Sentença de Julgado de Paz
Processo: 111/2018-JPCRS
Relator: ELISA FLORES
Descritores: RESOLUÇÃO DE LITÍGIOS ENTRE PROPRIETÁRIOS
Data da sentença: 12/04/2018
Julgado de Paz de : CARREGAL DO SAL
Decisão Texto Integral: SENTENÇA
RELATÓRIO
A e B, propuseram contra C, a presente ação declarativa, enquadrada na alínea d) do nº 1 do artigo 9.º da Lei n.º 78/2001, de 13 de julho, pedindo que a demandada seja condenada a proceder ao corte e à limpeza das árvores, arbustos e vegetação existentes no seu terreno junto à habitação dos demandantes, que tem estrema com o prédio destes e, que se encontram a menos de 5 metros de distância do imóvel; a abster-se a doravante, por qualquer forma lesar os demandantes e a indemnizá-los pelos danos patrimoniais e morais causados, no montante de € 5 928,00 (cinco mil novecentos e vinte e oito euros), importância acrescida dos juros de mora, à taxa legal, contados desde a data da citação até integral pagamento e nas custas.
Para o efeito, alegaram os factos constantes do requerimento inicial de fls. 5 a 17 e juntaram 35 documentos, que aqui se dão por reproduzidos.
A demandada contestou nos termos constantes de fls. 69 a 86 dos autos, suscitando a sua ilegitimidade para estar em juízo desacompanhada dos restantes herdeiros, uma vez que o prédio pertence à herança Ilíquida e Indivisa aberta por óbito de F, e ainda a ineptidão da petição inicial e a prescrição do direito dos demandantes. Por cautela contestou ainda por impugnação dos factos alegados pelos demandantes.
Juntou 6 documentos, que aqui também se dão por reproduzidos.
Os demandantes responderam às exceções invocadas pela demandada nos termos constantes de fls. 98 a 101 dos autos.
Vieram ainda os demandantes suscitar um incidente de intervenção principal provocada dos restantes herdeiros de F, o que, destinando-se a sanar uma situação de preterição de litisconsórcio necessário na parte passiva, atento o disposto no artigo 39º da Lei nº 78/2001, de 13 de julho, nova redação e ao abrigo do princípio da absoluta economia processual que rege a atuação dos Julgados de Paz, foi admitido e convidados os demandantes a aperfeiçoar o requerimento inicial em conformidade, sanando eventual ineptidão.
Citados os restantes herdeiros/demandados, D e E, e concedido prazo para contestar, vieram ambos acompanhar a contestação apresentada pela primeira demandada, sua mãe (cf. fls. 183 dos autos).
O litígio foi submetido a mediação não tendo as partes logrado chegar a acordo.
Ambas as partes apresentaram prova testemunhal.
Valor da ação: Fixo em € 5 928,00 (cinco mil novecentos e vinte e oito euros).
O artigo 60º da Lei n.º 78/2001, de 13 de julho, na sua alínea c), prescreve que do conteúdo da sentença proferida pelo juiz de paz faça parte uma sucinta fundamentação. Assim:
FUNDAMENTAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO:
Consideram-se provados, com interesse para a presente decisão, os seguintes factos:
1.º - Os demandantes, casados entre si no regime de comunhão de adquiridos, são donos e legítimos possuidores do prédio urbano, sito à Rua de Santo António, n º 36, freguesia de G e concelho de H, inscrito na matriz predial urbana da freguesia de G com o artigo 1107º (antigo 1226º), descrito a favor da demandante na Conservatória do Registo Predial de H sob o nº 1575;
2.º - O prédio dos demandantes é composto de casa de habitação com rés-do-chão, 1º andar, sótão, com telhado corrente de duas águas, revestido a telha cerâmica e com jardim anexo;
- A casa de habitação dos demandantes é um imóvel com mais de 40/50 anos de construção, construção antiga;
4.º - A parede tem imensas rachas/ fissuras, zonas sem tinta ou qualquer proteção e a necessitar de tratamento/ manutenção, sendo que o telhado tem telhas partidas e de fraca impermeabilização;
5.º - Por cima dessa pintura foi colocada uma tela de alcatrão com alumínios, para impermeabilização;
6.º - Fruto do tempo, a referida tela tem vindo a descolar-se da parede em algumas zonas;
7.º - A queda da tela de alcatrão ocorre para cima dos produtos hortícolas dos demandados;
8.º - Para recolha das águas pluviais a tardoz, na parede confinante com os demandados, a habitação dos demandantes dispõe de uma caleira de secção retangular que se desenvolve ao longo de todo o beirado do alçado posterior, tendo para efetuar a transição entre o leito da caleira e o tubo de queda de PVC acessórios em curva também de PVC com a forma de um S, onde se verifica a descarga; 9.º - O telhado dos demandantes não foi substituído pelo menos desde há 24 anos;
10.º - Neste prédio residem os demandantes, as suas duas filhas menores e os pais da demandante, I e J;
11.º - Por sua vez, os demandados foram habilitados como únicos e universais herdeiros de F, falecido em 12 de agosto de 2009, que não deixou testamento ou qualquer disposição de última vontade;
12.º - Do acervo hereditário faz parte o imóvel sito na XXX, União das Freguesias de G, inscrito na matriz predial rústica sob o artigo 4278º (antigo 4529º), a confrontar a Norte com caminho, a Sul com L, a Nascente com casas do mesmo e a Poente com M e outro;
13.º - Neste prédio rústico, na parte que confronta com o prédio dos demandantes identificado em 1.º supra, os demandados têm árvores de grande porte, nomeadamente uma nogueira, sendo que esta se encontra a menos de 5 metros da habitação dos demandantes;
14.º - Quando os demandantes compraram o imóvel, no ano de 2006, grande parte das árvores já existia no prédio dos demandados; 15.º - Por vezes as hastes da nogueira crescem acima do nível do telhado do prédio dos demandantes, pendendo para o mesmo;
16.º - A referida nogueira foi aparada recentemente;
17.º - Mas antes deste corte os demandantes ouviam, quando havia vento, os ramos da nogueira a bater nas paredes da sua habitação;
18.º - Por vezes a demandada e os únicos e legítimos proprietários do prédio fazem ou mandam fazer ao Sr. N a limpeza, corte e poda das suas árvores;
19.º - Mesmo em frente às gateiras/ seteiras da casa de habitação dos demandantes que estão viradas para o prédio dos demandados, ao nível do rés-do-chão, e a menos de 5 metros da habitação dos demandantes, a demandada C plantou arbustos e plantas de porte mais pequeno e, recentemente, cedros/ ciprestes, espécies de grande crescimento;
20.º - Em 25/05/2018 o pai da demandante dirigiu à demandada C, carta, que esta rececionou em 28/05/2018, alegando, em síntese, que a nogueira, que deveria estar a 5 metros da “sua” casa, causou prejuízos na caleira e num quarto “…visto que entupiu-a e a humidade começou a infiltrar-se na parede…” Que já a “…tinha avisado que a nogueira estava para cima do telhado e da minha varanda e não fez nada…” “os cedros que plantou em frente das janelas terá de os arrancar todos porque não estão pela lei dos 5 metros da casa …”, instando-a a proceder ao corte destas espécies arbóreas no prazo de 15 dias;
21.º - E esta respondeu que nos termos do nº 1 do artigo 1366º do Código Civil “é lícita a plantação de árvores e arbustos até à linha divisória dos prédios (…)”, e assim “…pela legislação em vigor, as árvores plantadas encontram-se de acordo com a lei, pelo que não poderei aceder ao seu pedido. Por outro lado, todos os anos ordeno a poda das árvores, bem como de eventuais ramificações que estas possam arremessar para o seu prédio, pelo que não corresponde à realidade que as árvores possam ter causado algum prejuízo, o que desde já se deixa impugnado.”
22.º - Os demandantes não têm forma de entrar no prédio dos demandados para cortar árvores e ramos que propendam para o seu prédio atendendo à justaposição dos prédios confinantes e porque as gateiras que construíram na parede virada para o prédio dos demandados, para circulação de ar e fonte de entrada de luz, têm grades e o pequeno terraço dos demandantes tem um muro, o que os impede, ainda que quisessem, de aceder ao prédio dos demandados para o efeito sem o invadir e devassar o direito de propriedade dos demandados;
23.º-O prédio da demandada e outros proprietários é completamente murado;
24.º - A água das chuvas infiltrou-se na placa da cobertura da habitação;
25.º - Na parede lateral que confina com os demandantes, os demandantes têm as paredes e tetos de três compartimentos com humidade e bolores;
26.º - Sendo que no quarto onde dormem as filhas dos demandantes, e em tempos os pais da demandante, situado no 1º andar direito-posterior da moradia, e onde está instalada a caleira supramencionada, por baixo da parte final da caleira na zona que corresponde à transição para o tubo de queda de água, houve infiltração de águas, e no canto posterior direito da parede junto ao teto há manchas do escorrimento de águas e a pintura das paredes e teto está estragada;
27.º - Nos termos do Orçamento junto pelos demandantes, datado de julho do corrente ano, a montagem de andaimes, remoção das telas de impermeabilização na caleira e fachada posterior, pintura desta última, aplicação de uma nova caleira e pintura das paredes e tetos dos compartimentos a tardoz ascende ao valor global de € 4 428,00, com IVA;
28.º - A mãe da demandante encontra-se em condição física debilitada;
29.º - Também as filhas menores dos demandantes têm tido problemas respiratórios.
Motivação dos factos provados:
A factualidade dada como provada resultou da conjugação dos documentos juntos aos autos, que não foram impugnados, e dos que tendo-o sido foram corroborados por outra prova, das declarações da demandante e da demandada D, e da prova testemunhal, tendo em conta o princípio da livre apreciação da prova previsto no artigo 607º, nº 5 do Código de Processo Civil e no artigo 396º do Código Civil (doravante designado simplesmente C.Civ).
A demandante declarou que comprou a sua casa aos pais que, por sua vez a haviam comprado em 1996. E ainda que: Estiveram emigrados até 2004, tendo neste período a casa ficado devoluta, embora viessem a Portugal duas vezes por ano; Fizeram obras em 2001 e mudaram janelas e colocaram as telas; O pai só há 2 anos é que limpou o telhado, que ia ser substituído este ano; O pai andou há pouco tempo a pôr uma tela na caleira e lavou três enfiamentos de telhas; No temporal recente da tempestade Leslie o pai foi “lá acima” e viu telha partida e agora quando foram os peritos estava uma partida; As manchas apareceram há cerca de um ano, dezembro de 2017; As hastes da nogueira, cujo tronco está a 2,70m da sua casa, “deitavam” para cima do seu telhado; No seu terraço só vê folhas da nogueira, de mais nenhuma árvore; A casa tem aquecimento central já do tempo em que a casa era dos seus pais; As gateiras/seteiras estão construídas a 1,80m do solo, pelo que, tendo 1,63m se quiser ver através delas tem de colocar-se sobre uma cadeira ou escadote; A mãe tem doença oncológica do pulmão e as filhas tiveram bronquiolite.
A demandada D, que está emigrada na Suíça há 7 anos, declarou que: Fala com a mãe todos os dias; O pai faleceu há dez anos e foi depois que plantaram a nogueira onde antes esteve uma cerejeira, com que nunca tiveram qualquer problema; Há mais árvores no enfiamento da parede da casa mas mais afastadas e que as plantaram de modo a passar pelo meio um trator e serem limpas com frequência; As telas da parede dos demandantes têm vindo a cair ao longo dos anos; E há um conflito entre a sua mãe e o pai da demandante;
Os demandantes apresentaram as seguintes testemunhas:
1- Eng.º O, engenheiro civil, e gerente da empresa P, Lda. e que nessa qualidade fez o orçamento das obras junto aos autos e que depôs que: O Sr. I, pai da demandante, foi quem o chamou queixando-se de humidades na habitação; Não conhecia os prédios; Esteve na habitação dos demandantes mas não subiu ao telhado só espreitou para cima; A nogueira tinha uns ramos encostados à vivenda; “A caleira tinha algumas folhitas, tinha”; A presença de humidade na caleira também provoca a sua putrefação; Viu que as caleiras e as telas estavam deterioradas; As humidades do quarto rosa não poderiam ser por condensação mas por infiltração do exterior; Atribui a entrada de humidade por a caleira estar danificada e que passou para a placa; As telas não são dos melhores materiais para a impermeabilização porque por vezes descolam-se pelas juntas e deixam entrar água; As telas da caleira eram para retirar porque estavam a causar humidades; Se a caleira estiver furada, rota, deixa passar água para baixo; O Orçamento pedido era para reparação da caleira, da parede e os compartimentos atrás da moradia. Prestou um depoimento isento e sobre factos de que tinha conhecimento direto e ainda no âmbito dos seus conhecimentos técnicos.
2- J, mãe da demandante, e que declarou que está zangada com a demandada C desde que colocaram as gateiras. Muito nervosa, disse que “A cabeça está baralhada por causa dos tratamentos oncológicos”. O seu depoimento terá, por todos estes factos, de ser valorado com reserva.
Depôs que: O marido foi há dois anos ao telhado para ver e para fazer as obras, que seriam este ano, limpar um pouco e ver o telhado; As humidades começaram há cerca de um ano e que a D. C, cortou as ramadas da nogueira já depois da entrada do processo; Os ciprestes impedem que o sol bata na parede; As telas têm caído; Iam fazer obras no telhado e as paredes de trás em capôto, a fazer pelo seu marido porque é a sua especialidade; O telhado tem de ser feito e vai fazer-se também a caleira porque está rota; Via a nogueira quando punha a roupa a secar na varanda; Há outras árvores mas estão mais afastadas;
3- Q, prima da demandante, com 27 anos de idade e que conhece a casa dos demandantes “há muitos anos”. Prestou um depoimento muito parcial, pouco fundamentado e baralhado, declarando ter conhecimentos de situações sem que conseguisse explicar a razão de ciência, nomeadamente sabia que por trás da parede há árvores, sendo uma nogueira, que causava humidades, e que a demandada plantou uns cedros, mas instada declarou que não se recordava de ver as árvores de fruto, e que não conhecia o quintal. O seu depoimento apenas poderá ser valorado no que tem conhecimento direto.
Depôs que nunca foi ao telhado, nunca viu a caleira entupida, nunca lhe falaram em obras e que já dormiu no quarto das menores, único que conhece e viu as humidades talvez há um ano.
Por sua vez os demandados apresentaram as seguintes testemunhas:
1- O Eng.º R, que se deslocou com as partes e o Engenheiro S, à habitação dos demandantes na pendência da causa e foi o único que subiu ao telhado. O seu depoimento foi sobre factos de que tinha conhecimento direto, e no âmbito dos seus conhecimentos técnicos mas revelou alguma parcialidade.
Depôs que a caleira estava toda rota e, depois instado, esclareceu que só viu sobre o quarto, perto do escoamento, onde já não havia tela, na zona onde fizeram a experiência de enchimento da caleira, explanada no relatório junto aos autos pelos demandantes.
Depôs que as humidades do quarto das menores vêm da infiltração de água da caleira, que é de chapa e se deteriorou pelo decurso do tempo; Da parte da parede sem tela não se nota humidade “vem tudo da caleira”; A caleira com a configuração que tem não tem muita capacidade de escoamento e se houver folhas a tapar, porque no Inverno caem folhas, mais entope e transborda; A caleira estava limpa e que tinha sido vedada com aspeto de ser recentemente; Viu uma telha partida, que também lhe parecia recente; A parede tem 30cm de largura, poderá ser parede dupla mas não tem caixa-de-ar; 2- T, empregado de mesa e que tem sido encarregado pela demandada C, para limpar e aparar as árvores “há uma meia dúzia de anos”, porque tem alguns conhecimentos de poda.
Depôs que: Conhece a casa da D. C há uns 50 anos porque reside na povoação e o terreno tem à volta abrunheiros, laranjeiras, nogueiras, etc.; Junto à casa dos demandantes tem a nogueira e os cedros e um diospireiro e uma laranjeira, mas estas mais afastadas; A D. C diz para aparar as árvores a 1,20m da parede e ele apara a nogueira 2 vezes por ano, “quando quer não tem data certa”, a última vez no ano passado; Os cedros vão tapar as janelas dos demandantes, “ quando crescerem, se crescerem”. Depôs sobre factos de que tinha conhecimento direito mas não convenceu quanto aos seus eventuais conhecimentos de podador e à frequência que referiu que podava/aparava as árvores do terreno dos demandados.
Mais foram tidos em conta, nos termos das alíneas a) e b) do nº 2 do artigo 5º do CPC, factos instrumentais e factos que complementam ou concretizam os que as partes alegaram e resultaram da instrução e discussão da causa e relativamente aos quais todos tiveram a possibilidade de se pronunciar, nomeadamente o Relatório do Eng.º S, junto pelos demandantes e se encontra a fls. 230 a 235 dos autos, que não foi impugnado, conjugado com o que resultou do depoimento do Eng.º R, testemunha dos demandados por terem ambos se deslocado ao local, a convite de ambas as partes, durante a pendência da ação.
Factos não provados e respetiva motivação:
Não se provaram quaisquer outros factos alegados pelas partes, com interesse para a decisão da causa, por existência de prova contrária ou por falta de mobilidade probatória credível que permitisse ao Tribunal aferir da veracidade dos factos, nomeadamente que:
Desde a data em que adquiriram a casa os demandantes nunca reclamaram com o que quer que seja, sendo que as árvores já ali existiam, com dimensão idêntica à que têm nos dias de hoje;
O Sr. I, por diversas vezes, colocou-se nas gateiras que se encontram a menos de 50 centímetros do chão, a observar o que a demandada se encontrava a fazer;
As árvores, arbustos e vegetação plantada na estrema do prédio identificado em 5º, confinante com o prédio identificado em 1º propendem para este, prédio dos demandantes, e estão a danificá-lo;
Os ramos da nogueira danificaram já o telhado e a caleira de escoamento de águas pluviais dos demandantes;
De facto, e quanto a estes últimos factos não se provou a efetiva deposição/existência de folhas de árvores na caleira, e ainda, sem dúvida, que tenha sido a causa dos danos verificados no quarto das menores.
Os demandantes não lograram fazer prova e a mesma competia-lhes como facto constitutivo do seu direito.
Nenhuma testemunha referiu ter visto folhas na caleira, à exceção do Eng.º O, que referiu a existência apenas de umas folhinhas e o relatório do Eng.º S, refere apenas: “…Tendo em atenção a curta distância da copa das árvores à caleira, é muito provável que haja algum tipo de deposição de folhas….”.
Ninguém foi verificar a caleira, sendo que também não foi provado que existisse uma regular limpeza e manutenção da mesma, à exceção dos últimos dois anos em que terá sido impermeabilizada.
Fundamentação de direito:
Visam, em síntese, os demandantes com a presente ação a condenação dos demandados proceder ao corte e à limpeza das árvores e, arbustos, a absterem-se futuramente de os lesar e em uma indemnização por danos patrimoniais e morais.
Antes de me debruçar sobre os pedidos há que me pronunciar sobre a suscitada prescrição do direito dos demandantes pelo decurso do tempo:
Ora, sem mais considerandos, resultando da factualidade provada, inclusivamente pelas declarações da demandada D, que a nogueira e os pequenos cedros plantados junto da parede confinante o foram há menos de dez anos, que a humidade apareceu há cerca de um ano, e que os demandantes interpelaram de seguida a demandada D para o corte das árvores que entendiam ser a causa da mesma, não estão minimamente reunidos os requisitos da prescrição do (eventual) direito a ser indemnizados, a que se refere o artigo 498º do C. Civ., pelo que não se verifica a exceção.
Do pedido de indemnização por danos morais e patrimoniais decorrentes das humidades na parede e tetos de compartimentos da sua habitação e telhado, alegadamente por infiltração através da sua caleira de escoamento de águas pluviais que terá ficado entupida por folhas da nogueira dos demandados que não cortaram nem deixaram cortar as hastes que penderam sobre o seu telhado.
As provas têm por função a demonstração da realidade dos factos (cf. artigo 341º do C. Civ).
Nos termos do disposto no nº 1 do artigo 342º, do C.Civ “Àquele que invocar um direito cabe fazer a prova dos factos constitutivos do direito alegado”, ou seja, era sobre os demandantes que recaía o ónus da prova, competindo-lhes provar os factos constitutivos do direito que alegam ter”.
No caso, os demandantes que vêm ao abrigo da responsabilidade extracontratual não provaram, desde logo, os danos morais alegados. Ficou apenas provado que as menores terão tido problemas respiratórios, e a mãe da demandante, problemas de saúde, desconhecendo se decorrentes da humidade.
Relativamente aos danos patrimoniais, ficaram exaustivamente demonstrados danos por infiltração de águas pluviais do telhado, através da placa, na zona de escoamento da caleira
Mas não ficou provado que tenham decorrido das folhas da nogueira, pela inércia dos demandados no cumprimento de uma obrigação legal do dever de zelar pelas suas árvores, em especial a nogueira, evitando ainda produzir danos aos vizinhos. E assim, que estes tenham resultado de comportamento ilícito e culposo dos demandados de tal modo que sem a sua ocorrência não se teriam produzido ou não se teriam produzido com aquela extensão.
Não logrando os demandantes provar na situação em apreço o nexo de causalidade entre a omissão de uma atuação regular dos demandados sobre a nogueira e os danos patrimoniais provados na sua habitação, não poderão os mesmos ser condenados em qualquer indemnização, por não estarem reunidos os pressupostos cumulativos da responsabilidade civil extracontratual, prevista no artigo 483º do Código Civil: prática de um ato ilícito, a imputação do facto ao agente em termos de culpa, a ocorrência de danos e um nexo de causalidade entre o facto e os danos.
- Do pedido de condenação ao corte e à limpeza das árvores, arbustos e vegetação existentes no seu terreno junto à habitação dos demandantes:
Resultou provado que a nogueira e os cedros estão a menos de 5 metros da habitação dos demandantes e, embora seja legalmente permitida a plantação de árvores e arbustos até á linha divisória dos prédios, nos termos do nº 1 do artigo 1366º do C. Civ, o vizinho não é obrigado a suportar as raízes que se infiltrem para o seu terreno nem os ramos ou hastes que sobre ele propendam (nº 2 do mesmo artigo).
Assim, prevê a 2ª parte, do nº 1 do artigo 1366º do C.Civ. que, tendo o proprietário do imóvel e das espécies arbóreas sido notificado para proceder ao corte dos ramos ou raízes que propenderem ou que se introduzirem sobre o prédio vizinho e nada fizer no prazo de 3 dias, é lícito que o dono do prédio vizinho os corte ou arranque;
Resultou provado que é a nogueira, através dos seus ramos, que atualmente tem impendido sobre o prédio dos demandantes e que é impraticável que sejam estes a proceder ao arrancamento e corte dos ramos ou raízes.
A nogueira é uma árvore majestosa, de grande porte, que requer muito espaço para exibir a sua extensa copa e caso não seja frequentemente aparada, encontrando-se muito próxima da habitação dos demandantes necessariamente os seus ramos para ela propenderão, podendo provocar-lhes prejuízos.
Todavia, resultou provado que a demandada já procedeu, recentemente, ao seu aparo, pelo que sendo legal a sua plantação e não pendendo já sobre o prédio vizinho, está neste momento prejudicado o pedido dos demandantes nesta parte.
Mas também resultou provado que a demandada plantou ciprestes estrategicamente em frente das gateiras da habitação dos demandantes que foram feitas para deixar passar luz e para arejamento da habitação.
Ora, os ciprestes são espécies de grande crescimento e vão impedir que aquelas cumpram essas funções quando crescerem, por as taparem, causando ainda sombra constante.
E, neste caso, tendo os demandados o direito de plantar até à extrema do prédio vizinho abusam desse direito quando plantam à frente das gateiras, com o intuito de as tapar, exercendo o seu direito fora do seu objetivo e da sua razão de ser, e em termos ofensivos da justiça, com intenção de os prejudicar ou de comprometer, o gozo do seu direito a usufruir das vantagens das referidas gateiras.
Agem assim, já não no exercício legítimo do seu direito mas em abuso do mesmo, excedendo os limites impostos pela boa-fé, bons costumes e o fim social ou económico do seu direito, nos termos do artigo 334º do Código Civil.
Pelo que devem os demandados proceder ao corte, ou replantação noutro lugar do seu terreno, se possível, dos ciprestes que estiverem plantados em frente às gateiras dos demandantes.
Mais devem os demandados abster-se de lesar, por qualquer forma, os demandantes, conforme peticionado.
Decisão:
Em face do exposto, julgo a ação parcialmente procedente, e em consequência:
Condeno os demandados a proceder ao corte dos ciprestes que se encontrarem em frente às gateiras do prédio dos demandantes, ou replantá-los em outro local do seu terreno, se possível;
Condeno os demandados a absterem-se de, por qualquer forma, lesar os demandantes;
Absolvo os demandados do demais peticionado.
Custas por ambas as partes, na proporção do decaimento, que se fixam em 50% para cada uma (cf. artigo 8º, 9º e 10º da Portaria n.º 1456/2001, de 28 de dezembro), e que já se encontram pagas. Registe e notifique.
Carregal do Sal, 04 de dezembro de 2018.
A Juíza de Paz, (Elisa Flores)
Processado por computador (art.º 131º, nº 5 do C P C)