Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01236/04
Data do Acordão:05/03/2005
Tribunal:2 SUBSECÇÃO DO CA
Relator:ANTÓNIO MADUREIRA
Descritores:PESSOAL DOS SERVIÇOS DO REGISTO E NOTARIADO.
PARTICIPAÇÃO EMOLUMENTAR.
Sumário:I - A nulidade prevista no artigo 668.º, n.º 1, alínea c), do CPC, verifica-se quando os fundamentos invocados devam, logicamente, conduzir a uma decisão oposta ou, pelo menos, diferente daquela que foi tomada.
II - Não se verifica essa nulidade num acórdão que, após considerar que, em face da lei, os emolumentos dos oficiais dos registos e notariado deviam ser calculados tendo em conta o número de oficiais do quadro legal estabelecido (94), mas só atribuídos aos funcionários que prestaram efectivamente serviço, decidiu que não procediam as alegações do recorrente, nas quais defendia que só deviam entrar para o cálculo de emolumentos os funcionários que estivessem legalmente providos no cargo (24), sendo ilegal a ficção, feita no acto impugnado, de entrarem para esse cálculo funcionários que, apesar de terem prestado serviço efectivo, ainda não tinham aceite a nomeação (64), e, em consequência, negou provimento ao recurso, não anulando o acto que calculou os emolumentos distribuindo a receita arrecadada por 88 oficiais.
III - O cálculo dos emolumentos dos referidos oficiais deve ser feito tendo em conta o número de funcionários do quadro que prestaram efectivamente serviço e não o número de oficiais constante do quadro legal (artigo 61.º, n.ºs 1 e 2 do Decreto-Lei n.º 519- F2/79, de 29/12 e n.º s 3 e 4 da Portaria n.º 669/90, de 14/8).
IV - A participação emolumentar dos oficiais do Registo Nacional das Pessoas Colectivas deve ser calculada por referência à participação do Conservador das Conservatórias do Registo Comercial autonomizadas e não à do Director (artigos 81.º, n.º 3 e 82.º, n.º 3 do Decreto-Lei n.º 129/98, de 13/5, e n.º 6 da referida Portaria n.º 669/90).
Nº Convencional:JSTA00061819
Nº do Documento:SA12005050301236
Data de Entrada:11/19/2004
Recorrente:MINISTÉRIO PÚBLICO - OUTRO
Recorrido 1:SE DA JUSTIÇA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL.
Objecto:AC TCA DE 2004/05/20.
Decisão:NEGA PROVIMENTO.
Área Temática 1:DIR ADM GER - FUNÇÃO PUBL / ESTATUTÁRIO
Legislação Nacional:DL 519/F2/79 DE 1979/12/29 ART61 N1 ART61 N2.
DL 129/98 DE 1998/05/13 ART81 N3 ART82 N3.
PORT 669/90 DE 1990/08/14 N3 N4 N6.
Jurisprudência Nacional:AC TCA PROC256/97 DE 2000/11/30.
Referência a Doutrina:PAULO VEIGA E MOURA FUNÇÃO PÚBLICA VOLI PAG267.
JOÃO ALFAIA CONCEITOS FUNDAMENTAIS DO REGIME JURÍDICO DO FUNCIONALISMO PÚBLICO VOLII PAG792-799.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam, em conferência, na 2.ª Subsecção da Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo:
1. RELATÓRIO
1. 1. ..., com os devidos sinais nos autos, interpôs recurso, no Tribunal Central Administrativo (TCA), do despacho do Secretário de Estado da Justiça de 25/5/2000, que lhe negou provimento ao recurso hierárquico interposto "dos actos de processamento do seu vencimento, no que se refere ao cálculo da remuneração base, desde 6/1/99 até 16/12/99", imputando-lhe vários vícios de violação de lei.
Por acórdão desse tribunal de 20/5/2004, foi negado provimento ao recurso.
Com ele se não conformando, interpuseram recurso para este Supremo Tribunal o recorrente contencioso e o Magistrado do Ministério Público.
O recorrente/recorrente contencioso apresentou alegações, nas quais formulou as seguintes conclusões:
1.ª) - O artigo 61.º do DL 519-F/79, de 29/12, refere que aos Oficiais de Registo e do Notariado é abonado, a título de participação emolumentar, uma percentagem da receita global líquida da totalidade dos serviços, apurada em cada mês a favor dos Cofres dos Conservadores, Notários e Funcionários de Justiça.
2.ª) - Os Oficiais do Registo e do Notariado são funcionários públicos com nomeação definitiva em lugar do quadro, nos termos dos artigos 40.º e 43.º daquele diploma.
3.ª) - Só estes têm direito à participação emolumentar, apurada nos termos dos n.ºs 1 e 2 da Portaria n.º 699/90, de 14/8, que por eles é integralmente distribuída, na proporção dos respectivos vencimentos da categoria.
4.ª) - O acórdão recorrido, ao considerar acertado que deve ser ficcionada a participação emolumentar do recorrente como se o quadro do pessoal da Conservatória estivesse preenchido, entrando no englobamento trabalhadores que não estavam providos em lugares do quadro, mal interpreta e aplica as disposições legais atrás mencionadas.
5.ª) - A aceitação da nomeação determina o início de funções para todos os efeitos, designadamente o abono de remunerações - artigo 12.º do DL 427/89, de 7/12.
6.ª) - Sem ocorrer a aceitação da nomeação, não podiam aqueles trabalhadores ser incluídos na distribuição da participação emolumentar.
7.ª) - Assim não considerando, mal interpreta e aplica o mencionado artigo 12.º do DL 427/89, de 7/12.
8.ª) - Os limites de 70% e 40% previstos no n.º 6 da Portaria 669/90 têm por referência a participação emolumentar do Conservador e do Notário - dirigente máximo da Conservatória ou do Notariado, nos termos do artigo 23.º do DL 519-F/79, de 29/12.
9.ª) - No Registo Nacional das Pessoas Colectivas, o dirigente máximo é um Conservador, que, durante o período em que assegura a Direcção, tem a designação de Director - artigo 79.º do DL 139/98.
10.ª) - É por referência à sua participação emolumentar que têm que fixar os aludidos limites.
11.ª) - Assim não considerando, o acórdão recorrido mal interpreta e aplica esses dispositivos legais.
O Magistrado do Ministério Público, nas suas alegações, formulou as seguintes conclusões:
1.ª) - Como fundamentos à decisão considerou bem o Acórdão recorrido os emolumentos como vencimento de exercício, consistindo nos quantitativos que “(…) só devem ser abonados quando o funcionário se encontre no efectivo desempenho das funções do cargo e por efeito desse desempenho” .
2.ª) - Sob o título “Emolumentos - pressupostos vinculados do cálculo e distribuição ", fundamenta, entre o mais, o douto Acórdão recorrido que os pressupostos de cálculo e de distribuição da participação emolumentar são vinculadamente determinados ou pelo legislador ou pela Administração no exercício da actividade regulamentar - como decorre, claramente, do art.º 61.°, n.° 2, do DL 519- F2/79 e dos n.°s 1.°, 2.°, 3.º, 4.º e 6.° da Portaria 669/90, em obediência aos princípios da proibição do retrocesso social e da protecção da confiança.
3.ª) - Mais se fundamenta no recorrido Acórdão que «... não tem fundamento legal a hipótese de conferir à Administração liberdade de escolha de pressupostos em função do que, em juízo de valoração do caso concreto, pareça mais adequado para cálculo do vencimento emolumentar ou para a respectiva distribuição pelos trabalhadores em sede de relação jurídica de emprego público, na medida em que “ (..) por estar em causa um direito que beneficia de um regime análogo aos dos direitos, liberdades e garantias - o direito à retribuição - as remunerações de categoria e exercício só podem ser suspensas ou perdidas nas situações e condições taxativamente enunciadas na lei (..), cfr. art.°s 17.° e 59.°, a), da CRP.
4.ª) - E, ainda que «no que ao caso sub judice importa, o n.° 3 da Portaria n.° 669/90, ao determinar que “ A participação (...) será distribuída por todos os chefes de secção e oficiais, na proporção dos respectivos vencimentos de categoria (..), deve ser interpretado tendo por referência o direito à concreta participação emolumentar legalmente reconhecida segundo os seguintes parâmetros:
1. a posição jurídica de chefes de secção e oficiais (no caso concreto, de 2.° ajudante,);
2. o quadro de pessoal de oficiais do Registo Nacional de Pessoas Colectivas (no caso concreto, 6 ajudantes principais, 8 1.°s ajudantes, 20 2.°s ajudantes e 60 escriturários);
3. atento o efectivo desempenho de funções, pressuposto do direito a emolumentos legalmente conferido pelo artigo 61.º, n.° 1, do DL 519-F2/79, de 29.12 ».
5.ª) - Todavia, em contradição com os fundamentos anteriores, afirma-se, em termos conclusivos, no douto Acórdão: «O que quer dizer que o cálculo em concreto a distribuir por “todos os chefes de secção e oficiais” não flutua consoante no mês X e mês Y estejam "todos” ou “todos menos 1, 2 ou 3 funcionários”, mas é referenciado a um número estável e antecipadamente conhecido v. g. pelos credores dos emolumentos, porque reportado ao número de chefes de secção e oficiais que o quadro de pessoal legalmente comporta. ».
6.ª) - Contrariando os fundamentos em que se sustentou, o douto Acórdão em recurso, aplicou assim, as disposições do art.º 61.° do DL n.º 519-F2/79, de 29.12, e da Portaria n.° 669/90, de 14/08, como se o cálculo da participação emolumentar tivesse por base unicamente o número global de chefes de secção e oficiais que o quadro legal de pessoal comporta.
7.ª) - Mesmo admitindo o requisito do parâmetro 2., nos termos em que foi formulado no Acórdão (em vez de “pertencerem ao quadro de pessoal de oficiais...”, como a nosso ver o deveria ter sido), sempre haveria de o ponderar, de acordo com os seus fundamentos, ou seja, conjugado com os restantes requisitos, nomeadamente o do parâmetro 3. (efectivo desempenho de funções), porque cumulativo dos restantes.
8.ª) - É que o quadro pode não estar totalmente preenchido, ou pode haver funcionários de baixa, ou em comissão de serviço, os quais por não estarem no desempenho efectivo das respectivas funções não têm direito à percepção de emolumentos nesse período, por não verificação do requisito descrito no mencionado parâmetro 3. do Acórdão.
9.ª)- Daí que, ao contrário do que se conclui no referido Acórdão, o cálculo em concreto do valor a distribuir “por todos os chefes de secção e oficiais “possa flutuar conforme no mês X e mês Y esteja o quadro preenchido por “todos” ou “todos menos 1, 2, ou 3” ou conforme “todos” ou “todos menos 1, 2, ou 3” estejam ou não no exercício efectivo de funções.
10.ª) - Em tal conclusão, o Acórdão em recurso parte ainda de pressupostos errados, já que a Administração nem efectuou o cálculo da participação emolumentar pelo número global de chefes de secção e oficiais que o quadro legal comportava, num total de 94 - mas antes pelo número de 84 ou 88 funcionários que ali prestavam serviço - nem distribuiu o montante equivalente pelos 62 funcionários pertencentes ainda ao quadro do GEPMJ que ali prestavam serviço (ainda que sob qualquer outro titulo).
11.ª) - Em oposição aos fundamentos em que se sustentou, nomeadamente quanto aos «pressupostos de cálculo e de distribuição da participação emolumentar...» a decisão do acórdão recorrido acabou por considerar legal um acto discricionário da Administração na escolha de pressupostos que se lhe afigurou mais adequado, sem qualquer fundamento legal e sem qualquer obediência aos pressupostos a que legalmente estava vinculada - o fraccionamento do número de 62 funcionários em desempenho de funções, que ainda não pertenciam ao quadro do RNPC, como se já pertencessem a esse mesmo quadro, para efeitos de cálculo da participação emolumentar, não por forma a distribuir a qualquer outro título tal participação por aqueles funcionários - já que a título de participação emolumentar tal não lhe era legalmente permitido - mas sim para fazer reverter os respectivos montantes para o ex - Cofre do GGF.
12.ª) - Os fundamentos em que se firmou o acórdão em recurso conduziriam logicamente a uma decisão que considerasse o despacho recorrido como enfermando dos vícios que lhe foram atribuídos, de erro nos pressupostos de facto e de direito, consequentemente, dando provimento ao recurso, motivo porque não o tendo feito, incorre na nulidade da alínea c) do n.° 1 do art.º 668.° do CPC.
13.ª) - Assim não se entendendo, sempre pelos motivos atrás expostos, o acórdão em recurso interpretou e aplicou indevidamente as normas legais em que se fundamenta, com violação do art.º 61.° do DL n.º 519-F/79 de 29/12, por referência à Portaria n.° 669/90, de 14/08, enfermando de erro de julgamento, o que implica a sua anulabilidade.
14.ª) - Um dos fundamentos do despacho contenciosamente impugnado foi o facto dos 62 funcionários do GEPMJ, terem sido já nomeados em Novembro de 1998, após concurso aberto, só tendo porém aceite os respectivos lugares em Novembro de 1999, ou seja decorrido um ano, por vicissitudes relacionadas com a impugnação das suas nomeações, pesando o facto de estarem a exercer funções no RNPC desde finais de 1998.
15.ª) - No cálculo da participação emolumentar, havendo a considerar o número de funcionários que, cumulativamente, preencham os requisitos de pertencerem ao quadro de chefes de secção e oficiais e estarem no exercício efectivo dessas funções, deveria o Acórdão recorrido analisar e concluir, na solução dada anteriormente, se a nomeação desses funcionários, produziu ou não efeitos desde a sua nomeação ou se os produziu apenas a partir do acto de publicitação da sua nomeação e/ou da sua aceitação, face ao art.º 12.° do DL 427/89, de 07/12.
16.ª) - E, por a conclusão não poder deixar de ser esta última - motivo porque a Administração ficcionou o seu número como se pertencessem a esse quadro, para cálculo dos emolumentos, mas não lhes distribuiu o montante correspondente apurado, antes o revertendo para o ex - Cofre do GGF - deveria o Acórdão recorrido numa apreciação e decisão única ter dado provimento ao recurso contencioso.
17.ª) - Ao não ter conhecido do erro dos pressupostos de direito do início de funções constante do art.º 12.° do DL n.° 427/89, de 07/12, por o entender prejudicado pela solução dada à questão anterior, o Acórdão recorrido parte do pressuposto da solução anterior estar correcta, o que não acontece, incorrendo, por inerência, o douto Acórdão, nessa parte, em erro de julgamento.
A autoridade contenciosamente recorrida contra-alegou, tendo formulado as seguintes conclusões:
1.ª) - Ao recorrente foi processado um vencimento de exercício corresponde à receita emolumentar que a Administração arrecadou mediante o exercício efectivo de funções por 88 funcionários.
2.ª) - O vencimento dos oficiais dos registos e notariado é composto por uma parte fixa e uma variável, vencimento de exercício que resulta de receita arrecadada pelos serviços pela prática de actos pelos quais a Administração cobra taxas.
3.ª) - A receita global desses serviços resulta do exercício efectivo de funções por parte dos oficiais do registo e notariado.
4.ª) - Daí que a ele só tenham direito os funcionários que estão em exercício efectivo de funções.
5.ª) - O acto recorrido teve em conta uma realidade - a de exercerem efectivamente funções muito mais pessoas do que as que, na tese do recorrido deveriam receber, a receita gerada por esse mesmo exercício de funções, apenas por não terem ainda aceitado os lugares.
6.ª) - O acto recorrido adaptou normas aplicáveis à remuneração dos oficiais de registo e notariado, como é o recorrente, tendo em conta uma realidade excepcional.
7.ª) - A decisão recorrida não viola assim, disposições invocadas do D.L. 519-F/79, de 29-12, nem da Portaria n.° 669/90, de 14 de Agosto.
8.ª) - A decisão recorrida procede a uma interpretação e adaptação das normas relativas à remuneração dos oficiais de registo e notariado tendo em consideração uma situação anormal e transitória.
9.ª) - Na realidade, essa interpretação não configura uma violação daqueles dispositivos, pois na prática o recorrente auferiu como vencimento de exercício, quantitativo que, de acordo com tais disposições receberia num contexto normal.
10.ª) - Ao adaptar a uma situação anormal as normas de processamento de vencimento do Recorrente, agiu a Administração de forma proporcionada e adequada.
11.ª) - Não merece, por isso, censura o acto recorrido que deve por isso ser mantido.
1. 2. Por despacho do relator de fls 159 v.º - 160, foi ordenada a baixa dos autos ao TCA, para este tribunal se pronunciar sobre a nulidade do acórdão, arguida nas alegações de recurso do Ministério Público.
1. 3. O TCA emitiu essa pronúncia, através do acórdão de fls 162- 166.
1. 4. Foram colhidos os vistos dos Exm.ºs Juízes Adjuntos, pelo que cumpre decidir.
2. FUNDAMENTAÇÃO
2. 1. OS FACTOS:
O acórdão recorrido deu como provados os seguintes factos:
1. Por despacho de 23.12.98, do Director Geral dos Registos e Notariado, foi o A nomeado por urgente conveniência de serviço para a categoria de 2ª ajudante do quadro de pessoal da Direcção Geral dos Registos e do Notariado, Registo Nacional das Pessoas Colectivas - termo de aceitação de nomeação a fls. 81 do PA apenso.
2. A aceitação, por termo de nomeação, teve lugar no dia 06.01.1999 - fls. 81 PA apenso.
3. Por ofício de 28.01.99, a Directora do Registo Nacional de Pessoas Colectivas dirigiu a consulta junto do Director Geral dos Registos e do Notariado, nos termos que se transcrevem:
Consulta / Vencimentos / Cálculo na participação emolumentar dos oficiais
O quadro de pessoal do Registo Nacional de Pessoas Colectivas, no que respeita a oficiais, comporta os seguintes lugares:
6 Ajudantes Principais
8 1° s Ajudantes
20 2°s Ajudantes
60 Escriturários
Ao primeiro concurso para provimento de tais lugares apenas pôde concorrer o pessoal do quadro do Gabinete de Estudos e Planeamento do Ministério da Justiça, nos termos e condições previstos no Decreto-Lei n.º 129/98, de 13 de Maio.
Tal concurso, que teve em vista a transição do pessoal do quadro do GEPMJ para os Registos e Notariado, ainda não se mostra concluído dado o efeito suspensivo dos recursos que sobre ele recaíram.
Sucede, porém, que durante este período de transição, foram entretanto preenchidos 4 lugares de 2° ajudante e 20 lugares de escriturário já pertencentes aos serviços dos registos e do notariado, tendo a maioria deles iniciado funções ainda no mês de Dezembro.
Para cálculo da participação emolumentar dos referidos oficiais procedeu-se em conformidade com o disposto na Portaria n° 669/90, de 14 de Agosto, tendo em conta a receita líquida da conservatória e não se incluindo na distribuição os funcionários que, embora prestem serviço no RNPC, pertencem ainda ao quadro do GEPMJ.
A aplicação do disposto na referida Portaria em tais condicionalismos atribui uma participação emolumentar absolutamente excepcional aos referidos funcionários.
Ou seja, a parte da receita líquida que, não fora tais circunstâncias, seria dividida por 88 oficiais na proporção dos vencimentos base, é actualmente dividida apenas por 24.
Dando por certo que o legislador não poderá ter querido tais distorções, afigura-se-me que:
a) Durante o período de transição deverá ser ficcionada a participação emolumentar dos funcionários como se o quadro estivesse preenchido com os que transitam do GEPMJ, já nomeados oficiais dos registos e do notariado, sem prejuízo da sorte dos recursos interpostos das referidas nomeações;
b) Os limites de 70% e 40% previstos no artigo 6° da Portaria n° 669/90 tenham por referência a participação emolumentar do conservador e não do director.
A Interpretação vertida na alínea b) encontra fundamento na distorção que ocorreria se um ajudante pudesse ter por limite de participação emolumentar o mesmo limite que um conservador-auxiliar equiparando vencimentos a funções e responsabilidades completamente distintas
Considerando que se trata de uma situação única e invulgar e atento o aproximar da data de processamento de vencimentos do mês em curso, tenho a honra de solicitar a melhor atenção de V. Exª no sentido de serem sancionados os entendimentos propostos quanto ao cálculo da participação emolumentar devida aos oficiais do RNPC. (..)“ — fls. 101/100 do PA apenso.
4. A consulta referida supra em 3. obteve do Director Geral dos Registos e do Notariado o despacho de 29.01.99, do teor que se transcreve: “Concordo, tanto mais que o indeferimento dos recursos pode eventualmente determinar a revisão da distribuição emolumentar pelos (ilegível) nomeados” - fls. 101 do PA apenso.
5. O A apresentou em 22.11.99 reclamação dos actos de processamento dos vencimentos junto da Directora da Conservatória do Registo Nacional de Pessoas Colectivas “no que se refere ao cálculo da remuneração base (..) quanto ao vencimento de exercício que lhe foi atribuído (..) desde 06 de Janeiro de 1999 (data da aceitação da nomeação nesse quadro e de exercício de funções) e a presente data” peticionando a final que fossem “restituídas e pagas as quantias referentes ao vencimento de exercício devido desde a data em que exerce funções nessa Conservatória (..) para além de serem restituídas e pagas as importâncias que não foram pagas, no mesmo período, por terem sido calculadas sobre uma remuneração base indevida (..)" - fls. 60/51 do PA apenso.
6. Antes de proferido despacho sobre a reclamação supra em 5., o A, em 14.12.99, interpôs recursos hierárquicos junto do Director Geral dos Registos e Notariado e Ministro da Justiça, com conteúdo e pedido idênticos ao da reclamação - fls. 95/78 e 125/112 do PA apenso.
7. Na DGRN foi proferida informação jurídica n° 48/00 - DSRH - DRH, de que se transcreve a parte que segue:
“(…)
2.1.- Efectivamente, dirigiu o recorrente dois recursos hierárquicos simultâneos, um para o Director-Geral dos Registos e do Notariado e outro para o Ministro da Justiça.
2.2.- Nos termos, designadamente, do art.° 65° do Dec.-Lei n.° 519-F2/79, de 29.12, e art.°s 134° e 135° do Dec.-Reg. n.° 55/80, de 8.10, cabe aos dirigentes dos serviços (conservadores e notários) o processamento da participação emolumentar, pelo que os actos recorridos se encontram correctamente identificados pelo recorrente.
2.3.- Dispõe o art. 49° do Decreto Regulamentar nº 55/80, de 8.10:
1- Os conservadores e notários estão hierarquicamente subordinados ao Ministro da Justiça, através do Director-Geral dos Registos e do Notariado.
2- O disposto no número antecedente não prejudica o exercício directo do poder hierárquico por parte do Ministro da Justiça.”
2.4.- Assim sendo, o recurso dos actos de processamento de vencimentos da autoria da Srª. Directora do RNPC, deverá ser dirigido e apreciado, nos termos do n.° 2 do art° 169°, pelo mais elevado superior hierárquico do autor do acto, na situação em apreço, o Sr. Secretário de Estado da Justiça, dado se encontrar nele delegada a competência para decidir acerca dos assuntos relativos à Direcção-Geral dos Registos e do Notariado (v.d. D.R., II, n.° 278, de 29.11.99 - Despacho n.° 23 175/99).
2.5.- De facto, os actos praticados pelos Secretários de Estado são actos verticalmente definitivos e executórios, não sendo susceptíveis de recurso hierárquico necessário, deles cabendo recurso contencioso, actualmente para o T.C.A. (v.d. Ac. do Tribunal Pleno, de 31.10.90, in Acórdãos Doutrinais, n° 351, pág. 387).
2.6.- Com efeito, só assim não seria se se pudesse entender que as competências dos directores - gerais, constantes do mapa II anexo à Lei n.° 49/99, de 22 de Junho, das quais constam no n.° 17 que ora nos ocupa, têm natureza exclusiva.
2.7.- Esta questão tem sido largamente apreciada no Supremo Tribunal Administrativo. Depois de a considerar como competência própria e exclusiva, e portanto, geradora de actos verticalmente definitivos (cfr. Ac. do S.T.A., Pleno, de 30.9.93, rec. 29.391), abandonou, de forma reiterada e uniforme, tal entendimento, passando a considerar que tal competência apesar de ser uma competência própria não é uma competência exclusiva (cfr. Ac. de 9.2.93, rec. 30.379; de 20.5.93, rec. 30.371; 9.6.93, rec. 31.458; 17.2.94, rec. 31.310).
2.8.- As razões desta firme orientação desenvolvem-se por três ordens de argumentos (v.d. Ac. do STA, de 17.11.94), a saber:
- Em primeiro lugar, por que se terá entendido que a intenção do legislador terá sido a de apenas atribuir aos directores-gerais um estatuto próprio através de um “bloco de competências próprias”.
- Em segundo lugar, a atribuição aos directores-gerais de competência exclusiva representaria uma “completa revolução do nosso sistema administrativo”, a qual não deixaria de ser convenientemente assinalada.
- E, em terceiro lugar, tal revolução implicaria que o vértice do grosso da actividade administrativa deixasse de ser o Governo, para passarem a ser os directores-gerais, pondo-se assim em causa o disposto nos artigos 185° e 202° da Constituição.
2.9.- De acordo com o exposto, se os recursos hierárquicos em consideração fossem apreciados pelo director-geral dos Registos e do Notariado, a decisão que sobre os mesmos viesse a ser proferida careceria de definitividade vertical, sendo, por conseguinte, contenciosamente irrecorrível.
III
1. Parece de subscrever integralmente a douta argumentação expendida pela Sra. Directora do RNPC, autora dos actos ora recorridos, na resposta dada à reclamação apresentada pelo recorrente, nos termos e para os efeitos do disposto no n.° 2 do art.° 172° do CPA, por se entender que perfilhar-se a solução contrária, pecaria por falta de razoabilidade, pelo que - consagrando o direito soluções de bom senso - não se harmoniza o pretendido pelo recorrente com os objectivos do sistema jurídico considerado na sua unidade e coerência interna, atendendo a um mesmo corpo de princípios e normas.
2.- De facto, o sistema jurídico tem de ser entendido de forma dinâmica e na sua globalidade, encontrando-se os normativos legais numa relação de conexão e interdependência e como tal devendo ser aferidos.
3.- Como bem refere a Directora do RNPC, na aludida resposta à reclamação apresentada, a situação em análise não se encontra verdadeiramente contextualizada na previsão da lei.
Efectivamente, “não previu o legislador, nem poderia ter previsto, a situação manifestamente excepcional de transição de funcionários de um quadro para outro mas sem que alguma vez tivessem deixado de exercer funções, nem poderia o legislador ter querido que as regras e princípios fixados em matéria remuneratória para situações na lei previstas fossem de forma idêntica aplicáveis a situações nela não contempladas.
4.- Por outro lado, e relativamente à questão de saber se os limites de 70% e 40%, previstos no art.° 6° da Portaria n.° 669/90, têm por referência a participação emolumentar do conservador ou do director, reitera-se, igualmente, o entendimento defendido pela Srª Directora, no sentido de que a interpretação que colhe suporte legal, sendo que é a própria lei que o estabelece no regime jurídico do RNPC, aprovado pelo Decreto-Lei n.° 129/98, de 13.5, precisamente ao distinguir, em termos remuneratórios, que a participação emolumentar do conservador corresponde a 85% da do director, pelo que a dos oficiais há-de estar indexada à participação emolumentar do conservador e não à do director, que nos termos legais pode nem pertencer ao quadro da Conservatória do Registo Nacional de Pessoas Colectivas.
Conclusão:
Nos termos e fundamentos constantes da presente informação, e em caso de concordância superior, propomos a remessa dos presentes autos a Sua Excelência o Secretário de Estado da Justiça. (..) - fls- 134/126 do PA apenso.
8. Remetidos os autos, pela Auditoria Jurídica do Ministério da Justiça foi proferido parecer no sentido que se transcreve na parte que segue:
“(…”
1. ..., 2° ajudante do quadro da Conservatória do Registo Nacional de Pessoas Colectivas, veio interpor para Vossa Excelência recurso hierárquico dos actos de processamento de vencimentos no que se refere ao cálculo de remuneração base, especificamente quanto ao vencimento de exercício que lhe foi atribuído desde 06/01/99 até à data da interposição do recurso (Dezembro de 1999).
De salientar, que em simultâneo recorreu também para o Director-Geral dos Registos e Notariado, invocando os mesmos fundamentos.
Antes reclamara já desse processamento para a Directora do Registo Nacional de Pessoas Colectivas, não tendo aguardado pela resposta desta à reclamação, que entretanto aquela elaborou e onde fundamenta a decisão de proceder ao processamento das remunerações nos termos reclamados.
2. No seu extenso recurso o recorrente tece diversas considerações quanto a princípios genéricos relativos ao direito ao lugar e à relação jurídica de emprego público, direito á remuneração e suas características gerais e natureza jurídica da remuneração dos funcionários.
Todas essas questões são digamos que, acessórias da questão central e não estão postas em crise pela decisão recorrida.
3. A questão central reside no facto de no cálculo do vencimento processado ao recorrente se ter tido em conta despacho do Director-Geral dos Registos e Notariado de 29/01/99, despacho proferido na sequência de consulta efectuada pela Directora do Registo Nacional de Pessoas Colectivas ao mesmo Director-Geral quanto aos vencimentos e cálculo da participação emolumentar dos oficiais.
4. Considera o recorrente que o facto de se ter procedido ao processamento dos vencimentos de acordo com tal despacho é ilegal pois que a remuneração na função pública resulta da aplicação de diplomas legais e estes não podem ser alterados por despachos que lhes são contrários.
5. Basicamente o recorrente invoca o facto de no cálculo do vencimento do exercício que lhe foi processado se ter “ficcionado” a participação emolumentar dos funcionários como se o quadro estivesse preenchido com os funcionários que transitaram do GEP já nomeados oficiais, mas cuja nomeação estava suspensa.
Tal situação devia-se ao facto de após nomeação destes funcionários, terem sido interpostos recursos hierárquicos com efeito suspensivo, das decisões que operaram a transição do quadro do antigo GEP para o actual R.N.P.C., este integrado na Direcção-Geral dos Registos e Notariado como Conservatória do Registo Comercial de lª classe, conforme Dec-Lei n° 129/98, de 13 de Maio.
Com efeito, nos termos do artigo 5° desse diploma ‘ao primeiro concurso para provimento dos lugares de oficial do quadro do R.N.P.C. que deve ser aberto no prazo de 90 dias a contar da entrada em vigor deste diploma, só pode concorrer o pessoal do quadro do G.E.P.M.J
6. O ora recorrente, tal como outros 21 funcionários da Direcção Geral dos Registos e Notariado foram nomeados para o quadro da nova Conservatória do Registo Nacional de Pessoas Colectivas, que prevê um quadro de oficiais dos registos e notariado de noventa e quatro lugares, por urgente conveniência de serviço (despacho do Director-Geral dos Registos e Notariado de 15 de Dezembro de 1998, publicado em D.R. II Série n° 2 de 04/01/99). E iniciou funções em 06/01/99.
7. Entretanto haviam sido nomeados após concurso aberto nos termos do artigo 5° do Dec-Lei n° 129/98, de 13 de Maio já referido, os ajudantes e escriturários que concorrendo ao primeiro concurso, (provenientes do GEPMJ) transitariam para o R.N.P.C., actualmente Conservatória integrada nos Serviços do Registo e Notariado como já foi referido.
Após o primeiro concurso foram abertos novos concursos em Novembro de 1998, estes já concursos externos.
Conforme refere a Senhora Directora do R.N.P.C. na resposta à reclamação do ora recorrente:
“Sucede que, por vicissitudes várias relacionadas com a impugnação das nomeações dos funcionários do quadro do GEPMJ em condições de ingressarem, por transição, no quadro do RNPC, cujas delongas processuais levaram a que os mesmos já nomeados repete-se em Novembro de 1998 apenas tivessem aceite os respectivos lugares em Novembro de 1999 (cerca de um ano depois) se verificou nesta conservatória uma situação perfeitamente imprevista, anómala e excepcional”.
8. E foi esta situação anómala e excepcional que levou à prolação do contestado pelo ora recorrente despacho do Director Geral dos Registos e Notariado de Janeiro de 1999, em que ficou determinado ficcionar que o quadro do R.N.P.C. estava preenchido para efeitos de cálculo de participação emolumentar a processar aos funcionários que aí exerciam funções efectivamente, embora em rigor, o quadro não estivesse preenchido, dado estarem pendentes recursos com efeito suspensivo e por isso haver funcionários a exercer funções mas que ainda não tinham aceite o lugar por aguardarem a decisão dos seus recursos.
9. Julga-se não haver ilegalidade na prolação desse despacho que o ora recorrente impugna e que determinou o concreto processamento do vencimento de exercício que lhe foi processado, de acordo com as regras que definem o cálculo dos vencimentos do pessoal do registo e notariado, nomeadamente - artigo 61º do Dec-Lei n° 519-F2/79 de 29 de Dezembro nos termos aí referidos.
10. De acordo com esta disposição é abonada aos oficiais do registo e notariado a título de participação emolumentar (vencimento de exercício) uma percentagem da totalidade de receita global líquida da totalidade dos Serviços apurada em cada mês.
Tendo por fundamento esta norma entende o recorrente que a totalidade da receita produzida no RNPC naquele período designado pela respectiva Directora de anómalo e excepcional deveria ser distribuída apenas pelos 22 funcionários provindos dos Serviços do Registo e Notariado, entre os quais o próprio que já tinha aceitado o lugar e exerciam funções e preenchiam vagas do quadro.
11. Acontece porém que os funcionários nomeados, mas com recursos pendentes, e provindos do GEP também exerceram funções nesse período e foi também esse exercício de funções que fez gerar a receita global mensal arrecadada pelo RNPC nesse período.
E foi o facto de independentemente de se não poder considerar preenchido o quadro, por pendência de recursos e não aceitação dos lugares por pessoas nomeadas, mas a exercerem efectivamente funções que se optou pela impugnada decisão proposta pela Directora do RNPC e sancionada pela já citada e considerado pelo recorrente ilegal despacho do Director-Geral dos Registos e Notariado de Janeiro de 1999.
12. Não pode deixar de se considerar que a pretensão do recorrente radica em interpretação restritiva e formalista das disposições relativas à remuneração do pessoal dos registos e notariado. O facto de formalmente, por não ter havido aceitação dos lugares por força da interposição dos recursos, se não poder considerar preenchido o quadro do RNPC não impede que se deva entender que nesse período as pessoas nomeadas e recorrentes exerciam e exerceram funções e consequentemente teriam sempre direito a perceber uma parte dessa receita global do RNPC (resultante do seu exercício efectivo de funções).
Foi essa a “ratio” do despacho do Director-Geral dos Registos e Notariado que não se pode considerar contrária a lei, se se considerar o efectivo exercício de funções por parte de pessoas ainda que não “preenchendo’ vagas pelas razões já referidas.
13. Uma outra questão levantada pelo recorrente é a de saber se os limites de 70% e 40% previstos no artigo 6° da Portaria n° 669/90, relativas aos limites a perceber por parte de chefes de secção, ajudantes e escriturários têm por referência a participação emolumentar do conservador ou do director do RNPC.
Quanto a este ponto dá-se aqui por reproduzida a posição da Senhora Directora do RNPC de que é o próprio Dec-Lei n° 129/98 que integra na Direcção-Geral dos Registos e Notariado o RNPC, considerando aplicável ao seu pessoal o estatuto do pessoal dos registos e notariado e que refere expressamente a participação emolumentar de conservador ou notário, já que o de director do RNPC que até pode não pertencer a esta carreira, é diferente.
14. Assim, tendo em conta nomeadamente a resposta da Directora do RNPC à reclamação do ora recorrente, a informação n° 48/00-DSRH-DRH e ainda o exposto julga-se de indeferir o presente recurso por não estarem os actos de processamento dos vencimentos do ora recorrente feridos dos apontados vícios de ilegalidade, violação de lei ou serem nulos como este pretende.
A interpretação dada a normas jurídicas não pode ter apenas em consideração o seu conteúdo literal “stricto sensu”, há que ter em conta a realidade fáctica que com elas se pretende regulamentar. E foi isso que aconteceu no presente caso, sendo de reiterar que os princípios que regulam a determinação da remuneração dos funcionários dos registos e notariado não foram violados com esta interpretação que lhes foi dada, podendo até dizer-se que face à situação esta foi a decisão mais adequada. (..)“ — fls. 141/135 do PA apenso.
9. Em 25.5.2000 por Sua Exa. o Secretário de Estado da Justiça foi proferido o seguinte despacho:
“Concordo, pelo que nego provimento ao recurso.” - fls. 141 do PA apenso.
2. 2. O DIREITO:
Conforme foi referido, estão interpostos dois recursos: um pelo Magistrado do Ministério Público junto do TCA e outro pelo recorrente contencioso.
No recurso do Ministério Público está assacada uma nulidade ao acórdão recorrido, cujo conhecimento é prioritário, pelo que desse recurso se irá começar por conhecer.
2. 2. 1. Recurso do Ministério Público:
2. 2. 1. 1. O Exm.º Magistrado do Ministério Público assaca ao acórdão recorrido a nulidade prevista no artigo 668.º, n.º 1, alínea c) do CPC - estarem os fundamentos em oposição com a decisão -, (conclusões 1.ª a 12.ª), pelo que dela há que conhecer prioritariamente.
Pronunciando-se sobre ela, em cumprimento do despacho de fls 159 v.º - 160, ao abrigo do disposto nos artigos 744.º, n.ºs 1 e 5 do CPC, ex vi artigo 102.º da LPTA, o TCA considerou que se não verifica essa contradição, mas sim a consagração de uma diferente interpretação da lei com a qual o recorrente não concorda, o que apenas poderá consubstanciar erro de julgamento, pelo que manteve o acórdão recorrido.
Vejamos:
Começa-se por assinalar que, nas referidas conclusões, o recorrente entremeia a nulidade invocada com o erro de julgamento imputado à não consideração da ilegalidade atribuída à consideração de funcionários que ainda não tinham aceite o cargo e que, como tal, não deviam, na sua óptica, ter sido considerados funcionários do quadro da Conservatória.
Verdadeiramente reportadas a esta nulidade são apenas as conclusões 5.ª a 9.ª e 11.ª e 12.ª das alegações.
Da apreciação destas conclusões resulta que a contradição apontada decorrerá, em síntese, do acórdão recorrido ter apontado como parâmetros legais para recebimento dos emolumentos em causa "o quadro de pessoal de oficiais do Registo e Notariado das Pessoas Colectivas", por um lado, e, por outro, "o efectivo desempenho de funções", e ter acabado por valorizar apenas o número global de oficiais que o quadro comporta, não atendendo ao efectivo desempenho de funções dos funcionários do quadro legal.
A nulidade arguida verifica-se quando os fundamentos invocados devam, logicamente, conduzir a uma decisão oposta ou, pelo menos, diferente daquela que foi tomada (cfr. Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio Nora, in Manual de Processo Civil,, 2.ª edição, pág. 690).
Extrai-se do acórdão recorrido que este, reportando-se aos preceitos legais que considerou aplicáveis, considerou que a distribuição dos emolumentos obedece a duas operações: uma primeira, em que se procede ao cálculo do montante a atribuir a cada oficial em função do quadro fixado e da sua categoria; uma segunda, em que se procede ao pagamento efectivo, tendo em conta o montante apurado em abstracto para cada oficial do quadro e o serviço efectivo prestado, donde decorre que quem não prestou serviço não recebe emolumentos, sem que tal tenha reflexo no montante dos emolumentos daqueles que os recebem.
Ou seja, que só tinham direito a emolumentos os funcionários que tivessem prestado serviço efectivo, e no período em que o tivessem prestado, mas o cálculo do montante desses emolumentos era feito em abstracto, tendo em conta o número de oficiais estabelecidos no quadro legal, independentemente de estar ou não totalmente preenchido e de ter havido ou não funcionários ausentes de serviço, em situação de não terem direito a esses emolumentos.
Tal é o que resulta da conclusão nele formulada e que se passa a transcrever: "Fora deste entendimento, entramos no puro casuísmo, hoje X, amanhã X-Y, o que, pelas razões de direito supra, viola frontalmente o princípio da legalidade, na vertente do princípio da confiança, no que respeita a um dos componentes do vencimento principal ou, como hoje é designação legal, da remuneração base, no caso, a remuneração de exercício por participação emolumentar."
E, prosseguindo, considerou esse acórdão que não assistia razão ao recorrente no que respeitava às questões suscitadas nas conclusões das suas alegações finais sob os itens 1 a 5 e 8, nas quais defendia que só deviam entrar para o cálculo de emolumentos os funcionários que estivessem legalmente providos no cargo (24), sendo ilegal a ficção, feita no acto impugnado, de entrarem para esse cálculo funcionários que ainda não tinham aceite a nomeação (64), o que prejudicava o conhecimento da questão subsequente suscitada nos itens 6 e 7 dessas mesmas conclusões, relativas à ilegalidade da consideração dos funcionários que ainda não tinham aceitado o cargo como pertencendo ao quadro.
Ora, perante esta consideração, não se verifica qualquer oposição entre os fundamentos e a decisão, pois que, em coerência com o critério enunciado - de apenas relevar o número de oficiais do quadro legal (94) - se impunha decidir, como foi decidido, que não relevava o número de funcionários do quadro eficazmente nomeados (número diferente daquele), como pretendia o recorrente, sendo que a posição contrária que defende o recorrente é que geraria contradição.
O que se nos afigura é que o recorrente interpretou mal o acórdão recorrido, considerando que este incluiu o efectivo desempenho de funções de funcionários como factor do cálculo dos emolumentos, quando este só considerou, para efeitos desse cálculo, o número global de oficiais do quadro. O efectivo exercício de funções apenas foi considerado para efeitos de recebimento dos emolumentos (quem não exerceu funções não os recebia), posição que, de modo implícito, se extrai do acórdão recorrido - o que provavelmente terá estado na base da errada interpretação dele feita pelo recorrente -, mas não para efeitos de cálculo, que era feito, conforme foi referido, tendo em conta apenas o número global de oficiais do quadro legal.
Em face do exposto, o que se verifica são posições divergentes entre o tribunal recorrido e o recorrente, aliás bem ilustradas nas conclusões 8.ª e 9.ª das alegações do recurso jurisdicional, passíveis de determinar erro de julgamento, mas nunca contradição entre os fundamentos e a decisão.
Improcedem, assim, as conclusões 5.ª a 9.º e 11.ª e 12.º das alegações do recorrente.
2. 2. 1. 2. Alega o Exm.º Magistrado do Ministério Público que os emolumentos deviam ser calculados e pagos em função do número de oficiais pertencentes ao quadro que prestaram serviço efectivo e não do número de funcionários que prestaram serviço, embora não pertencendo ao quadro, a cuja pertença foi ficcionada, como foi decidido no acto contenciosamente impugnado (conclusões 1. ª a 4.ª, 10.ª e 13.ª a 17.ª).
Vejamos se lhe assiste razão.
O que está em causa é a participação emolumentar dos funcionários do Registo Nacional de Pessoas Colectivas (RNPC), que foi extinto como Direcção de Serviços do Gabinete de Estudos e Planeamento do Ministério da Justiça (GEPMJ) e integrado, através do Decreto-Lei n.º 129/98, de 13/05, na Direcção-Geral dos Registos e Notariado, como Conservatória do Registo Comercial de 1.ª classe.
De acordo com o estabelecido no artigo 9.º do referido Decreto-Lei n.º 129/98, as remunerações dos funcionários do GEPMJ, à data em serviço na Direcção de Serviços do RNPC (extinta), continuavam, até à transicção para o respectivo quadro, a ser pagas por dotações do Gabinete de Gestão Financeira do Ministério da Justiça e do GEPMJ.
A Portaria n.º 411/98, de 14/07, aprovou o quadro de pessoal do RNPC, sendo o mesmo constituído pelos seguintes oficiais dos Registos e Notariado: 6 ajudantes principais, 8 primeiros ajudantes, 12 segundos ajudantes e 60 escriturários superiores ou escriturários, tendo o número de 2.ºs ajudantes passado a ser de 20, por força da Portaria n.º 966/98, de 12 de Novembro.
Na sequência do primeiro concurso aberto para o preenchimento desse quadro, a que só podia concorrer o pessoal do GEPMJ que prestava ou tivesse prestado funções de apoio técnico-administrativo no RNPC (artigo 5.º de Decreto-Lei n.º 129/98), foram nomeados 6 ajudantes principais, 8 primeiros ajudantes, 12 segundos ajudantes e 40 escriturários (66 oficiais, na totalidade).
Nos termos do artigo 10.º do mesmo diploma e dado que o quadro do RNPC não ficou completo, foi aberto concurso, agora externo, para o preenchimento das restantes vagas, tendo sido preenchidas 24, numa das quais foi provido o recorrente, que aceitou o lugar em 6/1/99.
Em virtude das impugnações deduzidas no âmbito do concurso interno aberto ao abrigo do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 129/98, só vieram a ser publicadas as suas nomeações, e a serem aceites, em Novembro de 1999.
De acordo com o estabelecido no artigo 21.º do Decreto-Lei n.º 519-F2/79, os oficiais do registo e notariado são pessoas do quadro das conservatória e dos cartórios notariais, sendo, conforme já foi referido, o CNRP uma Conservatória do registo Comercial de 1.ª classe.
O Estatuto do pessoal do RNPC, aprovado pelo referido Decreto-lei n.º 129/98 e publicado em anexo ao mesmo, estatui que o seu estatuto é o do pessoal dos serviços dos registos e notariado, sendo-lhe aplicáveis, no que não for contrariado por esse diploma, as disposições referentes ao pessoal das conservatórias autonomizadas.
O referido Decreto-Lei n.º 512-F2/79, que aprova o Regulamento dos Serviços dos Registos e do Notariado, estabelece que a remuneração deste pessoal compreende duas componentes principais: uma parte fixa, designada ordenado, e uma parte variável, chamada participação emolumentar (artigo 59º e sgs., designadamente o artigo 61.º).
Quanto à participação emolumentar não se suscitam grandes dúvidas, como se escreveu no acórdão deste STA de 15/1/2004, proferido no recurso n.º 1 107/03). "Se a participação emolumentar é uma «participação no rendimento» (ex.: art. 52º, DL nº 519-F2/70), fica evidente a ideia de que para participar no rendimento o interessado tem que contribuir para ele, isto é, tem que render, o que implica que o funcionário esteja em exercício efectivo dessas funções. Isto é assim porque a participação emolumentar traduz ou representa um «vencimento de exercício» (arts. 54º, nº 5 e 61º, nº 4 do cit. DL nº 519-F2/70), isto é, carece de exercício efectivo do cargo de uma determinada categoria para poder ser percebido, ao contrário do que sucede com a remuneração ou vencimento da categoria, que nem sempre implica esse exercício efectivo (PAULO VEIGA E MOURA, in Função Pública, I, pag.267; JOÃO ALFAIA, in Conceitos Fundamentais do Regime Jurídico do Funcionalismo Público, II, pags. 792 a 799; Ac. do TCA, de 30/11/2000, Rec. nº 256/97)."
Ora, a mesma doutrina, que se nos afigura correcta, vale quanto a nós, para situação inversa, ou seja, aquela situação em que, como na dos presentes autos, o rendimento tenha sido criado por outros funcionários que, embora ainda não estando integrados no quadro, desempenharam funções em pé de igualdade com os funcionários devidamente nomeados e que, com o seu trabalho, contribuíram para a criação desse rendimento.
A "ficção" criada pelo acto recorrido de equiparar, para efeito do cálculo da participação emolumentar, funcionários não eficazmente providos, mas que exerceram normalmente as suas funções (o que não é posto em causa pelos recorrentes, sendo certo que até se tratava de funcionários que já prestaram serviço na extinta Direcção de Serviços do RNPC da GEPMJ, o que não aconteceu com o recorrente, que ingressou no seu quadro através de concurso externo) apresenta-se, quanto a nós, como uma correcta interpretação da lei, em que, perante uma situação não prevista, decorrente da prestação de serviço sem nomeação eficaz, em situação especial, o intérprete resolveu a situação segundo a norma que criaria dentro do espírito do sistema (cfr. artigo 10.º do CC) e que decorre do enunciado princípio de beneficiar dos emolumentos o funcionário que tenha contribuído para eles.
É que, conforme já foi referido, os funcionários em causa já eram funcionários dos Registos e Notariado, tendo preferência na primeira nomeação para os lugares do Registo Nacional de Pessoas Colectivas, na sua actual qualificação de Conservatória do Registo Comercial de 1.ª Classe (que nunca paralisou a sua actividade), e continuavam a ser remunerados até à sua integração no RNPC (artigo 9.º do Decreto-Lei n.º 129/98).
Na base da discordância dos recorrentes está, para além da consideração dos emolumentos só poderem ser atribuídos a funcionários do quadro - e os funcionários do extinto RNPC da GEPMJ só passarem a ser funcionários do novo quadro após a aceitação da sua nomeação - o facto desses funcionários terem entrado para o cálculo e, depois, não terem recebido aquilo que deveria ser a sua parte.
Mas não devem proceder essas objecções.
Na verdade, não está em causa, no presente recurso, apurar se lhes deveria ou não ter sido atribuída participação emolumentar, mas apenas se o recorrente deveria "beneficiar" do rendimento que eles criaram, não havendo razão nenhuma, tendo em conta o espírito da lei, para responder afirmativamente.
Em face do exposto, entendemos que improcedem as restantes conclusões das alegações do recorrente, segundo as quais só os funcionários eficazmente nomeados tinham direito ao recebimento dos emolumentos.
De assinalar ainda que se nos afigura que os emolumentos devem ser calculados tendo em conta o número de funcionários (com a adaptação supra efectuada, no caso sub judice) que efectivamente esteve ao serviço, como considerou o acto contenciosamente impugnado, e não o número de funcionários do quadro legal (como considerou o acórdão recorrido), na medida em que, sendo a participação emolumentar uma participação no rendimento, deve essa divisão ser feita por quem contribuiu para esse rendimento, sentido em que, em execução do estatuído nos n.ºs 1 e 2 do artigo 61.º do Decreto-Lei n.º 519-F2/79, aponta a Portaria n.º 669/90.
Com efeito, o seu n.º 3, ao estabelecer que a participação emolumentar será distribuída por todos os oficiais, deve ser entendido como todos os oficiais que, estando ao serviço, contribuíram para a produção da receita a distribuir, pois que, em caso contrário, sabendo-se que, raramente, o quadro legal está completo, seja por falta de efectivo preenchimento, seja por motivos de faltas ao serviço, devia dizer pelo número de oficiais constante do quadro legal. E, se atentarmos no n.º 4 dessa mesma Portaria, que lhes assegurou, a título de participação emolumentar, uma percentagem mínima do seu vencimento de categoria, mais reforçado sai este entendimento, na medida em que o estabelecimento desse mínimo visa pô-los a coberto de cobranças que não assegurem montantes determinantes dessas percentagens, não sendo curial admitir que tal se possa ficar a dever a menor produtividade dos oficiais, mas antes a outras causas, como as já apontadas.
Não procede, assim, o recurso do Ministério Público.
2. 2. 2. Recurso do recorrente contencioso:
O seu recurso abarca a questão suscitada no recurso do Ministério Público (conclusões 1.ª a 7.ª) e ainda a questão do limite máximo dos emolumentos em causa terem por referência a participação emolumentar do conservador e não do director (conclusões 8.ª a 11.ª).
O acórdão recorrido optou pelo limite se reportar à participação emolumentar do conservador, em virtude do artigo 82.º, n.º 3 do Decreto-Lei n.º 129/98 reportar os emolumentos do director do RNPC ao estipulado para os "conservadores das conservatórias do registo comercial autonomizadas."
Não assiste, também nesta parte, razão ao recorrente.
Na verdade, de acordo com o estabelecido no artigo 79.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 129/98, que aprovou o regime do RNPC, este serviço é dirigido por um director.
Mas, segundo o disposto no n.º 1 do seu artigo 81.º, o estatuto do seu pessoal é o do pessoal dos serviços dos registos e do notariado, aplicando-se aos oficiais dos registos e do notariado o disposto no artigo 61.º do Decreto-Lei n.º 519-F2/79 (n.º 3), executado pela referida Portaria n.º 669/90, segundo a qual a percentagem emolumentar se reportava à participação dos conservadores.
E, por sua vez, o n.º 3 do artigo 82.º do Decreto-Lei n.º 129/98 estabeleceu expressamente que os emolumentos do director do RNPC se reportavam ao estipulado para os conservadores das conservatórias do registo comercial autonomizadas.
Em face do exposto, a participação emolumentar dos oficiais dos Registos reporta-se, como decidiu o acórdão recorrido, à participação emolumentar dos conservadores.
Improcedem, assim, as conclusões 8.ª a 11.ª das alegações do recorrente, o mesmo se verificando em relação às conclusões 1.ª a 7.ª, quanto a estas pelas razões aduzidas relativamente ao recurso do Ministério Público.
3. DECISÃO
Nesta conformidade, acorda-se em negar provimento a ambos os recursos.
Custas pelo recorrente contencioso, fixando-se a taxa de justiça em 300 euros e a procuradoria em metade.
Lisboa, 3 de Maio de 2005. - António Madureira (relator) – São PedroFernanda Xavier.