Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0351/14
Data do Acordão:05/11/2016
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:DULCE NETO
Descritores:IRC
DUPLA TRIBUTAÇÃO
Sumário:I - A nulidade da sentença por falta de fundamentação, prevista no art. 125º do CPPT e no art. 615º, nº 1, al. b), do CPC, corresponde à falta absoluta de motivação, não contemplando as situações de fundamentação medíocre, insuficiente ou errada.
II - Quando uma sociedade comercial sediada em território português possui uma sucursal fora deste território, as operações efectuadas por esse estabelecimento estável têm de ser refletidas na contabilidade da empresa sede e, em consequência, os rendimentos obtidos por esse estabelecimento têm de ser refletidos no resultado da actividade global da empresa, sendo tomados em conta na determinação do lucro tributável desta para efeitos do IRC devido em Portugal, dado o princípio da universalidade – que determina que as entidades residentes são tributadas pela totalidade dos seus rendimentos, incluindo os obtidos fora do território nacional. É o que decorre da norma contida no artigo 4º, nº 1, do CIRC.
III - Todavia, em regra, o estabelecimento estável é também tributado em imposto sobre o rendimento no país onde este está situado, o que gera uma situação de dupla tributação internacional dos rendimentos. Razão por que o CIRC, na redacção vigente à data dos factos (1994 e 1995) previa, como mecanismo para atenuar essa dupla tributação, a aplicação do método de imputação ordinária, em conformidade com as normas contidas nos artigos 58º, nº 1, alínea b), 71º, nº 2, al. b), e 73º, todos do CIRC.
IV - Desses preceitos legais resulta que, para efeitos da tributação prevista no art. 4º, nº 1, do CIRC, os rendimentos obtidos fora do território nacional são necessariamente englobados na sua totalidade, e esse englobamento é feito pelas importâncias ilíquidas do imposto pago no estrangeiro, originado tal pagamento um crédito de imposto que é dedutível ao IRC liquidado em Portugal, em conformidade com o disposto no art. 73º do CIRC.
V - O englobamento desses rendimentos pela importância ilíquida do imposto pago, tendo como desígnio assegurar a tributação da totalidade do rendimento obtido pelas entidades que tenham sede ou direcção efectiva em território português, impõe-se ao sujeito passivo, independentemente do uso do crédito que a lei lhe reconhece, e, por conseguinte, não é um regime facultativo, mas, antes, um regime obrigatório, já que se impõe ainda que não seja possível deduzir (total ou parcialmente) o crédito de imposto, designadamente por ausência de colecta.
VI - À data dos rendimentos em causa nestes autos a lei não previa a possibilidade de dedução integral do imposto pago no estrangeiro nos casos de ausência ou insuficiência de colecta, pois não permitia fazer o reporte do crédito de imposto, sendo que a possibilidade de o fazer só veio a ser concretizada através da Lei do Orçamento de Estado para 1999, pelo aditamento do nº 3 ao art. 73º do CIRC, segundo a qual nos casos de insuficiência da colecta no exercício em que os rendimentos obtidos no estrangeiro foram incluídos na base tributável da empresa sede, o remanescente pode ser deduzido até ao fim dos cinco exercícios seguintes.
VII - Razão por que os rendimentos obtidos pelas sucursais de Londres e Zhuhai, nos exercícios de 1994 e 1995, tinham de ser englobados na base tributável da empresa sede pelos valores ilíquidos do imposto ali pago, pese embora as normas (internas e convencionais) não contemplassem uma solução para o problema de o crédito de imposto não poder ser deduzido por ausência da colecta desta empresa.
VIII - Os rendimentos obtidos pela sucursal de Macau em 1994 estavam isentos de tributação, e, por consequência, em relação a eles não se coloca a questão do englobamento. Todavia, a partir de 1 de Janeiro de 1995, e por força das alterações introduzidas pela Lei nº 39-B/94, de 27/12, os rendimentos obtidos pela sucursal de Macau ficaram sujeitos ao regime geral previsto no art. 4º, nº 1, do CIRC, beneficiando do crédito de imposto por dupla tributação, nos termos definidos nos arts. 71º, nº 2, al. b), e 73º, e, por conseguinte, esses rendimentos ficaram sujeitos ao englobamento definido no art. 58º, nº 1, alínea b), do CIRC.
IX - As sucursais, sendo tributadas em imposto sobre o rendimento no Estado onde estão localizadas, têm de determinar nesse país o seu lucro tributável (calculado com base no resultado líquido apurado à luz da contabilidade organizada segundo as regras desse Estado e com observância das regras contabilísticas e fiscais nele vigentes, que estão obrigadas a cumprir), aí podendo deduzir todas as despesas que a legislação desse Estado aceite como dedutíveis para o apuramento do lucro tributável que aí é sujeito a tributação.
X - Todavia, todos os rendimentos obtidos por essas sucursais têm também de ser refletidos na contabilidade da empresa sede e, nesta fase, todas as regras contabilísticas e fiscais a observar são as vigentes em Portugal para o apuramento do lucro tributável da empresa sede residente neste país. Razão por que os gastos (da empresa sede e suas sucursais) são dedutíveis em Portugal apenas na medida em que estejam previstos na legislação fiscal nacional e com os limites que essa lei impõe a tais deduções.
Nº Convencional:JSTA00069696
Nº do Documento:SA2201605110351
Data de Entrada:03/20/2014
Recorrente:FAZENDA PÚBLICA
Recorrido 1:A..., S.A.
Votação:UNANIMIDADE
Ref. Acórdãos:
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TT1INST LISBOA
Decisão:PROVIDO
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - IMPUGN JUDICIAL.
Legislação Nacional:CPPTRIB99 ART125.
CPC13 ART615 N1 B.
CIRC01 ART5 N2 B ART4 N1 ART71 N2 B ART73 ART58 N1 B ART41 N4 ART33 N1 D ART32.
DL 48497 DE 07/24 ART2 ART5 N2 B ART7.
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC0459/08 DE 2008/09/24.
Referência a Pareceres:PAR CENTRO DE ESTUDOS FISCAIS 50/96.
Referência a Doutrina:ALBERTO DOS REIS - CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL ANOTADO VOLV PÁG140.
ALBERTO XAVIER - DIREITO TRIBUTÁRIO INTERNACIONAL 2ED PÁG325.
PINTO FERNANDES E NUNO FERNANDES - CIRC IRS ANOTADO E COMENTADO 5ED ANOTAÇÃO AO ART73 PÁG457-458.
Aditamento: