Sentença de Julgado de Paz
Processo: 73/2018-JPCSC
Relator: SÓNIA PINHEIRO
Descritores: AÇÃO DE CONDENAÇÃO
Data da sentença: 12/20/2018
Julgado de Paz de : CASCAIS
Decisão Texto Integral: I. Identificação das partes
Demandante: A., NIF 232895791, residente na Rua ..., Conceição da Abóboda, São Domingos de Rana, Cascais.
Demandada: B., Lda, NIPC ......, com sede na Estrada, Alfragide, Amadora.

II. Objecto do litígio
O Demandante veio propor contra a Demandada a presente acção declarativa, enquadrada na al. i) do n.º 1 do art.º 9º da Lei n.º 78/2001, de 13 de Julho, com as alterações introduzidas pela Lei n.º 54/2013, de 31 de Julho (doravante LJP) pedindo a condenação daquela no pagamento da quantia de € 6.532,76 (seis mil quinhentos e trinta e dois euros e setenta e seis cêntimos), acrescida de juros de mora contados desde a data da propositura da acção e até efectivo e integral pagamento.
Alegou, para tanto e em síntese, que solicitou à Demandada um orçamento de empreitada de obra com vista a efectuar obras de conservação e beneficiação da fracção . .. andar, do prédio sito na Rua...., Conceição da Abóboda, o qual lhe foi facultado em 03.07.2016 e rectificado em 03.08.2016. Que a Demandada iniciou a obra em Julho de 2016, sendo que não houve qualquer adjudicação formal do orçamento e menção quanto à data para termino da obra. Que o Demandante pagou inicialmente a quantia de € 400,00. Que o representante legal se comprometeu a finalizar a obra no final de Agosto de 2016. Que após a realização de desmontagem dos móveis da cozinha superiores, remoção e montagem de novos tetos falsos nos WC´s, hall, corredor e cozinha foi solicitado o pagamento de € 400,00, que foi efectuado. Que no inicio de Agosto de 2016 foi informado que não havia possibilidade de reparação do chão flutuante no valor de € 260,00. Foi apresentado nova proposta de orçamento que implica um custo de remoção e montagem do chão flutuante e rodapés no total de € 838,00, que seria pago após finalização do trabalho, em duas tranches, a primeira de € 300,00, que serviria para fundo de maneio destinado ao chão flutuante e rodapés e € 200,00, o que foi pago. Após a remoção do chão flutuante e assentamento do mesmo, por vários dias consecutivos houve falta de comparência na obra. Essa ausência impossibilitou a finalização da obra e incumprimento do prazo para o fim dos trabalhos. Perante a ausência, porque queria ver a situação resolvida com a maior brevidade possível, já que tinha a sua casa em obras, o que causava transtornos na sua rotina e bem-estar, tentou por diversas formas (SMS e chamadas telefónicas) entrar em contacto com o representante da Demandada, C., mas sem resposta cabal. A ausência de resposta era camuflada com desculpas de falta de pessoal, motivos de saúde, outras obras, desculpas estas inaceitáveis e alheias ao Demandante. Esta situação perdurou até Dezembro de 2016. Após troca de mensagens com D., representante da Demandada, e face à urgência de finalização da obra, o Demandante foi informado que aquela iria intervir de forma a colmatar os pendentes relativos à obra, informando, no entanto que teria de “existir um equilíbrio” entre pagamentos e execução de trabalhos. Em 26.01.2017 o Demandante alertou a Demandada que da parte dele nunca tinha existido qualquer falta de compromisso relativamente a esse pagamento. No dia 27.01.2017 o Demandante recepcionou um e-mail com os valores a aferir, dos quais o Demandante reclamou. Nesta reclamação o Demandante reiterou que seria necessário a realização dos trabalhos com a máxima brevidade possível, uma vez que estavam a assumir um encargo com outro imóvel para habitação. No dia 01.02.2017 o Demandante enviou e-mail com mapa de folha de calculo anexo, com todas as tarefas orçamentadas e com as verbas já disponibilizadas à Demandada, que esta recebeu e que respondeu referindo faltar a indicação do IVA à taxa de 23%. No dia 09.02.2017 o Demandante enviou e-mail explicando que o IVA era de 6% e não 23%, facultando a lista I – artº 227º do CIVA e folha de cálculo com IVA à taxa de 6%. No e-mail foi sugerido encontro de contas. Dado que foi indicado que a obra estaria a 70% concluída, correspondente a €2.217,60, e €133,06 ao IVA a 6%, foi proposto o pagamento do acerto até aos 70% da obra no valor de €1.151,66 até à próxima sexta-feira. Também foi solicitado novo contrato de empreitada, com as alíneas do orçamento total efectuado, as condições de pagamento e data prevista para a conclusão da ordem de trabalhos. Nesta data a Demandada solicitou ao Demandante que as latas de tinta e fitas de isolamento estivessem no local da obra, material que foi comprado e disponibilizado pelo Demandante. Em 10.02.2017 foi recepcionado e-mail confirmando que a taxa era de 6% tendo sido propostas as seguintes condições de pagamento: a) transferência dia 10.02.2017 de €1.501,66 correspondente a 70% da obra; b) pagamento de €503,71 no dia 20.02.2017; c) pagamento do restante €503,71 no final da obra. Nesse dia foi ainda solicitado pela Demandada a regularização de um orçamento destinado ao Condomínio do prédio. O Demandante informou já não ser administrador do Condomínio mas que tinha informado a actual administração para ser efectuado o pagamento com a maior brevidade possível. A 10.02.2017 foi recepcionado novo e-mail de forma a acordar as condições propostas e a data prevista para finalização da obra. O Demandante enviou à Demandada e-mail a concordar com as condições propostas de forma a concluir a empreitada da obra, efectuando um pagamento de €1.151,66 relativos a 70% da obra. A Demandada insistiu pelo pagamento da obra pelo Condomínio, o que o Demandado em 02.03.2017 esclareceu que não tinha acesso à conta bancária. Surpreendentemente e de má-fé, no mesmo dia, a Demandada enviou e-mail dizendo que o seguimento da obra do Demandante estava dependente do pagamento do condomínio. Em 14.03.2017 foi recepcionado novo e-mail informando que as obras estariam suspensas no imóvel da Demandante até à resolução da situação com a Administração do Condomínio. No dia 31.03.2017 após a Administração do Condomínio ter efectuado o pagamento, enviou e-mail a disponibilizar o comprovativo do pagamento da Administração realizado em 16.03.2017, tendo solicitado informação sobre a datas para serem retomadas as obras no seu imóvel. A Demandada não deu qualquer resposta. No dia 05.04.2017 foi enviado novo e-mail à Demandada a solicitar uma resposta às tentativas de contacto. No dia 10.04.2017 foi enviado novo e-mail à Demandada de forma a ser facultada a data da conclusão da obra e tarefas não realizadas, nomeadamente montagem dos rodapés, acertos de chão por folga nas extremidades, pinturas e acabamentos de paredes e tectos, montagem de sanitários e móveis de cozinha já que a obra tinha sido suspensa em 02.03.2017 por alegada mora de pagamento de montante que não lhe dizia respeito. Por carta registada datada de 17.04.2017 comunicou à Demandada que queria cancelar o contrato devido a tarefas não concluídas e mal executadas, incumprimento de datas para conclusão de obras. Foi solicitada a devolução de 118,00 remanescente do fundo de maneio para aquisição de materiais (chão e rodapés) e sugerido data para levantamento de todos os materiais deixados em obra e devolução de chave de acesso ao imóvel. O Demandante viu-se obrigado a substituir o canhão da porta da entrada da habitação para salvaguarda dos seus pertences e privacidade. Em início de Maio de 2017 foi solicitado a E. que efectuasse vistoria ao imóvel e elaborasse um relatório técnico detalhado das tarefas não executadas e anomalias visíveis no imóvel. O Demandante viu-se obrigado a solicitar orçamento à empresa de construção civil F., para colmatar os problemas existentes deixados, que fez a obra e foi paga. Foi necessário substituir as loiças do WC social removidas pela Demandada porque estavam picadas por trabalhos efectuados de corte das cantoneiras para fixação do pladur. Os danos e prejuízos são visíveis. A conduta da Demandada provocou diversos prejuízos e despesas ao Demandante que, no total, ascendem a €6.532,76. A Demandada deve ao Demandante a quantia de € 6.532,76, a título de incumprimento do contrato de empreitada e prejuízos causados pela realização defeituosa das obras, causando danos que tiveram de ser reparados por outra empresa, custos que não existiriam se a Demandada não tivesse agido negligentemente e de má-fé. Junta 46 documentos.
Válida e regularmente citada a Demandada não contestou.
Foi realizada mediação, sem que as partes chegassem a acordo.
Foi agendada audiência de julgamento, à qual a Demandada faltou, mas justificou a sua falta. Designou-se nova data para a realização da audiência de julgamento, que decorreu com obediência às formalidades legais como da Acta se infere, tendo sido juntos pelo Demandante cópias perceptíveis das facturas de flªs 86/89.
Fixo à acção o valor de €6.532,76 (seis mil quinhentos e trinta e dois euros e setenta e seis cêntimos) - cfr. artºs 306º nº 1, 297º nºs 1 e 2, 299º nº 1, todos do CPC, ex vi artº 63º da LJP.
O Tribunal é competente (artigo 7º da LJP).
As partes são dotadas de personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas.
Não se verificam excepções, nulidades ou incidentes processuais que impeçam o conhecimento do mérito da causa.
Cumpre apreciar e decidir.

III. Fundamentação fáctica
Com interesse para a decisão da causa, ficou provado que:
1. O Demandante e Demandada ajustaram em esta proceder a obras de reparação e beneficiação da fracção .., correspondente ao andar ..., do prédio sito na Rua, Conceição da Abóboda, habitação do Demandante.
2. Para o efeito, em 03.07.2016, a Demandada, que se dedica à construção civil, deu orçamento ao Demandante para reparação e pintura da sala, dois quartos, hall com corredor e cozinha do apartamento, com materiais fornecidos pelo Demandante, no valor de €850,00, acrescido de IVA.
3. Porque não contemplava toda a obra a realizar, em 03.08.2016, a Demandada emitiu novo orçamento, no valor de €3.087,30 (€ 2.510,00, acrescido de IVA de 23%), com fornecimento de materiais pelo Demandante, que este aceitou, e que compreendia a realização dos seguintes trabalhos:
- pintura como referido no item 2;
- remoção de sancas, reparar com massas e estucar a massa de acabamento;
- montagem de sancas 118 metros;
- desmontagem dos móveis da cozinha superiores para montagem de novo teto falso;
- montagem de novos tetos falsos no WCs, Hall, corredor, cozinha com sancas de 60cm;
- montagem de sanitários e um dos móveis do Wc comum;
- reparação dos rodapés;
- montagem de cerâmica até nova altura da sanca montagem dos tetos falsos no WCs;
- ligação do lava-loiça;
- reparação das paredes de entrada do WC da Suite; e
- reparação do chão flutuante”.
4. A Demandada iniciou a obra em Julho de 2016, com data previsível do seu término no final do mês seguinte.
5. Inicialmente, o Demandante pagou a quantia de €400,00;
6. Após a realização da desmontagem dos móveis da cozinha superiores, remoção e montagem de novos tetos falsos nos WC´s, hall, corredor e cozinha, o Demandante pagou a quantia de € 400,00.
7. No início de Agosto de 2016 o Demandante foi informado que não havia possibilidade de reparação do chão flutuante.
8. Foi apresentado novo orçamento pela Demandada para remoção e montagem do chão flutuante e rodapés, no total de €838,00, que o Demandante aceitou.
9. O Demandante entregou €300,00 à Demandada para compra de materiais necessários (no que se incluía piso e rodapés), e pagou a €200,00 por conta do orçamento.
10. Em materiais, a Demandada despendeu a quantia de €182,00, sendo a quantia de €115,00 em pavimento.
11. Após a remoção do chão flutuante e reassentamento do mesmo em Agosto de 2016, a Demandada nunca mais compareceu na obra.
12. O Demandante efectuou diversas tentativas de contacto, via SMS e chamadas telefónicas, com o representante da Demandada, C., mas sem resposta cabal, até Dezembro de 2016.
13. Em troca de mensagens, agora com D., representante da Demandada, em que o Demandante invocou urgência na finalização da obra, aquela informou-o que havia pagamentos pendentes.
14. Em 26.01.2017 o Demandante informou D. que tinha efectuado os pagamentos ajustados, e reiterou que era necessário a realização dos trabalhos com a máxima brevidade possível, uma vez que estava a assumir o pagamento de renda com outro imóvel para habitação.
15. No dia 27.01.2017, o Demandante recepcionou e-mail da Demandada com os valores a aferir referentes à obra.
16. Em 27.01.2017, o Demandante reiterou junto da Demandada a urgência na finalização da obra, dado estar a pagar renda de €300,00 de outro imóvel onde habitava.
17. Em 01.02.2017, o Demandante enviou e-mail à Demandada onde rectifica os valores em débito, sendo de €1.969,00 (sem IVA), e propôs o pagamento de 70% do valor, €1.018,60, para finalização dos trabalhos, e de €950,40 no final dos trabalhos, anexando mapa de folha de calculo, com as tarefas orçamentadas e valores pagos.
18. Em resposta, a Demandada envia e-mail ao Demandante referindo faltar a indicação do IVA.
19. No dia 09.02.2017, o Demandante enviou e-mail explicando que o IVA era de 6% e não 23%, sugerindo o pagamento de 70% do valor total (€2.350,66) da obra, €1,151,66 (com IVA) até sexta-feira seguinte, e o restante na data da conclusão da obra, e solicitou a elaboração de novo contrato de empreitada, com as alíneas do orçamento total efectuado, as condições de pagamento e data prevista para a conclusão da obra.
20. Em e-mail dirigido ao Demandante, a Demandada solicitou-lhe que as latas de tinta e fitas de isolamento estivessem no local da obra, material esse que foi comprado e disponibilizado pelo Demandante no local da obra.
21. Em 10.02.2017, o Demandante recepcionou e-mail da Demandada, onde esta confirma que a taxa de IVA aplicável de 6%, e propõe as seguintes condições de pagamento para na segunda-feira seguinte dar continuidade à obra: a) transferência nesse dia 10.02.2017 de €1.151,66, correspondente a 70% da obra; b) pagamento de €503,71 no dia 20.02.2017; c) pagamento dos restantes €503,71 no final da obra, sendo que para tal indicou o NIB da empresa.
22. Em 10.02.2017, o Demandante enviou e-mail à Demandada a aceitar a proposta, apontando para finalização a obra o dia 28.02.2017, conforme indicação da Demandada em e-mail datado desse dia.
23. Em 10.02.2017, foi efectuada transferência bancária de €1.151,66 para conta da Demandada, como ajustado.
24. Em 20.02.2017, o Demandado procedeu ao pagamento da quantia de €503,71, como ajustado.
25. Não obstante, no dia 10.02.2017 foi solicitado pela Demandada o pagamento do valor de uma factura emitida à Administração do Condomínio do prédio, referente a obra por si realizada.
26. Em resposta desse mesmo dia, o Demandante informou a Demandada que já não era Administrador do Condomínio do prédio, e que tal situação lhe era alheia.
27. A Demandada insistiu pelo pagamento do valor da referida factura, tendo em 02.03.2017 enviado e-mail ao Demandante onde menciona que o seguimento da obra do Demandante estava dependente da resolução dessa situação.
28. Em 14.03.2017, a Demandada envia novo e-mail referindo que a obra do Demandante encontra-se suspensa até resolução dessa situação.
29. No dia 31.03.2017 o Demandante enviou e-mail, anexando o comprovativo do pagamento da Administração realizado em 16.03.2017, e solicitou a indicação de data para conclusão da obra.
30. A Demandada não deu qualquer resposta ao Demandante.
31. Em 03.04.2017 e 05.04.2017, foi solicitado pelo Demandante à Demandada, via e-mail, resposta urgente ao e-mail referido no item 29.
32. Sem que obtivesse qualquer resposta, no dia 10.04.2017, foi enviado novo e-mail à Demandada a solicitar a indicação da data da conclusão da obra, aí se mencionando as tarefas não realizadas - montagem dos rodapés, acertos de chão por folga nas extremidades, pinturas e acabamentos de paredes e tectos, montagem de sanitários e móveis de cozinha.
33. Para além do referido no item anterior, a obra realizada pela Demandada apresentava as seguintes anomalias e trabalhos por realizar:
“Os acabamentos do pladur da cozinha encontram-se defeituosos, não apresentando superfícies lisas.
Não foram efectuados os orifícios para colocação dos spotes de luz no pladur do hall, corredor e casa de banho.
Visto o chão flutuante estar a expandir, falta efectuar o corte do mesmo nas extremidades de forma a não elevar futuramente.
Os rodapés não foram montados.
Várias paredes e tetos do imóvel apresentam deficiência a nível de pintura e nos acabamentos efectuados quanto à aplicação e lixamento de massas de acabamento aplicadas.
Os móveis superiores da cozinha não foram montados.
Ligação do lava-loiça não efectuada”.
O que foi comunicado à Demandante por carta registada com AR, datada de 17.04.2017, que veio devolvida, juntamente com a declaração de que o contrato celebrado entre as partes era dado como terminado.
34. Nessa missiva, mais foi solicitada à Demandada a devolução de €118,00 do remanescente do fundo de maneio para aquisição de materiais (entre os quais chão e rodapés), e a devolução da chave de acesso à habitação que lhe havia sido entregue.
35. A Demandada não restituiu a chave da habitação ao Demandante.
36. Por via do referido no item anterior, o Demandante substituiu o canhão da porta da entrada da habitação, onde despendeu a quantia de €165,00.
37. Em Maio de 2017, foi efectuada visita de inspecção à fracção e elaborado relatório técnico, que comporta as seguintes tarefas não executadas e anomalias visionadas, de que padecia a obra realizada pela Demandada:
- “1. Gesso laminado na cozinha – Patologia 1 – O acabamento deste material aplicado apresenta irregularidades, quer no remate com a parede vertical (fotos 1 e 2), quer na superfície horizontal da sanca do teto, na junção entre placas e deficiente barramento”
- “2. Pavimento flutuante – Patologia 2 – O pavimento flutuante apresenta vários defeitos de aplicação; falta de material junto ao topo inferior da guarnição de porta (foto 4); “excesso” de material junto às paredes e soleiras em vãos, o que não permite a dilatação devida e oscilações de temperatura e implica no levantamento do pavimento (fotos 5 e 6); e ainda deficiência de nivelamento entre peças, nomeadamente nos topos”
- “3. Falta de colocação de rodapés – Patologia 3 – Os rodapés em madeira, sobre o pavimento flutuante, não foram aplicados”
- “4. Deficiente reparação e pintura de paredes e tetos – Patologia 4 – Existem inúmeras deficiências no tratamento e acabamento das paredes e tetos, começando pela reparação/barramento e culminando com a pintura”
- 5. Móveis de cozinha – Dano 5 – Os móveis superiores da cozinha não foram montados”
- 6. Loiças sanitárias – Dano 6 – As loiças sanitárias também não foram montadas nas I.S.”.
38. A pedido do Demandante, a empresa F. , Lda, elaborou orçamento e relatório para reparação e conclusão da obra.
39. A pedido do Demandante, a empresa F., Lda, procedeu à reparação das patologias e conclusão dos trabalhos mencionados nos itens 32, 33 e 37, que consistiu no seguinte:
- reparação e pintura de tectos e paredes, com materiais fornecidos pelo Demandante identificados no item seguinte, pelo valor de €1.431,00, para o que foi emitida a factura nº 85;
- montagem de rodapé, pavimento, loiças sanitárias, móveis de cozinha, válvulas lava loiças e desmontagem de pavimento, no valor de €1.079,08, para o que foi emitida a factura nº 92 (parte);
- marcação e abertura de buracos para colocação de plafons de tecto, pelo valor de € 15,90, para o que foi emitida a factura nº 93 (parte);
- fornecimento de pavimento flutuante, pelo valor de €858,84, para o que foi emitida a factura nº 84;
no total de € 3.384,82, que lhe foi pago.
40. Para a pintura dos tectos e paredes referidos no item anterior, o Demandante adquiriu os seguintes materiais, que foram utilizados nos trabalhos:
- Em 06.06.2017, tinta vinyl matt branco, pelo valor de €86,09;
- Em 06.06.2017 e 13.06.2017, tinta esmalte cinacryl mate, pelo valor de €36,84 e €15,62, respectivamente;
- Em 24.08.2017, tinta vinyl matt branco, esmalte cinacryl mate e fita, pelo valor de €124,98.
41. A pedido da Demandada, o Demandante adquiriu e disponibilizou na obra os seguintes materiais:
- Em 29.02.2017, tintas vinyl matt branco e primário cinolite, pelo valor de €183,21;
- Em 17.02.2017, tinta vinyl matt branco, pelo valor de €92,25;
- Em 14.02.2017, cartão canelado e fita pintor, pelo valor de €5,18.
42. O Demandante comprou loiças para WC, onde despendeu o valor de €315,48.
43. A não conclusão das obras causou ao Demandante transtornos na sua rotina e bem-estar, bem como o pagamento de renda de €300,00 mensais em apartamento para sua habitação.

Com interesse para a apreciação da causa nada mais ficou provado, considerando-se não provados todos os factos alegados e que sejam de sentido contrário aos provados.
Nomeadamente não ficou provado que:
a) A ausência de resposta pela Demandada era camuflada com desculpas de falta de pessoal, motivos de saúde, outras obras;
b) Para pintura das paredes e tectos pela empresa F. , em 27.11.2017, o Demandante despendeu em primário cinolite o valor de € 7,16 – doc. 46, flªs 102 - Em 15.09.2017;
c) Para aplicação nos trabalhos, o Demandante despendeu em fita precisão, o valor de € 11,50;
d) Para reparação das anomalias e finalização dos trabalhos referidos nos itens 32 e 33 dos factos provados, foi necessário proceder ao isolamento de janelas e montagem de poleias de estores, no valor de € 147,34 (factura nº 92, parte), e à montagem de exaustor e abertura de buraco para esquentador, à desmontagem e montagem de pavimento flutuante (14m2), no valor de € 136,74 (factura 93, parte);
e) A Demandada, com o corte das cantoneiras metálicas para fixação do pladur, picou as loiças do WC.

Motivação da matéria de facto provada e não provada:
O Tribunal formou a sua convicção com base no conjunto da prova produzida, cotejada com as regras da experiência, tendo considerado os elementos documentais juntos pelo Demandante a seguir discriminados, que aqui se dão por reproduzidos e integrados, conjugados com as declarações das partes e com o depoimento sério e credível das testemunhas inquiridas em sede de audiência de julgamento.
Mais foram tidos em conta, nos termos das alíneas a) e b) do nº 2 do artigo 5º do Código de Processo Civil, factos instrumentais e factos que complementam ou concretizam os que o Demandante alegou e resultaram da instrução e discussão da causa.
Assim considerou o Tribunal o teor dos documentos juntos pelo Demandante de flªs 10 (primeiro orçamento da Demandada, para prova dos itens 1 e 2); flªs 11 e 12 (orçamento rectificativo, para prova dos itens 1 a 3), flªs 13 a 21 (SMS trocadas entre o Demandante e representante da Demandada, G., e tentativas de contacto, para prova do item 12); flªs 22 a 28 e 45, 47 (SMS trocadas entre Demandante e representante da Demandada, Srª D., para prova nos itens 13, 14, 25 a 27); flªs 29 a 37, 40 a 44, 46, 48, 50 a 63 (e-mails trocados entre o Demandante e Demandada, para prova dos itens 4 a 11, 13 a 22, 24 a 29, 31, 32 e 43), flªs 38 (comprovativo da transferência de € 1.151,66 para a Demandada, para prova do item 23), flªs 64 e 65 (carta e AR, para prova do item 33 e 34), flªs 67 (factura relativa à mudança do canhão da porta, para prova do item 36); flªs 68 a 78 (relatório técnico, para prova dos itens 32, 33 e 37); flªs 79 a 85 (orçamento da F. , para prova dos itens 32, 33, 37 e 38); flªs 147, 148, 149, 150 (facturas emitidas pela F., para prova do item 39); flªs 90/94 (fotografias de patologias, para prova itens 32, 33 e 37); flªs 95 a 101 (facturas relativas aos materiais adquiridos pelo Demandante, para prova itens 40 e 41); e flªs 104 (factura relativa à aquisição das loiças do WC, para prova item 42).
Atendeu-se ainda às declarações do Demandante, que reiterou o alegado no requerimento inicial, e o teor dos documentos que o instruem, mais referindo que a fracção “F”, apartamento onde reside, destina-se a sua habitação e da sua companheira. Que tentou por todos os meios possíveis resolver a situação. Que com a postura da Demandada em não acabar as obras sofreu muitos transtornos na sua vida diária, tendo de pagar renda noutro local pelo atraso nas obras.
Por sua vez em declarações, o representante legal da Demandada mencionou que era quem geria a empresa Demandada, na área da construção civil. Confirmou a celebração do contrato dos autos, não se sentindo responsável pelo pagamento do peticionado à excepção do valor das chaves, que tinha na sua posse (o que se atendeu, desde logo, para prova da matéria de facto dos itens 35 e 36). Que não colocou o rodapé (o que se atendeu para considerar como provado o item 33, na parte em que se refere que “os rodapés não foram montados”), porque ainda não existiam portas, o que foi contrariado pelas testemunhas H. e I. que disseram existirem portas na obra e ainda pela fotografia de flªs 70, não se atendendo, assim, a essa justificação.
A testemunha I. confirmou, em traços gerais, o alegado pelo Demandante, referindo nomeadamente ser seu amigo, que conhecia e visitava o apartamento com regularidade. Que se recordava da casa estar em obras durante muito tempo, com grande transtorno para aquele. Que notou a pintura das paredes estar mal feita no seu acabamento e que o chão, caixa de estores e portas tiveram problemas. Que o empreiteiro deixou a obra, foi lá outro profissional e ficou tudo bem feito Que se notava uma grande diferença na qualidade do trabalho.
Por sua vez a testemunha Eng. E., engenheiro civil, mostrou-se relevante para prova da existência das tarefas por realizar, anomalias e possibilidade da sua reparação (prova dos itens 32, 33 e 37). Foi confrontada com o relatório técnico dos autos, tendo confirmado o seu teor e autoria, a pedido do Demandante (prova do item 37). Acrescentou ter sido quem tirou as fotografias que nele constam e que retratam as anomalias mais visíveis e obra inacabada. Quanto ao piso referiu que o mesmo estava muito apertado, sendo que o pavimento começa a dilatar e levanta. Sendo possível retirar o soalho usado e colocar o mesmo, contudo essa situação tem de ser analisada caso a caso conforme o estado do material, sendo que no caso como já tinha sido reutilizado, não era aconselhado a sua utilização de novo. Os estuques não estavam regularizados, o que se notava desde logo ao “passar a mão”, sendo que se colmatava esse vício com mais massa e lixa. Referiu ser uma patologia corrigível.
Por fim a testemunha J., técnico de obras, que acompanhou a obra na fase final, foi relevante já que permitiu dar como assentes as anomalias detectadas, trabalhos por realizar e o custo da sua reparação e execução, respectivamente (prova dos itens 32, 33, 37, 38 e 40). Confrontada com o orçamento de flªs 79, referiu ser o representante da empresa F., Lda, e quem o elaborou, a pedido do Demandante (prova do item 38). Mais referiu que o que lhe chamou mais à atenção foram as paredes mal pintadas e chão mal colocado (referindo que este tanto “encolheu” como em outros sítios “empolou”). Os rodapés não estavam montados. O chão flutuante apresentava poucas folgas nas extremidades, e juntas mal feitas. Que teve de cortar prumadas das portas para o chão circular. As loiças da casa de banho estavam todas picadas. O pladur, os barramentos junto às bandas não estavam uniformes. Teve de reparar todas as paredes e pintar 3 a 4 vezes. Os tectos só alguns. Começou a obra em Junho e acabou em Agosto, uma vez que estiveram mais algum tempo em obra porque foram necessárias outras reparações, nomeadamente o piso, uma vez que após a sua remoção e colocação, tiveram de retirá-lo e colocá-lo de novo (trabalho extra). Quanto ao piso esclareceu que tiverem de colocar nova madeira já que a existente, por já não se encontrar uniforme nas suas tábuas (por ter sido reutilizada), já não permitia a sua utilização de novo, por não encaixarem correctamente, de modo a que a obra ficasse uniforme e sem defeitos. Confirmou que efectuou os trabalhos e forneceu o material constante das facturas de flªs 145 a 151, que emitiu em suporte papel por lhe ser permitido emiti-las dessa forma, e bem assim o pagamento das mesmas pelo Demandante (prova do item 39). Que alguns materiais foram por si comprados e as tintas foram compradas pelo Demandante, que utilizou em obra.
Ora não teve o Tribunal dúvidas quanto à versão trazida aos autos pelo Demandante, cabendo referir que a Demandada, validamente e regularmente citada, não apresentou contestação, nem apresentou/requereu qualquer prova que refutasse aquela versão. Assim, e atendendo sobretudo à prova documental junta aos autos, que não foi impugnada pela Demandada, conjugada com a demais produzida em sede de audiência de julgamento, em traços gerais, considerou-se que entre as partes foi celebrado um contrato de empreitada consistente na realização de trabalhos de construção civil na habitação do Demandante. Acontece que ajustadas as obras em causa a realizar e preço respectivo, a Demandada acabou por realizar parte delas, abandonando a obra e não mais aí regressando por mais de 6 meses. Perante essa ausência, o Demandante efectuou várias tentativas de contacto com a Demandada, e só passados alguns meses conseguiu resposta, agora da parte não do Sr. C. com quem contratara, mas de D. Primeiramente foi solicitada pela mesma o pagamento de valores, para continuação da obra, com indicação do término da obra em Fevereiro de 2017, o que foi efectuado pelo Demandante. Não satisfeita, exigiu a Demandada que o Condomínio do prédio efectuasse o pagamento do valor de uma factura referente a outra obra, chegando a suspender a obra do Demandante (que, aliás, nem sequer se tinha reiniciado) até que houvesse a regularização da divida. Regularizada essa divida, alheia ao Demandante, mesmo assim, a Demandada não iniciou as obras. Interpelada para indicar o início das obras nada disse. Perante tal ausência de resposta e dada a urgência em efectuar o restante da obra contratada, já que o Demandante pagava renda mensal de €300,00 de outra habitação, enquanto as obras do seu apartamento não terminassem, o Demandante comunicou as anomalias existentes na obra realizada e resolveu o contrato. Procedeu o Demandante, dada a urgência na realização do restante das obras, à contratação de empresa que reparou as patologias e acabou a obra. Pretende o Demandante com a presente acção o ressarcimento dos prejuízos sofridos com o custo da reparação de defeitos da obra levada a cabo pela Demandada e indemnização pelo incumprimento contratual, aqui se incluindo devolução do preço pago, devolução de quantia entregue para compra de material, custo de substituição de loiças do WC e de canhão da porta, por falta de devolução da chave, pedido esse que analisaremos adiante.
Quanto aos factos dados como não provados resultam da ausência de prova credível e bastante que atestasse a veracidade dos mesmos ou da prova em contrário. Nomeadamente no que respeita às al. a) e e) por ausência de prova bastante; al. b) atenta a data da factura em causa e o depoimento da testemunha J. que referiu ter acabado a obra em Agosto de 2017; al. c) atendendo aos mesmos motivos da anterior alínea e a factura não identificar o Demandante como comprador; e al. d) já que os trabalhos e materiais em causa espelhados nas facturas, extravasam a reparação das anomalias comunicadas pelo Demandante. Não se atendeu às facturas nºs 87, 88 e 91 dos autos (flªs 145, 146 e 151), pois não é peticionado o pagamento do valor dos trabalhos/materiais aí mencionados.


IV. O Direito
Antes de mais cabe saber qual a natureza do contrato celebrado entre Demandante e Demandada, nomeadamente se corresponde a um contrato de empreitada de consumo, abrangida pelo Decreto-Lei nº 67/2003, que procedeu à transposição da Directiva 1999/44/CE, de 25/5/1999, que estabeleceu um regime especial da venda e outros contratos de consumo, tendo por objectivo assegurar a protecção dos interesses dos consumidores nesses contratos.
Dos factos provados apurou-se que o Demandante ajustou com a Demandada a realização de trabalhos de construção civil, pelo preço inicial de € 2510,00, acrescido de IVA, que veio a sofreu alterações.
Sendo pacífico que o regime do D.L. 67/2003 é aplicável ao contrato de construção de imóvel, desde que o dono da obra seja consumidor, entendemos que a aplicação do mesmo não é de excluir nas empreitadas de reparação/beneficiação de imóvel.
Seguindo a posição de Menezes Leitão, in Direito das Obrigações, vol. III, 10ª edição, página 562, entendemos que a actual redacção do citado artigo 1.º A, e n.º 2 do D.L. n.º 67/2003, permite abranger não apenas a empreitada de construção, mas também a empreitada de reparação ou modificação, sob pena da alteração apesar de significativa em termos de redacção, não ter significado prático.
É incompreensível que o mesmo regime não seja aplicável quando o dono da obra contrata a reparação do imóvel. Essencial é que se esteja perante uma relação de consumo entre o dono da obra e o empreiteiro. Esta relação ocorre sempre que o empreiteiro exerça com carácter profissional essa actividade e o dono da obra seja um consumidor, visando a mesma fins não profissionais.
No caso dos autos a Demandada é uma sociedade que tem por objecto a construção civil e o contrato aqui em causa de empreitada foi celebrado, a título oneroso, no âmbito dessa sua actividade.
O artigo 1.º B, alínea a), do D.L. nº 67/2003, define consumidor como “aquele a quem sejam fornecidos bens, prestados serviços ou transmitidos quaisquer direitos, destinados a uso não profissional, por pessoa que exerça com caráter profissional uma atividade económica que vise a obtenção de benefícios, nos termos do n.º1 do artigo 2º da Lei n.º 24/96, de 31 de julho.”
Este artigo 2º nº 1 da Lei de Defesa do Consumidor, estipula que: “Considera- se consumidor todo aquele a quem sejam fornecidos bens, prestados serviços ou transmitidos quaisquer direitos, destinados a uso não profissional, por pessoa que exerça com caráter profissional uma atividade económica que vise a obtenção de benefícios.”.
Ora o Demandante não é profissional e o serviço foi prestado no seu apartamento – fracção – para sua habitação, onde reside actualmente com a sua companheira, pelo que não restam dúvidas que se aplica ao caso concreto, o D.L. 67/2003, ou seja, estamos perante o subtipo contratual de empreitada de consumo.

Posto isto,
Segundo o nº 1 do artigo 406º do Código Civil, que consagra o princípio pacta sunt servanda, traduzido no reconhecimento da força vinculativa dos contratos tal como foram concluídos, em relação aos contratantes, “o contrato deve ser pontualmente cumprido, e só pode modificar-se ou extinguir-se por mútuo consentimento dos contratantes ou nos casos admitidos na lei”.
De acordo com o artigo 762º do Código Civil, “o devedor cumpre a obrigação quando realiza a prestação a que está vinculado”.
Da relação jurídica emergente de uma empreitada, derivam obrigações recíprocas e interdependentes: Do lado do empreiteiro (aqui Demandada), a principal obrigação é a de obter um certo resultado material, que se traduz na execução da obra nas condições convencionadas, e sem vícios que excluam ou reduzam o seu valor, ou a sua aptidão para o uso ordinário ou previsto no contrato (artº 1208º do Código Civil). Do lado do dono da obra (aqui Demandante), em contrapartida, impende o dever principal de, caso aceite a obra, pagar o preço ajustado o que, na ausência de convenção ou uso em contrário, deve ser efetuado no acto daquela aceitação (artº 1211º, nº 2 do Código Civil).
No caso dos autos resultou provado que o Demandante efectuou pagamentos, para compra de materiais €300,00, e por conta do orçamento de €2.655,37, não tendo procedido ao pagamento do valor remanescente do orçamento de €503,71, em virtude da Demandada não ter procedido à finalização da obra.
Por sua vez, do lado da Demandada/empreiteiro resulta por um lado que a obra ficou inacabada e, por outro lado, que apresenta patologias – itens 32, 33 e 37 da matéria assente.

Abordemos primeiramente a questão da existência de patologias.
As anomalias sob apreço integram o conceito de vícios a que alude o artigo 1208º do Código Civil.
Como refere P. Romano Martinez “…os vícios correspondem a imperfeições relativamente à qualidade normal, enquanto que as desconformidades são discordâncias com respeito ao fim acordado. O conjunto dos vícios e das desconformidades constituem os defeitos da coisa. Os dois elementos fazem parte do conteúdo do defeito, determinam-se através do contrato e dependem da interpretação deste.”
É o caso dos autos, já que o pladur da cozinha não apresenta superfícies lisas, e várias paredes e tectos do imóvel apresentam deficiências no tratamento e acabamento na aplicação de massas, tanto na reparação/barramento como na pintura, irregularidades e protuberâncias na sua superfície, o piso não se mostra uniforme, porque muito apertado, as peças não estão niveladas, nomeadamente nos seus topos, o que para além do prejuízo estético, conduzirão, com o decurso do tempo, ao levantamento da madeira, à queda da pintura nesses locais por estar imperfeita e permitirão a infiltração de agentes causadores de erosão (areias, água, calor, etc.) que contribuirão para um processo degradação mais acelerada dessas paredes, tectos e piso.
Esperando o Demandante da parte da Demandada, entendida na construção civil, a realização da obra sem vícios, por ser pessoa com conhecimentos especiais, nomeadamente em matéria de pintura.
Estando vinculado a uma obrigação de resultado, o empreiteiro/Demandada goza de liberdade de actuação quanto ao modo de o atingir, devendo, porém, respeitar e proceder de harmonia com as regras de arte, as normas técnicas e os conhecimentos científicos e técnicos, aplicáveis à actividade em que se integra a obra, nomeadamente no que se refere à pintura das paredes e tectos e colocação do piso.
Ora, sendo dever Demandada executar o serviço segundo as regras da arte, devia tê-lo feito aplicando as massas e alisando as paredes convenientemente, bem como aplicar o piso em madeira uniformemente acautelando o facto do mesmo se expandir.
Ao Demandante cabia provar a existência de defeitos ou a falta de conformidade, a qual se presume, o que logrou fazer (artº 342º, nº 1 do Código Civil).
Cabendo ao empreiteiro, aqui Demandada, provar a ausência do nexo de imputação à sua pessoa dessa falta de conformidade.
Para afastar tal presunção o empreiteiro teria que alegar e provar a causa do defeito, sendo-lhe esta completamente estranha, pois que, só assim se exonerará da responsabilidade pelo defeito existente na obra, o que não se verificou.
Ora, considerando a factualidade provada e a presunção em causa, importa concluir que o incumprimento defeituoso dos trabalhos supra descritos, é imputável à Demandada.
A denúncia das anomalias é uma declaração receptícia, ou seja, tem de ser dirigida à pessoa alvo e levada ao conhecimento dessa pessoa, sob pena de não existir denúncia.
O Demandante, por carta registada, enviada para a sede da Demandada que consta do orçamento dos autos, comunicou-lhe a existência dessas anomalias.
E sendo certo que a carta veio devolvida, neste conspecto tem aplicação o disposto no artº 224º, nº 2 do Código Civil, que estatui que “É também considerada eficaz a declaração que só por culpa do destinatário não foi por ele oportunamente recebida”.
Ora essa missiva foi enviada para a morada da sede da Demandada, não tendo sido alegado por esta, como lhe incumbia, qualquer facto que justificasse o impedimento na sua recepção.
Contudo entendemos que, face ao incumprimento definitivo da Demandada no cumprimento das suas obrigações, que abordaremos de seguida, para a procedência do pedido do pagamento do custo com a sua reparação por terceiro, ao Demandado não era sequer exigível a comunicação prévia dos defeitos.

Outra questão a abordar é o facto da Demandada não ter acabado o obra.

Tem-se entendido que, se o empreiteiro declarar expressamente que já não vai realizar a obra ou se ele tiver uma conduta reveladora de uma intenção firme e definitiva no sentido de não cumprir a obrigação contratual de concluir a respectiva obra, ainda que anterior ao termo do prazo convencionado para a execução desta, está-se perante uma situação de incumprimento definitivo imputável ao empreiteiro, pelo que cabe ao dono da obra resolver o contrato e exigir uma indemnização.

Ora – segundo alguma jurisprudência -, uma das atitudes do empreiteiro susceptível de revelar essa sua intenção firme e definitiva de não cumprir a sua obrigação contratual de concluir a obra é, precisamente, o abandono da obra.

Por outro lado, suspender ou parar uma obra não é o mesmo que abandoná-la, correspondendo às diversas situações efeitos jurídicos diferentes.

Ora, provado está que a obra não foi concluída pela Demandada, tendo o Demandado, por repetidas vezes, solicitado a conclusão da mesma.

Demonstrou-se que a Demandada fez depender a conclusão da obra do pagamento de outra ajustada com o Condomínio do prédio da habitação do Demandante, a este alheio. E, não obstante o Demandante, que diligenciou pelo seu pagamento junto do Administrador do Condomínio, ter remetido o comprovativo de pagamento dessa obra do Condomínio à Demandada, esta não regressou à obra.

Já aqui a Demandada exprimiu inequivocamente a sua intenção de não concluir os trabalhos, pois, injustificadamente, fez depender a realização da obra do pagamento de divida alheia ao Demandante.

Demonstrou-se ainda que foi efectuado plano de pagamento, fazendo-se depender a continuação da obra do pagamento da quantia de €1.151,66. Porém, apesar do Demandante ter pago essa quantia de imediato (no próprio dia em que recebeu instruções para tal) a obra não foi reiniciada.

Mais, paga a quantia de €503,71, relativa a obras que ainda não estavam realizadas, e a Demandada não reiniciou e concluiu os trabalhos.

Novamente aqui a Demandada demonstrou a sua intenção de não concluir os trabalhos, pois, injustificadamente, fez depender a realização da obra do pagamento de preço e, este pago, não reiniciou e concluiu os trabalhos.

Para além do incumprimento, por duas vezes, das datas estipuladas para conclusão das obras, foram várias as tentativas de contacto, com pedido de conclusão da obra, sem que a Demandada respondesse às solicitações do Demandante, óbvio é pois, no caso dos autos, que a paragem dos trabalhos, o abandono da obra, e a conduta posterior da Demandada, que não mais finalizou os trabalhos, podem e devem, inequivocamente, ser interpretados como manifestação da sua intenção firme e definitiva de não cumprir a sua obrigação contratual de concluir a obra.

Acresce que o Demandante manifestou ao longo do tempo, por diversas vezes, a urgência na finalização da obra junto da Demandada, pois para além dos habituais transtornos que tal implica nas rotinas e bem-estar, estava a custear renda de €300,00 de outro imóvel, quando poderia habitar no apartamento objecto dos autos e não despender de tal quantia mensal, solicitações essas que nunca foram atendidas pela Demandada. Note-se que o Demandante estava impedido de habitar o seu apartamento, em condições ditas normais, já que como resulta da matéria assente, faltava montar os móveis da cozinha e da casa de banho e o piso, paredes e tectos apresentavam defeitos.

Assim sendo, entendemos que, ocorreu, in casu, o incumprimento definitivo do contrato por parte da Demandada, estando o Demandante dispensado de efectuar a interpelação admonitória para conclusão da obra, o que justifica a sua perda de interesse na conclusão da obra pela Demandada, com a operada resolução do contrato.

Aqui chegados,

Cabe agora verificar se o Demandante tem direito à indemnização peticionada nos autos, relativa ao custo suportado com a conclusão da obra contratada e com a reparação dos defeitos por terceiro.

Uma vez cessado o contrato, por incumprimento definitivo das obrigações dele decorrentes para o empreiteiro, ficou este, ipso jure, constituído na obrigação de indemnizar o dono da obra dos prejuízos que lhe causou (cit. art. 798º do Cód. Civil).

Entre tais prejuízos figura, naturalmente, o custo da conclusão dos trabalhos compreendidos no objecto da empreitada mas que a Demandada deixou inacabados.

Por outro lado, no que se refere às anomalias detectadas, o artigo 3.º do citado DL 67/2003 dispõe que o “ vendedor responde perante o consumidor por qualquer falta de conformidade que exista no momento em que o bem lhe é entregue ” (aplicável também nas situações de empreitada, cfr. artigo 1.º nº 2 do mesmo diploma).

O artigo 4.º, n.º 1 do diploma em questão dispõe, por sua vez, que “ em caso de falta de conformidade do bem com o contrato, o consumidor tem direito a que esta seja reposta sem encargos, por meio de reparação ou de substituição, à redução adequada do preço ou à resolução do contrato ”.

Por seu turno, o n.º 5 do citado artigo 4.º estatui que “ o consumidor pode exercer qualquer dos direitos referidos nos números anteriores, salvo se tal se manifestar impossível ou constituir abuso de direito, nos termos gerais ”.

Há ainda que atender ao disposto no artigo 12.º da Lei n.º 24/96 (LDC), na redacção do Decreto-Lei 67/2003, que atribui ao “ consumidor direito à indemnização dos danos patrimoniais e não patrimoniais resultantes do fornecimento de bens ou prestações de serviços defeituosos ”.

Tem-se entendido, porém que os direitos de indemnização estabelecidos no artigo 12.º da LDC se destinam a obter outros ressarcimentos, nomeadamente lucros cessantes e danos emergentes, mas já não o pagamento do custo de uma reparação dos defeitos.

Pelo que, perante a existência dos defeitos na obra executada o dono da obra aqui Demandante teria que lançar mão dos direitos que o artigo 4.º, nº 1 do DL 67/2003 põe à sua disposição.

Portanto, o que se impõe é que o consumidor (dono da obra) alegue as razões pelas quais desiste do programa contratual ou das possibilidades da sua reposição do modo mais “reconstituinte” possível - de declaração de não satisfação da reparação ou substituição da coisa, de transformação da mora da em incumprimento definitivo ou de urgência da reparação dos defeitos.

Significa isto que o dono da obra em certas circunstâncias pode pedir o custo de reparação dos defeitos por terceiro.

Necessário é que resulte da factualidade provada o excepcional circunstancialismo capaz de justificar a pretensão do Demandante no sentido de ser a Demandada condenada a pagar o valor ou custo da reparação dos defeitos em causa.

Isto posto

Como acima se deixou dito, o Demandante efectuou a prova, como lhe competia, quer de uma situação de incumprimento definitivo, quer da situação de urgência, por forma a justificar a procedência do pedido de condenação no custo da reparação dos defeitos. Aliás não seria sequer expectável que a Demandada, que abandonou a obra durante mais de seis meses, e apesar dos diversos pedidos nesse sentido, e da urgência alegada, não reiniciou e acabou os trabalhos, viesse agora reparar as anomalias detectadas.

Concretizando,

Está provado que o Demandante veio a despender, em materiais e serviço de mão-de-obra, a quantia total de €3.648,35, com a conclusão da obra e reparação das anomalias detectadas, pelo que a Demandada está obrigada a pagar-lhe tal importância, a título de indemnização dos prejuízos decorrentes do incumprimento definitivo das suas obrigações e reparação dos defeitos.

Bem como, deve ser indemnizado na quantia de €280,64, relativa ao custo dos materiais adquiridos para pintura das paredes/tectos a pedido da Demandada.

Quanto às demais despesas peticionadas, no valor de €302,75, relativas a materiais (primário, fita precisão) e realização de trabalhos (isolamentos de janelas, montagem de poleias de estores, montagem de exaustor e abertura de buraco para esquentador, desmontagem e montagem de 14m2 de pavimento), vai a Demandada absolvida por não se ter feito prova da sua existência e da sua relação com a matéria dos autos.

De igual forma tendo o Demandante entregue à Demandada a quantia de €300,00 para compra de materiais, e tendo a mesma despendido o valor de € 182,00, cabe-lhe devolver a diferença de €118,00 ao Demandante.

Em relação ao valor de €1.587,30 peticionado pelo Demandante, referente à invocada diferença entre o valor pago pelo Demandante (€2.854,00) e os montantes das obras executados de forma correcta (€1.266,70), dir-se-á o seguinte:

Como decorre dos factos provados, o Demandante e Demandada reconheceram que setenta por cento das obras estava concluído. Nessa medida, ajustaram o pagamento pelo Demandante até 10.02.2017 do valor em falta até atingir esses setenta por cento, que ascendia à quantia de €1.151,66, sendo que o restante seria pago em duas tranches de €503,71 cada uma, a primeira até 20.02.2017 e a segunda no final da obra.

Nesse sentido, foi efectuada transferência bancária do valor de €1.151,66 para completar os ditos setenta por cento do valor da obra.

Já no que se reporta à quantia de €503,71 pagos após essa data, relativos às demais obras que seriam concluídas pela Demandada e não o foram, deve tal quantia, e apenas esta, por efeito da resolução do contrato, ser restituída ao Demandante.

Os efeitos da resolução ficam limitados à restituição da parte do preço que não se “reflectiu”, em termos de correspectividade, na obra efectuada.

Por isso é que, extinguindo-se o contrato deve ocorrer a devolução do preço pago pelo dono somente na parte que exceda o valor da prestação parcial efectuada pelo empreiteiro, que no caso corresponde ao valor pago de €503,71.

O mesmo se diga relativamente ao valor peticionado de €115,00, relativo ao preço do pavimento que foi aplicado na obra e veio a padecer de defeito.

Se assim não fosse, e sendo o Demandante ressarcido do custo da reparação dos defeitos, ocorreria um injustificável enriquecimento deste à custa da Demandada, que a lei repele (artº 473º, nº 1 do Código Civil).

Quanto ao valor despendido na aquisição das chaves, por não ter sido alegado/provado qualquer direito de retenção das mesmas que suporte a sua detenção pela Demandada, vai a mesma condenada no pagamento do valor despendido pelo Demandante na sua substituição de €165,00.

Quanto o valor peticionado pela substituição das loiças não resultou provado que as mesmas tivessem sido danificadas pela Demandada, pelo que, faltando o requisito basilar da imputação da responsabilidade da Demandada, nessa parte a mesma vai absolvida.

Quanto aos juros de mora peticionados, de acordo com o disposto nos artigos 798º e 799º do Código Civil, o devedor que falta culposamente ao cumprimento da obrigação torna-se responsável pelo prejuízo que causa ao credor.

Tratando-se de obrigações pecuniárias, a indemnização corresponderá aos juros a contar do dia da constituição em mora. O devedor só fica, em regra, constituído em mora depois de ter sido judicial ou extrajudicialmente interpelado para cumprir, o que ocorreu, no caso, com a citação.

Assim, vai a mesma condenada em juros à taxa legal dos juros civis, actualmente de 4% (artigo 559º do Código Civil e Portaria n.º 291/2003, de 04/04), desde a data da sua citação e até efectivo e integral pagamento.

V. Decisão
Face ao exposto, julgo a presente acção parcialmente procedente, e, em consequência, condeno a Demandada a pagar ao Demandante a quantia de €4.715,70 (quatro mil setecentos e quinze euros e setenta cêntimos), acrescida dos juros de mora, à taxa legal de 4% ou outra que vier a ser fixada, a contar da citação da Demandada e até efectivo e integral pagamento, indo no demais absolvida.

Custas: por via do disposto no artigo 527º nºs 1 e 2 do CPC, ex vi artigo 63º da LJP, declaro ambas as partes vencidas, pelo que vão ambas condenadas em custas na proporção do respectivo decaimento, que se fixa em 30% para o Demandante e 70% para a Demandada (art.º 8.º da Portaria n.º 1456/2001, de 28 de dezembro).

*
Registe e notifique as partes, por não se encontrarem presentes.
Para constar se lavrou a presente ata, por meios informáticos, que, depois de revista e achada conforme, vai assinada, sendo enviada uma cópia da mesma a cada uma das partes.
Cascais, Julgado de Paz, 20 de dezembro de 2018
A Técnica do Serviço de Atendimento A Juíza de Paz