Sentença de Julgado de Paz
Processo: 659/2018-J.PLSB
Relator: MARGARIDA SIMPLÍCIO
Descritores: RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRA CONTRATUAL / ACIDENTE ESTRADAL / PRESCRIÇÃO
DANOS E INDEMNIZAÇÃO.
Data da sentença: 10/29/2018
Julgado de Paz de : LISBOA
Decisão Texto Integral: SENTENÇA
Processo n.º 659/2018-J.P.

RELATÓRIO:

O demandante, A., NIF. 18..., residente no …, em Lisboa, representado por mandatária constituída.

Requerimento inicial: O demandante é proprietário do veículo ligeiro de passageiro com a matrícula ZE, da marca …, modelo … coupé. A 5/06/2015, pelas 13 e 30h, ocorreu um acidente de viação no parque de estacionamento do Hospital D. Estefânia, em Lisboa. O veículo ZE estava estacionado no parque. O veiculo X, modelo .., com a matricula OS, provinda do estacionamento, fazendo marcha atrás, mas sem tomar as devidas cautelas, não guardando as distâncias laterias do ZE, ocorrendo o embate com a lateral esquerda do OS no para choques da frente do ZE. Sendo a condutora do OS a única responsável pela produção do sinistro, violando as disposições do C.E, pois devia abster-se de praticar atos que afetem a segurança dos demais utentes da via, o que não sucedeu, não tendo avaliado a sua saída do estacionamento, nem guardou a distância, como lhe era devido. Perante tal facto, a demandada assumiu a responsabilidade pelo mesmo a 5/06/2015. Em consequência sofreu diversos danos patrimoniais e não patrimoniais, todavia a demandada não pretende ressarci-la de todos os prejuízos. Na realidade o demandante participou do facto apenas a 30/05/2016, pelo facto de haver atrasos na assinatura da declaração amigável da parte da outra condutora. Depois ocorreu desencontros e reagendamentos de peritagem. Apenas a 4/2017 foi informado de um reagendamento de peritagem, na qual o processo foi encerrado, pois o sinistro ocorrera em 2015, o que motivou a reclamação/ participação da demandada e começou o ping-pong entre as companhias de seguro. A Z. disponibilizou-se para fazê-lo a 30/05/2017 e posteriormente a demandada a 12/062017. Ainda nesse dia foi informado que o relatório ficava pronto para levantamento na oficina. A 14/06/2017 ao pretender agendar data para reparação do veículo tomou conhecimento que os danos assumidos não correspondiam aos danos integrais, e que o relatório da peritagem não seria fornecido. Pretendeu saber porque não assumia a totalidade dos danos sofridos, e só após várias insistências conseguiu obtê-lo, foi aí que verificou existir erros na mesma, pois o veículo fora identificado como P coupé quando afinal é um Y coupé. Depois com o decorrer do tempo o material tem vindo a deteriorar-se, mas o veículo não sofreu qualquer outro sinistro, pelo que os danos não foram corretamente avaliados. Assim, às suas expensas foi forçado a solicitar outra peritagem, que lhe custou 64,80€, na qual os danos foram avaliados na quantia de 1.485,68€. Face á situação ocorrida, o que lhe causou angustias, perturbações e sofrimentos, entende que deve ser indemnizado em quantia de 1.500€. Conclui pedindo que a demandada seja condenada no pagamento da quantia de 3.050,48€, acrescida dos juros, á taxa legal, até efetivo pagamento. Juntou 18 documentos.

MATÉRIA: Ação de responsabilidade extracontratual, enquadrada no art.º 9, n.º1, alínea H) da L.J.P.

OBJETO: Sinistro estradal, indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais.

VALOR DA AÇÃO: 3.050,48€ (três mil e cinquenta euros e quarenta e oito cêntimos).

A demandada, AP, S.A., NIPC. 5..., com sede na rua …, no concelho do Porto, representada por mandatária constituída.

Contestação: O sinistro ocorreu a 5/06/2015, a ação foi intentada a 4/07/2018, e a demandada foi citada a 16/08/2018. Decorre do art.º 498, n.º 1 do C.C. que o direito á indemnização prescreve no prazo de 3 anos, razão pela qual invoca o mesmo. Caso assim não se entenda, aceita os factos vertidos nos art.º 1 a 6 do r.i, ainda o 12, mas apenas quanto á assunção da responsabilidade pelos danos ocorridos a 5/06/2015. Impugnam-se os art.º 13, 17 a 19. Após a abertura do proc. IDS, pela seguradora Z., foi solicitado ao demandante a indicação de data para realização de peritagem, o que resulta do seu email de 31/05/2016. Assim, a peritagem só não foi realizada por facto imputável ao próprio, pois apenas contactou a Z. um ano depois para agendar a peritagem, o que se encontra patente no doc. 4 que apresentou com o r.i. Ora aquela, também, não é parte nos autos, pelo que não pode ser responsabilizada por algo que não provocou. Ademais não se verifica a urgência, atento o lapso de tempo decorrido. Volvidos 2 anos, recebe a reclamação do demandante, e foi no seguimento desta que assumiu a responsabilidade pelo sinistro, contudo apenas diz respeito aos danos decorrentes daquele acidente, sendo que os demais não podem ser assumidos. Efetivamente foi realizada peritagem, e conforme se junta o capot do veiculo foi aberto, foi realizado orçamento detalhado para reparação, aberta ficha de informação e o respetivo relatório, no qual se apurou o montante de 566,64€ para os danos referidos no acidente de 2015, mostrando-se disponível para proceder ao seu pagamento, o que foi recusado pelo demandante. O relatório apresentou danos que não provinham deste acidente, nomeadamente no para choques da frente, peça que só foi considerada 50%. Impugna os doc. 14 a 16. Face ao resultado da peritagem informou-o que poderia autorizar a reparação junto da oficina, mas o demandante não deu autorização, pelo que não pode ser responsabilizada pelas opções do proprietário que não concordava com o relatório de peritagem. Impugna também o valor de 1.485,68€, não sabendo se foi totalmente liquidado o valor de 64,80€. Não compreende o motivo de ser realizada 2ª peritagem, pelo que não pode suportar tal encargo. Quanto aos danos não patrimoniais, não comprova os mesmos, pois se esteve sem o veículo 3 anos, deve-se exclusivamente á sua responsabilidade, e inércia, o que denota não haver urgência na realização do mesmo, pelo que deve improceder. Conclui pedindo: A) deve proceder a exceção perentória de prescrição, sendo absolvida do pedido, B) caso assim não se entenda, considerar a ação improcedente, por não provada, provando-se a contestação. Junta 2 documentos.

Notificado o demandante, de fls. 109 a 110, para responder á exceção nada alegou.

TRAMITAÇÃO:

Não se realizou pré mediação por recusa expressa da demandada.

As partes dispõem de personalidade e capacidade judiciária e são legítimas.

O processo está isento de nulidades que o invalidem na totalidade.

O Tribunal é competente em razão do valor e da matéria.

AUDIÊNCIA DE JULGAMENTO:

Iniciou-se dando cumprimento ao disposto no art.º 26, n.º1 da L.J.P., sem obter o consenso das partes. Seguiu-se para produção de prova, ocorrendo a rectificação do art.º 5 do r.i., a junção de dois documentos, as declarações de parte do demandante, nos termos do art.º 57, n.º 1 da L.J.P., e audição de 1 testemunha. Na 2ª sessão continuou-se com a produção de prova, ouvindo-se as restantes testemunhas e terminando com alegações finais, conforme consta das atas, de fls. 111 a 118, e 119 a 121.

-FUNDAMENTAÇÃO-

I- DOS FACTOS ASSENTES (Por Acordo):

A)O demandante é proprietário do veículo ligeiro de passageiro com a matrícula ZE, da marca … modelo Y coupé.

B) A 5/06/2015, pelas 13 e 30h, ocorreu um acidente de viação no parque de estacionamento do Hospital D. Estefânia, em Lisboa.

C) O veículo ZE estava estacionado no mencionado parque, sem condutor.

D) O veiculo X, modelo …, com a matricula OS,

E) Provindo de um estacionamento, fazendo marcha atrás, não toma as devidas cautelas, nomeadamente não guarda as distâncias laterias do ZE.

F) Embate com a lateral esquerda do OS no para choques da frente do ZE.

G)A demandada assumiu a responsabilidade pela produção do sinistro.

II- DOS FACTOS PROVADOS:

1)Em consequência do sinistro o demandante sofreu danos patrimoniais.

2)O demandante procedeu á participação do sinistro á sua seguradora Z. a 30/05/2016.

3)Quase 1 ano após a ocorrência do sinistro.

4) O demandante esperou que a condutora do OS assinasse a declaração amigável.

5)A Z. abriu o processo IDS, conforme documento 3, junto a fls. 16, cujo conteúdo dou por reproduzido.

6)Em abril de 2017, o demandante foi informado que o processo não podia prosseguir como IDS, por o sinistro ser do ano de 2015, conforme documento 4, junto a fls. 19, cujo conteúdo dou por reproduzido.

7)O demandante fez participação á demandada a 21/04/2017, conforme documento 5, junto a fls. 22,

8)Cada seguradora remetia o assunto para a sua congénere.

9)A Z. disponibilizou-se para realizar peritagem ao ZE, documento 9, junto a fls. 34, que dou por integralmente reproduzido.

10)Foi realizada peritagem pela demandada a 12/06/2017, conforme documento 10, junto de fls. 35 a 51.

11)Foi comunicado ao demandante que foi efetuada desvalorização de 50% ao para choques, documento 10, a fls. 45.

12)O demandante solicitou a entrega da peritagem do ZE, conforme documentos 12 e 13, de fls. 54 a 58.

13)A demandada acabou por disponibiliza-la, conforme documento junto a fls. 55 verso, cujo conteúdo dou por reproduzido.

14)O relatório de peritagem não identificou o veículo ZE de forma correta, pois é um Y coupé, documentos 1, a fls. 13, e 10, de fls. 35 a sgs.

15)O para choques, com o decorrer do tempo, devido ao material, tem vindo a deteriorar-se.

16)Nas inspeções periódicas realizadas ao veiculo ZE não atestam danos no para choques, documentos 14 e 15, juntos de fls. 60 a 61.

17) O relatório de peritagem não se pronunciou em relação ao dano do resguardo.

18) O demandante solicitou outra peritagem ao veículo ZE, suportando o seu pagamento no valor de 64,80€, documento 18 junto a fls. 68.

19)Os danos no veículo ZE foram avaliados no valor de 1.485,68€, documento 17, de fls. 62 a 66.

20)O demandante ficou nervoso.

21) Após a abertura do proc. IDS, pela seguradora Z., foi solicitado ao demandante a indicação de data para realização de peritagem, o que resulta do seu email de 31/05/2016, documento 3, junto a fls. 16.

22)Só a 20/04/2017 o demandante contatou a Z. para agendar a data da peritagem ao veículo, conforme documento 4, junto a fls. 21.

23)Em abril/2017, ou seja, 2 anos após o acidente, a demandada recebeu a reclamação do demandante, documento 7, junto de fls.

24) A demandada assumiu a responsabilidade pelo sinistro, documento 7, junto de fls. 32.

25) A demandada procedeu á realização da peritagem ao veículo ZE, documento 1, junto de fls. 85 a 96.

26)O relatório da peritagem inclui a reportagem fotográfica, documento 1, de fls. 85 verso a 87, identifica e discrimina os danos existentes no veículo.

27) O relatório da peritagem apurou o valor de 566,64€ para reparar os danos do sinistro, documento 1, junto de fls. 85 a 96.

MOTIVAÇÃO:

O Tribunal baseou a convicção na análise de toda a documentação junta, cujo teor considero reproduzido, conjugada com a prova testemunhal produzida em audiência, regras de repartição do ónus da prova e regras da experiência comum.

O demandante prestou declarações, nos termos do art.º 57, n.º1 da L.J.P., relatando a sua versão dos factos.

A testemunha, MB, é mulher do demandante, e foi a pessoa que no dia do acidente conduzia o veículo ZE, motivo pelo qual tem conhecimento pessoal da maioria dos factos. Teve um depoimento isento, esclarecedor e digno de credibilidade, auxiliando na prova dos factos com os n.º 1, 2, 3, e 4.

A testemunha, MT, é colega de trabalho do demandante e foi o autor das fotografias juntas em audiência, fls. 117 e 118. Viu o veículo antes e depois do acidente, o seu depoimento foi claro, coerente e digno de credibilidade, auxiliando na prova dos factos com os n.º 1, 15 e 20.

A testemunha, LC, é colega de trabalho do demandante há largos anos, conhecendo o veículo e a maneira de ser dele. O depoimento foi coerente e digno de credibilidade, 1, 15 e 20.

A testemunha, RP, é familiar do demandante, sabe de alguns factos por visitar assiduamente a casa do demandante e vice-versa, conhecendo bem a família, e o veículo em questão. O depoimento foi coerente, não obstante houve factos que relatou por ouvir dizer ao demandante, nomeadamente os contratempos que sucederam no processo em relação á demandada. Este depoimento foi considerado somente nos factos que teve conhecimento direto, auxiliando na prova dos factos com os n.º1, 15 e 20.

A testemunha, AC, foi o perito averiguador do sinistro, sendo o autor do relatório junto aos autos de fls. 35 a 51 e também de fls. 85 a 96. O seu conhecimento deriva precisamente das funções que executou, tendo um depoimento coerente, claro e esclarecedor, sendo relevante para prova dos factos com os n.º14, 25, 26 e 27.

O facto provado com o n.º 8, resulta das declarações do demandante, conjugadas com a prova documental.

Os factos não provados resultam da ausência de prova.

III- DO DIREITO:

O caso dos autos prende-se com a ocorrência de um sinistro automóvel.

Questões: prescrição, atrasos, danos e indemnização.

Inicia-se a apreciação do assunto que pela lógica processual precede face às demais questões suscitadas (art.º 608, n.º1 do C.P.C.).

A prescrição consiste na extinção do direito pelo seu não exercício, no período de tempo estabelecido por lei (art.º 298, n.º1 e 3 do C.C.). Em termos processuais representa uma exceção perentória, a qual tem como efeito jurídico a absolvição da demandada do pedido (art.º 576, n.º 3 e 579, ambos do C.P.C.).

A presente ação visa apreciar a responsabilidade civil por danos, ocorridos no veículo automóvel, propriedade do demandante, na sequência de um acidente, situação regulada pelo disposto no art.º 483 e sgs do C.C. conjugado com as disposições aplicáveis do C. da Estrada.

Nos termos do art.º 498, n.º 1 do C.C. o direito á indemnização considera-se prescrito no prazo de 3 anos a contar da data em que o lesado teve conhecimento do direito que lhe compete, embora com desconhecimento da pessoa responsável e da extensão integral dos danos.

Nos termos do art.º 43, n.º 8 da LJ.P. determina-se que a apresentação do requerimento inicial implica a interrupção da prescrição, nos termos gerais. Ora este preceito estabelece um desvio face ao disposto no art.º 323, n.º1 do C.C., uma vez que a interrupção ocorre "ex vi legis", logo no momento da apresentação do requerimento, independentemente da sua ocorrência ou da sua alegação pela demandada de já ter prescrito. Acrescenta-se que a LJP é uma norma especial face ao disposto no conteúdo das normas do CPC, pelo que prevalecerá sobre as normas que se refiram a este assunto.

Assim, tendo em consideração que o facto danoso ocorreu no dia 5/06/2015 e a data da interposição desta ação foi a 4/06/2018, interrompeu-se o prazo prescricional, precisamente no último dia para o fazer.

Em relação ao assunto principal, o sinistro automóvel, a demandada acabou, após realização de peritagem ao veículo, por assumir a responsabilidade por aquela ocorrência, conforme admitiu na sua contestação, e também resulta do documento 13, junto a fls. 58.

Contudo, existe uma divergência nomeadamente em relação ao valor a atribuir ao dano sofrido.

Resulta do art.º 562 do C.C. que quem estiver obrigado a reparar o dano, deve reconstituir a situação que existiria, senão tivesse verificado o evento que obriga a reparação. No caso concreto, o demandante não pediu a reparação do veículo, conforme resulta do seu pedido, o que equivaleria á reconstituição natural, optou antes por ser indemnizado pela quantia que vem reclamar (art.º 566 do C.C.).

Quanto á peritagem, conforme resultou das declarações do perito que procedeu á averiguação do sinistro, a testemunha AC, o veículo constante do relatório é efetivamente o do demandante, para atestar tal facto consta a matrícula do mesmo. Não obstante na descrição do mesmo cometeu um lapso, identificou incorretamente o modelo do veículo, sendo um ….. Y coupé em vez do P coupé. Este lapso apenas tem um senão, pode importar uma diferença no preço da peça, nada mais, conforme assim admitiu. Quer isto dizer que o veículo em consequência do acidente sofreu somente os danos no lado direito, junto ao farol e sensivelmente ao meio, o que também resulta da prova testemunhal, nomeadamente de MB, MT e LC.

Todavia, na data da realização da peritagem, foi apurado que o para choques apresentava danos que não se coadunavam com a descrição do sinistro, nomeadamente os danos existentes no lado esquerdo, que seriam superiores, assim como na zona lateral traseira do veiculo junto ao guarda-lamas, como foi assinalado na reportagem fotográfica que faz parte da peritagem, nomeadamente a fls. 37 e 39, e foi por este motivo que foi desvalorizado em 50%. Contrariamente ao que o demandante alega foi-lhe explicado o motivo, porém o demandante não concorda com esse facto.

Ora resulta do disposto no art.º 563 do C.C. que consagra a teoria da causalidade adequada na sua formulação negativa que a obrigação de indemnizar só existe em relação aos danos que o lesado não teria sofrido se não fosse a lesão.

Quer isto dizer que se “deve atender apenas aos danos que em concreto o facto ilícito tenha causado, e não a todos que sobrevenham. O nexo de causalidade entre o facto e o dano desempenha uma dupla função de pressuposto da responsabilidade civil e da medida da obrigação de indemnizar”, in Almeida Costa, Obrigações, 4ª ed., 397.

De facto resulta da experiência comum que com o passar do tempo os danos podem vir a agravar-se, o que as testemunhas, LC e RP, assim bem o explicaram, relatando as consequências da trepidação resultante da movimentação constante do veiculo e exposição do mesmo ao tempo. Contudo, estas consequências não resulta diretamente do sinistro, mas são danos que se verificaram principalmente devido á incúria do demandante, pois na realidade o mesmo esteve um ano para realizar a participação do sinistro e outro ano para marcar a peritagem, o que resulta da vasta documentação que forneceu aos autos, assim como o afirmou em declarações que voluntariamente prestou em audiência, nomeadamente esclareceu que primeiramente está a sua vida, família e o trabalho, e só posteriormente vem a resolução deste facto, embora seja algo que o incomoda.

Esclarece-se, ainda, que foi tido em consideração a demora na assinatura da declaração amigável, contudo tal facto também não é imputável á demandada, mas quanto muito á condutora do OS, e sendo pessoas distintas, não deve a demandada ser responsável por algo que em nada contribuiu. Para além disso, o demandante podia perfeitamente ter participado o sinistro á sua companhia sem ter de esperar pela assinatura da dita declaração, algo que, também, resulta das explicações dadas pela testemunha, AC, e que o demandante acabou por reconhecer que lhe foi dito por uma das companhias de seguro.

Depois, é preciso não esquecer o espaço de tempo que o demandante demorou para marcar a peritagem, praticamente um ano após a participação do sinistro, pois não tinha tempo para dispensar a este ato, o qual é necessário para a resolução do caso, tal como reconheceu em declarações.

Quer isto dizer que as consequências que ao longo dos anos têm agravado o dano não podem ser imputadas á demandada, mas sim ao próprio lesado, e como tal tem de acatar as suas responsabilidades.

Posto isto, não foi feita prova que os danos existentes no lado esquerdo do para choques do veiculo ZE sejam de outro sinistro, mas que resultam do agravamento do dano, o qual no caso concreto, atendendo a todo o circunstancialismo ocorrido, é diretamente imputável ao demandante e não há demandada.

Quanto ao outro dano que alega, o resguardo, não resulta da própria declaração amigável haver qualquer problema no resguardo, pois do constante da mesma apenas refere o para choques, veja-se o documento 2, de fls. 14 a 15, pelo que não existe nexo de causalidade entre o facto e o dano (art.º 563 do C.C.).

Para além disso, das declarações que o demandante prestou referiu que caiu uma peça do veículo, contudo não conseguiu explicar o que é, nem a relação desta com o sinistro, para além disso, mais nenhuma das testemunhas o referiu, pelo que não pode ser considerado.

Assim, analisando os dois orçamentos apresentados, há efetivamente alguma diferença de preços, pois o modelo do veículo, também, difere, facto que tem influência no valor das peças, o que resulta do senso comum. Para além disso, o orçamento pedido pelo demandante, documento 18 de fls. 62 a 66, foi realizado quase um ano após a peritagem, tal facto implica existir uma atualização de preços, quer em relação a peças, quer em relação á mão-de-obra necessária á reparação, o que sucede em regra anualmente, como resulta da experiência comum. Por fim, não se compreende que não se contabilize o IVA, o qual é obrigatório a sua inclusão, já que todo o serviço de reparação importa tal obrigação fiscal, algo que o demandante deve suportar ao proceder á reparação do veiculo.

Não obstante, o preço mais atualizado é o mais adequado, pois tal resulta do erro de identificação do veiculo, facto que motivou que o demandante pedisse um 2º orçamento, embora deva ser somente considerado 50%, tal como foi realizado no orçamento derivado da peritagem. Assim, deve a demandada suportar a quantia de 878,52€.

Quanto á despesa referente ao pedido de novo orçamento, documento junto a fls. 68, foi solicitado pelo demandante para aferir e corrigir o valor do engano constante do orçamento na identificação do modelo do veículo ZE, o qual, como já se referiu tem implicações no valor das peças. Na realidade, este documento é uma fatura, paga pelo demandante, na quantia de 64,80€, na sequência da assunção do sinistro pela demandada, pelo que é justo que seja repercutido no valor da indemnização, enquanto dano material.

Quanto ao pedido por danos não patrimoniais o demandante alega ter sofrido momentos de angústia, nervosismo, e perturbações que o fizeram sofrer.

Nos termos do art.º 496, n.º 1 do C.C. apenas são ressarcíeis aqueles que pela sua gravidade merecem a tutela do direito, isto significa que o direito põe a tónica na gravidade do dano, pelo que embora possam existir danos, nem todos têm gravidade suficiente para serem indemnizáveis.

No caso concreto, foi apurado que devido á maneira de ser do demandante, meticuloso, os atrasos tem-no incomodado ficando nervoso com o assunto, o que transparece pois não para de falar neste assunto, tal como que foi referido pelos colegas de trabalho, MT e LC, bem como pelo familiar RP. Não obstante, todos reconhecem que o demandante e família, têm outro veículo, e durante este período têm sempre usado o veículo ZE, embora tenha danos.

Quer isto dizer que apesar de ser algo que o incomode, não tem a dignidade necessária para o direito, para que seja ressarcido, acrescenta-se que, nos nossos dias a dias, há sempre situações que nos incomodam, que nos aborrecem chegando a repercutir-se no sistema nervoso causando irritações, contudo para o direito não são suficientemente graves, significativas, para serem indemnizáveis, motivo pelo qual se declina.

DECISÃO:

Nos termos expostos, julga-se a ação parcialmente procedente, pelo que se condena a demandada no pagamento da quantia de 943,32€, acrescida dos juros, á taxa legal, até efetivo pagamento.

CUSTAS:

Atendendo ao decaimento na ação em 50%, são da responsabilidade do demandante, pelo que deve suportar o valor de 35€ (trinta e cinco euros) no prazo de 3 dias, sob pena de lhe ser aplicada a sobretaxa diária no valor de 10€ (dez euros), (art.º 10 da Portaria n.º 1456/2001 de 28/12, na redação atualizada).

Proceda-se ao reembolso da demandada.

Proferida e notificada nos termos do art.º 60, n.º 2 da L.J.P.

Lisboa, 29 de outubro de 2018

A Juíza de Paz

(redigida pela signatária, art.º 131, n.º 5 do C.P.C.)

(Margarida Simplício)