Sentença de Julgado de Paz
Processo: 409/2018-JPPRT
Relator: MARTA M. G. MESQUITA GUIMARÃES
Descritores: AÇÃO DE CONDENAÇÃO
Data da sentença: 01/17/2019
Julgado de Paz de : PORTO
Decisão Texto Integral: SENTENÇA
Proc. n.º 409/2018-JPPRT

IDENTIFICAÇÃO DAS PARTES
Demandantes: A. NIF …., residente na Rua ….. Porto, e B., NIF ….., residente na Rua…. Porto
Demandado: C., NIF …, residente na Rua… Porto
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OBJECTO DO LITÍGIO
Os Demandantes vieram propor contra o Demandado a presente acção declarativa, enquadrável na alínea f) do n.º 1 do artigo 9.º da Lei n.º 78/2001 de 13 de Julho, pedindo que o Demandado fosse condenado a pagar-lhes € 405,00 referentes a anuidades em falta (2017 e 2018).
Alegaram, em suma, que são administradores da compropriedade Garagem … Porto, prédio inscrito na matriz sob o artigo 000, que o Demandado é comproprietário de três lugares de garagem, correspondente a 3/346 indivisos do indicado prédio, e que se encontra em falta com o pagamento da anuidade de comparticipação nas despesas referentes aos anos de 2017 e 2018, estando em dívida € 180,00 (€ 60,00 por lugar) respeitantes a 2017 e € 225,00 (€ 75,00 por lugar) respeitantes a 2018; que enviaram carta ao Demandado, em 02.07.2018, e que o interpelaram presencial e telefonicamente, e que o mesmo se recusa a pagar por discordar da actual administração – cfr. fls. 2 a 9.
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Devidamente citado (cfr. fls. 15), o Demandado não apresentou contestação, tendo, porém, comparecido na audiência de julgamento.
Procedeu-se à realização da audiência de julgamento com observância do legal formalismo, consoante resulta da respectiva acta (cfr. fls. 29).
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O Julgado de Paz é competente em razão da matéria (cfr. alínea f) do n.º 1 do artigo 9.º da Lei nº 78/2001, de 13 de Julho), do território (cfr. artigo 12.º, nº 1, da indicada Lei n.º 78/2001, de 13 de Julho) e do valor, que se fixa em € 405,00 (cfr. artigos 297.º, n.º 1, e 306.º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil, doravante CPC, aplicáveis ex vi artigo 63.º da mencionada Lei n.º78/2001, de 13 de Julho 1) As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas.
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FACTOS PROVADOS COM RELEVÂNCIA PARA A DECISÃO DA CAUSA
A. O prédio sito na Rua … freguesia de Ramalde, concelho do Porto, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 000, é detido, em compropriedade, pelos Demandantes e pelo Demandado, entre outras pessoas.
B. Na caderneta predial urbana, o prédio supra mencionado é descrito como “Prédio em Prop. Total sem Andares nem Div. Susc. De Utiliz. Independente” e ainda como “Prédio de r/c, com duas frentes rebocadas e destinado a recolha de viaturas automóveis”, tendo a seguinte “Afectação: Estacionamento coberto”.
C. Os Demandantes são os administradores do prédio supra mencionado durante o ano de 2018, tendo sido eleitos para tal por comproprietários representativos de 175 lugares de estacionamento, sendo ainda certo que foram igualmente eleitos administradores do prédio durante o ano de 2017.
D. Dispõe o ponto 3 do “Regulamento” do prédio supra mencionado nos precedentes factos provados que: “Os 346 lugares e zonas comuns da garagem estão devidamente delimitados e numerados na planta anexa a este Regulamento, do qual faz parte integrante.”
E. Mais dispõe o ponto 4 do “Regulamento” mencionado no precedente facto provado que: “Relativamente às partes comuns da garagem, todos os comproprietários têm direitos qualitativamente e quantitativamente iguais, pelo que todos participam nas vantagens e encargos da garagem em absoluta paridade.”
F. Preceitua, ainda, o ponto 8 do “Regulamento” mencionado nos precedentes factos provados que: “Todas as despesas efectuadas com a manutenção e conservação da garagem, serão distribuídas em partes iguais pelos 191 comproprietários, sendo 155 lugares pertencem à D. ficam isentos de pagamento de quotas, contribuindo com o pagamento na íntegra da energia eléctrica bem como da manutenção e conservação dos seus lugares.”
G. O Demandado detém 3/346 indivisos do prédio supra mencionado, correspondente a três lugares de garagem: 242, 253 e 254.
H. Os comproprietários representativos de 175 lugares de estacionamento deliberaram, em 09.02.2018, que o valor da anuidade a pagar por cada comproprietário passava de € 60,00 para € 75,00.
I. O Demandado não procedeu ao pagamento da sua comparticipação nas despesas relativas ao prédio supra mencionado nos precedentes factos provados, respeitantes aos anos de 2017 e 2018, estando em dívida € 180,00, portanto, € 60,00 por lugar, respeitantes a 2017, e € 225,00, portanto, € 75,00 por lugar, respeitantes a 2018.
J. Os Demandantes interpelaram o Demandado, presencialmente e por telefone, para que este procedesse ao pagamento dos valores mencionados no precedente facto provado, ao que o Demandado disse não pagar por discordar da actual administração.
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FACTOS NÃO PROVADOS COM RELEVÂNCIA PARA A DECISÃO DA CAUSA
Não se deram como não provados quaisquer factos com relevância para a decisão da causa.
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FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
Os factos A, C, G, I e J resultaram provados por via de admissão (cfr. artigo 574.º, nº 1 e 2 do CPC), sendo ainda certo que o facto A resultou, ainda, provado por via da cópia da caderneta predial urbana junta aos autos em audiência de julgamento pelos Demandantes, não impugnada pelo Demandado, e os factos C e G resultaram ainda provados por via da acta n.º 31, datada de 09.02.2018, junta com o requerimento inicial, não impugnada pelo Demandado, a qual faz expressa referência à eleição dos Demandantes como administradores do prédio, bem como aos lugares de garagem propriedade do Demandado. Cumpre, ainda, mencionar que parte do facto A, especificamente, a compropriedade detida pelos Demandantes e pelo Demandado, entre outras pessoas, do prédio em causa, foi tomada em consideração à luz do disposto no artigo 5.º, n.º 2, alíneas a) e b), do CPC.
Os factos B, D, E, F e H foram tomados em consideração à luz do disposto no disposto no indicado artigo 5.º, n.º 2, alíneas a) e b), do CPC, e tendo por base a caderneta predial urbana já aludida quanto ao facto B, o regulamento junto em sede de audiência de julgamento pelos Demandantes, igualmente não impugnado pelo Demandado, quantos aos factos D, E e F, e a já citada acta n.º 31, datada de 09.02.2018, quanto ao facto H.
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O DIREITO
Os presentes autos respeitam ao direito de uso e administração da compropriedade, a qual vem prevista nos artigos 1403.º e seguintes do Código Civil (CC), e se apresenta como um dos tipos de direito de propriedade.
Qualquer proprietário goza dos direitos de uso, fruição e disposição das coisas que lhe pertencem (cfr. artigo 1305.º do CC), assim como tem que suportar os inerentes encargos de manutenção e conservação dessas mesmas coisas, não só para seu interesse pessoal (pois apenas por via da manutenção e conservação da coisa poderá efectuar um cabal uso e fruição da mesma), mas também para tutela de direitos e interesses de terceiros, sob pena de poder vir a ser civilmente responsável (cfr. artigo 492.º, n.º 1, do CC).
No que concretamente se reporta à compropriedade, dispõe o artigo 1403.º, n.º 1, do CC que existe propriedade em comum, ou compropriedade, quando duas ou mais pessoas são simultaneamente titulares do direito de propriedade sobre a mesma coisa; já o n.º 2 do mesmo artigo prevê que os direitos dos consortes ou comproprietários sobre a coisa comum são qualitativamente iguais, embora possam ser quantitativamente diferentes; as quotas presumem-se, todavia, quantitativamente iguais na falta de indicação em contrário do título constitutivo.
Mais dispõe o artigo 1405.º, n.º 1, do CC que os comproprietários participam nas vantagens e encargos da coisa, em proporção das suas quotas e nos termos dos artigos seguintes.
Entre os encargos da coisa comum figuram, naturalmente, “as despesas realizadas por causa da coisa comum (conservação, inovações, acções judiciais para defesa dos direitos dos consortes, etc.)” Cfr. PIRES DE LIMA e ANTUNES VARELA, inCódigo Civil Anotado”, Volume III, 2.ª Edição Revista e Actualizada (Reimpressão), Coimbra Editora, 1987, pág. 355. (o sublinhado é nosso).
E o artigo 1407.º, n.º 1, do mesmo diploma legal, sob a epígrafe “Administração da coisa”, preceitua que é aplicável aos comproprietários, com as necessárias adaptações, o disposto no artigo 985.º; para que haja, porém, a maioria dos consortes exigida por lei, é necessário que eles representem, pelo menos, metade do valor total das quotas.
Já o artigo 985.º, n.º 1, preceitua que, na falta de convenção em contrário, todos os sócios têm igual poder para administrar.
Entre os poderes de administração (ordinária) contam-se o poder de exigir dos demais consortes/comproprietários o encargo devido por cada um para fazer face às despesas de conservação e manutenção da coisa comum
No caso, deu-se como provado que o prédio em apreço nos autos é detido, em compropriedade, pelos Demandantes e pelo Demandado, entre outras pessoas, mais se tendo dado como provado que o prédio se encontra descrito, nas Finanças, como sendo um prédio em propriedade total, destinado a recolha de viaturas automóveis, sendo um prédio afecto a estacionamento coberto. Mais se deu como provado que, conforme “Regulamento” do prédio junto aos autos, o mesmo é composto por 346 lugares, e que os comproprietários têm direitos quantitativamente iguais, todos participando nas vantagens e encargos da garagem em absoluta paridade, e, ainda, que todas as despesas efectuadas com a manutenção e conservação da garagem, serão distribuídas em partes iguais pelos 191 comproprietários, estando 155 lugares (pertencentes à Soares da Costa) isentos de pagamento de quotas.
Ora, não obstante se mencionar, no “Regulamento” que disciplina a administração da compropriedade em apreço, que todos os comproprietários têm direitos quantitativamente iguais, todos participando nas vantagens e encargos da garagem em absoluta paridade, a verdade é que, mais à frente, nesse mesmo “Regulamento”, se prevê uma isenção de encargos para 155 lugares. Portanto, as despesas inerentes à manutenção e conservação da garagem serão suportadas, em partes iguais, pelos comproprietários dos 191 lugares.
Deu-se, igualmente, como provado que o Demandado detém 3/346 indivisos do prédio supra mencionado, correspondente, portanto, a três lugares de garagem, e que os comproprietários representativos de 175 lugares de estacionamento deliberaram, em 09.02.2018, que o valor da anuidade a pagar por cada comproprietário passava de € 60,00 para € 75,00; mais se deu como provado que o Demandado não procedeu ao pagamento da sua comparticipação nas despesas relativas ao prédio em apreço nos autos, respeitantes aos anos de 2017 e 2018, estando em dívida € 180,00, portanto, € 60,00 por lugar, respeitantes a 2017, e € 225,00, portanto, € 75,00 por lugar, respeitantes a 2018, embora tenha sido presencial e telefonicamente interpelado pelos Demandantes, na qualidade de administradores da coisa comum (cfr. referido artigo 985.º, n.º 1, do CC), para que procedesse ao pagamento de tais valores.
Ora, no caso, os comproprietários representativos de 175 lugares de estacionamento (em 346) deliberaram, em 09.02.2018, que o valor da anuidade a pagar por cada comproprietário, a título de encargos com a coisa comum, passava de € 60,00 para € 75,00, pelo que se encontra preenchido o disposto no artigo 1407.º, n.º 1, do CC, tendo o Demandado sido interpelado, pelos Demandantes, na qualidade de administradores, para pagar as anuidades respeitantes aos seus 3 lugares de garagem e referentes a 2017 e 2018, não o tendo feito, pelo que é o Demandado responsável pelo pagamento dos indicados valores de € 180,00 respeitantes a 2017 e de € 225,00 respeitantes a 2018, que se encontram em dívida.
Em face de todo o exposto, vai, assim, o Demandado condenado a pagar aos Demandantes o valor peticionado de € 405,00.
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DECISÃO
Face a quanto antecede, julgo procedente a presente acção e, em consequência, condeno o Demandado a pagar aos Demandantes o valor de € 405,00 (quatrocentos e cinco euros) peticionado nos presentes autos.
Nos termos do disposto nos artigos 8.º e 9.º da Portaria nº 1456/2001, de 28 de dezembro, condeno o Demandado no pagamento das custas totais do processo, no valor de € 70,00 (setenta euros), pelo que tendo procedido ao pagamento de taxa de justiça no valor de € 35,00 (trinta e cinco euros), deverá ainda o Demandado pagar o valor restante de € 35,00 (trinta e cinco euros) em falta, no prazo de três dias úteis, a contar do conhecimento desta sentença, sob pena do pagamento de uma sobretaxa de € 10,00 (dez euros) por cada dia de atraso (cfr. artigo 10.º da citada Portaria n.º 1456/2001), comprovando o pagamento no Julgado de Paz.
Devolva aos Demandantes o valor de € 35,00 (trinta e cinco euros).
Registe e remeta cópia da sentença, por correio postal registado, ao 1.º Demandante, atenta a falta de comparência na presente data e hora (17.30h), agendadas para leitura de sentença.

1) Na falta de indicação em contrário, os artigos do CPC que sejam referidos na presente sentença são aplicáveis ex vi artigo 63.º da Lei n.º 78/2001, de 13 de Julho.

Porto, 17 de Janeiro de 2019
A Juíza de Paz,

(Marta M. G. Mesquita Guimarães)

Processado por computador
(Artigo 18.º da Lei n.º 78/2001, de 13 de Julho)
Revisto pela signatária.
Julgado de Paz do Porto