Sentença de Julgado de Paz
Processo: 87/2017-JPCNF
Relator: LUÍSA ALMEIDA SOARES
Descritores: UM CONTRATO COM REGRAS DE DOIS CONTRATOS ONEROSOS: COMPRA E VENDA DO MATERIAL FUNERÁRIO - E O DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS
Data da sentença: 05/15/2018
Julgado de Paz de : FUNCHAL
Decisão Texto Integral:

Processo n.º 87/2017-JP
SENTENÇA
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I. RELATÓRIO
A) IDENTIFICAÇÃO DAS PARTES
Demandante: A, LDA, sociedade por quotas com o NIPC ---------, com sede na Rua ---------, Funchal.

Demandado: B, portadora do cartão de cidadão n.º ----------, válido até 08.06.2020, com o NIF -------------, com residência conhecida na Travessa -------------------------, Funchal.
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B) PEDIDO
A Demandante propôs contra a Demandada a presente ação declarativa enquadrada na alínea i) do n.º 1 do artigo 9.º da Lei n.º 78/2001 de 13 de julho, peticionando a condenação desta no pagamento de €2.012,42 (dois mil e doze euros e quarenta e dois cêntimos), sendo €1.943,00 (mil novecentos e quarenta e três euros) a título de capital e 69,42€ (sessenta e nove euros e quarenta e dois cêntimos) a título de juros de mora já vencidos à data da propositura da presente ação, acrescidos de juros de mora vincendos até integral e completo pagamento.
Peticiona ainda a Demandante a condenação da Demandada em todas as custas de parte que terá de suportar para ser ressarcida dos valores em dívida.
Alegou para tanto os factos constantes do requerimento inicial, de fls. 2. a 5.
Juntou 5 (cinco) documentos.

A Demandada foi declarada ausente (fls. 35), tendo-lhe sido nomeada Defensora Oficiosa que, regularmente citada (fls. 39), não apresentou contestação escrita.

A questão em análise não foi submetida a mediação, por ter sido declarada a ausência da Demandada.
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II- SANEAMENTO
Estão reunidos os pressupostos da estabilidade da instância: o Julgado de Paz é competente em razão da matéria, do objeto, do território e do valor. O processo não enferma de nulidades que o invalidem na totalidade. As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas. Não há exceções, nulidades ou quaisquer questões prévias que cumpra conhecer.
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III- VALOR DA AÇÃO
Fixa-se em €2.012,42 (dois mil e doze euros e quarenta e dois cêntimos) o valor da presente causa (artigos 296.º, 297.º n.ºs 1 e 2, 299.º e 306.º do Código de Processo Civil ex vi artigo 63.º da Lei 78/2001 de 13 de julho, com a redação da Lei 54/2013 de 31 de julho).
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IV – OBJETO DO LITÍGIO
O objeto litígio entre as partes circunscreve-se ao (in)cumprimento pela Demandada das suas obrigações decorrentes do contrato celebrado com a Demandante.
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V – QUESTÕES A DECIDIR
Nos presentes autos importa apreciar do (in)cumprimento pela Demandada das suas obrigações decorrentes do contrato celebrado com a Demandante, nomeadamente o pagamento dos bens vendidos e dos serviços prestados e, na negativa, as consequências resultantes do mesmo.
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VI - FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
Com relevância para a decisão da causa, de acordo com a prova documental carreada para os autos, resultaram os seguintes factos:

FACTOS PROVADOS
1. A Demandante é uma sociedade comercial por quotas que se dedica à prestação de serviços na área funerária.
2. No desenvolvimento da sua atividade, a pedido da Demandada, a Demandante forneceu-lhe diversos bens e prestou-lhe serviços, constantes da fatura 6/186 emitida em 31.03.2016, com vencimento no dia 30.04.2016, no valor de €1.943,00 (mil novecentos e quarenta e três euros).
3. Os bens e serviços referidos em 2. foram entregues e prestados à Demandada.
4. A Demandante, através do seu Mandatário, em 08.02.2017 escreveu e enviou em 10.02.2017 uma carta à Demandada onde solicitava o pagamento da fatura referida em 2. acrescida de juros de mora, dando-lhe prazo de 10 dias para pagamento sob cominação de recurso aos meios judiciais.
5. A carta referida em 4. foi rececionada por C na morada da Demandada, em 13.02.2017.
6. Até à presente data a Demandada não liquidou o valor referido em 2.

FACTOS NÃO PROVADOS
7. A Demandante terá de suportar despesas para tentar ser ressarcida do valor não pago até à data pela Demandada.
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MOTIVAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
Para a convicção formada, conducente aos factos julgados provados em 1 a 6, concorreu o teor dos documentos juntos aos autos e a não prova de factos contrários pela Demandada.
O facto dado como não provado em 7., resulta da falta de prova pela Demandante nesse sentido, a quem competia (artigo 342.º do Código Civil).
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VII – ENQUADRAMENTO JURÍDICO LEGAL
Entre as partes foi celebrado um contrato com regras de dois contratos onerosos: o de compra e venda do material funerário, - sinalagmático e com eficácia real, - e o de prestação de serviços, designadamente a transladação de cadáver para o cemitério (cfr. artigos 408.º, 876.º e seguintes, 1207.º e seguintes, todos do Código Civil).
Trata-se de uma união de contratos, dependentes entre si, bilateralmente, porque assim foi a vontade das partes, mas em que nenhum deles perde a sua individualidade (cf. artigo 405.º, n.º 2 do Código Civil).
Desta união de contratos resultam efeitos obrigacionais recíprocos: para uma das partes, a entrega dos bens funerários (véu, urna, flores e outros) e o serviço de homens de transladação de cadáver para o cemitério e transporte em carro mortuário, e para a outra, a obrigação do pagamento (cf. artigos 879.º, 882.º, 1208.º e 1211.º do mesmo Código).
Nos termos do artigo 762.º do Código Civil, o devedor cumpre a obrigação quando realiza a prestação a que está vinculado e o contrato deverá ser pontualmente cumprido por ambos os contraentes (cf. artigo 406.º do mesmo diploma legal).
No caso em apreço, só a Demandante cumpriu, fornecendo os bens e executando os serviços descritos na fatura 6/186, em conformidade com o que foi convencionado, e que a Demandada não liquidou, nem alegou, nos termos do n.º 2 do artigo 342.º do Código Civil, qualquer facto impeditivo, modificativo ou extintivo do direito invocado pela Demandante à quantia em dívida.
Faltando culposamente ao cumprimento da obrigação o devedor torna-se responsável pelo prejuízo que causa ao credor, incumbindo-lhe o ónus de provar que a falta de cumprimento não procede de culpa sua (cf. artigos 798.º e 799.º do Código Civil), o que aqui não se verificou.
Se a obrigação tiver prazo certo e a prestação não for efetuada no tempo devido, por causa imputável ao devedor, fica este constituído em mora, tornando-se responsável pela reparação dos danos causados ao credor pela demora na prestação (artigos 804.º n.ºs 1 e 2 e 805.º, n.º 2 a) do Código Civil).
Tendo a obrigação natureza pecuniária, e nada tendo sido estipulado em contrário, tais danos corresponderão aos juros legais, contabilizados desde o dia da constituição em mora (artigo 806.º, n.º 1 do Código Civil).
Assente a existência de mora, torna-se necessário determinar o momento a partir do qual ela opera.
Dispõe o artigo 805.º, n.º 1, do Código Civil, que o devedor só fica constituído em mora depois de ter sido judicial ou extrajudicialmente interpelado para cumprir.
Porém, o n.º 2 do mesmo preceito, na sua alínea a), estabelece que, independentemente de interpelação há mora do devedor se a obrigação tiver prazo certo.
Assim, sobre a quantia em dívida são devidos juros moratórios, à taxa legal e contados desde o dia seguinte à data de vencimento da fatura (01.05.2016) até integral pagamento.
Pelo que, a Demandante tem direito ao pagamento do preço dos bens adquiridos e serviços prestados ao Demandado, que se mostra em falta, acrescido de juros vencidos e vincendos à taxa de juro legal contados desde o dia seguinte à data de vencimento da fatura (01.05.2016) até integral pagamento.
Atento o exposto, tendo a Demandante peticionado juros sobre o capital em dívida desde o dia seguinte à data de vencimento da fatura (01.05.2016) até efetivo e integral pagamento, pelas razões expostas, tem forçosamente tal pedido de proceder.
Assim, procedem os pedidos de condenação da Demandada no que respeita ao capital em dívida e juros de mora.
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Peticiona ainda a Demandante a condenação da Demandada em todas as custas de parte que terá de suportar para ser ressarcida dos valores em dívida.
Nos termos do disposto no artigo 63.º da Lei 78/2001, de 13 de julho, com a redação da Lei 54/2013 de 31 de julho, o Código de Processo Civil é aplicável subsidiariamente nos Julgados de Paz, não o sendo em tudo quanto se mostre incompatível entre os dois diplomas.
Os Julgados de Paz têm uma lei própria quanto a custas, a Portaria n.º 1456/2001, de 28 de dezembro, onde as custas correspondem a uma taxa fixa de 70,00€ por cada processo tramitado, não prevendo outro valor. E será nos termos da Portaria citada, que as custas serão fixadas na presente sentença, não tendo aplicação o Regulamento das Custas Processuais, nem o disposto nos artigos 529.º n.º 4 e 533.º do Código de Processo Civil, improcedendo nesta parte o pedido.

VIII– RESPONSABILIDADE POR CUSTAS:
As custas serão suportadas pela Demandada B, que se declara parte vencida, nos termos e para os efeitos dos n.ºs 8.º e 10.º da Portaria n.º 1456/2001, de 28-12 (o n.º 10 com a redação dada pelo artigo único da Portaria n.º 209/2005, de 24-02), com custas totais €70,00 (setenta euros) a seu cargo, sem prejuízo da isenção de que beneficia por ter sido declarada ausente (alínea l) do n.º 1 do artigo 4.º do Regulamento das Custas Judiciais e Deliberação n.º 5/2011, do Conselho dos Julgados de Paz, de 8 de fevereiro de 2011).
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Proceda à devolução de 35,00€ à Demandante A, Lda, NIPC -----------, nos termos do artigo 9.º da Portaria n.º 1456/2001, de 28/12.
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IX- DISPOSITIVO
Nos termos e com os fundamentos invocados, julgo a presente ação parcialmente procedente, e em consequência decido:
a) Condenar a Demandada B no pagamento à Demandante A, LDA da quantia de sendo €1.943,00 (mil novecentos e quarenta e três euros) a título de capital, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, desde 01.05.2016 à taxa legal até integral e efetivo pagamento.
b) Absolver a Demandada B do demais peticionado.
c) Condenar a Demandada B nas custas do processo, sem prejuízo da isenção de que beneficia.
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Cumpra o disposto no artigo 63.º da Lei 78/2001 de 13 de julho.

Registe.
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Funchal, 15 de maio de 2018

A Juíza de Paz


Luísa Almeida Soares
(Art.º 31 n.º 5 CPC/Art.º 18 LJP)