Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0147/17
Data do Acordão:05/03/2018
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ASCENSÃO LOPES
Descritores:COIMA
Sumário:I - Justifica-se, a admissão do recurso interposto ao abrigo do n.º 2 do artigo 73.º do RGCO – para melhoria da aplicação do direito e promoção da uniformidade da jurisprudência -, da decisão final que anulou a decisão de aplicação da coima para que seja organizado um só processo ou efectuada a apensação dos vários processos a fim de ser proferida uma decisão de aplicação de coima (única) caso se verifiquem os pressupostos da infracção continuada porquanto tal decisão se afigura desconforme à jurisprudência deste STA em casos semelhantes.
II - Estando em causa nos presentes autos decisão de aplicação de coima por não pagamento ou pagamento viciado de taxas de portagem em infra-estruturas rodoviárias, p.p. pela Lei n.º 25/2006, de 30 de Junho, e, sendo do conhecimento público que esta lei foi objecto de recente alteração pela Lei n.º 51/2015, de 8 de Junho, concluindo-se que esta Lei se repercute necessária e inelutavelmente nas decisões de aplicação de coima questionada nos autos – por imposição constitucional e legal do princípio da aplicação retroactiva da lei nova mais favorável - haverá que oficiosamente ordenar a baixa dos autos à autoridade administrativa para que esta reveja ou renove a(s) decisão(ões) de aplicação de coima(s) em conformidade com o disposto na Lei n.º 51/2015, de 8 de Junho.
Nº Convencional:JSTA000P23231
Nº do Documento:SA2201805030147
Data de Entrada:02/09/2017
Recorrente:A......, LDA
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam, em conferência, nesta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo

1 – RELATÓRIO
A…………, Ld.ª, devidamente identificada nos autos, vem recorrer para este Supremo Tribunal da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria que julgou improcedente o recurso e confirmou a coima no valor de €713,38 acrescida do valor das custas no montante de € 76,50.
Inconformada com o assim decidido, apresentou as respectivas alegações que resumiu nas seguintes conclusões:
«a) O objeto do presente recurso é a decisão proferida no processo n. 52/15.9BELRA em 22-09-2016 pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria.
b) A Arguida não pode concordar com a decisão do tribunal a quo, em primeiro lugar por não se encontrar preenchido o elemento subjetivo do dolo.
c) Na verdade, a Arguida praticou a dita infração para evitar um mal maior (neste caso, a sua integridade física/vida e de outros automobilistas) agindo assim ao abrigo do estado de necessidade desculpante, o que exclui a ilicitude.
d) A Arguida não poderá ser imputada mais do que uma conduta negligente.
e) Além disso, através da culpa reduzida é possível optar antes pela pena de admoestação, tal como admitido na decisão do tribunal a quo.
f) Acresce o facto que o tribunal a quo não conheceu da questão prévia de ter a lei sancionatória sido alterada posteriormente e ser mais favorável à arguida, nem a conheceu oficiosamente, tal como é seu dever por imposição constitucional do Artigo 292/4 da CRP.
Nestes termos e nos mais de direito, deve o presente recurso ordinário ser admitido como tal, e considerado procedente, e em consequência revogando - se o Acórdão recorrido e substituindo - o por outro, que julgue procedente a presente ação aplicando à arguida uma admoestação, ou caso, não seja esse entendimento de V. Ex.ª que seja ordenado a baixa dos autos à autoridade administrativa, para que renove a sua decisão final, fazendo V. Exªs, Venerando Conselheiros, a costumada justiça.

Não foram apresentadas contra alegações.

Neste Supremo Tribunal, o Ministério Público a fls. 124 e seguintes emitiu parecer com o seguinte conteúdo:
«Recurso interposto por A………., Lda., em processo de contraordenação tributária.
A factualidade fixada assentou que a recorrente, sendo proprietária de veículo automóvel, transpôs, a 2-9-2012, barreira de portagem, através de uma via reservada ao sistema eletrónico de portagens denominado Via verde, sem que o dito veículo se encontrasse associado por força de contrato de adesão ao respetivo sistema, e não tendo, em consequência, procedido ao pagamento da taxa de portagem devida.
Em face do que invoca o recorrente quanto à falta do elemento subjetivo essa descrição é suscetível de conduzir à prática com dolo.
Aliás, a recorrente concordou a que se tivesse decidido por despacho, o que não permite que ponha agora em causa a factualidade fixada.
E não é de aplicar a admoestação por tal sanção não se encontrar prevista no R.G.I.T., nomeadamente nos arts. 26.º e ss., em que se preveem apenas a sua redução, dispensa e atenuação especial.
Contudo, os autos são de mandar remeter à autoridade administrativa que aplicou a coima a fim de que seja proferida nova decisão de acordo ainda com o novo regime punitivo, na procedência da questão prévia que se invoca a final.
Aliás, é de verificar que na decisão de aplicação de coima tal como consta proferida a fls. 23 e que foi confirmada pela sentença recorrida não foram satisfeitas referências legalmente exigidas quanto à mesma.
Com efeito, é apenas indicado ter a punição ocorrido pelo art. 7.º da Lei n.º 25/06, de 30/6, sem referência ao n.º aplicado.
E nessa disposição punitiva contém-se ainda um n.º 3, relativo à punição por negligência, importando que se deixe claro tal.
Também não foram especificadas as circunstâncias descritas no art. 27.º n.1 do R.G.I.T., de que depende a graduação na coima que foi fixada no montante de € 713,38.
E a determinação da coima depende sempre de uma apreciação quanto a essas circunstâncias.
Ora, essas faltas Integram a referida nulidade insuprível prevista no art. 63.º n.º 1 al. d) do R.G.I.T. subsidiariamente aplicável, que conduz também a que seja revogada a decisão de aplicação da coima que foi proferida.
Concluindo:
O recurso é de proceder quanto a ser de revogar a sentença proferida e mandar enviar os autos à autoridade administrativa, a fim de que possa ser proferida nova decisão quanto à coima a aplicar de acordo com a atual redação do art. 7.º da Lei n.º 25/06, de 30/6.
Tal revogação impõe-se por não constar da decisão de aplicação da coima a que n.º do art. 7º da lei n.º 25/06, de 30/6 se refere, nem terem sido apreciado as circunstâncias previstas no art. 27.º n.º 1 do R.G.I.T., subsidiariamente aplicável, ocorrendo a nulidade insuprível prevista no art. 63.º n.º 1 al. d) do R.G.I.T..»

2 - Fundamentação

O Tribunal “a quo” deu como provada a seguinte matéria de facto.
1. Em 2012, a Recorrente era titular do direito de propriedade da viatura de matrícula …………. - cf. fls, 15 dos autos, que se dá por integralmente reproduzida; facto não controvertido;
2. Em 2012, a viatura de matrícula …………. não estava autorizada a circular na via verde pelo facto de não ter um identificador válido atribuído que permitisse a sua passagem pelos respetivos corredores, sendo que apenas em 06.09.2013 foi associado um identificador a esta viatura - cf. fls. 10 a 15 dos autos, que se dão por integralmente reproduzidas;
3. Em 20.08.2013, foi levantado auto de notícia pelo Serviço de Finanças de Torres Novas em nome da Recorrente com fundamento na violação, em 02.09.2012, através da utilização da viatura de matrícula …………., do disposto no artigo 5º, n.º 1, alínea a) da Lei n. 25/06, de 30/06 - cf. fls. 3 dos autos, que se dá por integralmente reproduzida;
4. Em 20.08.2013, com base no auto de notícia referido no ponto 3. Que antecede, foi autuado em nome da Recorrente o processo de contraordenação (PCO) n.º 2119201306015727 - cf. fls. 2 e 3 dos autos, que se dão por integralmente reproduzidas;
5. A Recorrente foi notificada, para, além do mais, apresentar a sua defesa no âmbito do PCO n.º 2119201306015727 - cf. fls. 14 e 15 dos autos, que se dão por integralmente reproduzidas;
6. Em 22.10.2013, a Recorrente apresentou defesa no âmbito do PCO n. 2119201306015727 - cf. fls. 6 e 7 dos autos, que se dão por integralmente reproduzidas;
7. Por despacho do Chefe do Serviço de Finanças de Torres Novas, no âmbito do PCO n.º 2119201306015727, foi aplicada à Recorrente coima no montante de € 713,38, acrescida de custas no valor de €76,50 - cf. fls. 23 dos autos, que se dá por integralmente reproduzida;
8. Em 12.02.2015, foi apresentado o presente recurso judicial - cf. carimbo a fls. 71 dos autos.


A decisão recorrida tem a seguinte fundamentação jurídica:
(…)
A questão a decidir nos presentes autos consiste em saber se o presente PCO deve ser arquivado ou se deve ser aplicada uma sanção de admoestação.
Vejamos:
Estabelece o artigo 5°, n.°1 alínea a) da Lei n.º 25/06, de 30/06 o seguinte:
“1 - Constitui contraordenacão, punível com coima, nos termos da presente lei, o não pagamento de taxas de portagem resultante:
a) Da transposição de uma barreira de portagem através de uma via reservada a um sistema eletrónico de cobrança de portagens sem que o veículo em causa se encontre associado, por força de um contrato de adesão, ao respetivo sistema;”.
Ora, ficou provado nos presentes autos que em 2012 a Recorrente era titular do direito de propriedade da viatura de matrícula …………. (cf. ponto 1. dos factos provados)
Flui ainda dos factos provados que em 2012 a viatura de matrícula …………. não estava autorizada a circular na via verde pelo facto de não ter um identificador válido atribuído que permitisse a sua passagem pelos respetivos corredores, sendo que apenas em 06.09.2013 foi associado um identificador a esta viatura (cf. ponto 2. dos factos provados).
De resto, do teor da petição inicial apresentada não resulta que a Recorrente conteste de forma firme esta factualidade, admitindo que tal possa ter ocorrido em virtude das muitas viagens que realiza naquele percurso.
Assim sendo, e sem necessidade de mais amplas considerações, impõe-se concluir que a Recorrente, efetivamente, praticou a contraordenação de que vem acusada, razão pela qual improcedem nesta parte as alegações formuladas na petição inicial.
Vejamos, agora, se pode ser in casu aplicada a sanção de admoestação.
Estabelece o artigo 51.º do RGCO que “Quando a reduzida gravidade da infração e da culpa do agente o justifique pode a entidade competente limitar-se a proferir uma admoestação.”
Ora, no caso dos autos não foram alegados na petição inicial quaisquer factos dos quais se possa retirar que a culpa da Recorrente é reduzida. Nesta conformidade, tendo em conta o recorte probatório dos presentes autos, concluímos que não ficou demonstrado que a conduta da Recorrente revela uma culpa reduzida, elemento indispensável para que possa ser aplicada a sanção de admoestação.
Notamos que a culpa relevante para efeitos de preenchimento do tipo contraordenacional deve ser determinada de uma forma objetiva, ou seja, tendo em conta a factualidade assente nos presentes autos, e não numa vertente meramente subjetiva.
Deste modo, improcedem também estas alegações da Recorrente.

IV Decisão
Termos em que julgamos o presente recurso de aplicação da coima, intentado por A……… Ldª, improcede por não provado.

DECIDINDO NESTE STA
Previamente se dirá que seguiremos de perto o acórdão deste STA de 14/10/2015 tirado no recurso nº 0766/15 disponível no site da DGSI.
Questões a decidir:
Haverá previamente que decidir da admissibilidade do recurso, ao abrigo do disposto no n.º 2 do artigo 73.º do Regime Geral do Ilícito de Mera Ordenação Social (RGIMOS) subsidiariamente aplicável – para melhoria da aplicação do direito ou promoção da uniformidade da jurisprudência -, porquanto o valor da causa é inferior ao da alçada (cfr. o artigo 83.º, n.º 1 do RGIT) e este STA não se encontra vinculado pela decisão de admissão do recurso proferida pelo tribunal a quo.
Caso seja de admitir, suscita-se, a questão de saber se esta enferma de erro de julgamento a decisão recorrida.
Não obstante, estando em causa recurso de decisão de aplicação de coima por não pagamento ou pagamento viciado de taxas de portagem em infra-estruturas rodoviárias – matéria primariamente regulada pela Lei n.º 25/2006, de 30 de Junho –, importa, como questão prévia à do conhecimento do mérito do(s) recurso(s), oficiosamente decidir das consequências da entrada em vigor da Lei n.º 51/2015, de 8 de Junho nos recursos de decisões de aplicação de coimas por contra-ordenações daquela natureza pendentes nos tribunais tributários, porquanto a questão de aplicação no tempo de lei mais favorável constitui uma questão prévia de conhecimento oficioso, que prejudica, imediatamente, a apreciação das restantes questões objecto do recurso, dado que a apreciação da situação da recorrida, à luz da nova Lei poderá envolver a repetição do que tiver sido anteriormente processado (cfr. artigo 608.º, n.º 2, do CPC, aplicável “ex vi” artigo 4.º do CPP, aplicável “ex vi” artigo 41.º do Decreto-Lei n.º 433/83, aplicável “ex vi” artigo 3.º, alínea b), do RGIT, aplicável “ex vi” artigo 18.º da Lei n.º 26/2006, de 30 de Junho).
Da admissibilidade do recurso ao abrigo do artigo 73.º, n.º 2 do RGCO, subsidiariamente aplicável.
No que concerne ao recurso da decisão final atendendo a que a decisão nele tomada não considerou a lei nº 51/2015 de 08/06, tal julgamento afigura-se desconforme ao que vem sendo decidido por este STA em outros recursos de contra-ordenação tributários por factos idênticos e assim sendo, julga-se justificada a admissão do recurso ao abrigo do n.º 2 do artigo 73.º do RGCO, em ordem à promoção da uniformidade da jurisprudência e à melhoria da aplicação do direito, havendo, pois, que dele conhecer.
Apreciando.
Questão prévia: Consequências da entrada em vigor da Lei n.º 51/2015, de 8 de Junho nos recursos de decisões de aplicação de coimas por não pagamento ou pagamento viciado de taxas de portagem em infra-estruturas rodoviárias
Estando em causa nos presentes autos decisão de aplicação de coima por não pagamento ou pagamento viciado de taxas de portagem em infra-estruturas rodoviárias, p.p. pela Lei n.º 25/2006, de 30 de Junho, e, sendo do conhecimento público que esta lei foi objecto de recente alteração pela Lei n.º 51/2015, de 8 de Junho que, além do mais, aprovou um regime excepcional de regularização de dívidas resultantes do não pagamento de taxas de portagem e coimas associadas, por utilização de infra-estrutura rodoviária, importa como questão prévia e de conhecimento oficioso ajuizar das consequências da entrada em vigor da nova lei nos recursos de decisões de aplicação de coimas por contra-ordenações daquela natureza pendentes nos tribunais tributários, porquanto a questão de aplicação no tempo de lei mais favorável constitui uma questão prévia de conhecimento oficioso, que prejudica, imediatamente, a apreciação das restantes questões objecto do recurso, dado que a apreciação da situação dos autos, à luz da nova Lei poderá envolver a repetição do que tiver sido anteriormente processado (cfr. artigo 608.º, n.º 2, do CPC, aplicável “ex vi” artigo 4.º do CPP, aplicável “ex vi” artigo 41.º do Decreto-Lei n.º 433/83, aplicável “ex vi” artigo 3.º, alínea b), do RGIT, aplicável “ex vi” artigo 18.º da Lei n.º 25/2006, de 30 de Junho), prejudicando o conhecimento do mérito do recurso.
Isto porque, em matéria penal, como em matéria contra-ordenacional, vigora por imperativo constitucional e legal a regra da aplicação retroactiva da lei mais favorável – cfr. artigos 29.º, n.º 4 da CRP, 2.º, n.º 4 do Código Penal e 3.º, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 433/82, aplicável “ex vi” artigo 3.º, alínea b) do RGI, aplicável “ex vi” artigo 18.º da Lei n.º 26/2006, de 30 de Junho) – daí que o facto de em causa nos autos estarem contra-ordenações praticadas em data anterior à da entrada em vigor da Lei nova não constitui obstáculo a essa aplicação se esta lei se revelar mais favorável.
E é precisamente isso que sucede.
Em primeiro lugar, porque o artigo 7.º da Lei n.º 51/2015, de 8 de Junho, ao dar nova redacção ao n.º 1 do artigo 7.º da Lei n.º 25/2006, procedeu à alteração dos limites mínimo e máximo das coimas aplicáveis às contra-ordenações previstas naquela lei no sentido da sua redução, pois que estas passaram a ser sancionadas com coima de valor mínimo correspondente a 7,5 vezes o valor da respetiva taxa de portagem, mas nunca inferior a €25 e de valor máximo correspondente ao quádruplo do valor mínimo da coima, com respeito pelos limites máximos previstos no Regime Geral das Infracções Tributárias, ao invés de serem sancionadas com coima de valor mínimo correspondente a 10 vezes o valor da respectiva taxa de portagem, mas nunca inferior a (euro) 25, e de valor máximo correspondente ao quíntuplo do valor mínimo da coima, com respeito pelos limites máximos previstos no Regime Geral das Infracções Tributárias. Ora, tendo sido reduzidos os limites mínimo e máximo das coimas aplicáveis às contra-ordenações em causa, impõe-se necessariamente nova graduação da coima aplicada, que os tenha agora em conta, o que necessariamente implica uma nova decisão administrativa de aplicação da coima.
Em segundo lugar porque o artigo 7.º da Lei n.º 51/2015, de 8 de Junho, ao aditar ao artigo 7.º da Lei n.º 25/2006 os seus (novos) números 4 e 5, procedeu à unificação legal das infracções previstas naquela lei praticadas pelo mesmo agente, no mesmo dia, através da utilização do mesmo veículo e que ocorram na mesma infraestrutura rodoviária, entendendo-se como tal as ocorridas em estrada cuja exploração está concessionada ou subconcessionada à mesma entidade, determinando que esta contra-ordenação única seja sancionada com coima cujo valor mínimo a que se refere o n.º 1 é o correspondente ao cúmulo das taxas de portagem. Ora, esta unificação legal a que procedeu a lei nova, porque prescinde da averiguação das circunstâncias de que depende a contra-ordenação continuada, pode revelar-se, em concreto, mais favorável ao agente, daí que, verificados os respectivos pressupostos legais haverá que proceder à respectiva unificação da conduta delituosa e aplicar-lhe a cominação legalmente estabelecida, nos novos limites fixados pela nova lei, o que também necessariamente implica uma nova decisão administrativa de aplicação da coima.
Em terceiro lugar, porque a Lei n.º 51/2015 aprovou um regime excepcional de regularização de dívidas resultantes do não pagamento de taxas de portagem e coimas associadas, por utilização de infra-estrutura rodoviária efectuada até ao último dia do segundo mês anterior ao da sua publicação – que consta dos seus artigos 1.º a 6.º -, no qual se prevê que o pagamento pelo agente da infracção da taxa de portagem e custos administrativos efectuado até 60 dias a contar da entrada em vigor da lei, determina, além do mais, a atenuação da coima associada ao incumprimento do dever de pagamento, atenuação especial esta que há-de efectuar-se ope legis e em termos diversos e mais favoráveis do que os que decorrem das regras gerais sobre a atenuação especial da coima (cfr. o artigo 3.º da Lei n.º 51/2015 com o artigo 18.º, n.º 3 do Decreto-Lei n.º 433/82, aplicável subsidiariamente).
Finalmente, porque o mesmo regime excepcional, aprovado por aquela lei, prevê a redução legal das coimas não aplicadas ou não pagas (…) cuja regularização ocorreu antes da entrada em vigor da Lei n.º 51/2015, que venham a ser pagas até 60 dias a contar da entrada em vigor da lei (artigo 4.º, n.ºs 2 e 3 da Lei n.º 51/2015), havendo, obviamente, que apurar, neste caso como no anterior, se houve ou não adesão do agente da infracção ao regime excepcional e, em caso afirmativo, proceder à atenuação/redução da(s) coima(s) em causa nos termos legais, o que implica também novas decisão de aplicação da(s) coima(s).
Pelas razões expostas, a decisão administrativa de aplicação da coima sindicada nos presentes autos e a sentença que a confirmou não podem manter-se - desde logo, porque há que graduar a(s) coima(s) aplicada(s) dentro dos novos limites legais e eventualmente retirar as legais consequências do pagamento ao abrigo do regime excepcional das taxas de portagem e/ou das coimas -,o que apenas poderá ser feito de modo adequado e eficiente pelos próprios Serviços, que não pelos Tribunais, a quem não cabe substituir-se à Administração nas decisões de aplicação coimas, antes escrutinar, se para tal solicitados, se tais decisões são conformes à Lei e ao Direito.
A decisão de aplicação de coima que está na origem dos presentes autos foi tomada em momento anterior ao da entrada em vigor da nova Lei, mas esta repercute-se inelutavelmente nela, como supra demonstrado, impedindo que possa subsistir nos termos em que foram proferidas. Por sua vez a decisão judicial agora sindicada apenas atendeu ao disposto na Lei 25/06 de 30/06 ignorando a entrada em vigor da dita Lei n.º 51/2015.
Impõe-se, em consequência, a baixa dos autos à Autoridade Administrativa para que esta tenha a oportunidade de as rever ou renovar, em conformidade com o novo quadro legal, o que se determina.
Prejudicado fica o conhecimento do objecto do recurso.
3- Decisão -
Termos em que, face ao exposto, decidem os Juízes deste STA em:
- admitir o recurso da decisão final e, quanto a este, procedendo questão prévia e de conhecimento oficioso, revogar tal decisão e determinar a baixa dos autos à autoridade administrativa para que esta reveja ou renove as decisões de aplicação da(s) coima(s) em conformidade com a Lei n.º 51/2015, de 8 de Junho, nos termos supra expostos, assim se concedendo provimento ao recurso.
Sem custas.

Lisboa, 3 de Maio de 2018. - Ascensão Lopes (relator) - Ana Paula Lobo - António Pimpão.