Sentença de Julgado de Paz
Processo: 96/2016-JP
Relator: MARGARIDA SIMPLÍCIO
Descritores: INCUMPRIMENTO CONTRATUAL - CELEBRAÇÃO DE UM CONTRATO
QUE AS PARTES DESIGNARAM POR ACORDO DE PAGAMENTO
Data da sentença: 11/30/2016
Julgado de Paz de : FUNCHAL
Decisão Texto Integral:
SENTENÇA

Processo n.º 96/2016-J.P.

RELATÓRIO:

DEMANDANTE, A, pessoa coletiva sem fins lucrativos, NIPC. ---------, com se na rua --------------, no concelho do Funchal e representada por mandatário.

Requerimento Inicial: Alega em suma que no dia 29/01/2016 celebrou com os demandados um contrato particular de reconhecimento de divida, onde fixaram o pagamento da mesma, conforme documento que junta. Nos termos do mesmo declararam-se devedores solidários da demandante na quantia de 3.532,61€, o qual corresponde ao investimento feito no espaço comercial B -Escola de Música, sito na rua ---------, no período entre 1/11/2013 a 31/01/2016. Pelo contrato, os demandados comprometeram-se a pagar a divida mediante 10 prestações mensais e sucessiva no valor de 350€, devendo realizar-se a 1ª no dia 1/02/2016, porém nunca procederam a qualquer pagamento, faltando assim ao cumprimento da obrigação assumida, pelo que além do capital venceu-se os respetivos juros, á taxa legal, perfazendo os vencidos a quantia de 45,03€ a 29/01/2016. Acrescente-se que no referido contrato constava, ainda a cláusula de, em caso de incumprimento de 1 só prestação, implica o vencimento das restantes prestações, motivo pelo que requer a totalidade da quantia vencida. Para além do exposto, a demandante para reaver a quantia teve que contratar os serviços de mandatário, o que não seria necessário se tivessem honrado o acordo, para o efeito despendeu as custas do julgado de paz, a procuradoria, assim como os honorários, o que se cifra no valor de 1.000€. Conclui pedindo: A) que sejam solidariamente condenado no pagamento á demandada na quantia de 3.532,61, pelo incumprimento contratual; B) na quantia de 1.000€ de danos patrimoniais suportados pela demandante; C) nos juros de mora desde a citação até integral pagamento. Junta 1 documento.

MATÉRIA: Incumprimento contratual, enquadrado no art.º 9, n.º1, alínea I) da L.J.P.

OBJETO: Transação contratual, danos patrimoniais.

VALOR DA AÇÃO:4.532,61€.

DEMANDADOS, C, NIF ----------- e D, NIF: --------, residentes no ------------------, n.º24, no Funchal.

Contestação: Alegam que o referido acordo de pagamento está assinado apenas por um deles, e de acordo com a certidão permanente exigia-se a assinatura de ambos de forma a obrigar a empresa, pelo que não é valido. Acrescentam que foram coagidos a assinar o acordo, sob pena de não celebraram o contrato de Arrendamento para a firma E, Lda. Assim o acordo não poderá ser considerado como valido. No entanto, a demandante é devedora para com cada um eles, da quantia de 15.400€, devido a prestação de serviços realizadas por eles, no período entre Novembro/2013 a dezembro/2015, sem que tenham obtido qualquer recompensação. No ano de 2013, o demandado Bruno informou a demandante que encontrara um espaço para exercer o ensino de música, como a demandante não tinha disponibilidade financeira, foi ele que investiu dinheiro e material na empresa da demandante, e acordaram que logo que a empresa tivesse lucros, ele seria contratado e retribuído condignamente, contudo ainda hoje contínua sem ser recompensado. Em dezembro/2015 a associação foi alvo de uma fiscalização, da qual resultou o apuramento que havia irregularidades fiscais em termos de IVA, faltando as quantias provenientes das aulas, para evitarem continuar a participar numa irregularidade fiscal resolveram iniciar uma empresa, E, Lda., e ofereceram-lhe sociedade a qual recusou. Assim, exigem verificar as contas da demandante no período entre Novembro/2013 a dezembro/2015. Reclamam, também, a quantia de 20.000€ para o demandado D uma vez que investiu em equipamentos, instrumentos e obras, para a demandante, para que a escola de música pudesse laborar sob a gestão da associação, e com o intuito de mais tarde passar para a E, Lda., da qual este é sócio. Nesse período investiu e trabalhou sem receber qualquer contrapartida, inclusive pelas faturas que verifica-se o seu investimento, e todas foram pagas pelo demandado, embora estejam em nome da demandante. Ao lhe ser transmitida a gestão da escola, o contrato inicial que lhe foi apresentado não aceitaram, sendo elaborado alterações por advogado. Esclarecem que a demandante apenas assumiu o pagamento das rendas e caução inicial do espaço, e algum material, como é o caso de palhetas, cordas, baquetas e afinadores. Assim, consideraram de má-fé que em janeiro/2016 fossem confrontados com a situação que só lhes passariam a gestão da escola se pagassem a quantia ora reclamada. Quanto a esta, aceitam paga-la desde que houvesse um verdadeiro acerto de contas, sem referir que a gestão da escola, por vezes, esteve desamparada, devido a períodos de ausência da demandante. Quanto á gestão da demandante foi verificado que ocorreu um furto no valor de 7.000€ perpetuado por um funcionário, o qual só foi detetado cerca de 7 meses depois, o referido funcionário ao ser confrontado acabou por admitir mas com intenção de repor a caixa, mas até ao momento desconhecem se já repôs ou não. Ora essa quantia devia ser reposta para que a demandante possa ter lucros, algo que desconhecem se sucedeu, e consequentemente contratar o demandado Bruno, conforme prometera. Por fim, reclamam ainda o pagamento de 1.000€, pois o pai do demandado D investiu na demandante para efeitos de aquisição de material, como cortiça, para o isolamento de salas de música, e nunca lhe foi devolvido. Não obstante, o que expuseram declaram que prescindem do pedido reconvencional e valores referidos, se a demandante desistisse do seu pedido. Concluem pela procedência do pedido reconvencional na quantia de 58.400€.

Resposta da demandante: Alega que o pedido reconvencional não poderá proceder nos termos requeridos, pois além de ultrapassar os valores admissíveis nos Julgados de Paz. Para além disso, o que alegam é um conjunto de alarvidades, que serão tratadas em sede própria. Não obstante, esclarece que nunca foram assalariados, nem existe qualquer direito de crédito da parte deles, esclarecendo que o demandado C esteve nos últimos anos a receber subsídio de desemprego e o demandado D é funcionário da empresa Indutora, pelo que dificilmente se entende o que pedem. Acrescentando que a escola é um espaço de ocupação de tempos livres, não tendo qualquer professor contratado até 1/02/2016. Quanto á gestão do projecto de ocupação de tempos livres foi a B, lançada pela demandante em 2013 que até á sua transmissão para a sociedade E, Lda., o que sucedeu a 1/02/2016, da responsabilidade da demandante, ficando por via dessa transferência todos os bens na posse daquela empresa. De facto, os demandados comprometeram-se a pagar o valor do investimento realizado pela demandante no espaço GIG, no período entre 1/11/2013 a 31/01/2016, e não cumpriram, daí o ora reclamado na ação, de resto os demandados sempre estiveram de má fé nas negociações do acordo, pois nunca foi intenção deles pagarem o que quer que seja, devendo responder nos termos do art.º 227 do C.C., pelos danos que culposamente causaram. Quanto ao acordo não ser valido por falta de assinatura dos dois gerentes da E, Lda., esclarece que a ação não foi intentada contra aquela mas sim contra pessoas singulares e a título pessoal, o que consta do documento que ambos assinaram, aliás são eles que o admitem que o assinaram, pelo que esta exceção não tem sentido. Conclui pela procedência da ação com a condenação dos demandados, e pela inadmissibilidade da reconvenção.
Em relação ao pedido reconvencional, o Tribunal por despacho fundamentado, de fls. 38 a 40, pronunciou-se com base no art.º 48, n.º1 da L.J.P., indeferindo por não estar reunidos os pressupostos da compensação, sem prejuízo de o puderem reclamar noutra instância, por reclamarem créditos que não lhes pertence mas sim a quem não é parte da ação e por reclamarem um crédito que pertencerá á própria demandada, e a prestação de contas há uma ação própria para o efeito, não sendo esta a adequada a este pedido.

TRAMITAÇÃO:
Não se realizou sessão de pré-mediação por recusa expressa da demandante.
O Tribunal é competente em razão do território, do valor e da matéria.
As partes dispõem de personalidade e capacidade judiciária.
O processo está isento de nulidades que o invalidem na sua totalidade.

AUDIÊNCIA DE JULGAMENTO:
Foi iniciada dando cumprimento ao art.º 26, n.º1 da L.J.P., sem obter consenso das partes. Seguiu-se para produção de prova com audição de testemunhas e alegações, conforme ata, de fls. 45 a 47.

- FUNDAMENTAÇÃO-
I- FACTOS PROVADOS:
1)Que no dia 29/01/2016 as partes celebrem por escrito particular um contrato.
2)Nele os demandados reconheceram ser devedores solidários da demandante.
3)E, fixaram o valor da divida na quantia de 3.532,61€.
4)A qual era referente ao valor que a demandante tinha investido no projecto B - Escola de Música, sediada na rua do ---------, no período entre 1/11/2013 a 31/01/2016.
5) No contrato os demandados comprometeram-se a pagar a divida mediante 10 prestações, mensais e sucessivas na quantia de 350€, vencendo-se a 1ª no dia 1/02/2016 e as seguintes no dia 1 de cada mês.
6)Que os demandados não pagaram qualquer prestação.
7)Que o contrato prevê que em caso de não cumprimento de uma prestação implica o vencimento imediato das restantes.
8)Que as prestações seriam pagas por transferência bancária.
9)Que o contrato foi assinado pelos demandados a título pessoal.
10)Os demandados nunca foram assalariados da demandante.
11)O demandado C esteve e está desempregado.
12)E, o demandado D é funcionário de uma empresa e sócio da sociedade comercial E, Lda.
13)Até 1/02/2016 a B nunca teve qualquer professor contratado.
14)Nem a demandante.
15) Até 1/02/2016 a GIG foi gerida pela demandante.
16)Entretanto, a demandante transmitiu a gestão daquele projeto para a E, Lda.
17)Pela transmissão todos os bens existentes na B ficaram na posse da nova sociedade, E, Lda.
18)Pelo contrato os demandados comprometeram-se a reembolsar a demandante do valor que despendeu no projecto B, no período entre 1/11/2013 a 1/02/2016.
19)Que os autos foram patrocinados por mandatário constituído.
20)Que no contrato previa-se a possibilidade de ser cobrado as despesas suportadas pela demandante com a recuperação do crédito.

MOTIVAÇÃO:
O tribunal sustenta a prova com base nos documentos juntos aos autos, conjugados com a prova testemunhal produzida em audiência e declarações de parte dos demandados (art.º 57, n.º1 da L.J.P.).
A testemunha, F, é funcionária da demandante. Tendo conhecimento dos factos devido às funções que exerce. Não obstante, o seu depoimento foi claro e isento, auxiliando na prova dos factos com os n.º6, 8, 10, 11, 12, 13, 14, 15, 16, 17 e 18.
A testemunha, G, pertence á direção da associação demandante desde 2008. Tendo conhecimento dos factos pelas assembleias em que participa com regularidade. O seu depoimento foi claro e isento, auxiliando na prova dos factos com os n.º:4, 10, 11, 12, 13, 14, 15, 16, 17 e 18.
Os factos complementares de prova com os n.º 19 e 20 resultam do documentos junto de fls. 5 a 6.
Os factos não provados resultam da ausência de prova nesse sentido.

II - DO DIREITO:
Os autos prendem-se com a celebração de um contrato, que as partes designaram por acordo de pagamento, conforme documento 1 que juntaram.
Questões: validade do acordo negocial, consequências do incumprimento.
Para o efeito cumpre esclarecer que a demandante é uma associação sem fins lucrativos, mas que tem como objeto social apoio de pessoas e famílias no âmbito de doenças oncológicas, e tem atividades desportivas nas áreas educacionais, musicais, desportivas e artes.
E, foi no âmbito do seu objeto social que a demandante prestou apoio inicial aos demandados, para posteriormente se retirar, deixando o projecto desenvolver-se.
Na realidade, os demandados têm em comum o gosto pela música, e como costumavam frequentar a associação, prestando-lhe apoio, bem como aos seus associados, entenderam pedir apoio para desenvolverem um projecto na área musical, que designaram por B- Escola de Música.
Para o efeito, descobriram primeiramente um espaço físico, para instalarem a B - Escola Musical. No entanto, para que aquela pudesse “abrir portas” contou com o auxílio inicial da demandante. De facto, foi esta que inicialmente negociou e contratou o arrendamento do espaço, assumindo as despesas inerentes ao mesmo, tais como caução e rendas, pagamento de despesas com eletricidade e água, assim como outras ligadas ao projecto, inclusive a contabilidade inicial daquela.
Este apoio económico durou cerca de dois anos e meio. Porém, como em todos os apoios que concede, a determinada altura, quando verifica que o projecto já é viável, a demandante cessa o apoio.
Assim, a demandante ao pretender retirar-se da B, negoceia com os demandados, e foi assim que surgiu o documento junto como documento 1, de fls. 5 a 6.
E, após a celebração deste documento, a demandante transferiu a gestão daquele projecto, para outra entidade, a sociedade comercial E, Lda. sendo esta que passou a explorar e desenvolver o projecto musical.
No âmbito da liberdade contratual podem as partes celebrar os contratos que bem lhes aprouver, e nele inserir as cláusulas que melhor se coadunam com as suas pretensões, desde que lícitas (art.º 405 do C.C.).
Citando, o prof. Menezes Cordeiro, in Tratado de Dtº Civil, parte geral I, 2ª ed., pág. 217, “a autonomia privada reconduz-se a uma permissão de produção de efeitos jurídicos., correspondendo a um espaço de liberdade jurídica atribuída pelo direito às pessoas”.
No caso concreto, temos um documento escrito, e assinado pelas partes, trata-se pois de um documento de natureza particular (art.º 373 do C.C.)
Este traduz precisamente o acordo a que as partes chegaram, o qual foi objeto de negociações previas entre as partes.
Na realidade, o documento que se encontra junto aos autos não será o primeiro e único documento existente, no âmbito do processo de transferência da gestão da GIG para E, Lda.
Este surge depois dos demandados terem solicitado o pagamento do valor que acordaram em prestações, o que sucedeu após as partes terem verificado as faturas que foram pagas pela demandante. Na realidade, os demandantes não podiam pagar tudo de uma só vez, e a sociedade comercial E, Lda. estava a iniciar a sua “vida”, pelo que o valor encontrado para pagamento das prestações foram, assim, acordados por todos os intervenientes no acordo negocial. Algo que os demandados admitiram em audiência.
De facto, a demandante não os ameaçou com nada. Por outro lado, nem sequer estava em causa o eventual perigo de alguns funcionários poderem perder o respetivo emprego, pois na altura a B não tinha qualquer funcionário. Para além disso, foi provado que todos os que prestaram serviços para aquela, até ao período de transição, foram pagos pela demandante, como também resulta do documento exemplificativo -recibo electrónico- que juntaram em audiência, a fls. 48.
Quando os demandados pediram apoio económico para iniciarem o projecto musical tinham conhecimento que esse apoio não duraria eternamente, pois os demandados participavam da vida da associação e sabiam como aquela funcionava.
Dos contactos negociais que encetaram com a demandante, acordaram que, aquela sairia da gestão do referido projecto, e o mesmo seria continuado por uma entidade que eles indicassem. Aliás, foi por esse motivo que foi constituída a sociedade comercial E, Lda., e foi para esta que foi transferida a gestão da B, sendo um dos demandados, D, um dos sócios da mesma.
Ora, perante isto não se pode dizer que o documento foi assinado pelos demandados sob chantagem como alegam na contestação- art.º28-, o que em termos jurídicos equivale a coacção moral (art.º255 e 256 do C.C.).
Por outro lado, conheciam os termos em que a demandante aceitou apoiar o projecto, e reconhecem que alguns dos associados contribuíram em termos económicos para apoiar a B, pelo que nada disto consubstancia qualquer ameaça.
De facto, o que os demandados queriam era não ter de devolver qualquer quantia á demandante, mas não se pode dizer que isso constitui alguma ameaça. Na realidade, este documento acaba por constituir o exercício legítimo de um direito, reaver o que lhe pertence, já que ninguém é obrigado a ceder o seu património a terceiro, e se isso suceder é por livre vontade do titular do bem e não porque o outro assim entende que aquele deve proceder dessa forma.
Perante o exposto, concluo que o documento em causa é valido entre as partes que o subscreveram, não existindo qualquer vício da vontade que possa inquinar a validade do mesmo.

Este documento consubstancia o reconhecimento (assunção) de uma divida para com a demandante e a forma de liquidar a mesma, sendo um negócio valido e eficaz entre as partes.
Na realidade, para que o mesmo pudesse ser juridicamente válido, implicaria, primeiramente, que as partes tivessem acordado em todas as cláusulas que o compõe, e por fim que as partes entendessem, de forma voluntária, subscrever o documento em causa. E, conforme se referiu não existe motivo valido para suspeitar da legalidade do documento.
Quanto ao conteúdo do acordo, os demandados não o desconhecem, o que resulta das suas declarações (art.º 57 da L.J.P.).
Pela análise do documento verifica-se que os demandados assumiram ser devedores solidários (art.º 512 e 513, ambos do C.C.) isto é, que reconheceram ser responsáveis pelo pagamento da quantia aposta na cláusula 1 do documento, respondendo cada um deles pela prestação integral, estando em causa a quantia monetária de 3.532,61€.
Mais, foi claramente identificado o motivo da existência da divida, investimento feito pela demandante na B, e o período a que se reporta.
No entanto, no contrato consta ainda, na qualidade de devedor outro demandado, a sociedade comercial, E, Lda.
Porém, no caso concreto, a demandante não dirigiu o pedido em relação aquela sociedade, limitando-se a faze-lo somente em relação aos demandados.
Do regime da responsabilidade solidária deriva precisamente a faculdade concedida ao credor de poder exigir de qualquer um dos devedores a totalidade da divida (art.º 512 do C.C.), por sua vez o credor solidário pode defender-se pelos meios pessoais, como também pelos que são comuns a todos os codevedores (art.º 514 do C.C.), contudo não pode socorrer-se dos meios de defesa pessoal do outro codevedor.
Ora os demandados alegam, ainda, que este documento não é valido pois não contém a assinatura de um dos sócios que obriga legalmente a sociedade comercial, E, Lda.
Quanto a esta o Tribunal desconhece como é que aquela sociedade legalmente se obriga, pois os demandados não apresentaram provas nesse sentido (art.º 342, n.º2 do C.C.), nomeadamente o registo comercial da mencionada sociedade.
E, a referida sociedade comercial não é parte nestes autos, por isso a alegada exceção não pode proceder, já que a mesma só por ela poderia ser invocada.

Quanto ao modo de pagamento comprometeram-se a liquidar a divida mediante o pagamento mensal e sucessivo em dez prestações, na quantia unitária de 350€. Em relação a prazos foi estabelecido que se iniciava no dia 1/02/2016. Mais acordaram que o pagamento das prestações seria efetuado por transferência bancária.
Convencionaram, ainda, que a falta de pagamento de uma só prestação implicaria o vencimento imediato da divida (art.º 934, por força do art.º 936, n.º1, ambos do C.C.). Significa isto que, acordaram que o pagamento da divida fosse fraccionado em dez prestações, de montante igual, devendo cada uma das prestações ser paga na data acordada, o dia 1 de cada mês.
Mas caso assim não sucedesse, estipularam que o credor podia, de imediato, exigir a totalidade da divida, devido ao incumprimento. Neste caso, o não pagamento de uma só prestação equivaleria, não só á mora do devedor, mas também ao incumprimento definitivo do acordo, pelo que o credor, a ora demandante, podia requer judicialmente a totalidade do montante em divida.
Ora o contrato só se considera cumprido quando todas as cláusulas forem integralmente cumpridas (art.º 406, n.º1 e 762 do C.C.).

Porém, está provado que a prestação inicial não foi paga, nem no dia acordado, nem posteriormente, o mesmo sucedeu às seguintes prestações. Algo que a testemunha que efetua a contabilidade da demandante averigua mensalmente, e consegue atestar que não foi efetuado qualquer depósito creditório na conta da demandante.
Perante isto, não há duvida que a demandante podia exigir dos demandados a quantia integral no montante de 3. 532,61€ (art.º 519, n.º1 do C. C.).
E, que ocorreu o incumprimento do acordo a que se vincularam, como os demandados também admitem.
Trata-se de um incumprimento culposo (art.º 798 e 799, ambos do C.C.), pois os demandados não elidiram a presunção legal.
Perante o incumprimento, a demandante, necessitou de vir judicialmente reclamar o seu crédito (art.º 817 do C.C.).
Acerca do incumprimento, as partes convencionaram a possibilidade de ser cobrado juros, á taxa legal, bem como imputar ao credor as despesas que tenha de suportar para recuperação do crédito (cláusula 5 do contrato).
Na realidade os juros moratórios é a indemnização comum, aplicável subsidiariamente, às obrigações pecuniárias (art.º 806 do C.C.), como é o caso desta.
Tendo em consideração que se trata de um incumprimento culposo, é de aplicar ao caso em apreço, os juros moratórios, á taxa legal, deste a interpelação judicial, ou seja desde a citação, ocorrida a 22/04/2016, até integral pagamento da obrigação.
Para além disto, a demandante reclama, ainda, o pagamento da quantia de 1.000€ a título de danos patrimoniais, incluindo as custas de parte.
Decorre do disposto no art.º 529, n.º1 e 3 do C.P.C. que as custas processuais abrangem a taxa de justiça, os encargos e as custas de parte, considerando-se como encargos todas as despesas resultantes da condução do processo e requeridas pela parte contrária, o que será compensado ao requerente, na sequência da sentença condenatória, nos termos do Regulamento das Custas Processuais.
Ora nos Julgados de Paz, embora seja aplicado em termos subsidiários o C.P.C., não tem cabimento a referência ao Regulamento das Custas Processuais, pois as custas destes Tribunais são reguladas pela Portaria n.º 1456/2001 de 28/12, com as alterações constante da Portaria n.º 209/2005 de 24/02.
E, facilmente se percebe que o montante das custas, no montante global de 70€, não se compara com os montantes praticados nos Tribunais Judiciais.
Posto isto, nos Julgados de Paz não se pode atribuir as custas de parte, conforme prescreve o Regulamento das custas Processuais, no entanto nada obsta a que seja requerido o pagamento de despesas que a parte tenha suportado, assim como os honorários de mandatário constituído, os quais devem ser suportados por quem tenha ficado vencido na ação e se comprove o montante da quantia solicitada, enquanto dano material.
Assim, no caso em apreço os demandados contestaram os autos, dando assim causa á ação.
Por outro lado, verifica-se que a demandante constituiu mandatário, o qual patrocinou os autos, acompanhando todas as diligências processuais que se realizaram.
No entanto não se provou o montante concreto das despesas que a demandante suportou, como tal deve a mesmo ser liquidada em execução de sentença, até ao montante peticionado (art.º 609, n.º2 do C.P.C.).

DECISÃO:
Nos termos expostos julga-se a ação procedente, por provada, condenando-se os demandados no pagamento da quantia de 3.532,61€, acrescida dos juros, á taxa legal, até integral pagamento da obrigação, e ainda da quantia que vier a ser liquidada em execução de sentença referente a encargos efetivamente suportados pela demandante e honorários de mandatário constituído.

CUSTAS:
São da responsabilidade dos demandados, na quantia de 35€ (trinta e cinco euros) a efetuar no prazo de 3 dias, sob pena de lhes ser aplicado a sobretaxa diária na quantia de 10€ (dez euros).
Em relação á demandante proceda-se em conformidade com o art.º 9 da Portaria n.º 1456/2001 de 28/12.

Funchal, 30 de Novembro de 2016

A Juíza de Paz

(redigido pela signatária, art.º 131, n.º5 do C.P.C.)


(Margarida Simplício)