Justiça da União Europeia:

“Dada a complexidade da situação em apreço, cabendo a interpretação do direito comunitário ao Tribunal de Justiça da União Europeia, subsistindo dúvidas quanto à correta aplicação da norma do Regulamento (CE) nº 1260/1999 (programa plurianual), bem como do artigo 3º do Regulamento (CE, EURATOM) nº 2988/95 (prazo de prescrição do procedimento no âmbito de programas plurianuais), requer o recorrente que sejam colocadas a esse Tribunal em sede de reenvio prejudicial, as seguintes questões:

i. A medida Agricultura e Desenvolvimento Rural dos PO Regionais (designada por medida AGRIS), deve ser considerada um «programa plurianual» na aceção do artigo 14º do Regulamento (CE) nº 1260/1999 do Conselho, de 21 de Junho de 1999?

ii. Deverá a Medida AGRIS ser considerada como programa plurianual para efeitos de aplicação do disposto na 2ª parte do 2º parágrafo do nº 1 do artº 3º do Regulamento (CE, EURATOM) nº 2988/95 (segundo o qual “O prazo de prescrição no que se refere aos programas plurianuais corre em todo o caso até ao encerramento definitivo do programa”)?

iii. Sendo a Medida AGRIS considerada um «programa plurianual» para efeitos de aplicação do disposto na 2ª parte do 2º parágrafo do nº 1 do artº 3º do Regulamento (CE, EURATOM) nº 2988/95,

□ a prescrição dos procedimentos administrativos abertos no seu âmbito está sujeita ao prazo de 4 anos prescrito no nº 1 do artigo 3º?

ou

□ ao prazo previsto na 2ª parte do 2º parágrafo do nº 1 do artº 3º do Regulamento (CE, EURATOM) nº 2988/95, ou seja: “até ao encerramento definitivo do programa” [plurianual]?

iv. A Medida AGRIS, enquanto programa plurianual, encontra-se encerrada desde o dia 20 de dezembro de 2013 (conforme notificação remetida pela Comissão Europeia ao IFAP, I.P., em 16 de janeiro de 2014)?”

Tendo já sido suscitado no processo 912.15 deste STA o reenvio prejudicial foi a presente instância suspensa até decisão do Tribunal de Justiça, entretanto junta aos autos e aqui dada por reproduzida.

2. O presente recurso de revista vem interposto do acórdão do TCA Norte que negou provimento ao recurso do acórdão proferido pelo TAF de Viseu, o qual anulou o acto do Presidente do Conselho Diretivo do IFAP, Instituto de Financiamento da Agricultura e Pescas IP, ora recorrente, que determinou a reposição da quantia de € 29.927,87, recebida pela A., A……….., Lda, ora recorrida, acrescida de juros legais, num total de EUR 43.197,80, a coberto do Contrato de Atribuição de Ajuda ao Abrigo dos Programas Operacionais de Âmbito Regional (Medida Agris Subação 7.2).

O recorrente imputa ao acórdão recorrido erro de julgamento com violação dos artºs 8º e 9º do Código Civil e do disposto no 2º parágrafo do nº 1 do art. 3º do Regulamento (CE EURATOM) nº 2988/95 do Conselho, de 18/12/95.

Para tanto alega que a decisão recorrida ao não considerar que se estava perante um contrato plurianual violou os artigos 8º e 9º do CPC e 2º parágrafo nº 1 do art. 3º do Regulamento (CE EURATOM) nº 2988/95 do Conselho, de 18/12/95.

A decisão de 1ª instância julgou a acção procedente por prescrição do procedimento por terem decorrido mais de 4 anos entre a data da concessão do subsídio e a data do acto do pedido de reposição do mesmo.

Em sede de recurso para o TCAN o IFAP invoca a questão de que ainda que não se conclua pelo prazo prescricional de 20 anos, que entende ser o correcto, ainda assim, o referido art. 3º nº 1 do Regulamento 2988/95 não foi aplicado na sua plenitude já que a medida Agris programa PO Norte, sendo um programa plurianual, ainda não se encontrava encerrada.

A decisão recorrida entendeu que, porque não estava em causa uma irregularidade continuada, o prazo de prescrição seria de 4 anos a contar da data da apresentação da candidatura, em 16/4/2001, pelo que, em 11/05/2012 estaria prescrita, sem se ter pronunciado quer sobre a questão de estar em causa um programa plurianual quer quanto ao facto de o programa ainda não ter encerrado.

Na verdade, apenas refere que se encontra prescrito o procedimento instaurado pelo ora recorrente tendente à reposição da quantia indevidamente recebida pela recorrida, uma vez que, «não se mostrando a irregularidade imputada, como "continuada" ou "repetida"», decorreu prazo muito superior a quatro anos entre o ato de apresentação da candidatura (16/04/2001) e a data do pedido de reposição (11/05/2012), prazo que é o aplicável.

Como se extrai da mesma:

“(...) A irregularidade imputada à então Autora, que determinou o pedido de reposição, consubstancia-se pois num único ato, traduzido na apresentação da candidatura com a inclusão de despesas que o então IFADAP entendeu não elegíveis.

Tendo a candidatura conexa com o financiamento do projeto de financiamento controvertido sido apresentada em 16-04-2001, só em 25-11-2011 a Autora foi notificada em sede de audiência prévia da intenção do IFADAP proceder ao pedido de reposição de 29.927,87€, sendo que só em 11-05-2012 o IFADAP notificou a Autora da decisão final de reposição daquele montante, acrescida de juros legais, um total de 43.197,80€.

Assim, não se mostrando a irregularidade imputada, como “continuada” ou “repetida” e uma vez decorreram entre o ato originário relevante (16-04-2001) e o pedido de reposição (11- 05-2012) prazo muito superior a quatro anos, mostra-se prescrito o procedimento instaurado pela aqui Recorrente, tendente à reclamada reposição (...).”

A questão aqui suscitada pela recorrente consiste, assim, em saber se, à data da notificação da decisão final de reposição da quantia aqui em causa, já havia decorrido o prazo de prescrição aplicável, por estar em causa uma irregularidade praticada no âmbito de um programa plurianual.

Então vejamos.

Quanto à aplicabilidade do prazo de 4 anos fixado no art. 3º nº 1 do Regulamento supra referido, o TJUE, no acórdão de 17.09.2014 pronunciou-se relativamente ao pedido de reenvio deste STA, 2.ª Secção, no Acórdão de 17.04.2013, proc. 398/12 no sentido de que:

“1) O artigo 3.º do Regulamento (CE, EURATOM) n.º 2988/95 do Conselho (...), relativo à proteção dos interesses financeiros das Comunidades Europeias, deve ser interpretado no sentido de que se aplica aos procedimentos instaurados pelas autoridades nacionais contra beneficiários de ajudas da União na sequência de irregularidades verificadas pelo organismo nacional responsável pelo pagamento das restituições à exportação no âmbito do Fundo Europeu de Orientação e de Garantia Agrícola (FEOGA).

2) O prazo de prescrição previsto no artigo 3.º, n.º 1, primeiro parágrafo, do Regulamento n.º 2988/95 aplica-se não apenas aos procedimentos por irregularidades que conduzem à aplicação de sanções administrativas, na aceção do artigo 5.º deste regulamento, mas também aos procedimentos que conduzem à adoção de medidas administrativas, na aceção do artigo 4.º do referido regulamento. Embora o artigo 3.º, n.º 3, do mesmo regulamento permita que os Estados-Membros apliquem prazos de prescrição mais longos do que os de quatro ou três anos previstos no n.º 1, primeiro parágrafo, deste artigo, resultantes de disposições de direito comum anteriores à data da adoção do referido regulamento, a aplicação de um prazo de prescrição de vinte anos excede o que é necessário para atingir o objetivo de proteção dos interesses financeiros da União”.

Também recentemente foi julgado por este STA, em Acórdão de Uniformização de Jurisprudência n.º 0173/13, de 26-02-2015, que o prazo de prescrição relativo às quantias recebidas no âmbito das ajudas comunitárias é de quatro anos.

Como se extrai do mesmo:

II - O prazo para ser pedida a devolução das quantias recebidas irregularmente no âmbito do Fundo Europeu de Orientação e Garantia Agrícola é o previsto no nº 1 do artigo 3º do Regulamento (CE Euratom) nº 2988/95, do Conselho, de 18 de Dezembro, por se tratar de uma norma jurídica directamente aplicável na ordem interna, e, porque não existe no ordenamento nacional norma especificamente aplicável que preveja prazo superior.”.

Ora, se não há dúvidas que se deve considerar aplicável, no caso dos autos, o prazo de prescrição previsto no nº 1 do artigo 3º do Regulamento nº 2988/95, por se tratar de uma norma jurídica diretamente aplicável na ordem interna - artigo 288º, parágrafo 2º CE (face às alterações operadas pelo Tratado de Lisboa) e artigo 8º, n.ºs 3 e 4 da CRP - e porque não existe no ordenamento nacional norma especificamente aplicável que preveja prazo superior (cf. acórdãos, desta Secção de 30.10.2014, proc. 092/14 e da 2.ª Secção de 08.10.2014, proc. 398/12), outra questão será a de estarmos ou não perante uma das especificidades previstas neste mesmo preceito.

O Regulamento (CE, EURATOM) nº 2988/95 veio adotar uma “regulamentação geral em matéria de controlos homogéneos e de medidas e sanções administrativas relativamente a irregularidades no domínio do direito comunitário” (art. 1º/1), estabelecendo no seu artigo 3.º que:

“1. O prazo de prescrição do procedimento é de quatro anos a contar da data em que foi praticada a irregularidade referida no nº 1 do artigo 1º. Todavia, as regulamentações sectoriais podem prever um prazo mais reduzido, que não pode ser inferior a três anos.

O prazo de prescrição relativo às irregularidades continuadas ou repetidas corre desde o dia em que cessou a irregularidade. O prazo de prescrição no que se refere aos programas plurianuais corre em todo o caso até ao encerramento definitivo do programa ...”

Daqui resulta que se distingue por um lado se a irregularidade é ou não continuada ou repetida e por outro se está em causa um programa plurianual ou não, sendo que ambas as situações não interferem uma com a outra.

Ou seja, se está em causa uma irregularidade continuada, o prazo de 4 anos a que alude a 1ª parte do nº 1 conta-se a partir da data de cessação da mesma, e se não estiver em causa uma irregularidade continuada a mesma conta-se a partir da data da sua prática.

E, independentemente de estarmos perante uma irregularidade continuada ou não, caso esteja em causa um programa plurianual, o prazo de prescrição não termina enquanto não encerrar definitivamente o programa plurianual.

A decisão recorrida entendeu estarmos perante uma irregularidade instantânea e tal não foi aqui sindicado.

O que a recorrente vem aqui invocar é que está em causa um programa plurianual, pelo que o prazo de prescrição corre em todo o caso até ao encerramento definitivo do programa.

Então vejamos.

Dispõe o artigo 14º do Regulamento (CE) nº 1260/1999 do Conselho, de 21 de Junho de 1999 que:

“1. Cada plano, quadro comunitário de apoio, programa operacional e documento único de programação abrangerá um período de sete anos, sem prejuízo do disposto no artigo 6º e no nº 4, primeiro parágrafo do artigo 7.

O período de programação terá início em 1 de Janeiro de 2000.

2. Os quadros comunitários de apoio, programas operacionais e documentos únicos de programação serão reexaminados e, se for caso disso, adaptados por iniciativa do Estado-Membro ou da Comissão, com o acordo desse Estado-Membro, nos termos do presente título, na sequência da avaliação intercalar referida no artigo 42.- e da atribuição da reserva de eficiência prevista no artigo 44.

Aqueles quadros, programas e documentos podem ser igualmente revistos noutro momento, se se verificarem mudanças importantes da situação socioeconómica e do mercado de trabalho.”

Por sua vez no acórdão do Tribunal de Justiça, de 16.11.017, no processo C-491/16, suscitado em sede de pedido de reenvio no âmbito do proc. 912/15 a correr neste STA, diz-se que:

1) ... 2) O artigo 3º, nº 1, segundo parágrafo, segunda parte, do Regulamento (CE, Euratom) nº 2988/95 do Conselho, de 18 de dezembro de 1995, relativo à proteção dos interesses financeiros das Comunidades Europeias, deve ser interpretado no sentido de que um programa operacional .... que estabelece disposições gerais sobre os Fundos estruturais, como o programa operacional “Agricultura e desenvolvimento rural”, aprovado pela Decisão C (2000) 2878 da Comissão, de 30 de Outubro de 2000, não está abrangido pelo conceito de “programa plurianual”, na aceção da primeira destas disposições, exceto se o referido programa já indicar ações concretas a executar, o que cabe ao órgão jurisdicional do reenvio verificar.”

Contudo, não esclarece este acórdão se a medida Agris aqui em causa se deve considerar ou não como um programa plurianual.

O que é essencial para aferir o prazo de prescrição a que alude o art. 3º nº 1 1ª parte do supra referido Regulamento, já que, nos termos da 2ª parte do mesmo preceito, o prazo de prescrição no que se refere aos programas plurianuais corre em todo o caso até ao encerramento definitivo do programa.

Atendendo a tudo o que supra exposto vejamos.

O Quadro Comunitário de Apoio a Portugal para o período de 2000 a 2006, foi aprovado pela Comissão Europeia através da Decisão C (2000) 762, de 30 de Março.

No âmbito do III Quadro Comunitário de Apoio para o período de 2000 a 2006 (QCA III) o DL 163-A/2000, de 27 de Julho, estabeleceu as regras gerais de aplicação do Programa Operacional de Agricultura e Desenvolvimento Rural, abreviadamente designado por AGRO, bem como da Medida Agricultura e Desenvolvimento Rural dos programas operacionais de âmbito regional, abreviadamente designada por AGRIS.

E, como resulta do nº 1 deste Decreto-Lei nº 163-A/2000 de 27 de Julho de 2000 in DR 172 – Série I-A 1º Suplemento

“Artigo 1.º

Objecto

O presente diploma estabelece as regras gerais de aplicação do Programa Operacional de Agricultura e Desenvolvimento Rural, abreviadamente designado por AGRO, bem como da Medida Agricultura e Desenvolvimento Rural dos programas operacionais de âmbito regional, abreviadamente designada por AGRIS, aprovados no âmbito do III Quadro Comunitário de Apoio para o período de 2000 a 2006 (QCA III).”

Em suma, este diploma estabelece as regras gerais de aplicação do Programa Operacional de Agricultura e Desenvolvimento Rural (POADR/Programa), bem como da componente agrícola dos programas operacionais de âmbito regional do III Quadro Comunitário de Apoio (QCA III) para o período de 2000 a 2006 integrando intervenções operacionais no âmbito da agricultura e do desenvolvimento rural, enquadradas nos Eixos Prioritários 2 e 3 do Plano de Desenvolvimento Regional (PDR), designadamente o Programa Operacional Agricultura e Desenvolvimento Rural e a Medida Agricultura e Desenvolvimento Rural dos programas operacionais de âmbito regional.

Como resulta do seu preâmbulo: Estas intervenções contribuem, ainda, para outras prioridades fixadas no PDR, como sejam as respeitantes à elevação do nível de qualificação dos portugueses e à promoção do emprego, da coesão social e do desenvolvimento sustentável das regiões, assegurando a igualdade de oportunidades.”

Mas, este programa não refere quaisquer ações concretas a executar, estando antes dependente de concretas candidaturas que sejam formuladas.

Como resulta do nº 3 do Decreto-Lei nº 163-A/2000 de 27 de Julho

“Medidas

1 - No âmbito do Programa AGRO, podem ser concedidas ajudas nos seguintes domínios (...)

2 - No âmbito da Medida AGRIS, podem ser concedidas ajudas nos seguintes domínios:

a) Diversificação na pequena agricultura;

b) Desenvolvimento dos produtos de qualidade;

c) Gestão sustentável e estabilidade ecológica das florestas;

d) Serviços à agricultura;

e) Gestão de recursos hídricos e emparcelamento;

f) Caminhos e eletrificação agro-rurais;

g) Valorização do ambiente e do património rural;

h) Dinamização do desenvolvimento agrícola e rural.”

Mas, não estão aqui indicadas quaisquer concretas ações a executar.

Pelo que, e nos termos do acórdão do Tribunal de Justiça, de 16.11.017, no processo C-491/16, proferido no proc. 912/15, a correr neste STA não estamos perante um programa plurianual.

Neste mesmo sentido se pronunciou este STA nos acórdãos de 26/04/2018 Processo nº 249/16 e nº 1478/15 cuja argumentação subscrevemos.

3. Não resultando provado dos elementos dos autos que estejamos perante um contrato plurianual, vejamos se já havia decorrido o prazo de 4 anos e, portanto, se o procedimento estava prescrito.

A irregularidade aqui invocada reporta-se a pagamentos de despesa do projecto ocorridas em Março de 2002, após a assinatura do contrato constantes dos autos que ocorreu em 08.11.2001.

Como o início da contagem do prazo prescricional de quatro anos se conta a partir da data da apresentação na DRABL do Pedido de Pagamento 1/2002 acompanhado de vários documentos da realização da despesa, ou seja, 03.01.2002, em 5/12/2011, altura em que a autora foi notificada em sede de audiência prévia, já haviam decorrido os 4 anos prescricionais.

Pelo que, quando se interrompeu o prazo de prescrição de 4 anos previsto no art. 3.º, n.º 1 do Regulamento (data em que a mesma foi notificada em sede de audiência prévia e não apenas quando é notificada da decisão final) já estava esgotado o prazo quanto a todas as despesas consideradas inelegíveis.

É, pois, de manter a decisão recorrida com a presente fundamentação.


*

Em face de todo o exposto acordam os juízes deste STA em negar provimento ao recurso nos termos supra expostos.

Custas pelo recorrente.

Lisboa, 3 de Maio de 2018. – Ana Paula Soares Leite Martins Portela (relatora) - Alberto Acácio de Sá Costa Reis – António Bento São Pedro.