Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0589/15
Data do Acordão:06/28/2017
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:FONSECA CARVALHO
Descritores:EXECUÇÃO FISCAL
RECLAMAÇÃO E GRADUAÇÃO DE CRÉDITOS
Sumário:Existindo reclamação com vista à verificação e graduação de créditos no processo de execução fiscal, o pagamento voluntário da dívida exequenda efectuado posteriormente à venda dos bens que garantiam os créditos reclamados, não determina a inutilidade da lide em relação ao processo de verificação e graduação que deverá prosseguir para os efeitos do disposto no artigo 265 do CPPT.
Nº Convencional:JSTA00070258
Nº do Documento:SA2201706280589
Data de Entrada:05/12/2015
Recorrente:CAIXA ECONÓMICA MONTEPIO GERAL
Recorrido 1:A...... E FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF PORTO
Decisão:PROVIDO
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - EXEC FISCAL
Legislação Nacional:CCIV66 ART817.
CPPTRIB99 ART176 N1 A ART246 ART265 N3.
CPC13 ART917 N2.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam os Juízes da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo.

Relatório
Não se conformando com o despacho do mº juiz do TAF do Porto que julgou extinta a instância no processo de execução fiscal nº 3964199901017470 instaurado pela AT contra A………. e referente a dívidas de IRS do ano de 1995 veio a Caixa Económica Montepio Geral dele interpor recurso para a Secção do Contencioso Tributário do Supremo tribunal Administrativo formulando as seguintes conclusões:

A O pagamento conducente à extinção da execução não torna supervenientemente inútil o prosseguimento dos autos de verificação e graduação de créditos
B Caixa Económica Montepio Geral foi citada para a execução fiscal e nela deduziu oportunamente reclamação para pagamento dos seus créditos pelo produto da venda de dois imóveis penhorados e sobre os quais tinha garantia real de hipotecas
C Foi feita a venda judicial com aceitação de propostas, depósito de preço e adjudicação desses imóveis
D A credora reclamante só pode ser paga na execução fiscal pelos bens sobre que tiver garantia real e conforme graduação dos seus créditos e os direitos sobre as coisas vendidas transferem-se para o produto da venda dos respectivos bens
E Sem a sentença de verificação e graduação de créditos não podem ser feitos os pagamentos ao credor reclamante
F Quer haja pagamento coercivo quer haja pagamento voluntário se já tiverem sido vendidos os bens e o produto da venda for para graduar com outros credores reclamantes e se ainda não estiver feita a graduação dos créditos reclamados a execução prossegue para verificação e graduação desses créditos conforme é de lei expressa artigo 256/3 do CPPT
G De outro modo a credora reclamante perdia a garantia real da hipoteca sobre os imóveis e sobre os produtos da venda par o qual aquela se transferiu
H A sentença recorrida violou por erro de interpretação e aplicação ente outros o disposto nos artigo 873 nº 2 d do anterior CPC (796 nº 2 do actual CPC) “ex vi ”dos artigos 2º al e) e 246 do CPPT bem como os artigo 245 247 261 nº1 e maxime 265 nºs 1 e 3 do CPPT
Deve dar-se provimento ao recurso e ordenar-se a baixa dos autos ao Tribunal “a quo” para a prolacção da sentença de verificação e graduação de créditos.

Não houve contra alegações.

O Mº Pº emitiu o seguinte parecer:
O presente recurso vem interposto da decisão de folhas 202 que pôs termo ao processo e julgou extinta a instância por inutilidade superveniente da lide ao abrigo do disposto nos artigos 277 al. e) do CPC e 246 do CPPT
Alega o recorrente que a sentença padece de ilegalidade por vício de violação de lei já que os autos deviam prosseguir para pagamento da quantia exequenda ainda não paga e dos créditos reclamados não se verificando a inutilidade da lide que serviu de fundamento à extinção da instância
Considera assim que foram violados os artigos 796 nº 2 do actual CPC (anterior 873/2) “ex vi” dos artigos 2 al e) e 246 do CPPT bem como os artigos 245 247 261 nº 1 e “maxime” 265 nºs 1 e 3 do CPPT
Conforme se alcança da decisão recorrida a reclamação de créditos apresentada pelo Montepio Geral na qualidade de credor hipotecário foi apresentada em 16 03 2009 no âmbito do processo de execução fiscal nº 3964 99 1017470 que correu termos no serviço de Finanças de Vila Nova de Gaia e ao qual estão apensados outros processo e no qual havia sido penhorado o imóvel para garantia de € 16 718,05 correspondente ao valor das quantias exequendas dos vários processos e do acrescido.
O referido imóvel foi vendido ao Montepio e após a venda o executado efectuou vários pagamentos por conta ficando apenas em divida o valor do processo da execução fiscal nº 396 4200601104217 no valor de € 4681,40
Na sequência daqueles pagamentos o serviço de finanças declarou extintos todos os processos incluindo o processo principal nº 396 4 99 1017470 com excepção do referido processo nº 3964200601104217
Depreende-se assim, com mediana clareza, que, restando a dívida deste último processo, o produto da venda do imóvel servirá para pagamento dos créditos reclamados para os quais se transferiram as garantias dos créditos que oneravam o bem alienado e o crédito exequendo não se verificando assim a inutilidade da lide.
O facto de o processo executivo que servia de processo principal ter sido declarado extinto é perfeitamente indiferente uma vez que os processos estavam apensos e a penhora do imóvel ter sido realizada para garantia das quantias exequenda de cada um deles
Daí que se o processo que serve de processo principal for por qualquer motivo extinto será designado um dos outros como principal
Como no caso dos autos apenas se manteve um processo é esse à ordem do qual ficará o produto da venda do imóvel e ao qual ficará apensa o processo de verificação e graduação de créditos
Por outro lado tendo o pagamento da quantia exequenda e extinção da execução ocorrido após a venda do imóvel penhorado não faria sentido que os créditos reclamados não fossem graduados para ser pago com o produto da venda para o qual se transferiram os direitos reais de garantia
É o que resulta do disposto nos artigos 917 nº2 e 918 do CPC de aplicação subsidiária (artigo 246 do CPPT)
A decisão recorrida reveladora de um formalismo exacerbante não pode assim ser mantida por ilegal.
Em face do exposto entendemos que o recurso deve ser julgado procedente e a sentença revogada determinando-se a baixa dos autos à 1ª instância a fim de ser proferida sentença de graduação de créditos.

Fundamentação:

De Facto:
Dá-se aqui por reproduzido o despacho de folhas 202 em que o Mº Juiz “a quo” julgou extinta a instância relativamente ao processo de verificação e graduação de créditos pelo facto de o executado ter pago voluntariamente a quantia exequenda.

De direito:
O Mº juiz no seguimento do parecer do MºPº d folha 185 julgou extinta a instância por inutilidade superveniente da lide relativamente ao processo de verificação e graduação de créditos em que é reclamante a ora recorrente Caixa Económica Montepio Geral.
Para tanto considerou que o processo de execução que dera origem aos presentes autos – o processo de execução fiscal nº 39641 9991017470 – se encontrava extinto por pagamento nos termos do disposto no artigo 176 al a) e 264/1 do CPC.
A recorrente não se conforma com tal decisão na medida em que tendo visto penhorar e vender na execução fiscal os imóveis sobre os quais os créditos por si reclamados gozavam da garantia real de hipoteca se torna premente o prosseguimento dos autos para graduação e pagamento dos seus créditos com o produto da venda dos mesmos sob pena de ver perdida essa garantia.
Vejamos.
O processo de reclamação e verificação de créditos vem regulado nos artigos 240 e segs do CPPT e assenta no princípio de que o património do executado devedor é a garantia comum de todos os credores como dispõe o artigo 817 do Código Civil.
Não sendo a obrigação voluntariamente cumprida, tem o credor o direito de exigir judicialmente o seu cumprimento e de executar o património do devedor, nos termos declarados neste código e nas leis de processo.
Como refere José Alberto dos Reis in processo de execução vol 2º pp 242 “promovida a execução por um credor chama-se ou admitem-se a intervir outros credores do executado a fim de que a expropriação forçada dos bens do devedor não se realize em proveito exclusivo do exequente e com sacrifício dos direitos dos restantes credores”.
No caso dos autos não se questiona a verificação dos créditos reclamados mas tão só a necessidade de prosseguimento dos autos para a necessária graduação dado que vendidos que foram os bens sobre os quais os créditos reclamados gozavam da garantia real da hipoteca esse direito de garantia se transferiu para o produto da venda nos termos do disposto no nº 3 do artigo 824 do Código Civil.
E não se diga que tendo o executado pago voluntariamente a dívida exequenda e decorrendo do artigo 176 nº 1 alínea a) do CPPT que o processo de execução fiscal se extingue com tal pagamento que a situação é necessariamente uma situação de inutilidade da lide.
Tal só será assim se o processo de execução apenas respeitar ao exequente e executado.
Mas a reclamação de créditos é como se disse um processo especifico, de concurso de credores, e na medida em que a venda dos bens do executado ocorreu no decorrer da execução deixando por isso de ser a garantia real dos créditos do reclamante que se transfere para o produto da venda há que proceder à sua graduação face ao produto da venda nos termos do disposto no artigo 917 nº 2 do CPC aplicável ex vi do artigo 246 do CPPT e 265 nº 3 do CPPT que expressamente dispunha.

Artigo 265.º
Formalidades do pagamento voluntário
1 - O pagamento poderá ser requerido verbalmente e efectuar-se-á no mesmo dia, por meio de guia ou documento de cobrança equivalente a aprovar, passada pelo funcionário competente.
2 – (Revogado pelo Decreto-Lei n.º 238/2006, de 20 de Dezembro).
3 - O pagamento não sustará o concurso de credores se for requerido após a venda e só terá lugar, na parte da dívida exequenda não paga, depois de aplicado o produto da venda ou o dinheiro penhorado no pagamento dos créditos graduados.
Redacção dada pelo seguinte diploma: Decreto-Lei n.º 238/2006, de 20 de Dezembro

Porque a sentença assim não considerou padece de erro de julgamento de direito pelo que não pode manter-se já que contrariamente ao decidido se não verifica a inutilidade da lide.

Decisão:
Face ao exposto acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida e determinar a baixa dos autos ao Tribunal de 1ª Instância para proceder à necessária graduação dos créditos reclamados.
Sem custas.

Lisboa, 28 de Junho de 2017. – Fonseca Carvalho (relator) – Isabel Marques da Silva – Pedro Delgado.