Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0458/13
Data do Acordão:10/16/2013
Tribunal:PLENO DA SECÇÃO DO CT
Relator:CASIMIRO GONÇALVES
Descritores:DESPACHO DE REVERSÃO
FUNDAMENTAÇÃO
RECURSO POR OPOSIÇÃO DE JULGADOS
Sumário:A fundamentação formal do despacho de reversão basta-se com a alegação dos pressupostos e com a referência à extensão temporal da responsabilidade subsidiária que está a ser efectivada (nº 4 do art. 23º da LGT) não se impondo, porém, que dele constem os factos concretos nos quais a AT fundamenta a alegação relativa ao exercício efectivo das funções do gerente revertido.
Nº Convencional:JSTA00068409
Nº do Documento:SAP201310160458
Data de Entrada:04/03/2013
Recorrente:FAZENDA PÚBLICA
Recorrido 1:A...
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC OPOS JULGADOS
Objecto:AC TCA SUL DE 2012/06/26
AC TCA SUL DE 2009/09/29 - PROC03071/09
Decisão:NEGA PROVIMENTO
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - REC JURISDICIONAL
Legislação Nacional:LGT ART23 ART24
CPPTRIB99 ART153
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC0580/12 DE 2012/10/31; AC STA PROC0953/12 DE 2013/01/23
Referência a Doutrina:JORGE LOPES DE SOUSA - CÓDIGO DE PROCEDIMENTO E PROCESSO TRIBUTÁRIO ANOTADO 2ED 2000 PAG701 NOTA4
Aditamento:
Texto Integral: Acordam no Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

RELATÓRIO
1.1. A Fazenda Pública recorre, por oposição de acórdãos, do aresto do Tribunal Central Administrativo Sul que deu provimento ao recurso que A………………… interpusera da sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa, na qual, por sua vez, se julgara improcedente a oposição contra a execução fiscal para cobrança de dívidas de IRS, IRC e IVA dos anos de 2000, 2003 a 2005, inicialmente instaurada contra a devedora originária B………………., Lda.
Invoca existência de oposição de acórdãos entre o acórdão recorrido e o acórdão proferido no TCA Sul, em 29/9/2009, no proc. nº 03071/09.

1.2. Admitido o recurso, a recorrente apresentou, nos termos do disposto no nº 3 do art. 284º do CPPT, alegações tendentes a demonstrar a alegada oposição de julgados (fls. 866-868).

1.3. Por despacho do Exmo. Relator junto do TCAS (fls. 869) considerou-se existir a invocada oposição de acórdãos e foi ordenada a notificação das partes para deduzirem alegações, nos termos do disposto no nº 5 do art. 284º do CPPT.

1.4. A recorrente termina as alegações do recurso formulando as conclusões seguintes:
1) Entre os doutos Acórdãos em causa, o fundamento e o recorrido, existe oposição susceptível de determinar o prosseguimento do presente recurso, encontrando-se preenchido o condicionalismo previsto no art. 284º do CPPT.
2) Deve ser fixada como jurisprudência desse Venerando Tribunal, a constante do douto Acórdão fundamento, isto é, de que está devidamente fundamentado o despacho de reversão, nos termos do art. 23º nº2 da LGT e art. 153º nº2 do CPPT, desde que demonstre a inexistência de bens penhoráveis do devedor principal e seus sucessores ou a sua fundada insuficiência, de acordo com os elementos constantes do auto de penhora não sendo necessário que demonstre, também, o exercício efectivo da gerência por parte do revertido.
3) Na verdade, parece-nos mais adequado concluir, contrariamente ao deliberado no Acórdão recorrido que considerou que, para o despacho de reversão estar devidamente fundamentado necessita, para além da declaração da inexistência ou fundada insuficiência de bens penhoráveis do devedor originário e seus sucessores, da demonstração do exercício efectivo da gerência, com indicação do período de exercício do cargo, que a lei, de acordo com as normas citadas, não exige que o despacho de reversão contenha, também, a demonstração de o revertido ter sido gerente de facto no período a que respeita a dívida.
Termina pedindo que se decida no sentido de que existe oposição de julgados e que o recurso seja julgado procedente, de acordo com a jurisprudência constante do acórdão fundamento, revogando-se o acórdão recorrido.

1.5. A recorrida A………………… apresentou contra-alegações, formulando as conclusões seguintes:
A) No caso de se concluir que existe oposição entre os dois acórdãos, ao abrigo do disposto no art. 284º CPPT, o presente recurso deve prosseguir tendo em vista a sua apreciação e o dirimir do conflito de jurisprudência.
B) O despacho de reversão sub judice não se encontra suficientemente fundamentado, em virtude da «...total ausência de menção do exercício da gerência pela revertida, bem como, a completa omissão de indicação da normação legal, sustentante da imputada responsabilidade subsidiária.», conforme resulta do acórdão recorrido.
C) Ao contrário do entendimento da Recorrente, o despacho de reversão não se basta, em termos de fundamentação, com a demonstração de inexistência de bens penhoráveis do devedor principal e seus sucessores ou a sua fundada inexistência, carecendo ainda da demonstração do exercício da gerência por parte da Revertida.
D) Tal entendimento é, desde logo, posto em causa pelo elemento sistemático de interpretação das normas, impondo-se uma análise do conjunto dos diplomas (incluindo a Lei Fundamental) que regulam a matéria.
E) Pelo que não é possível restringir a análise da questão da fundamentação do despacho de reversão à interpretação literal dos artigos nº 2 do art. 23º LGT, com a norma do nº 2 do art. 153º CPPT.
F) O art. 24º, nº 1 LGT introduz um elemento fundamental na determinação do conteúdo do dever de fundamentação do despacho de reversão, e que é o exercício efectivo das funções de gerente, sendo este elemento relevado ao nível da jurisprudência maioritária dos tribunais administrativos superiores.
G) O Ac. do TCA Sul de 28/02/2012 - CT 2º Juízo, Proc. 02698/08, refere quanto aos fundamentos a incluir no despacho de reversão, «têm de ser alegados, incorporados, no despacho de reversão e comprovados pela administração tributária/AT, com a obrigatoriedade de indicação das normas legais em que esta faz apoiar a responsabilidade subsidiária imputada ao revertido», um pressuposto de cariz substantivo (declaração da inexistência ou fundada insuficiência de bens penhoráveis do devedor originário (e seus sucessores), e um requisito constitutivo do direito à reversão, (a gerência, mais, específica e exigentemente, o exercício efetivo da gerência), sob pena de falta de fundamentação e consequente anulação do acto.
H) O Ac. TCA Norte de 11/03/2010, Proc. nº 00349/05.6BEBRG, refere que «a AT, pese embora a possibilidade referida em V, que assiste ao tribunal em sede de oposição à execução fiscal, não pode dispensar-se de alegar no despacho de reversão a gerência de facto.»
I) O Ac. STA de 03/02/2011, Proc. 0944/10, refere que «Nos termos do artigo 24º, nº 1, da LGT, não basta para a responsabilização das pessoas aí indicadas a mera titularidade de um cargo, sendo indispensável que tenham sido exercidas as respectivas funções.»
J) Aliás, o regime do anterior CPT coincide em pleno com o regime da LGT, evidência demonstrada pela utilização nos dois normativos da mesma expressão «...e outras pessoas que exerçam...», constituindo pois, tal exercício efectivo ou de facto, um dos pressupostos para poder haver lugar à responsabilidade subsidiária.
K) Uma vez que estamos perante um acto tributário de natureza excepcional, dado que constitui um desvio ao princípio da capacidade contributiva, existe em relação ao mesmo um especial dever de fundamentação, não só por se tratar de um acto administrativo que afecta direitos e interesses subjectivos (arts. 125º do CPA), mas também para plena salvaguarda do seu direito de defesa (art. 268º CRP e art. 77º LGT).
L) O despacho de reversão deveria, pois, conter em termos de fundamentação, as razões de facto e de direito que levaram o órgão de execução fiscal a decidir como decidiu, de modo a que a revertida, no pleno exercício do seu direito de defesa, pudesse impugnar a decisão por erro nos pressupostos ou qualquer outro vício.
M) Conforme consta do acórdão recorrido, a propósito da ausência da menção do exercício da gerência e da correspondente normação legal ao nível do despacho de reversão, «...estes défices são, objectiva e independentemente de qualquer tipo de adivinhação sobre se, pelo conteúdo da petição de oposição, a oponente compreendeu o sentido e o alcance da ocorrida reversão, idóneos, bastantes, para reputarmos insuficiente a fundamentação do despacho apreciando, insuficiência que encerra vício equiparável à falta de fundamentação, com a mesma consequência directa: a anulação do ato afetado (arts. 125º nº 2 e 135º CPA)»
N) Assim, improcede em toda a linha o recurso interposto, devendo o conflito jurisprudencial ser dirimido a favor da jurisprudência constante do acórdão recorrido.
Termina pedindo a confirmação do julgado recorrido.

1.6. O MP emite Parecer nos termos seguintes, além do mais:
«1. O conflito de jurisprudência deverá ser decidido por adesão à doutrina do acórdão recorrido, com a restrição de que é suficiente a alegação do exercício efectivo do cargo e a indicação do período temporal relevante (período de verificação do facto constitutivo da dívida tributária ou período do prazo legal de pagamento ou entrega).
2. ARGUMENTÁRIO
1º A responsabilidade subsidiária efectiva-se por reversão do processo de execução fiscal (art. 23º nº 1 LGT).
O despacho de reversão dá início ao procedimento para efectivação da responsabilidade subsidiária; sendo um acto administrativo tributário, o despacho de reversão está sujeito a fundamentação, como corolário do princípio constitucional da fundamentação expressa e acessível dos actos administrativos (art. 268º nº 3 CRP; arts. 23º nº 4 e 77º nº 1 LGT).
2º São pressupostos da responsabilidade subsidiária (arts. 23º nº 4 e 24 nº 1 LGT):
- a inexistência ou fundada insuficiência dos bens penhoráveis do devedor principal, dos responsáveis solidários e seus sucessores (art. 23º nº 2 LGT; art. 153º nº 2 CPPT);
- o exercício efectivo do cargo nos períodos relevantes de verificação do facto constitutivo da dívida tributária ou do prazo legal de pagamento ou entrega (art. 24º nº 1 LGT).
3º Enquanto acto administrativo tributário o despacho de reversão deve incluir igualmente a indicação das normas legais que determinam a imputação da responsabilidade subsidiária ao revertido, por forma a permitir-lhe o eventual exercício esclarecido do direito de defesa (art. 77 nº 1 LGT).
4º A fundamentação formal do despacho de reversão deve bastar-se com a mera alegação dos pressupostos e extensão temporal da responsabilidade subsidiária (art. 23º nº 4 LGT).
5º Em caso de discordância o revertido exercerá o direito de defesa mediante dedução de oposição onde, de acordo com as regras de repartição do ónus da prova aplicáveis às distintas situações das previsões legais:
- incumbe à administração tributária comprovar a alegação de exercício efectivo do cargo e a culpa do revertido na insuficiência do património da pessoa colectiva ou ente fiscalmente equiparado para a satisfação da dívida tributária, quando esta se tenha constituído no período de exercício do cargo ou cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado após aquele exercício (art. 24º nº 1 a) LGT).
- incumbe ao revertido comprovar que não lhe é imputável a falta de pagamento pelas dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período de exercício do cargo (art. 24º nº 1 al. b) LGT).
6º A jurisprudência do STA-SCT pronunciou-se no sentido propugnado quanto ao conteúdo da fundamentação do despacho de reversão (acórdãos STA-SCT 31.10.2012 processo nº 580/12; 23.01.2013 processo nº 953/12).
3. No caso concreto a aplicação da solução da questão fundamental de direito submetida à apreciação do STA tem como consequência jurídica a ilegalidade do despacho de reversão por omissão de alegação do exercício efectivo do cargo e de indicação das normas legais que determinam a imputação da responsabilidade subsidiária ao executado revertido (probatório al. K); acórdão recorrido fls. 826).
CONCLUSÃO
O recurso não merece provimento.
O conflito de jurisprudência deve ser resolvido mediante solução da questão fundamental de direito nos termos enunciados na fundamentação»

1.7. Corridos os vistos legais, cabe decidir.

FUNDAMENTOS
2. Nas instâncias julgaram-se provados os factos seguintes, tendo o especificado na alínea K) sido aditado pelo acórdão recorrido, ao abrigo da al. a) do nº 1 do art. 712º do CPC:
A) Em 25/03/2005, foi instaurado no serviço de finanças de Vila Franca de Xira 2, o processo de execução fiscal nº 3573200501007556 e apensos, à sociedade B……………….., LDA. (Cfr. fls 1 e ss do PEF).
B) As dívidas referem-se a IRC de 2003, coimas fiscais, IVA de 2004 e 2005, IRS de 2000, 2004 e 2005.
C) Em 21/06/2005 foi lavrado no serviço de finanças de Vila Franca de Xira 2, o auto de diligências de fls 15 do PEF, no qual se deixa exarado que foram penhorados créditos contabilizados pela executada B…………………., LDA., no montante de 2.777,94, e penhorou-se a sua conta bancária que se encontrava devedora e que “Sendo notória a insuficiência de meios da executada para solver as suas dívidas fiscais, propõe-se o desencadear imediato do processo de reversão contra os responsáveis subsidiários da mesma.”.
D) Em 24/05/2006 foi proferido despacho de reversão pelo chefe do serviço de finanças de Vila Franca de Xira 2, pelo qual se reverteu as dívidas mencionadas em A) e B) contra a ora oponente, na qualidade de responsável subsidiária.
E) O despacho mencionado na alínea anterior refere a “insuficiência de bens penhoráveis do devedor principal”, identificando a natureza das dívidas e o montante da dívida exequenda.
F) Em 01/06/2006 foi assinado o aviso de recepção referente à citação da oponente para os termos da execução fiscal mencionada em A).
G) As condições do mercado não eram as melhores para o desenvolvimento da actividade da executada originária.
H) A oponente era sócia e única gerente da sociedade executada originária desde 28/05/1998 (cfr. certidão do Registo Comercial de fls 145 dos autos).
I) A sociedade executada originária obrigava-se com a intervenção de um gerente (cfr. certidão do Registo Comercial de fls 145 dos autos).
J) A oponente era a pessoa que na sociedade executada originária assinava todos os documentos que obrigavam esta sociedade.
K) O despacho de reversão, referido em D) e E), tem a seguinte redação:
Face às diligências de folhas 5 e estando concretizada a audição do(s) responsável(eis) subsidiário(s), prossiga-se com a reversão da execução contra na A………………….. contribuinte nº ……………., morador em Av. ………………, ………….., nº …../…- ……….. - Queluz, na qualidade de responsável subsidiário, pela dívida abaixo discriminada.
Atenta a fundamentação infra, a qual tem de constar da citação, proceda-se à citação do(s) executado(s) por reversão, nos termos do art.º 160.º do CPPT para pagar no prazo de 30 (trinta) dias, a quantia que contra si reverteu sem juros de mora nem custas (nº5 do art.º 23.º da LGT).

Fundamentos da reversão
Insuficiência de bens penhoráveis do devedor principal
…, cfr. fls 10 do PA apenso.

3.1. O presente recurso vem interposto do acórdão proferido na Secção de Contencioso Tributário do TCA Sul, em 26/6/2012 (fls. 823/834), invocando a recorrente que o mesmo está em oposição com o acórdão proferido na Secção do Contencioso Tributário do mesmo TCA Sul, em 29/9/2009, no proc. 03071/09.
E como acima se referiu, por despacho proferido em 20/11/2012 (fls. 869) o Exmo. relator do acórdão recorrido considerou verificada a apontada oposição de acórdãos.
Mas porque tal decisão do relator não faz, nesse âmbito, caso julgado, nem impede ou desobriga o Tribunal de recurso de a apreciar - cfr. art. 685º-C, nº 5 do CPC – podendo, se for caso disso, ser julgado findo o respectivo recurso, (( ) Cfr. o ac. deste STA, de 7/5/2003, proc. nº 1149/02: «o eventual reconhecimento judicial da alegada oposição de julgados pelo tribunal recorrido, ao abrigo, nos termos e para os efeitos do disposto no referido art. 284° nº 5 do CPPT não só não faz, sobre o ponto, caso julgado, pois apenas releva em sede de tramitação/instrução do respectivo recurso, como, por isso, não obsta a que o Tribunal Superior, ao proceder à reapreciação da necessária verificação dos pressupostos processuais de admissibilidade, prosseguimento e decisão daquele recurso jurisdicional, considere antes que aquela oposição se não verifica e, em consequência, julgue findo o recurso».
Cfr. também neste sentido Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário: Anotado e Comentado, volume II, 5ª ed., Lisboa, Áreas Editora, 2007, p. 814 (nota 15 ao art. 284º).) importa, então, averiguar se a alegada oposição de acórdãos se verifica.

3.2. Sendo ao caso aplicável o regime legal resultante do ETAF de 2002, nos termos dos arts. 2º, nº 1, e 4º, nº 2, da Lei nº 13/2002, de 19/2, na redacção da Lei nº 107-D/2003, de 31/12, a admissibilidade do recurso por oposição de acórdãos, tendo em conta o regime previsto nos artigos 27º, al. b) do ETAF e 152º do CPTA, depende, como se deixou expresso no ac. de 26/9/2007, do Pleno da Secção do Contencioso Tributário deste STA, no processo nº 0452/07, da satisfação dos seguintes requisitos:
«– existir contradição entre o acórdão recorrido e o acórdão invocado como fundamento sobre a mesma questão fundamental de direito;
– a decisão impugnada não estar em sintonia com a jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo.
Como já entendeu o Pleno da Secção do Contencioso Administrativo deste Supremo Tribunal Administrativo (() Acórdão de 29-3-2006, recurso nº 1065/05), relativamente à caracterização da questão fundamental sobre a qual deve existir contradição de julgados, devem adoptar-se os critérios já firmados no domínio do ETAF de 1984 e da LPTA, para detectar a existência de uma contradição:
– identidade da questão de direito sobre que recaíram os acórdãos em confronto, que supõe estar-se perante uma situação de facto substancialmente idêntica;
– que não tenha havido alteração substancial na regulamentação jurídica;
– que se tenha perfilhado, nos dois arestos, solução oposta;
– a oposição deverá decorrer de decisões expressas e não apenas implícitas (() Neste sentido, podem ver-se os seguintes acórdãos da SCA:
– de 29-3-2006, recurso n.º 1065/05;
– de 17-1-2007, recurso n.º 48/06;
– de 6-3-2007, recurso n.º 762/05;
– de 29-3-2007, recurso n.º 1233/06.
No mesmo sentido, pode ver-se MÁRIO AROSO DE ALMEIDA e CARLOS CADILHA, Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, 2ª edição, páginas 765-766.)».
Por um lado, portanto, a oposição deverá decorrer de decisões expressas, não bastando a pronúncia implícita ou a mera consideração colateral, tecida no âmbito da apreciação de questão distinta e, por outro lado, a oposição de soluções jurídicas pressupõe identidade substancial das situações fácticas, entendida esta não como uma total identidade dos factos mas apenas como a sua subsunção às mesmas normas legais.

3.3. Neste contexto, importa, então, apreciar se se verifica, ou não, a suscitada oposição no que respeita à questão em apreciação nos acórdãos em confronto e que se prende com o conteúdo da fundamentação do despacho de reversão proferido em processo de execução fiscal.
Vejamos, pois.

4.1. A oponente/recorrida A…………….. deduziu a presente oposição à execução fiscal e apensos contra si revertida por dívidas de IRS, IRC, IVA (dos anos de 2000, 2003 a 2005) e de coimas fiscais, da executada originária B………………., Lda..
No Tribunal Tributário de Lisboa foi proferida sentença que decidiu julgar improcedente tal oposição (excepto quanto à dívida de coimas e custas processuais).
Tendo a oponente interposto recurso da sentença, o TCA Sul, dando provimento ao recurso, revogou a sentença e julgou procedente a oposição.
Considerou-se, para tanto, no respectivo acórdão (ora recorrido), o seguinte, no que aqui releva:
- Em face da exigência legal de fundamentação do despacho de reversão e apesar de essa fundamentação dever resultar da especificidade de cada caso, há elementos imprescindíveis que devem integrar o conteúdo dos fundamentos a incluir e a externar no texto do próprio despacho, pelo que será em função dos “termos contextuais” deste que devem determinar-se a sua validade e legalidade.
- Do nº 2 do art. 153º do CPPT e do nº 2 do art. 23º da LGT emerge desde logo um pressuposto de cariz substantivo, essencial, da reversão de qualquer execução fiscal, e que corresponde à declaração da inexistência ou fundada insuficiência de bens penhoráveis do devedor originário (e seus sucessores).
- De outra banda, na condição de requisito constitutivo do direito à reversão, encontramos o exercício efectivo da gerência, o qual, se estiverem em causa situações (como no caso presente) susceptíveis de enquadramento na previsão do nº 1 do art. 24º da LGT, impõe a circunstanciada indicação do período do exercício do cargo: se na data da constituição das dívidas exequendas e/ou se na data do pagamento ou entrega do tributo respectivo.
- Ambos os apresentados pressupostos têm de ser alegados, incorporados, no despacho de reversão e comprovados pela AT, com a obrigatoriedade de indicação das normas legais em que esta faz apoiar a responsabilidade subsidiária imputada ao revertido, para permitir-lhe conhecer e questionar, atacando, se necessário, os concretos pressupostos determinantes da reversão da execução contra si.
- No caso, presente o teor da al. K) dos factos provados, complementado com a análise integral do documento («DESPACHO (REVERSÃO)»), verifica-se que, quanto à decisão de reversão emitida contra a oponente, a total ausência de menção do exercido da gerência pela revertida, bem como, a completa omissão de indicação da normação legal, sustentante da imputada responsabilidade subsidiária.
- E estes défices são, objectiva e independentemente de se tentar saber se a oponente compreendeu, pelo conteúdo da petição de oposição, o sentido e o alcance da ocorrida reversão, idóneos, bastantes, para reputar de insuficiente a fundamentação do dito despacho de reversão, o que encerra vício equiparável à falta de fundamentação, com a mesma consequência directa: a anulação do acto afectado (arts. 125º nº 2 e 135º do CPA).

4.2. Por sua vez, no acórdão fundamento (proferido na Secção de Contencioso Tributário do TCA Sul, em 29/9/2009, no proc. nº 03071/09) estavam em causa dois recursos:
(i) um interposto pela Fazenda Pública, no qual a questão a apreciar se reconduzia quer a uma questão de facto (saber se, face à data da cessação de funções de gerência do ali oponente, nos autos existiam ou não elementos factuais que permitissem identificar se os factos tributários sobre que incidiu o lucro do exercício de 2003 ocorreram ou não no período de gerência efectiva), quer à questão de saber é ao revertido que cabe o ónus da prova (relativamente a dívidas tributárias cujo facto constitutivo se tenha verificado no período de exercício do cargo de gerente ou cujo prazo legal de pagamento ou de entrega tenha terminado depois deste) de não ter sido por culpa sua que o património da sociedade se tornou insuficiente para a sua satisfação;
(ii) um outro, interposto pelo ali oponente, no qual a questão a apreciar se reconduziu à de saber se a fundamentação do despacho de reversão deve também demonstrar a gerência de facto do revertido e bem assim que foi por culpa deste que se verificou a insuficiência ou insuficiência de bens penhoráveis do devedor originário.

4.3. É apenas quanto a este recurso que importa considerar o acórdão fundamento.
O qual, relativamente a esta matéria exara o seguinte:
«Nos termos do disposto no art. 23º da Lei Geral Tributária (LGT), com entrada em vigor em 1.1.1999 – cfr. art. 6º do Dec-Lei nº 398/98, de 17 de Dezembro – a responsabilidade subsidiária efectiva-se por reversão do processo de execução fiscal (seu nº 1).
A reversão contra o responsável subsidiário depende da fundada insuficiência dos bens penhoráveis do devedor principal e dos responsáveis solidários, sem prejuízo do benefício da excussão prévia – seu nº 2.
A reversão, mesmo nos casos de presunção legal de culpa, é precedida de audição do responsável subsidiário nos termos da presente lei e da declaração fundamentada dos seus pressupostos e extensão, a incluir na citação – seu nº 4.
Ao nível processual, sobre esta matéria, dispõem as normas do artigo 153º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT):
2 – O chamamento à execução dos responsáveis subsidiários depende da verificação de qualquer das seguintes circunstâncias:
a) Inexistência de bens penhoráveis de devedor e seus sucessores;
b) Fundada insuficiência, de acordo com os elementos constantes do auto de penhora e outros de que o órgão da execução fiscal disponha, do património do devedor para a satisfação da dívida exequenda e acrescido.
De acordo com estas normas citadas, a lei não exige que o despacho de reversão contra o responsável subsidiário pelo pagamento da dívida tenha como pressupostos também, a demonstração de o revertido ter sido gerente de facto no período a que respeita a dívida exequenda nem a culpabilidade do mesmo na existência de bens penhoráveis, contrariamente ao invocado pelo recorrente, mas tão só que demonstre a inexistência de bens penhoráveis do devedor principal e seus sucessores ou a sua fundada insuficiência, de acordo com os elementos constantes do auto de penhora.
A falta de gerência de facto no período a que respeita a dívida exequenda ou a falta de culpa do revertido pela falta ou insuficiência do património do devedor para solver a dívida exequenda, antes constitui um fundamento válido de oposição à execução fiscal, que o mesmo poderá utilizar para vir a ser desresponsabilizado pelo pagamento dessa dívida, subsumível na norma da alínea b), nº 1, do art. 204º do CPPT – por não figurar no título e não ser responsável pelo pagamento da dívida – mas não como pressupostos a constarem do despacho de reversão por a lei os não ter erigido como tais ((1) Cfr. neste sentido Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário, anotado, 2ª Edição revista e aumentada, 2000, VISLIS, pág. 701, nota 4.)
(…)
No caso, como consta da matéria das alíneas B) e C) do probatório e melhor se colhe dos autos, de fls. 11 e segs., foram, pelo órgão da execução fiscal, efectuadas diligências no sentido de apurar bens penhoráveis da sociedade executada e como nenhuns foram encontrados, legitimada se encontrava a AT para proceder à reversão contra o responsável subsidiário pelo pagamento da dívida, pelo que tal despacho de reversão não padece do invocado vício de falta de fundamentação, quer formal, quer substancial, tendo sido verificados os pressupostos que a lei faz depender a reversão da dívida contra o responsável subsidiário (falta ou insuficiência de bens da devedora originária) e que foram erigidos como suporte factual no mesmo despacho de reversão, que assim não pode lograr eivado do invocado vício.
No entanto, tal matéria face à prolação do despacho de reversão não ficava desde logo arrumada, bem podendo o oponente e ora recorrente no âmbito do seu direito ao contraditório, ter vindo alegar e provar a existência de bens da executada originária, suficientes para solver a dívida exequenda, cujo ónus da prova assim lhe pertencia nos termos disposto no art. 74º, nº 1 da LGT, tendo em vista infirmar factualidade contrária à apurada em sede do mesmo despacho de reversão, e se o conseguisse, então seria a oposição de julgar procedente, por erro nos pressupostos de facto de tal despacho, conducente à sua anulação, o que o mesmo não fez pelo que o presente recurso não pode deixar de improceder.»

4.4. Confrontando os citados arestos e o teor das Conclusões do recurso, concluímos que, tal como aponta o Exmo. Procurador-Geral adjunto, a questão a decidir se prende com o conteúdo da fundamentação do despacho de reversão proferido em processo de execução fiscal e que, considerando o quadro normativo decorrente das disposições contidas nos arts. 23º, nºs. 2 e 4, 24º, nº 1 e 77º, nº 1, da LGT e no art. 153º, nº 2, do CPPT, os acórdãos em confronto se pronunciaram sobre essa questão em termos divergentes.
Na verdade, o acórdão recorrido conclui que o despacho de reversão terá de conter (i) a declaração de inexistência ou fundada insuficiência de bens penhoráveis do devedor originário e seus sucessores, (ii) a alegação e comprovação pela administração tributária do período de exercício efectivo do cargo (período do facto constitutivo da dívida tributária ou período do prazo legal de pagamento ou entrega) e (iii) a indicação das normas legais que permitem a imputação da responsabilidade subsidiária ao revertido, enquanto que o acórdão fundamento concluiu que o despacho de reversão terá de conter somente a declaração de inexistência ou fundada insuficiência de bens penhoráveis do devedor originário e seus sucessores, demonstrada pelos elementos constantes do auto de penhora.
E para além disso também, por outro lado, se verificam os restantes pressupostos da oposição de acórdãos, nomeadamente a identidade de situações fácticas e a não alteração substancial na regulamentação jurídica, sendo, pois, de concluir que se verifica, no caso, a invocada oposição de acórdãos, susceptível de fundamentar o presente recurso.

5. Importa, portanto, conhecer de fundo.
Vejamos.
5.1. De acordo com o disposto no nº 1 do art. 23º da LGT, a responsabilidade subsidiária efectiva-se por reversão do processo de execução fiscal, sendo o despacho que a ordena (despacho de reversão) o acto que dá início ao procedimento para efectivação da responsabilidade subsidiária.
E sendo um acto administrativo tributário, aquele despacho está sujeito a fundamentação, dado até o princípio constitucional da fundamentação expressa e acessível dos actos administrativos (nº 3 do art. 268º da CRP) densificado, no caso, no nº 4 do art. 23º e nº 1 do art. 77º da LGT. Daí que, enquanto acto administrativo tributário, o despacho de reversão deva incluir, além da indicação das normas legais que determinam a imputação da responsabilidade subsidiária ao revertido, por forma a permitir-lhe o eventual exercício esclarecido do direito de defesa (citado nº 1 do art. 77º da LGT), também a «declaração fundamentada dos seus pressupostos e extensão, a incluir na citação» - cfr. nº 4 do art. 23º da LGT. (De acordo com o disposto neste nº 4 do art. 23º da LGT «A reversão, mesmo nos casos de presunção legal de culpa, é precedida de audição do responsável subsidiário nos termos da presente lei e da declaração fundamentada dos seus pressupostos e extensão, a incluir na citação».)
Ora, são pressupostos da responsabilidade tributária subsidiária, a inexistência ou fundada insuficiência dos bens penhoráveis do devedor principal, dos responsáveis solidários e seus sucessores (nº 2 do art. 23º da LGT e nº 2 do art. 153º do CPPT), bem como o exercício efectivo do cargo nos períodos relevantes de verificação do facto constitutivo da dívida tributária ou do prazo legal de pagamento ou entrega desta (nº 1 do art. 24º da LGT).
Daí que a fundamentação formal do despacho de reversão se baste com a alegação dos pressupostos e com a referência à extensão temporal da responsabilidade subsidiária que está a ser efectivada (citado nº 4 do art. 23º da LGT).
Não se impondo, porém, que dele constem os factos concretos nos quais a AT fundamenta a alegação relativa ao exercício efectivo das funções do gerente revertido.
É que, como se exara no acórdão de 31/10/2012, da Secção do Contencioso Tributário deste STA, processo nº 0580/12, «não … parece, porém, … que seja necessário que do despacho de reversão constem os factos concretamente identificados nos quais a Administração tributária fundamenta a sua convicção relativa ao efectivo exercício de funções, pois que em causa não está uma acusação em matéria sancionatória e persistindo dúvida acerca do efectivo exercício de funções o “non liquet” não poderá deixar de ser valorado contra a Administração fiscal, que invoca o direito a responsabilizar o gerente, pois que inexiste presunção legal no sentido de que o gerente de direito exerça de facto as suas funções, daí que não possa seriamente defender-se que a não invocação no despacho de reversão de tais factos possa comprometer a defesa do responsável subsidiário» (No mesmo sentido ver também o acórdão de 23/1/2013, processo nº 0953/12.) sendo que, em caso de discordância, o revertido sempre poderá exercer o direito de defesa mediante dedução de oposição onde, de acordo com as regras de repartição do ónus da prova aplicáveis às distintas situações das previsões legais (i) incumbe à AT comprovar a alegação de exercício efectivo do cargo e a culpa do revertido na insuficiência do património da pessoa colectiva ou ente fiscalmente equiparado para a satisfação da dívida tributária, quando esta se tenha constituído no período de exercício do cargo ou cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado após aquele exercício (al. a) do nº 1 do art. 24º da LGT); (ii) incumbe ao revertido comprovar que não lhe é imputável a falta de pagamento pelas dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período de exercício do cargo (al. b) do nº 1 do art. 24º da LGT).

5.2. Neste contexto, descendo ao concreto caso dos autos e considerando a factualidade julgada provada no acórdão recorrido, nomeadamente a especificada na al. K) do Probatório, constata-se que o despacho de reversão é omisso quanto à alegação do exercício efectivo do cargo e quanto à indicação das normas legais que determinam a imputação da responsabilidade subsidiária ao executado revertido.
E apesar de o acórdão recorrido ter concluído que o despacho de reversão deve conter, além do mais, não só a alegação, mas também a comprovação, por parte da AT, do período de exercício efectivo do cargo, nada obsta, como salienta o MP, citando o Cons. Jorge Lopes de Sousa, (Código de Procedimento e de Processo Tributário, anotado e comentado, Áreas Editora, 6ª ed., 2011, Vol. IV, p. 485. Cfr. também o acórdão do Pleno da SCT do STA, de 20/10/2004, processo nº 1076/03, ali referenciado.) a que no recurso por oposição de acórdãos não se adira ao entendimento contido nos arestos em confronto: a solução da questão não obriga à adesão a um dos entendimentos em confronto, podendo o tribunal de recurso optar por solução distinta, no exercício do seu poder de livre indagação, interpretação e aplicação das regras de direito - art. 664º CPC (a que corresponde o actual nº 3 do art. 5º do novo CPCivil).
Ou seja, nada obsta a que ora se decida o conflito de jurisprudência e o subjacente recurso, por adesão à doutrina do acórdão recorrido, mas com a restrição de que é suficiente a alegação do exercício efectivo do cargo e a indicação do período temporal relevante (período de verificação do facto constitutivo da dívida tributária ou período do prazo legal de pagamento ou entrega).
Solução da qual resulta, de todo o modo, a ilegalidade do despacho de reversão por omissão de alegação do exercício efectivo do cargo e de indicação das normas legais que determinam a imputação da responsabilidade subsidiária ao executado revertido.
Pelo que, neste contexto, improcede o presente recurso por oposição de acórdãos, impondo-se, a confirmação do acórdão recorrido, com a presente fundamentação.


DECISÃO
Termos em que, face ao exposto, acordam os Juízes do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em, julgando verificada a invocada oposição de acórdãos, negar provimento ao recurso e confirmar, com a presente fundamentação, o acórdão recorrido.
Custas pela recorrente.
Lisboa, 16 de Outubro de 2013. – Joaquim Casimiro Gonçalves (relator) – Dulce Manuel da Conceição Neto – João António Valente Torrão – Isabel Cristina Mota Marques da Silva – José da Ascensão Nunes Lopes – Pedro Manuel Dias Delgado.