Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0366/06
Data do Acordão:07/03/2007
Tribunal:2 SUBSECÇÃO DO CA
Relator:JOÃO BELCHIOR
Descritores:POLÍCIA JUDICIÁRIA
PESSOAL DE INVESTIGAÇÃO CRIMINAL
TRANSIÇÃO DE PESSOAL
PROIBIÇÃO DO ARBITRIO
Sumário:I - Para o legislador do D.L. n.º 275-A/2000, de 09 de Novembro (concretamente através do artº 156º, nº2), à semelhança do que fora estabelecido através do Decreto-Lei n.º 295-A/90, de 21 de Setembro (cf. artº artigo 161.º), na transição para a nova estrutura indiciária do pessoal em epígrafe atende-se à contagem integral do tempo de serviço na categoria, contando-se, para efeitos de progressão, o tempo remanescente como tempo já prestado no escalão para o qual se opera a transição.
II - Tal regulação levava a que agentes daquele corpo de funcionários que tivessem a categoria de inspector estagiário [categoria de ingresso da respectiva carreira a partir da vigência daquele Decreto-Lei n.º 295-A/90 (ou ainda agente estagiário, segundo este diploma), diferentemente do que sucedia no regime do Dec. Lei 458/82-artº 112, nº 1], relativamente a outros agentes que, embora mais antigos na P.J. ingressaram directamente na carreira de investigação criminal, ao abrigo da legislação então em vigor (sem a realização de qualquer estágio), vissem tal diferenciação de ingresso naquela carreira reflectida na lista de transição.
III - Tendo sido eleito na transição em causa como critério de diferenciação um elemento objectivo e materialmente fundado - contagem de todo o tempo de serviço prestado em dada categoria pelos agentes referidos a cujo acesso foi requerido um plus de preparação específica e profissionalizante –, tal não ofende a proibição do arbítrio ou de outro valor constitucionalmente protegido.
Nº Convencional:JSTA00064463
Nº do Documento:SA1200707030366
Data de Entrada:04/07/2006
Recorrente:A... E OUTROS
Recorrido 1:MINJ
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL.
Objecto:AC TCA SUL.
Decisão:NEGA PROVIMENTO.
Área Temática 1:DIR ADM GER - FUNÇÃO PUBL / ESTATUTÁRIO.
Legislação Nacional:DL 275-A/2000 DE 2000/11/09 ART126 ART156.
DL 458/82 DE 1982/11/24 ART112.
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC179 DE 2006/10/11.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo (STA):
I.RELATÓRIO
A..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ... e ..., com os restantes sinais dos autos, recorrem do acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul (TCA) que negou provimento ao recurso contencioso de anulação, que ali interpuseram do despacho do MINISTRO DA JUSTIÇA (AR), que negou provimento aos recursos hierárquicos por si interpostos e em que impugnaram o despacho de 02.03.01, do Director Nacional da Polícia Judiciária que, aprovando a versão final da Lista de Transição para a nova estrutura salarial dos funcionários da Polícia Judiciária (P.J.) e do Quadro do Instituto de Polícia Judiciária e Ciências Criminais, elaborada de acordo com as normas de transição constantes do Decreto-Lei n.º 275-A/2000, de 9 de Novembro, e da Lista de Posicionamento relativos às alterações funcionais ocorridas após 1 de Julho de 2000, colocou os recorrentes, na lista de antiguidades, em posição posterior e em escalão inferior aos actuais inspectores que frequentaram o 25.º Curso de Formação de Agentes Estagiários.
Remataram a sua alegação de recurso com as seguintes CONCLUSÕES:
“1. Os Recorrentes como funcionários da Polícia Judiciária ao abrigo da Lei orgânica em vigor à data, apresentaram-se a concurso e frequentaram um curso para agentes de 3ª classe.
2. Terminado o curso, os Recorrentes foram empossados em agentes de 3ª classe.
3. Não lhes era exigível nos termos da lei em vigor à data, a frequência de estágio.
4. Tal situação, desnecessidade de estágio, que sempre foi exigível, para o recrutamento externo, tinha como pressuposto a experiência dos Recorrentes e o conhecimento que a Policia Judiciária tinha dos candidatos a agentes de 3ª classe.
5. A antiguidade na categoria conta-se desde a tomada de posse na mesma.
6. Os Recorrentes sempre foram posicionados na lista de antiguidades, com maior antiguidade que os colegas do 25.° curso de formação.
7. O artigo 156.°, n.° 2 do D.L. n.° 275-A/2000 não pode ser interpretado como se o tempo remanescente a que reporta o preceito, se reportasse ao tempo na categoria.
8. Ou seja, sendo que o tempo de estágio conta para todos os legais efeitos, o mesmo não conta para efeitos da antiguidade na categoria.
9. Um facto é o tempo já prestado no escalão para o qual se opera a transição, outra é o tempo de antiguidade.
10. Contando-se a antiguidade na categoria desde a posse, é esta que deve ser tida em consideração, para efeitos do estabelecimento da antiguidade na mesma.
11. O acórdão recorrido ao perfilhar a interpretação do normativo - artigo 156.°, n.° 2 do D.L. n.° 275-A/2000, de que o estágio para agentes de 3ª classe da Policia Judiciária conta para a antiguidade nesta categoria, colocando os Recorrentes em posição inferior aos dos colegas do 25.° curso de formação faz uma incorrecta interpretação e aplicação do mesmo.
12. Viola o princípio da justiça tal interpretação e aplicação do referido normativo, mormente o artigo 3.° do CPA, já que os Recorrentes ocuparam na lista de antiguidades posição de maior antiguidade que os colegas do 25.° curso, até à prolação do despacho sindicado por via do presente contencioso e confirmado pelo acórdão agora recorrido, pelo que deve este ser REVOGADO POR SER DE INTEIRA JUSTIÇA”.
Por seu lado a AR, na sua contra-alegação formulou as seguintes CONCLUSÕES:
“a) O n° 1 do artigo 126° do Dec. Lei n° 275-A/2000, à semelhança do que já prescrevia o n° 1 do artigo 77° do Dec.Lei n° 295-A/90 de 21.09, determina explicitamente que o ingresso na carreira de investigação criminal se faz pela categoria de estagiário.
b) Por seu turno, ao contrário do que normalmente sucede em casos de transição de pessoal, o Dec. Lei n° 275-A/2000 não fez depender a integração nos escalões, da antiguidade no nível, tendo antes feito relevar o tempo de serviço na carreira.
c) Os ora recorrentes, ingressaram directamente na carreira de investigação criminal, sem terem sido submetidos ao estágio, ao abrigo da possibilidade que a legislação em vigor, ao tempo do seu ingresso lhes abriu.
d) Para efeitos da transição operada pelas listas, ora impugnadas, não lhes podia, consequentemente, ser contado como tempo de serviço na categoria, o período de tempo correspondente ao estágio profissionalizante que os seus colegas prestaram, e que eles, necessariamente não possuíam.
e) De resto, o Dec.-Lei n° 275-A/2000 não contem mecanismo de transição que contemple o seu caso, ao invés do que sucede com aqueles seus colegas (artigos 77° do Dec.-Lei n° 295-A/90 e 126° do Dec.-Lei n° 275-A/2000).
f) Este critério, acolhido pelo Dec.-Lei n° 275-A/2000, que como qualquer outro poderá ser ou não discutível, não é porém ilegal, nem tão pouco violou o artigo 3° do C.P.A. e 266° da C.R.P.
g) Do mesmo modo que o princípio da igualdade não foi “in casu” sequer beliscado, sendo certo que a situação dos recorrentes é substancialmente diferente da do pessoal de investigação criminal que frequentou com êxito o estágio profissionalizante a que se referia o artigo 77° do Dec.-Lei n° 295-A/90 (actual artigo 126° do Dec.-Lei n° 275-A/2000), tendo quanto a este último, a lei considerado aquele, como tempo de serviço na respectiva carreira;
h) Ao contrário dos recorrentes, aos quais não podia ser computado como tempo de serviço na carreira, um estágio que não possuem, pelo que o acto recorrido é válido e legal, improcedendo, totalmente, as alegadas violações do artigo 5° do C.P.A. e 13° da C.R.P.
i) Finalmente, no que respeita à inconstitucionalidade – reclamada pelos recorrentes, derivada da inobservância pelo acto recorrido daquilo a que chamam “discricionariedade legislativa”, por violação dos artigos 3º, 13° e 266° n° 1 da C.R.P. -, dir-se-á que a mesma não foi, até ao momento declarada pelo Tribunal Constitucional, com força obrigatória geral, nos termos do artigo 281° nº 3 da Constituição da República.
j) Pelo que a Administração Pública, se limitou “in casu” a cumprir os preceitos legais aplicáveis à respectiva situação, em estrita observância dos princípios da legalidade e imediata subordinação à lei, aos quais se encontra subordinada”.
Neste Supremo Tribunal o Digno Magistrado do Ministério Público emitiu parecer no sentido da procedência do recurso, acompanhando a argumentação dos recorrentes.
Destacam-se ainda de tal parecer as invocações de que, até à publicação do Dec. Lei nº 275-A/2000 e ao despacho do Director-Nacional da P.J., que aprovou a lista de transição em causa, sempre os recorrentes se mantiveram, na lista de antiguidades, colocados à frente dos estagiários que frequentaram o 25º curso de formação, listas essas que, definindo a antiguidade na categoria, se firmaram na ordem jurídica.
Por outro lado, à data da entrada em vigor do Dec. Lei 295-A/90 (cujo artº 77, nº 1, é de conteúdo idêntico ao que veio posteriormente a ter o artº 126º, nº 1, do Dec. Lei nº 275-A/2000), já os recorrentes tinham ingressado na carreira de pessoal de investigação criminal, integrando a categoria de Agentes, ao abrigo do regime anteriormente em vigor.
Foram colhidos os vistos da lei.
II.FUNDAMENTAÇÃO
II.1. O acórdão recorrido decidiu com base nos seguintes FACTOS (Mª de Fº):
a) - os recorrentes frequentaram, como internos, o 26.° Curso de Formação de Agentes Estagiários, o qual era destinado a Agentes Motoristas e a funcionários administrativos da Polícia Judiciária (cfr. doc. junto ao pa);
b) - após a frequência deste curso foram integrados na categoria de Agentes de 3.ª Classe, sem frequência de qualquer estágio (cfr. doc. junto ao pa);
c) - por despacho de 2 de Março de 2001 do Director Nacional da Polícia Judiciária, publicado no D.R., II Série n.° 81 de 05 de Abril de 2001, foram aprovadas as listas de transição para a nova estrutura salarial dos funcionários do quadro da Polícia Judiciária e Ciências Criminais, elaborada de acordo com as normas de transição constantes do D.L. n.° 275-A/2000, de 09.11;
d) - nas listas de transição referidas em c), os recorrentes encontram-se em posição posterior e em escalão inferior aos agentes que frequentaram o 25° Curso de Formação de Agentes Estagiários e que realizaram estágio;
e) - do despacho referido em c) interpuseram os recorrentes recurso hierárquico para o Ministro da Justiça, alegando terem sido prejudicados relativamente aos agentes estagiários que frequentaram o 25.° curso de Formação porque, uma vez que não foram submetidos a estágio, ao contrário do que sucedeu com aqueles, viram as suas posições invertidas nas listas de transição e de posicionamento face aos colegas que frequentaram o 25.° curso de formação;
f) - sobre os recursos hierárquicos interpostos pelos recorrentes foram prestadas as informações da Auditoria Jurídica do Ministério da Justiça e as Informações de Serviço da Directoria-Geral da Polícia Judiciária, constantes do processo instrutor, cujos teores se dão por reproduzido, onde se concluía que os recursos deviam ser indeferidos, constando das Informações de Serviço da Directoria-Geral da Polícia Judiciária, designadamente, relativamente aos recorrentes ..., ..., ..., ..., ..., ..., ... e ..., o seguinte: “(..) 9. Constatou-se deste modo, que os candidatos que frequentaram o 25° Curso de Formação iniciaram, em geral, o exercício das correspondentes funções, na qualidade de agentes estagiários, em data anterior à do ingresso da (o) exponente em agente de 3ª classe, que frequentou o Curso de Formação imediatamente (o 26°) e não foi submetida a estágio.
10. Consequentemente, aqueloutros encontram-se a exercer aquelas funções há mais tempo do que a(o) recorrente, (..,).“ e, relativamente à recorrente A..., o seguinte: “(…) 9. Constatou-se deste modo, que os candidatos que frequentaram o 25° Curso de Formação iniciaram, em geral, o exercício das correspondentes funções, na qualidade de agentes estagiários, em 25 de Fevereiro de 1988, quando a exponente, que frequentou o Curso de Formação imediato (o 26°) e não foi submetida a estágio, iniciou o exercício dessas funções apenas em 3 de Outubro de 1988, ou seja, cerca de oito meses mais tarde. 10. Consequentemente, aqueloutros encontram-se a exercer aquelas funções há mais tempo do que a recorrente, (..).“
g) - com base nas informações aludidas na alínea anterior foi negado provimento aos recursos hierárquicos, por despacho do Ministro da Justiça datado de 07.08.01 onde se pode ler “Concordo as informações da Auditoria Jurídica bem como com os pareceres da Polícia Judiciária que lhes vêm anexos, pelo que indefiro os recursos hierárquicos interpostos Por: ... A..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ......” (entre outros, tendo só estes recorrido contenciosamente).
“Lisboa, 7 de Agosto de 2001
ass) O Ministro da Justiça
...”.
II.2.DO DIREITO
Os recorrentes (que frequentaram o 26º Curso de Formação de Agentes Estagiários), manifestaram no recurso contencioso a sua inconformação pelo facto de na lista de transição para a nova estrutura salarial dos funcionários do quadro da Polícia Judiciária e Ciências Criminais (elaborada de acordo com as normas de transição constantes do D.L. n.° 275-A/2000, de 09.11) se terem visto colocados em posição posterior e em escalão inferior relativamente aos seus colegas do 25º Curso de Formação de Agentes Estagiários quando nas listas de antiguidades, como vinha sucedendo, se encontravam antes deles.
No entanto, o acórdão recorrido não lhes deu razão, não tendo anulado o Despacho do Ministro da Justiça que negou provimento ao recurso hierárquico que interpuseram do Despacho do Director Nacional da P.J. que, naquela lista, posicionara os recorrentes daquele modo.
No presente recurso reeditam o essencial da posição manifestada em sede contenciosa, traduzida em resumo no que segue.
- como funcionários da Polícia Judiciária ao abrigo da Lei orgânica em vigor à data em que ingressaram (e em que não era exigível a frequência de estágio.), apresentaram-se a concurso e frequentaram um curso para agentes de 3ª classe, tendo sido empossados em conformidade uma vez terminado o curso.
- sempre foram posicionados na lista de antiguidades, com maior antiguidade que os colegas do 25.° curso de formação;
- não deve ser interpretado o artigo 156.°, n.° 2, do D.L. n.° 275-A/2000 como se o tempo remanescente a que se reporta o preceito, se reportasse ao tempo na categoria;
- ou seja, o tempo de estágio não deve contar para efeitos da antiguidade na categoria.
- “Contando-se a antiguidade na categoria desde a posse, é esta que deve ser tida em consideração, para efeitos do estabelecimento da antiguidade na mesma”.
Vejamos:
II.2.1. É essencial, antes do mais, atentar no que está em causa, com base nos FACTOS seleccionados.
Os recorrentes frequentaram, como internos, o 26.º Curso de Formação de Agentes Estagiários, destinado a Agentes Motoristas e a funcionários administrativos da Polícia Judiciária, após o que foram integrados na categoria de Agentes de 3.ª Classe, sem frequência de qualquer estágio (cfr. alíneas a e b dos FACTOS).
Na sequência da publicação do D.L. n.º 275-A/2000, de 09.11, foram aprovadas as listas de transição para a nova estrutura salarial dos funcionários do quadro da Polícia Judiciária e Ciências Criminais, elaborada de acordo com as normas de transição ali constantes (cf. alínea c dos FACTOS).
Em tal lista os recorrentes encontram-se em posição posterior e em escalão inferior aos agentes que frequentaram o 25º Curso de Formação de Agentes Estagiários, que realizaram estágio.
A tal posicionamento presidiu essencialmente a ponderação de que, os candidatos que frequentaram o 25º Curso de Formação iniciaram, em geral, o exercício das correspondentes funções, na qualidade de agentes estagiários, em data anterior à do ingresso dos interessados em agentes de 3ª classe, que frequentaram o Curso de Formação imediatamente a seguir (o 26º) e não foram submetidos a estágio.
O essencial da fundamentação do acórdão recorrido que sufraga a posição da Administração pode ver-se no seguinte trecho:
…a Administração considerou como tempo de serviço prestado na categoria, o tempo do estágio que os inspectores que frequentaram o 25.º Curso de Formação de Agentes Estagiários, isto é, como tempo integrante da categoria de ingresso, logo, como tempo de serviço prestado integralmente na carreira, de acordo com a lei que fixou os critérios de transição.
Ora, a situação dos ora recorrentes é diferente, porquanto, de acordo com a legislação ao tempo em vigor, os recorrentes ingressaram na carreira de pessoal de investigação criminal e na categoria de agente, sem que tivessem de realizar aquele estágio, já que esse ingresso teve lugar antes da entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 295-A/90, de 21.09, facto que os próprios recorrentes reconhecem no artº 11º da sua petição de recurso: não frequentaram o estágio de pelo menos um ano (sic) .
Não tendo os recorrentes efectuado qualquer estágio, tendo ingressado directamente na carreira de investigação criminal, ao abrigo da legislação então em vigor, não é possível que lhes seja considerado, a esse título, qualquer tempo de serviço como tempo de serviço na categoria, pois, face à legislação em vigor, ao tempo do respectivo ingresso, os recorrentes não foram submetidos a estágio, não sendo possível contar como tempo de serviço um período que, efectivamente, não foi prestado como tal” (o realce não consta do acórdão recorrido).
II.2.2. Tenha-se agora em atenção o quadro normativo que presidiu à actuação administrativa em causa vertida na lista de transição e posicionamento.
O Decreto-Lei n.º 275-A/2000, através do seu artigo 126.º n.º 1, estipula que “o ingresso na carreira de investigação criminal faz-se na categoria de inspector estagiário”. Inteiramente à semelhança do que já anteriormente dispunha o Decreto-Lei n.º 295-A/90, no seu artigo 77.º n.º 1 que estipulava: “o ingresso nas carreiras de investigação criminal faz-se, conforme o caso, na categoria de inspector estagiário ou agente estagiário
A lei prevê, assim, um estágio profissionalizante, iniciando-se a respectiva carreira na categoria de inspector estagiário.
Pelo contrário, o n.º 1 do art.º 112.º do D.L. n.º 458/82, de 24.11( Tem interesse, justamente a respeito de agentes na situação dos recorrentes e sua não integração na carreira de investigação criminal, no domínio do DL n.º 458/82, de 24/11, ver o recente acórdão do STA de 11.10.06 (Rec. 179).), preceituava, tão somente, que os lugares de agente de 3.ª classe eram providos por nomeação de agentes estagiários que tivessem, pelo menos, 1 ano de estágio com bom e efectivo serviço, não prevendo tal diploma qualquer categoria de ingresso na carreira em que o estágio fosse parte integrante de tal categoria.
Ora, segundo o artº 156º, nº2 do D.L. n.º 275-A/2000, “na transição para a nova estrutura indiciária atende-se à contagem integral do tempo de serviço na categoria, contando-se, para efeitos de progressão, o tempo remanescente como tempo já prestado no escalão para o qual se opera a transição”.
Ou seja, no que tange à carreira de investigação criminal o legislador, como ponderaram a Administração e o acórdão recorrido, optou por um critério de natureza quantitativa, privilegiando o tempo integral de serviço na categoria, em detrimento de aspectos de cariz qualitativo, assim como pela preparação específica e carácter profissionalizante do estágio referido no artigo 126.º n.º 1 do D.L. 275-A/2000, de 09.11, fazendo relevar a contagem desse estágio como tempo de serviço efectivamente prestado na carreira.
Definiu, assim, o legislador, como critério de transição, a contagem de todo o tempo de serviço prestado na categoria detida.
Sendo, pois, a categoria de inspector estagiário a categoria de ingresso da respectiva carreira, e operando-se a transição para a nova estrutura indiciária com base no único critério definido pelo legislador - contagem integral do tempo de serviço na categoria -, tal como se ponderou no acórdão recorrido, este critério repercute-se no posicionamento obtido após a transição operada pelo DL 275-A/2000, pois o legislador não elegeu como critério de transição o tempo de serviço prestado no nível em que os agentes se encontrassem posicionados, mas antes a todo o tempo de serviço prestado na categoria, sendo assim determinante na referida transição a data de ingresso em tal categoria.
II.2.3. Ora, como acima já se viu, foi considerado como tempo de serviço prestado na categoria, o tempo do estágio dos inspectores que frequentaram o 25.º Curso de Formação de Agentes Estagiários, e bem assim, como tempo integrante da categoria de ingresso, logo, como tempo de serviço prestado integralmente na carreira, de acordo com a lei que fixou os critérios de transição.
O que levou a que os ora recorrentes, como não tendo frequentado esse estágio, como reconhecem desde a fase contenciosa - (cf. artº 11º da p.i.), tendo sido “a lei então em vigor que [lhes] permitiu o ingresso na carreira do Pessoal de Investigação Criminal e na categoria de Agente sem terem de fazer estágio” (ibidem artº 13º), e “perante a possibilidade aberta…não realizaram qualquer estágio” (ibidem artº 14º) - não pudessem lograr tratamento semelhante àqueles seus colegas.
Em suma, foi o facto de os referidos colegas dos recorrentes terem ingressado na referida carreira de investigação criminal numa categoria (inspector estagiário) em que eles não o foram, e em data anterior à do ingresso dos recorrentes como agentes de 3ª classe, que levou a que, na transição para a nova estrutura indiciária tivessem visto ser-lhes contado na íntegra o “tempo de serviço na categoria”, e “contando-se[-lhes], para efeitos de progressão, o tempo remanescente como tempo já prestado no escalão para o qual se opera a transição”, o que levou a colocar tais agentes em situações diferenciadas relativamente aos recorrentes.
II.2.4. Face ao que se deixa exposto, ou seja, porque está em causa a definição da situação dos interessados nas listas de transição para a nova estrutura salarial dos funcionários emergente da publicação do citado D.L. n.º 275-A/2000, de 9 de Novembro, diferente pois da mera organização das listas de antiguidade a que se refere hoje o Dec. Lei 100/99 (cf. artº 93.º), não pode falar-se, salvo o devido respeito, como o faz o Ministério Público, em firmeza na ordem jurídica de alguma lista de antiguidades que assim pudesse opor-se àquela definição.
II.2.5. Também do que se deixa referido ressalta que a conduta da Administração não foi de molde a violar qualquer princípio normativo que deve enformar a sua actividade.
Concretamente, e quanto à única invocação que os recorrentes mantêm a tal respeito (cf. conclusão 12ª da alegação), tendo sido eleito na transição para a nova estrutura indiciária do pessoal em causa como critério de diferenciação um elemento objectivo e materialmente fundado - contagem de todo o tempo de serviço prestado em dada categoria pelos agentes referidos a cujo acesso foi requerido um plus de preparação específica e profissionalizante –, não se antolha em tal relevância, dada a sua referida diferenciação relativamente aos recorrentes, alguma ofensa à proibição do arbítrio ou de outro valor constitucionalmente protegido.
III. DECISÃO
Nos termos e fundamentos expostos acordam em negar provimento ao presente recurso jurisdicional.
Custas pelos recorrentes fixando-se a taxa de justiça em 300 € e a procuradoria em 50%.
Lisboa, 3 de Julho de 2007. João Belchior (Relator) - São Pedro - Edmundo Moscoso.