Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0393/18
Data do Acordão:04/26/2018
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:COSTA REIS
Descritores:RECURSO DE REVISTA EXCEPCIONAL
PROVIDÊNCIA CAUTELAR
PREJUÍZO DE DIFÍCIL REPARAÇÃO
Sumário:Não é de admitir recurso de revista numa medida cautelar onde o recorrente alega a existência de prejuízos de difícil reparação sem fundar essa alegação em factos concretos.
Nº Convencional:JSTA000P23224
Nº do Documento:SA1201804260393
Data de Entrada:04/16/2018
Recorrente:A..........
Recorrido 1:CAIXA DE PREVIDÊNCIA DA ORDEM DOS ADVOGADOS E SOLICITADORES
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: ACORDAM NA FORMAÇÃO DE APRECIAÇÃO PRELIMINAR DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO DO STA:

I. RELATÓRIO

A……… intentou, no TAF de Almada, contra a Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores (doravante CPAS), a presente providência cautelar, pedindo a suspensão de eficácia da deliberação da CPAS, de 02/09/2016, pedindo:
Estando reunidos os pressupostos de facto e de direito para deferir a requerida suspensão, o presente pedido dirigido à adoção de providência cautelar é de julgar procedente, por provado e, em consequência, devem ser revogadas/anuladas as deliberações tomadas em 01-03-16, Acta nº 40/2016, Acta nº 152/2016.”

Aquele Tribunal, por sentença de 03/10/2017, indeferiu a requerida providência.

Decisão que o Tribunal Central Administrativo Sul manteve.

É desse acórdão que o Autor vem recorrer, ao abrigo do disposto no artigo 150.º/1 do CPTA.

II.MATÉRIA DE FACTO
Os factos dados como provados são os constantes do acórdão recorrido para onde se remete.

III.O DIREITO

1. As decisões proferidas pelos TCA em segundo grau de jurisdição não são, por via de regra, susceptíveis de recurso ordinário. Regra que sofre a excepção prevista no art.º 150.º/1 do CPTA onde se lê que daquelas decisões pode haver, «excepcionalmente», recurso de revista para o Supremo Tribunal Administrativo «quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental» ou «quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito». O que significa que este recurso foi previsto como «válvula de segurança do sistema» para funcionar em situações excepcionais em haja necessidade, pelas apontadas razões, de reponderar as decisões do TCA em segundo grau de jurisdição.
Deste modo, a pretensão manifestada pelo Recorrente só poderá ser acolhida se da análise dos termos em que o recurso vem interposto resultar que a questão nele colocada, pela sua relevância jurídica ou social, se reveste de importância fundamental ou que a sua admissão é claramente necessária para uma melhor aplicação do direito.
Vejamos se, in casu, tais requisitos se verificam.

2. O Autor requereu, no TAF de Almada, a suspensão de eficácia das deliberações da CPAS, de 1 de Março de 2016, constantes das Actas n.°s 40/2016 e 152/2016, para o que alegou que estavam reunidos os pressupostos de facto e de direito para deferir a requerida suspensão.

O TAF começou por afirmar que o deferimento da requerida pretensão dependia da verificação cumulativa dos seus requisitos e que, por isso, bastava que um deles não ocorresse para que a providência solicitada tivesse de ser indeferida. Tendo a seguir acrescentado:
“No caso em apreço há um fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o Requerente visa assegurar no processo principal?
O Requerente alega que o não decretamento da providência causará prejuízos de difícil reparação e fá-lo nos seguintes:
O valor de 13.546,67 euros (doc. n° 6) que tem sido exigido indevidamente pela CPAS por inexistentes contribuições em dívida dos meses de 11/2013 a 08/2015, mais a negação ou recusa/indeferimento da melhoria da pensão de reforma vencida e vincenda (doc. n° 14) representam um prejuízo considerável, irreparável na vida de um reformado e da sua família no tempo de crise acentuada que se vive no País, constituindo uma violação da confiança inerente ao Estado de Direito Democrático e do princípio da proporcionalidade que norteiam o regime das pensões (artigo 2° da CRP e Acórdão do TC 862/2013 de 19-12) (artigo 14° da p.i)”.
Ora, estamos perante uma alegação meramente conclusiva e genérica, sem ter qualquer facto alegado concreto, circunstanciado no tempo, lugar e modo que alicerce tais conclusões.
….
Na verdade, desconhece o Tribunal qual a situação económica do Requerente ou do seu agregado familiar, designadamente os valores de outros rendimentos provenientes de outras fontes para além da reforma.
Ora tal não foi alegado nem provado.
Acresce, ainda, conforme exposto, o requisito do periculum in mora conforme plasmado no artigo 120 n°1 do CPTA, não se destina a evitar a produção de prejuízos de difícil reparação por si só, mas aos interesses que o Requerente visa assegurar no processo principal de modo a evitar a inutilidade da sentença a proferir no processo principal.
…..
Ora, percorrendo a petição inicial denota-se que nada quanto à necessidade de ser decretada desde já a providência cautelar, por forma a evitar-se que a decisão a proferir no processo principal perca a sua utilidade, foi alegado.
Assim, também terá que se considerar como não verificado o requisito em apreço face à não alegação do periculum in mora nos termos expostos de acordo com o artigo 5° do CPC, aplicável ex vi artigo 1° do CPTA.
Considerando, que a verificação dos requisitos expressos no artigo 120.º do CPTA aplicável ex vi 1° do CPTA é cumulativa, torna-se desnecessário proceder à aferição dos restantes requisitos.
Destarte, terá que improceder a presente providência.

O TCA, para onde o Autor apelou, depois de considerar que a sentença não era nula por omissão de pronúncia confirmou a decisão recorrida pela seguinte ordem de razões:
“ ….. Nas demais conclusões da sua alegação, o Recorrente pretende que sejam aferidos todos os requisitos expressos no artigo 120.° do CPTA, por forma a concluir pela procedência da providência cautelar.
Vejamos.
O preenchimento dos requisitos do n° 1 do artigo 120.° é essencial, na medida em que constitui a conditio sine qua non e, forçosamente, o primeiro passo de que depende a concessão da tutela cautelar. A demonstração do periculum in mora e do fumus boni iuris permite afirmar que a posição do requerente se apresenta prima facie, como merecedora de protecção, colocando, assim, o requerente numa posição de partida favorável à obtenção da tutela cautelar.

Não obstante, como foi evidenciado pela Mma. Juiz a quo, a verificação dos referidos requisitos é cumulativa, pelo que a não ocorrência de um deles torna desnecessário proceder à aferição dos demais requisitos.
Foi o que sucedeu no caso sub judice, em que o Tribunal a quo se limitou a apreciar o requisito do periculum in mora, concluindo pela sua improcedência na medida em que considerou, e bem, faltar a concretização do prejuízo, constituindo uma mera alegação genérica o facto de o Requerente se ter limitado a invocar que o valor em questão e a recusa da melhoria da pensão de reforma “representam um prejuízo muito considerável, irreparável na vida de um reformado e da sua família em tempo de crise acentuada que se vive no País” - cfr. artigo 14° do requerimento inicial. E, verdadeiramente, o Requerente nem sequer logrou concretizar e demonstrar os seus rendimentos e a composição do seu agregado familiar.
Por conseguinte, bem andou o Tribunal a quo ao considerar como “não verificado o requisito em apreço face à não alegação do periculum in mora nos termos expostos, de acordo com o artigo 5° do CPC, aplicável “ex vi” artigo 1.º do CPTA.” Quanto a tal requisito o ora Recorrente nem sequer logrou rebater a argumentação expendida na sentença, por forma a obter o provimento do recurso.
Termos em que, de acordo com os fundamentos expostos, improcedem as demais conclusões da alegação do Recorrente.”

3. A jurisprudência desta Formação tem adoptado um critério restritivo no tocante à admissão de revistas em matéria de providências cautelares por entender que se está perante a regulação provisória de uma situação, destinada a vigorar apenas durante a pendência do processo principal, e que, sendo assim, a admissão de um recurso excepcional não era conforme com a precariedade da definição jurídica daquela situação.
Entendimento que é de manter sem embargo de se reconhecer que essa jurisprudência tem de ser afeiçoada ao caso concreto e ter em conta as razões esgrimidas em cada um desses casos e isto porque, por um lado, o art.º 150.º do CPTA não inviabiliza a possibilidade da revista ser admitida nas providências cautelares e, por outro, por a intensidade das razões invocadas poder justificar a admissão da revista. – vd. por todos o Acórdão de 4/11/2009 (rec. 961/09).
Todavia, no caso, não está em causa uma dessas situações que justificam a admissão da revista.
Com efeito, a única questão que aqui se coloca é a de saber se o TCA decidiu bem quando concluiu que se não verificava o periculum in mora e, com esse fundamento, indeferiu a requerida medida cautelar. Conclusão que decorreu do Requerente não ter alegado factos que, provados, fossem susceptíveis de convencer o Tribunal de que o indeferimento da providência requerida conduziria à produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o Requerente visava assegurar no processo principal.
Ora, essa questão não justifica a admissão deste recurso.
Desde logo, porque ela se prende com as especificidades do caso concreto, dificilmente se prestando a assumir, pela sua relevância jurídica ou social, interesse geral.
Depois, porque as instâncias decidiram convergentemente essa questão e fizeram-no com uma fundamentação jurídica convincente, razão pela qual também se não justiça a sua admissão para uma melhor aplicação do direito.

Termos em que os Juízes que compõem este Tribunal acordam em não admitir a revista.
Custas pelo Recorrente.
Lisboa, 26 de Abril de 2018. – Costa Reis (relator) – Madeira dos Santos – São Pedro.