Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01234/03
Data do Acordão:10/29/2003
Tribunal:PLENO DA SECÇÃO DO CT
Relator:BRANDÃO DE PINHO
Descritores:RECURSO POR OPOSIÇÃO DE ACÓRDÃOS.
TRAMITAÇÃO.
INCONSTITUCIONALIDADE ORGÂNICA.
Sumário:I - Nos termos das disposições combinadas dos artºs 284° e 286° do CPPT, o processamento do recurso por oposição de acórdãos tem lugar no tribunal a quo, incluindo a apreciação da existência, ou não, de oposição, competindo ao tribunal ad quem o julgamento final do recurso.
II - As referidas normas, embora revogatórias do disposto nas alíneas b) do art° 22° e c) dos art°s 24° e 30° do ETAF, não padecem de inconstitucionalidade orgânica, por atinentes a matéria processual, da competência do Governo, ainda que interferindo, mas apenas indirectamente, com a competência respectiva.
Nº Convencional:JSTA00062158
Nº do Documento:SAP2003102901234
Data de Entrada:07/09/2003
Recorrente:A...
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC OPOS JULGADOS.
Objecto:AC TCA.
Decisão:ORDENADA DILIGÊNCIA.
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - REC JURISDICIONAL.
Legislação Nacional:CPPTRIB99 ART284 ART286 ART288.
CPC67 ART763.
ETAF96 ART24 ART30.
Jurisprudência Nacional:AC TC 400/87 IN DR IIS DE 1987/12/21.; AC TC 329/89 IN DR IIS DE 1989/06/22.; AC STA PROC970/02 DE 2003/03/19.; AC STA PROC26769 DE 2003/02/19.
Referência a Doutrina:JORGE DE SOUSA CÓDIGO DE PROCEDIMENTO E DE PROCESSO TRIBUTÁRIO ANOTADO 3ED PAG1280.
ALBERTO DOS REIS CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL ANOTADO V6 PAG311.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam no Pleno da Secção do Contencioso Tributário do STA:
A..., interpôs recurso, por oposição de Acórdãos, para este Pleno, do aresto do TCA, a fls 133 e segts que lhe denegou o direito aos juros indemnizatórios peticionados.
Admitido o recurso pelo relator do processo, a recorrente alegou no sentido da verificação da aludida oposição - fls 142 e segts -.
Posto o que, aquele ordenou a subida dos autos a este Pleno pois que caberia ao relator "a quem aí for distribuído o processo, proferir o despacho a que se refere o n° 5 do mesmo artigo (284 do CPPT), isto de acordo com o disposto no art. 30 c) do ETAF".
Tal entendimento vem alicerçado, em síntese, em que, revogados os artºs 763 e segts do CPCivil, aliás expressamente pelos artºs 3 e 17 do dec-lei 392-A/95, de 12-12, eles continuaram contudo a vigorar no contencioso administrativo e tributário até que, neste, o CPPT veio dispor sobre a matéria – artº 284° e segts -, continuando, todavia, em vigor o dito artº 30 al. c), conferindo ao Pleno do STA "a competência para o seguimento dos recursos por oposição de acórdãos, por tal devendo "entender-se toda a tramitação subsequente à apresentação das alegações tendentes a demonstrar a existência de oposição de acórdãos constantes dos artºs 765° nº 5 a 768° do CPCivil, situação que se manteve com as alterações introduzidas pelo dec-lei 229/96, de 29-11.
Assim - continua o mesmo Exmº relator - "parece que o legislador quis manter uma certa semelhança com o regime anterior vigente em matéria de tramitação de recursos para uniformização da jurisprudência"; "aliás, o CPPT é um diploma de natureza adjectiva, pelo que não cabe a este diploma atribuir ao relator, no TCA ou no STA, competência para conhecer de matéria que cabe única e exclusivamente ao relator ao qual, no Pleno, for distribuído o respectivo processo", não podendo, pois considerar-se, que o CPPT revogou o artº 30° do dec-lei 129/84, de 27-04, já que a intenção do legislador do Código foi apenas o de regular a tramitação do recurso para o Pleno e não o de alterar a competência constante das leis de organização dos tribunais administrativos e fiscais", o mesmo devendo dizer-se, mutatis mutandis, em relação ao artº 284° n° 5 do CPPT "já que tal preceito é de natureza meramente adjectiva, não consagrando qualquer norma de competência nesta matéria."
Contra tal entendimento, emitiu parecer o Exmº magistrado do MP, já que ele "ignora ostensivamente disposição legal imperativa da tramitação do recurso que confere ao relator do processo no TCA, o poder-dever de se pronunciar sobre a oposição/inoposição de acórdãos (artº 285° n° 5 do CPPT)" e a "correlação sistemática das normas constantes dos artºs 284° n° 5 e 286° n° 1" do mesmo diploma legal, pelo que "o processo deverá ser devolvido ao TCA para proferimento pelo relator, de despacho sobre a oposição de acórdãos".
E, corridos os vistos legais, nada obsta à decisão.
A questão dos autos é a do processamento dos recursos por oposição de acórdãos.
Nos termos das disposições combinadas do artº 284° e 286° do CPPT, o recurso é interposto e alegado no tribunal ou formação a quo, aí sendo julgado deserto pelo relator, logo na falta de alegação tendente a demonstrar a referida oposição.
Caso o mesmo relator entenda não haver oposição, o recurso considera-se findo, devendo as partes alegar de meritis, se o recurso dever prosseguir.
E preparado completamente o recurso, o processo sobe ao tribunal superior mediante simples despacho do relator – artº 246°.
Assim, as referências feitas no artº 284° ao "relator" - n° 2 e 5 - referem-se ao relator do processo, no tribunal recorrido; caso contrário, resultaria incompreensível aquele artº 246º, dispondo dever o relator ordenar a subida dos autos, mediante simples despacho.
O processo só sobe ao tribunal (ou formação) ad quem, uma vez e só quando completamente pronto para julgamento final que aquele efectuará.
Assim, a decisão sobre se se verifica, ou não, a alegada oposição de acórdãos compete ao relator do processo, no tribunal recorrido, sem que contudo vincule o tribunal superior como pressuposto que é, da admissibilidade do recurso que, como se disse, se considera findo, caso não haja oposição – artº 284° n° 5- cfr artºs 288° n° 2 do CPPT e 687° n° 4 do CPCivil.
Como se escreve Jorge de Sousa, CPPT, Anotado, 3ª edição pág. 1280, "a decisão do relator ou o acórdão que, na sequência de reclamação, reconheça a existência de oposição, não impede que, no julgamento do conflito de jurisprudência, se decida em sentido contrário" e - pág. 1282, nota 21, "nos recursos por oposição de acórdãos", o tribunal pode reapreciar as questões da admissibilidade do recurso e da existência da oposição de acórdãos, abstendo-se de conhecer do mérito do recurso se decidir alguma dessas questões em sentido negativo".
Cfr. ainda Alberto dos Reis, CPC anotado, vol. VI pág. 311.
Pelo que, remetido o processo ao tribunal superior, este decidirá da oposição e de meritis, se a tal nada obstar.
Tal modo de processamento veio preencher a lacuna resultante da revogação dos arst. 763° e seg.ts do C.P.Civil, que, não obstante, se continuaram a entender vigorar, no contencioso tributário., antes da vigência do CPPT.
Mas, assim sendo, deve concluir-se pela revogação das alíneas b) do artº 22° e c) dos artºs 24° e 30° do ETAF, atinentes ao processamento ou "seguimento" dos recursos com fundamento em oposição de julgados.
Tais disposições legais referem-se à competência do Plenário e do Pleno do STA, para o efeito.
Não obstante, não padecem de inconstitucionalidade orgânica aqueles artºs 245° e 246°
É que, como é entendimento do Tribunal Constitucional, importa distinguir entre as intervenções legislativas directamente votadas à definição da competência e as que, inscrevendo-se no domínio da regulamentação processual, todavia acabam por interferir apenas indirecta, acessória e necessáriamente com aquela competência; as primeiras são normas de competência e as segundas, puras normas de processo.
"A Constituição distingue com nitidez entre a matéria da competência e a matéria do processo; qualquer que seja o nível ou grau de definição da competência dos tribunais, reservado à Assembleia da República seguramente que nele não entram as modificações da competência judiciária a que deva atribuir-se simples carácter processual".
Cfr. os Acd.s do TC n° 400/87 in D.Rep., 2ª série de 21/Dez/87 e n° 329/89, ibidem, de 22/Jun/89.
Por outro lado, tem o mesmo tribunal entendido não haver invasão da reserva de competência da Assembleia da República quando se não altera a prévia distribuição de competência entre as várias ordens de tribunais (tributários e judiciais).
"A necessidade de autorização legislativa apenas é exigível se ocorre modificação das regras de competência judiciária material, com natural reflexo na distribuição das matérias pelas diversas espécies de tribunais" – cfr. Acd. n° 114/00 in Acd' do TC, pág. 415.
Cfr. ainda abundante jurisprudência sobre o ponto no Ac. do mesmo tribunal, de 28/Nov/00, in D. Rep., 2ª, de 5/Jan/01.
Assim, deverá o relator no tribunal a quo averiguar, concreta e especificamente que não apenas de modo genérico, ou através de meras fórmulas "passe partout", da existência dos respectivos pressupostos exigidos no artº 30° do ETAF a saber: que se trate "do mesmo fundamento de direito", que não tenha havido "alteração substancial na regulamentação jurídica", se tenha perfilhado solução oposta nos dois arestos.
O que naturalmente supõe a identidade de situações de facto, já que, sem ela, não tem sentido a discussão dos referidos requisitos; por isso, ela não foi ali, referida de modo expresso.
Para que exista oposição é, pois, necessária tanto uma identidade jurídica como factual, que, por natureza, se aferem pela análise do objecto das decisões em confronto.
Cfr., aliás, por todos o Ac. deste STA de 19-03-03 Rec. 970/02.
Por outro lado, revogado que se mostra, nos preditos termos, o artº 763° nº 4 do CPCivil, haverá que averiguar do trânsito em julgado do acórdão fundamento, como requisito de admissibilidade do recurso com fundamento em oposição de acórdãos, no domínio do contencioso tributário, exigência aliás decorrente da própria finalidade primacial de tal tipo de recurso: a de assegurar igualdade de tratamento de situações iguais.
Ainda, indicados, como no caso, vários acórdãos fundamento sobre a mesma questão de direito, deverá o recorrente ser notificado para optar por um deles, tendo a falta de indicação como consequência a rejeição do recurso pois que, então, não se verifica outro dos pressupostos da sua admissibilidade: a indicação, sobre a mesma questão, de um só acórdão em oposição com o recorrido.
Em suma: o mesmo relator terá de apreciar todas as questões atinentes quer à própria admissibilidade do recurso quer à efectiva existência de oposição de acórdãos, podendo julgar o recurso deserto, findo ou sem efeito - conforme os casos -, ou ordenando o seu prosseguimento, nos precisos termos do artº 284° do CPPT.
E só depois, poderá ordenar a subida do processo ao tribunal superior – artº 286°.
Cfr., aliás, o recente Ac. deste STA, de 19-02-03 Rec. 26.769.
Termos em que se acorda ordenar a devolução do processo ao TCA para proferimento, pelo relator, de despacho sobre a oposição de acórdãos e, se disso for caso, demais tramitação subsequente – artº 285° n° 3, 2ª parte, do CPPT.
Sem custas
Lisboa, 29 de Outubro de 2003
Brandão de Pinho – Relator – Mendes Pimentel– Lúcio Barbosa – Almeida Lopes – Vítor Meira