Sentença de Julgado de Paz
Processo: 639/2016-JP
Relator: MARIA JUDITE MATIAS
Descritores: DIREITOS E DEVERES DE CONDÓMINOS - DANOS RESULTANTES DE INUNDAÇÃO RESULTANTE DE VAZAMENTO DE ÁGUA
Data da sentença: 07/03/2017
Julgado de Paz de : LISBOA
Decisão Texto Integral:
Sentença
(n.º 1, do art. 26º, da Lei n.º 78/2001, de 13 de Julho na redação que lhe foi dada pela Lei n.º 54/2013 de 31 de julho).
Processo n.º 639/2016 –JP
Matéria: Direitos e deveres de condóminos.
(alínea c) do n.º 1, do art. 9º, da Lei n.º 78/2001, de 13 de Julho na redação que lhe foi dada pela Lei n.º 54/2013 de 31 de julho).
Objecto: Danos resultantes de inundação resultante de vazamento de água.
Valor da acção: €700,00 (setecentos euros).

Demandante:
1) A, com domicílio na Rua ----------------------------------- Lisboa.
2) B, com domicílio na Rua ----------------------------------- Lisboa.
3) C, com domicílio na ------------------------------------------ Lisboa.
4) D, com domicílio na ------------------------------------------ Lisboa.
Mandatário: Dr. E, com domicílio profissional em ------- Lisboa.

Demandado: F, com domicílio na Rua ------------ em Lisboa. Mandatário: Dr. G, advogado, domicílio profissional na Av. ------------------- Lisboa.


Do requerimento inicial: Fls. 1 a 7.
Pedido: Fls.6.
Junta: 9 documentos e procuração forense.

Contestação: A fls. 48 a 54.
Tramitação:
O demandado afastou a mediação.
Foi designado o dia 16 de março de 2017, pelas 10h, que continuou em 18 de abril de 2017, pelas 13h, sendo as partes devidamente notificadas para o efeito.
Audiência de Julgamento.
A audiência decorreu conforme acta de fls. 88 e 89; e fls. 98 a 100.
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Fundamentação fáctica.
Com relevância para a decisão da causa dão-se por provados os seguintes factos:
1 – O primeiro e segunda, demandantes têm registado a seu favor a aquisição por compra, com data de 29 de julho de 1999, da fração autónoma designada pela letra “B”, correspondente ao rés-do-chão do prédio sito na Rua H, com entrada pelo n.º 33-A, 1200 – 796 Lisboa (cfr. doc de fls. 96 e 97);
2 - O demandado tem registado a seu favor a aquisição por compra, com data de 19 de dezembro de 2006, da fração autónoma designada pela letra “C”, correspondente ao primeiro andar do prédio sito na Rua H, com entrada pelo n.º 33-A, ----------- Lisboa (cfr. doc. 2, a fls. 1);
3 – Em 09 de Setembro de 2014 ocorreu uma inundação da fração autónoma designada pela letra “B”, correspondente ao rés do chão do prédio identificado supra ponto 1, tendo sido chamadas a PSP e Bombeiros Sapadores (cfr. doc. 3, doc. 4, doc. 9, a fls. 14, 15, 85 e 85V, e fls. 87 e 87V, cujo teor se dá por integralmente reproduzido;
4 – Do auto da policia consta que acederam ao interior do primeiro andar não tendo os bombeiros verificado nenhuma divisão inundada, opinando que a rotura terá ocorrido apenas nas paredes situadas entre o R/C e o primeiro andar (cfr. doc. 4, fls. 87V, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).


Factos não provados.
Com relevância para a decisão da causa não se consideram provados os factos não consignados, nomeadamente não se dá por provado:
- Que os 3.º e 4.ª demandados sejam usufrutuários da fração autónoma designada pela letra “B”, correspondente ao rés-do-chão do prédio sito na Rua H, com entrada pelo n.º 33-A, ------------ Lisboa;
- Que na noite de 8 para 9 de Setembro de 2014 tenha havido corte de abastecimento de água em toda a zona da Estrela;
- Que o vazamento de água que inundou o R/C tivesse ocorrido na fração do demandado.
Motivação.
A convicção do tribunal fundou-se nos autos, nos documentos apresentados e referidos nos respectivos factos, complementados pelos esclarecimentos das partes que se tiveram em consideração ao abrigo do princípio da aquisição processual e nos depoimentos das testemunhas apresentadas, referidos nos respectivos factos,
A testemunha I, afirmou ser arrendatária da fração que sofreu a inundação, descreveu prejuízos que ela própria teve (os quais não estão em apreço na presente ação) e disse foram feitas obras na fração para reparar o teto e o chão que foi a Dona D que pagou, mas não sabe quanto;
A testemunha J, comum a ambas as partes, prestou um depoimento muito confuso, pouco assertivo, confirmou que fazia a gestão da empresa que tinha a seu cargos imóveis e as rendas dos inquilinos; que foi ele que franqueou a entrada da polícia e bombeiros nos 3.º e 2.º andares; disse que antes tinha havido outra inundação devido a um balde que estava debaixo do lavatório que encheu e entornou sendo inquilino o K mas que a 2.ª inundação não provinha do mesmo inquilino.

Do Direito.
Da legitimidade dos demandantes.
A legitimidade processual é um pressuposto de cuja verificação depende o conhecimento do mérito da causa e afere-se pelo interesse direto do autor em demandar e pelo interesse directo do réu em contradizer, conforme determina o artigo 30º, nº 1, do Código de Processo Civil, na redacção dado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de junho, doravante CPC, aplicável ex vi artigo 63º, da Lei nº 78/2001, de 13 de Julho, alterada pela Lei 54/2013, de 31 de julho, doravante LJP. Estabelece o n.º 3, do referido artigo 30.º, que, na falta de indicação da lei em contrário, são considerados titulares do interesse relevante para o efeito da legitimidade os sujeitos da relação controvertida, tal como é configurada pelo autor. Decorre deste normativo que, há que atender à substância do pedido formulado e à concretização da causa de pedir, de tal maneira que, partes legítimas na acção, são os sujeitos da relação material, definida através destes dois elementos. Assim, estando perante um litígio onde está em causa a indemnização por danos causados no objecto do direito de propriedade, direito previsto e regulado nos artigos 1302.º e segs. do Código Civil., é ao proprietário, em primeiro lugar, que assiste o direito de ser ressarcido, por violação do direito de propriedade nos termos, nos termos previstos nos artigos 483.º e segs. igualmente do Código Civil. Porém, podem existir direitos a favor de outras pessoas que igualmente lhes atribua poderes de exigir indemnização ressarcitória de prejuízos. É o caso do direito de usufruto. Ora, na presente ação, os 3.º e 4.º demandantes afirmam ser usufrutuários da fração onde alegam ter sido causados os danos pelos quais pretendem ser indemnizados. Para tanto protestam juntar documento do registo predial, o que não fizeram, nem juntaram qualquer documento que sustente a aquisição desse direito. Assim, não lograram estes demandantes fazer prova da titularidade de direito que traduza interesse relevante para o efeito da legitimidade processual, atenta a relação que eles próprios configuram. Deste modo, face ao que antecede, há que concluir que os 3.º e 4.º demandantes são parte ilegítima, verificando-se assim uma excepção dilatória (art. 576º do CPC), (578.º e 579.º CPC), e por consequência, relativamente a estes demandantes declaro o demandado absolvido da instância, conforme determina o artigo 278º, nº 1, al. d), do CPC --
Da alegada ilegitimidade passiva do demandado.
Na contestação apresentada, longa exposição sobre a relação jurídica que estabeleceu com a empresa L por via do contrato de arrendamento e dos contratos de sub arrendamento celebrados entre esta e os
usuários das frações, relações estabelecidas com o objectivo de atribuir a gestão do seu património a terceiros e que não cumpre aqui apreciar, embora se possa afirmar que tais contratos são celebrados com amparo no princípio da autonomia negocial consagrado no artigo 405.º, e servem para satisfazer os legítimos interesses das partes. Porém, tais contratos, não têm eficácia erga omnes e por isso não podem afastar as eventuais responsabilidades do proprietário para com terceiros, quando a mesma seja consubstanciada em factos que suscetíveis de preencher os pressupostos da responsabilidade civil, questão que cabe apreciar em sede de mérito da causa. Na mesma toada narrativa, alega que é parte ilegítima com fundamento no facto de possuir contrato de seguro por via do qual transferiu a sua responsabilidade civil para a Companhia Crédito M. Neste ponto, pretende o demandado que a norma especial prevista no artigo 64.º, do Decreto-Lei 291/2007, de 21 de Agosto, que estabelece a legitimidade das partes em caso de litigio decorrente de acidente de viação, se aplique nos caso de seguro voluntário de responsabilidade civil. Porém, não lhe assiste razão alguma. Assim, e no que para o caso importa, é consabido que a legitimidade processual de afere de acordo com o critério fixado na lei processual civil, nos nºs 1 e 2 do artº. 30º do NCPC (correspondente aos nºs 1 e 2 do artº. 26º do anterior CPC): Têm legitimidade processual as pessoas que, juridicamente, têm interesse directo em demandar e em contradizer, o qual se exprime pela utilidade derivada da procedência da acção e pelo prejuízo directo que dela advenha, no contexto da
relação material controvertida tal como é configurada pelo autor na petição inicial. E é nestes termos que tem que ser apreciada. Assim, alegando os demandantes danos na sua fração e imputando a causa desses danos à propriedade daquele contra quem propõe a ação, forçoso é concluir que tem interesse em contradizer, facto suficiente para concluir que é parte legitima não lhe assistindo razão alguma quanto à exceção suscitada.
Cumpre apreciar a pretensão formulada pelos primeiro e segunda demandantes, os quais vêm requerer a condenação do demandado no pagamento da quantia de €700,00, quantia que alegam ter despendido na reparação de danos causados na fração de que são proprietários, causados por infiltração decorrente de vazamento de água com origem na fração do demandado. Duvidas não existem de que o conflito subjacente aos factos supra dados por provados e não provados constituem matéria subsumível após normativos que regem o instituto da responsabilidade civil extracontratual, estabelecidos nos artigo 483º e segs. do Código Civil, incluindo a disciplina relativa à da obrigação de indemnizar, decorrente dos artigos 562º e segs. do mesmo diploma. Os pressupostos da responsabilidade civil extracontratual são o facto, a ilicitude, a culpa, o dano e o nexo de causalidade entre o facto e o dano, funcionando a culpa como nexo de imputação do facto ao agente. Estabelece o nº1 do art.º 342º do Cód. Civil: “Àquele que invocar um direito cabe fazer a prova dos factos constitutivos do direito alegado.” Assim, é sobre os demandantes que recai o ónus da prova dos factos por si alegados, uma vez que, no caso, não se verificava nenhuma excepção a esta regra. Vejamos se o lograram fazer. Quanto ao facto, a questão que se coloca em termos de causalidade é saber se o vazamento (quer fosse balde que entornou, quer fosse cano de ligação ao tubo de queda) teve origem foi na fração do demandado. À mingua de outros factos probatórios, resta atentar no teor do auto de policia, transcrito, no que ao caso importa, no ponto 4 dos factos provados. Diz o agente “que acederam ao interior do primeiro andar não tendo os bombeiros verificado nenhuma divisão inundada”, opinando que “ rotura terá ocorrido apenas nas paredes situadas entre o R/C e o primeiro andar”. Face a esta constatação, não é possível estabelecer o necessário nexo de causalidade
pelo que a pretensão indemnizatória formulada não pode proceder. Ainda se dirá que os demandantes não lograram provar que tiveram prejuízo com a inundação, dado que quem suportou o prejuízo, a avaliar pelo depoimento da testemunha I e pelo orçamento junto como doc. 5 a fls. 16, não é parte na presente ação e sem prejuízo não há indemnização.

Decisão.
Em face do exposto, considero a presente ação improcedente por não provada e em consequência declaro o demandado absolvido da instância.

Custas.
Nos termos da Portaria n.º 1456/2001, de 28 de Dezembro, alterada nos seus n.ºs 6.º e 10.º pela Portaria n. 209/2005, de 24 de Fevereiro, custas pelos primeiro e segunda demandantes, pelo que deverão proceder ao pagamento da quantia de €35,00, correspondentes à segunda parcela, no prazo de três dias úteis, sob pena do pagamento de uma sobretaxa de €10,00 por cada dia de atraso.
Cumpra-se o disposto no n.º 9 da referida portaria em relação ao demandado.
Proceda-se às devoluções a que houver lugar relativamente aos terceiro e quarta demandantes.
Julgado de Paz de Lisboa, em 03 de julho de 2017
A Juíza de Paz
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Maria Judite Matias


Processo n.º 639/2016 –JP
Matéria: Direitos e deveres de condóminos.
(alínea c) do n.º 1, do art. 9º, da Lei n.º 78/2001, de 13 de Julho na redação que lhe foi dada pela Lei n.º 54/2013 de 31 de julho).
Objecto: Danos resultantes de inundação resultante de vazamento de água.
Valor da acção: €700,00 (setecentos euros).

Demandante:
1) A, com domicílio na Rua -----------------------------------Lisboa.
2) B, com domicílio na Rua -------------------------------------- Lisboa.
3) C, com domicílio na Travessa ------------------------------- Lisboa.
4) D, com domicílio na Travessa ------------------------------- Lisboa.
Mandatário: Dr. E, com domicílio profissional em --------Lisboa

Demandado: F, com domicílio na Rua --------------- em Lisboa.
Mandatário: Dr. G, advogado, domicílio profissional na Av. ---------------------Lisboa.
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Nos presentes autos foi proferida sentença a fls. 101 a 107. Inconformados com a improcedência da pretensão indemnizatória formulada contra os demandados, veio o 3.º demandante, declarado parte ilegítima, reclamar, alegando que a “Meritíssima Juíza não percebeu nada do que ocorreu”. Diz que não compreende a razão de não ter sido dado por provado o corte de água na noite de 8 para 9 de Setembro e que o Sr. Pedro Moura mentiu.

Revistas atentamente o teor dos documentos juntos aos autos e o teor dos depoimentos, conclui-se que não há fundamento para alterar o sentido da decisão. Ainda se dirá que, ainda que houvesse, sendo o reclamante parte ilegítima (não provou que era usufrutuário), decisão da qual não reclama, também não tem legitimidade para vir aos autos reclamar da decisão de mérito.
Notifique.
Julgado de Paz de Lisboa, em 28 de agosto de 2017
A Juíza de Paz

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Maria Judite Matias