Sentença de Julgado de Paz
Processo: 70/2011-JP
Relator: IRIA PINTO
Descritores: RESPONSABILIDADE CIVIL - ACIDENTE DE VIAÇÃO
Data da sentença: 07/05/2011
Julgado de Paz de : TROFA
Decisão Texto Integral:
Sentença

Relatório
Os demandantes A, menor, representada pelos seus progenitores B e C, todos melhor identificados a fls. 4, intentaram contra os demandados D e E, melhor identificados a fls. 5 e 58, acção declarativa nos termos do artigo 9º, nº 1, alínea h) da Lei 78/2001 de 13 de Julho, formulando o seguinte pedido:
Serem os demandados condenados a pagar aos demandantes o valor de €4.946,96 a titulo de valor indemnizatório, a fim de compensar danos patrimoniais, físicos e morais causados aos demandantes.
Tendo, para tanto, alegado os factos constantes do requerimento inicial, de folhas 4 a 8 dos autos, que aqui se dá por integralmente reproduzido. Juntaram 13 (treze) documentos e em audiência de julgamento exibiram 4 (quatro) objectos alegadamente danificados, nomeadamente computador, calças, blusão e telemóvel (melhor identificados em acta de fls. 105 e 106 dos autos).
Regularmente citado, o demandado D não apresentou contestação, tendo comparecido em audiência de julgamento
Regularmente citada, a demandada E apresentou contestação, de folhas 51 a 57, que se dá por integralmente reproduzida, impugnando parcialmente os factos constantes do requerimento inicial e peticionando a absolvição da demandada do pedido no valor que exceda €365,00. Juntou 5 (cinco) documentos.
Cumpre apreciar e decidir
O Julgado de Paz é competente, as partes têm personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas e não se verificam quaisquer outras excepções ou nulidades de que cumpra conhecer.
Fundamentação da Matéria de Facto
Factos provados
Com interesse para a decisão da causa ficou provado que:
1 - No dia 29 de Novembro de 2010, pelas 19.45h, o Demandado D seguia, com o seu veículo VOLKSWAGEN matrícula OR, na Rua das Indústrias, na Trofa e embateu na Demandante A, quando esta atravessava uma passadeira aí localizada, tendo embatido na parte esquerda do seu corpo.
2 - O acidente deu-se quando a Demandante atravessava a Rua das Indústrias, na Trofa, na passadeira, tendo sido embatida pelo Demandado D no lado esquerdo, incidindo sobre a perna e pé.
3 - Nesse mesmo dia, a Demandante A teve que recorrer ao Serviço de Urgência do Centro Hospitalar do X.
4 - A deslocação a este Serviço de Urgência não só obrigou ao pagamento da taxa moderadora de €17,15, como também ao pagamento aos Bombeiros Voluntários da Trofa, pelo recurso ao serviço de ambulância no valor de €12,48.
5 - Como consequência do acidente provocado pelo Demandado D, a Demandante A ficou com os seguintes bens danificados, que transportava e vestia na altura do acidente:
a) um telemóvel, de marca sony, no valor comercial de €150,00;
b) um blusão no valor de €180,00;
c) umas calças de ganga no valor de €35,00.
Num total de €365,00.
6 - Resultado das sequelas referentes ao acidente provocado pelo Demandado D, a Demandada A foi obrigada a ser medicamentada com fármacos adequados para este tipo patologias, tendo gasto o valor de €17,33.
7 - Por indicação da Demandada E, a Demandante A, nos dias 24 e 26 de Janeiro de 2011, permaneceu no Hospital de X, sito no concelho do Porto, para efeitos de consultas e exames.
8 - Dessas consultas e exames resultou que a Demandante A foi declarada sem Incapacidade, pela Demandada E, com efeitos a partir de 24 de Janeiro de 2011.
9 - Assim, a Demandante A, conforme comprova a própria Demandada E, esteve incapacitada no período entre 29 de Novembro de 2010 e 24 de Janeiro de 2011, durante esse período esteve sujeita a vários tratamentos.
10 - Na sequência disto, a Demandante A recebeu comunicação da Demandada, em 11 de Fevereiro de 2011, da confirmação de alta sem desvalorização.
11 – Em 28 de Março de 2011, a Demandante A foi notificada pela Demandada E a informar da atribuição do valor indemnizatório de €8,65.
12 - No que concerne às deslocações ao Porto, os Demandantes gastaram um valor de €40,00, acrescidos de €10,00, perfazendo um valor global de €50,00 – adiantados pelos Demandantes progenitores - adstritos a portagens, visto que os episódios de consulta e exames aconteceram nos dias 24 e 26 de Janeiro de 2011.
13 - Os Demandantes consideram que a culpa exclusiva do sinistro se deveu à desatenção e imperícia do Demandado D, que assumiu a factualidade do sinistro.
14 - Houve, por parte dos Demandantes, uma intenção inequívoca em solucionar o problema, não tendo, porém, aceite o valor de €8,65 oferecido pela demandada para ressarcimento de todos os danos relativos ao sinistro.
15 – Conclui-se que os Demandantes, pelo sinistro causado pelo Demandado D, tiveram os seguintes danos patrimoniais:
1. Quanto a despesas de saúde: €17,15 e €17,33.
2. Quanto a deslocações: €12,48 e €50,00 de duas deslocações ao Porto.
3. Quanto a bens móveis: €150,00 de telemóvel Sony, €180,00 do blusão e €35,00 de calças de ganga.
16 - A título de danos patrimoniais, os Demandantes tiveram um dano global de € 461,95.
17 - Em consequência do acidente, a Demandante A teve dores físicas, ficou assustada, receosa em se deslocar para a escola e com medo de andar sozinha, bem como transtornada, durante um período superior a trinta dias, pelo que, além dos danos patrimoniais, deve ainda ser ressarcida pelos danos não patrimoniais de €1.000,00.
18 - Dão-se por integralmente reproduzidos os documentos de fls. 9 a 16, 18 a 25, 59 a 75 juntos aos autos.
A fixação da matéria dada como provada resultou da audição da parte demandante, dos factos admitidos e confessados, do depoimento da testemunha da demandada, o qual foi considerado isento e credível, por na qualidade de perito averiguador ter elaborado o relatório relativo ao sinistro dos autos, tendo ainda realçado que na data do relatório, 27/12/2010, “a demandante A ainda se encontrava queixosa”, a que acrescem os documentos acima referidos (ponto 18 de factos provados) juntos aos autos, o que devidamente conjugado com regras de normalidade, razoabilidade e experiência comum alicerçou a convicção do Tribunal.
Não se provaram quaisquer outros factos, com interesse para a decisão da causa, dada a inexistência ou insuficiência de prova nesse sentido. Relativamente a danos patrimoniais, os demandantes não lograram provar que o computador fizesse parte dos objectos danificados em consequência do sinistro, faltando suporte documental ou testemunhal, nem comprovaram que o valor comercial dos demais objectos danificados, fosse superior ao constante do relatório do perito averiguador da demandada. Relativamente a danos não patrimoniais, os mesmos só parcialmente procedem, por, em parte, não existir prova complementar bastante, testemunhal ou documental, que os suportem na totalidade.
O Direito
Os demandantes intentaram a presente acção, com base no instituto da responsabilidade civil emergente de acidente de viação, ocorrido em 29 de Novembro de 2010, que teve como intervenientes o veículo Volkswagen, com a matrícula OR, propriedade do 1º demandado D e o peão, ora demandante, A, tendo aquele transferido a responsabilidade civil pela circulação do mesmo para a 2ª demandada E, através da respectiva apólice nº x (a fls. 59 a 61).
Nessa medida, dado o atropelamento da 1ª demandada A, peticionam os demandantes a condenação dos demandados no pagamento da quantia total de €4.946,96, sendo €1.446,96 de danos patrimoniais e €3.500,00 de danos não patrimoniais.
Segundo o artigo 483º, nº 1 do Código Civil, que define o princípio geral em matéria de responsabilidade civil extracontratual, aquele que, por dolo ou mera culpa, violar ilicitamente disposição legal destinada a proteger interesses alheios, fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação culposa.
Ora, no domínio da responsabilidade civil extracontratual por actos ilícitos a regra é que a obrigação de indemnizar só existe, para além dos restantes pressupostos, quando haja culpa do agente, sendo excepcionais os casos em que dela se prescinde. Exige-se, para a imputação a título de culpa, a um tempo, uma relação de desconformidade entre a conduta devida e o comportamento observado, e a possibilidade de formulação de um juízo de censura na imputação do facto.
Prescreve o artigo 99.º do Código da Estrada que os peões devem transitar pelos passeios, pistas ou passagens a eles destinados ou, na sua falta, pelas bermas. Dispõe ainda o artigo 103º, nº 2 do mesmo código que ao aproximar-se de uma passagem para peões, o condutor deve reduzir a velocidade e, se necessário, parar para deixar passar os peões que já tenham iniciado a travessia da faixa de rodagem.
A demandada seguradora aceita que a responsabilidade do sinistro é exclusiva do condutor do veículo nela seguro, devido a conduta culposa do mesmo, por ter efectuado uma condução negligente e inconsiderada, desrespeitando os normativos estradais, nomeadamente os constantes dos artigos 3º, nº 2 e 24º, nº 1 do Código da Estrada e os acima descritos. Nessa medida, a demandada seguradora assumiu a responsabilidade pelo sinistro.
Estão agora em causa os valores dos danos decorrentes do sinistro, uma vez que a demandada só os aceita parcialmente, nomeadamente os danos patrimoniais até ao montante de €365,00.
Ora, da prova produzida resulta que os danos patrimoniais sofridos em consequência do atropelamento dos autos, são um telemóvel Sony no valor de €150,00, um blusão no valor de €180,00 e umas calças de ganga no montante de €35,00, que a 1ª demandante usava na altura do acidente, além das despesas de saúde de €17.15 e de €17,33, a que acresce o valor de deslocações com ambulância de €12,48 e de consultas no valor de €50,00, que os demandantes tiveram que suportar e que a demandada aceita, não tendo os demandantes comprovado que o valor comercial dos objectos danificados, fosse superior ao constante do relatório do perito averiguador da demandada. Ainda, por outro lado, os demandantes não lograram provar que o computador, cujo valor peticionaram, fizesse parte dos objectos danificados em consequência do sinistro, faltando o respectivo suporte documental ou testemunhal. Pelo que, somam os danos patrimoniais o valor total de €461,95, dos quais os demandantes deverão ser ressarcidos.
Relativamente aos danos não patrimoniais, os demandantes peticionam o montante de €3.500,00, não aceitando a demandada indemnização a esse título. Ora, não obstante serem tais danos não patrimoniais de difícil quantificação, face à prova constante dos autos, aceita-se que a demandante A sofresse dores físicas, além de receios e transtornos em virtude da ocorrência do atropelamento de que foi vitima, atendendo ainda ao facto de ser menor e às circunstâncias que rodearam o atropelamento.
Assim sendo, considera-se haver lugar a indemnização por danos não patrimoniais por serem merecedores de tutela jurídica nos termos do disposto no artigo 496º, nº 1 do Código Civil, dado que se estenderam por período superior a 30 dias (conforme peticionado), resultando queixas ao nível de dores de cabeça e em várias partes do corpo, como consta do relatório junto pela demandada (fls. 72, 73), o que obrigou a tratamentos, além de constar ainda do mesmo relatório um “exame de avaliação de dano corporal”, cujas sequelas são “traumatismo de joelho direito e craniano”, com “data da alta” de “31/01/2011”, onde consta uma “incapacidade temporária absoluta de 1 dia” e um “quantum doloris” de “2”, em 7 pontos (fls. 75). Pelo que, considerando juízos de razoabilidade e adequação, tem-se como justo atribuir o valor global de €1.000,00 a titulo de indemnização por danos não patrimoniais, sendo €500,00 para compensação de dores físicas suportadas pela 1ª demandante em consequência do atropelamento e €500,00 relativo a compensação pelos medos, receios, apreensões e transtornos sofridos em consequência do atropelamento de que a demandante A foi vitima. Relativamente a estes danos não patrimoniais, não obstante o peticionado, os mesmos só poderão parcialmente proceder, por, em parte, não existir prova complementar bastante, testemunhal ou documental, que os suportem na totalidade. Devem assim os demandantes ser ressarcidos a título de danos não patrimoniais no valor global de €1.000,00.
Tendo o 1º demandado D transferido a respectiva responsabilidade civil através da competente apólice para a 2ª E, relativamente a danos decorrentes do sinistro dos autos, deve a demandada E assumir o pagamento dos danos daí decorrentes.
Pelo que, é da responsabilidade da 2ª demandada, E, o pagamento aos demandantes dos valores de indemnização relativos a danos patrimoniais de €461,95 e de danos não patrimoniais de €1.000,00, num total de €1.461,95.
Decisão
Em face do exposto, julgo a presente acção parcialmente procedente, por parcialmente provada, e, consequentemente, condeno a demandada E, a pagar aos demandantes o valor global de €1.461,95 (mil quatrocentos e sessenta e um euros e noventa e cinco cêntimos), sendo €461,95 de danos patrimoniais e €1.000,00 de danos não patrimoniais, indo no mais absolvida e, ainda, absolvendo o demandado D do pedido.
Custas
Nos termos da Portaria nº 1456/2001, de 28 de Dezembro, condeno os demandantes e demandada no pagamento das custas totais do processo no valor de €70,00 (setenta euros), sendo da responsabilidade dos demandantes o pagamento total de €49,00 (quarenta e nove euros) face ao decaimento e da responsabilidade da demandada o pagamento de €21,00 (vinte e um euros). Pelo que, tendo pago de taxa de justiça €35,00, (trinta e cinco euros) devem os demandantes proceder ao pagamento dos restantes €14,00 (catorze euros), no Julgado de Paz, no prazo de três dias úteis, a contar da notificação desta sentença, sob pena do pagamento de uma sobretaxa diária de €10,00 (dez euros) por cada dia atraso.
Devolva-se à demandada E o valor de €14,00 (catorze euros).
A sentença (processada em computador, revista e impressa pela signatária - artº 18º da Lei nº 78/2001, de 13 de Julho) foi proferida nos termos do artigo 60º, da Lei nº 78/2001, de 13 de Julho.
Notifique e Registe.
Julgado de Paz da Trofa, em 5 de Julho de 2011
A Juíza de Paz
(Iria Pinto)