Sentença de Julgado de Paz
Processo: 518/2013-JP
Relator: MARIA JUDITE MATIAS
Descritores: RESPONSABILIDADE CIVIL
Data da sentença: 08/28/2013
Julgado de Paz de : LISBOA
Decisão Texto Integral:
Sentença
(n.º 1, do art. 26º, da Lei n.º 78/2001, de 13 de Julho)

Processo n.º x
Matéria: Responsabilidade Civil
Alínea H do n.º 1, do art. 9º, da Lei n.º 78/2001, de 13 de Julho)
Objecto: pedido de indemnização
Valor da acção: € 2 136,69 (dois mil cento e trinta e seis euros e sessenta e nove cêntimos)
Demandante: A
Mandatário: B
Demandados: 1 - C e 2 - D
Do requerimento inicial: folhas 1 a 7.
Pedido: folhas 6
Junta: 12 documentos
Contestação: a fls. 147 do II demandado; e a fls. 154, I.
Tramitação:
Foi realizada sessão de mediação em 20 de Junho de 2013, não tendo as partes logrado obtenção de acordo susceptível de pôr fim ao litigio, pelo que foi marcada audiência para o dia 09 de julho de 2013, pelas 12:00h, sendo as partes devidamente notificadas para o efeito.
Audiência de Julgamento.
A audiência decorreu conforme acta de fls. 185 a 190.
Fundamentação fáctica.
Com relevância para a decisão da causa dão-se por provados os seguintes factos:
1 – A demandante, na qualidade de proprietária, vendeu ao primeiro demandada o veículo automóvel de marca x, com a matrícula CQ;
2 – Na mesma data o primeiro demandado assinou um termo de responsabilidade nos termos do qual assumiu “inteira responsabilidade por tudo quanto possa acontecer (multas, transgressões, incidentes com terceiros ou próprios e outros de qualquer espécie) e ainda pagamentos respeitantes a selos e impostos de circulação, nas condições em que se encontra, sem garantia, bem como a fazer o seguro obrigatório por lei” para a referida viatura CQ (crf. Doc 1, fls. 8, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido);
3 – A demandante entregou ao primeiro demandado um documento de venda por si assinado com vista à revenda do CQ por parte do primeiro demandado;
4 – Em 18 de Agosto de 2010 o primeiro demandado vendeu o CQ ao segundo demandado, usando a declaração de venda referida supra ponto 3, fazendo crer que tinha sido a ora demandante a fazer a venda ao aqui segundo demandado;
5 – O primeiro demandado não procedeu ao registo em seu nome do CQ, nem tão pouco o segundo demandado o fez;
6 – O primeiro demandado não efetuou o seguro legal do CQ, nem tão pouco o segundo demandado;
7 – O primeiro demandado não efetuou o pagamento do Imposto Único Automóvel nem tão o fez o segundo demandado;
8 – Em Abril de 2011 a demandante recebeu um telefonema de uma gasolineira sita em torres Vedras a comunicar que o CQ, registado em seu nome, tinha feito um abastecimento sem efetuar o respetivo pagamento;
9 – A demandante procurou inteirar-se da situação do veículo tendo ido à repartição de Finanças da área onde expôs a situação;
10 – Na Repartição de Finanças a demandante foi aconselhada a solicitar ao E a apreensão dos documentos do CQ;
11 – Em 27 de Abril de 2011 a demandante solicitou ao E a apreensão dos documentos do CQ;
12 - Em julho de 2011 a demandante foi intimada a comparecer no F (doc 2, fls. 28);
13 – A demandante deslocou-se ao F no dia 7 de Julho de 2011, onde lhe foi pedido que identificasse o condutor que abasteceu o CQ sem pagar na gasolineira de Torres Vedras e outra em Faro;
14 – A partir de Outubro de 2011 a demandante passou a notificações para pagamento de despesas feitas com o CQ, conforme docs. 3 a 8, a fls. 20 a 96, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzidos;
15 – Em 21 de Agosto de 2011 os documentos do CQ foram apreendidos na sequência de um acidente em que interveio;
16 – A demandante confrontou o primeiro demandado com o documento relativo ao termo de responsabilidade e respetivo conteúdo (doc referido supra ponto 2);
17 – O primeiro demandado informou a demandante que tinha vendido o CQ ao segundo demandado entregando-lhe o documento de venda que a demandante lhe entregou a ele;
18 – No dia 21 de Novembro de 2012 a demandante dirigiu-se novamente ao E para pedir o cancelamento da matrícula do CQ;
19 – Seguindo a orientação do E a demandante dirigiu-se à PSP de x, que a mandou dirigir-se à G (crf. Doc 10 fls. 105 a 113);
20 – A demandante aguarda deferimento ao pedido de cancelamento de matrícula formulado no supra referido doc 10;
21 – Para resolução das questões com as quais foi sendo confrontada, desde que vendeu o CQ ao primeiro demandado, a demandante despendeu as seguintes quantias: €890,52 em honorários de advogado; €35,05 em registo de cartas; €23,45 em material de papelaria (crf. Doc 11, fls. 114 a 130); €189,67 em deslocações a consultas médicas (doc.12, fls. 131 a 137);
22 – A demandante deslocou-se inúmeras vezes ao E e à PSP no sentido de resolver os problemas que lhe foram sendo colocados decorrentes dos factos supra dados por provados;
23 – A demandante vivenciou um período de grande angústia e preocupação;
24 – A demandante ficou desorientada quando foi chamada ao F, envergonhada, triste e deprimida por se sentir suspeita de ter praticado os factos ilícitos nos quais interveio o CQ depois de o ter vendido ao primeiro demandante.
Factos não provados.
Com relevância para a decisão da causa não se consideram não provados quaisquer factos.
Motivação.
A convicção probatória do tribunal ficou a dever-se ao conjunto de prova produzida nos presentes autos, nos autos, nos documentos apresentados e assinados nos respetivos factos supra dados por provados, complementados pelos esclarecimentos das partes que se tiveram em consideração ao abrigo do princípio da aquisição processual, nos depoimentos de ambas as partes, e nos depoimentos das testemunhas apresentadas. Nos depoimentos de parte prestados por ambas as partes, estas nada acrescentaram ao que tinham alegados nas respectivas peças processuais. A testemunha H, filha da Demandante, acompanhou a demandante em todo os factos colocados à apreciação deste tribunal, de igual modo a testemunha I, filho da demandante, bem como a a testemunha J, colega de trabalho da demandante e que acompanhou o desenrolar dos acontecimentos e presenciou o sofrimento, angustia e preocupação da demandante. Todos responderam com clareza, objectividade e isenção, pelo que mereceram inteira credibilidade;
Do Direito.
Nos presentes autos pretende a demandante ver-se ressarcida dos prejuízos e danos que sofreu, na sequência da venda que fez do veículo automóvel supra identificado ao primeiro demandado, alegando que este, de acordo com o documento que assinou e está junto aos autos a fls. 8, assumiu “inteira responsabilidade por tudo quanto possa acontecer (multas, transgressões, incidentes com terceiros ou próprios e outros de qualquer espécie) e ainda pagamentos respeitantes a selos e impostos de circulação, nas condições em que se encontra, sem garantia, bem como a fazer o seguro obrigatório por lei” para a referida viatura CQ, conforme ponto 2, dos supra factos dados por provados, ao abrigo do principio da liberdade e autonomia negocial consagrado no artigo 405.º do Código Civil. Ocorre que o primeiro demandado, antes de proceder ao registo de propriedade em seu nome, vendeu o referido automóvel ao segundo demandado, que por sua vez vendeu a terceiro. De permeio, foi o referido veículo usado na prática de ilícitos, cujas consequências, devido ao facto do mesmo constar registado a seu favor, lhe têm sido imputadas a si, situação que, para além das despesas supra referidas, lhe têm causado transtornos de saúde com o inerente sofrimento. Por seu turno, diz o primeiro demandado, que alienou o veículo antes de expirar o prazo que a lei lhe concede para promover o registo e que por isso não lhe pode ser imputada qualquer responsabilidade. Ora, resulta daqui que o litígio em causa se subsume a uma situação de incumprimento contratual. Ou seja, o facto da lei conceder certo prazo para promover o registo não significa que o comprador, no caso o primeiro demandado, não o pudesse fazer antes. Por cautela, deveria tê-lo feito. Uma vez que entendeu deixar expirar o prazo, as consequências desta sua opção recaem sobre si e não sobre quem quer que seja, dado que os restantes intervenientes não assumiram perante a demandante quaisquer obrigações, sendo certo que, se o primeiro demandado tivesse promovido o registo, podendo tê-lo feito, a demandante não teria sofrido os danos que sofreu, submetida a uma via sacra sem fim. Assim, com os factos supra dados por provados, consideramos preenchidos todos os pressupostos da responsabilidade civil, quer se entenda estarmos perante responsabilidade por factos ilícitos quer responsabilidade contratual, como é, seguramente, o caso dos autos, conforme resulta dos artigos 483.º e seguintes. Assim, violou o primeiro demandado o disposto no artigo 406.º, sendo responsável nos termos dos artigos 798.º e segs do Código Civil, mostrando – preenchidos, com os factos supra dados por provados, todos os pressupostos da obrigação de indemnizar.
Quanto ao montante pedido a título de danos morais, face aos factos supra dados por provados, entende-se justo e equitativo o montante de €1.000,00 pedido pela demandante.
De resto, os montantes pedidos quer a título de danos materiais quer morais, sempre se considerariam justos e equitativos à luz dos critérios estabelecidos no n.º 3 do artigo 566.º do CC.
Decisão.
Em face do exposto, considero procedente por provada a presente ação, absolve-se o segundo demandado do pedido e condena-se o primeiro demandado, C, a pagar à demandante a quantia de €2.136,69 (dois mil cento e trinta e seis euros e sessenta e nove cêntimos).
Custas.
Nos termos da Portaria n.º 1456/2001, de 28 de Dezembro, alterada nos seus n.ºs 6.º e 10.º pela Portaria n. 209/2005, de 24 de Fevereiro, considero o demandado C parte vencida, pelo que deve proceder ao pagamento da quantia de €35,00, correspondentes à segunda parcela, no prazo de três dias úteis, sob pena do pagamento de uma sobretaxa de €10,00 por cada dia de atraso.
Cumpra-se o disposto no n.º 9 da referida portaria em relação à demandante e ao demandado D.
Julgado de Paz de Lisboa, em 28 de Agosto de 2013
A Juíza de Paz
Maria Judite Matias