Sentença de Julgado de Paz
Processo: 141/2018-JPPRT
Relator: CRISTINA BARBOSA
Descritores: VENDA DEFEITUOSA
Data da sentença: 07/18/2018
Julgado de Paz de : PORTO
Decisão Texto Integral: OBJECTO DO LITÍGIO
O Demandante intentou a presente acção declarativa, enquadrável na alínea i) do nº 1 do art.º 9º da Lei n.º 78/2001 de 13 de Julho, pedindo a condenação da Demandada:
A) no pagamento do preço dispendido pelo Demandante na aquisição do telemóvel ---------- ---- de cor preta, refª A, no valor de € 128,19, declarando-se resolvido o contrato;
B) no pagamento de €100,00 por deslocações efectuadas pelo Demandante não só à loja como ao Julgado de Paz do Porto;
C) nos juros vencidos e vincendos a partir da reclamação do equipamento (03/10/2017), data em que efectivamente o Demandante não usufrui do bem que pagou;
D) ao pagamento das custas e de procuradoria condigna.

A Demandada, devidamente citada, não apresentou contestação, mas fez-se representar em audiência de julgamento pela sua ilustre mandatária, a qual se realizou com observância do legal formalismo, consoante resulta da respectiva acta.
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O Julgado de Paz é competente em razão da matéria, do território e do valor que se fixa em € 228,19 – artºs 297º nº1 e 306º nº2, ambos do C.P. Civil.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias (a Demandada por representação – artº 25º do C.P. Civil) e são legítimas.
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FACTOS PROVADOS COM INTERESSE PARA A DECISÃO DA CAUSA
A. O Demandante, em 24 de Março de 2017, comprou na loja on line B, um equipamento de telemóvel ----------- ----- de cor preta, Refª A, pelo preço de € 128,19.
B. A encomenda foi expedida no dia 24 de Março de 2017 por CTT Expresso, tendo sido atribuído o nº encomenda C entregue no dia 27 de Março de 2017.
C. De 27 de Março ao dia 3 de Outubro do mesmo ano, o equipamento funcionou sempre bem.
D. Em Outubro de 2017, o equipamento avariou.
E. O Demandante deslocou-se à loja física da Demandada no --------- em D - Gondomar, onde reclamou da avaria e deixou o equipamento, sem que lhe fosse facultado um equipamento de substituição.
F. Em 9 de Outubro, o Demandante foi chamado à loja da Demandada no ---------- em D - Gondomar, e foi informado que a avaria do equipamento não estava a coberto pela garantia, segundo informação da empresa E, sita na Amadora.
G. A avaria reportada era que o equipamento não carregava a bateria e quando carregava esta tinha pouca autonomia.
H. A referida empresa E refere no relatório técnico que: “Na sequência da verificação feita ao equipamento detectam-se vestígios de utilização indevida (pistas danificadas no conector de carga) passíveis de causar avarias de carácter aleatório no terminal. A anomalia reportada pelo Cliente está directamente relacionada com os danos encontrados, pelo que não é possível a reparação da garantia de fabricante. Aplica-se o orçamento para substituição da placa.
I. Juntando também uma proposta de orçamento para reparação no valor de € 85,66 a que acrescia IVA para substituição da referida placa.
J. O Demandante reclamou directamente no site da B em 23/10/2017, sem qualquer resposta.
K. Tendo também reclamado directamente no Livro de Reclamações da Loja da Demandada no -------- em -------- - Gondomar, não tendo logrado obter qualquer resposta.
L. A atitude da Demandada causou transtornos e aborrecimentos ao Demandante.
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FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO:
Os factos assentes resultaram da conjugação dos documentos constantes dos autos com a testemunha apresentada pelo Demandante, F, que é Colega de profissão do Demandante e que o acompanhou nas reclamações feitas por aquele junto da Loja da Demandada.
As testemunhas apresentadas pela Demandada, limitaram-se a referir o que dizia o relatório, não sendo nenhuma delas da área das reparações, não tendo tido qualquer intervenção directa no apuramento da avaria do telemóvel e nessa medida, não conseguiram esclarecer este tribunal sobre essa matéria.
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ENQUADRAMENTO JURÍDICO DA CAUSA:
Conforme se apurou, o Demandante celebrou com a Demandada um contrato de compra e venda em 24 de Março de 2017 de um telemóvel ---------- ----- de cor preta, refª A.
Esta relação contratual qualifica-se como uma relação de consumo, à qual se aplica a Lei de Defesa do Consumidor, Lei nº 24/96, de 31 de Julho e o D.L. nº 67/2003, de 8 de Abril, que procedeu à transposição para o direito interno da Directiva nº 1999/44/CE, de 25 de Maio, relativa a certos aspectos da venda de bens de consumo e das garantias a ela referidas, devendo ainda ter-se em conta o regime geral da responsabilidade contratual - art.s 798º e seg.s do C.Civil.
Dispõe o n.º 1 do artigo 4.º do supra citado D.L. que “em caso de falta de conformidade do bem com o contrato, o consumidor tem direito a que esta seja reposta sem encargos, por meio de reparação ou substituição, à redução adequada do preço ou à resolução do contrato”, clarificando o n.º 5 do mesmo artigo que “o consumidor pode exercer qualquer dos direitos referidos nos números anteriores, salvo se tal se manifestar impossível ou constituir abuso de direito, nos termos gerais”.
Dispõe ainda o n.º 1 do artigo 2.º do D.L. n.º 67/2003 que “o vendedor tem o dever de entregar ao consumidor bens que sejam conformes com o contrato de compra e venda”, presumindo-se que os bens de consumo não são conformes com o contrato se, entre outros factos, se verificar que os bens não apresentam “as qualidades e o desempenho habituais nos bens do mesmo tipo e que o consumidor pode razoavelmente esperar, atendendo à natureza do bem (…)” (alínea d) do nº 2 do mesmo artigo).
Analisemos agora a pretensão do Demandante, tendo em conta apenas o redigido nas alíneas a) a d) do petitório: a resolução do contrato respeitante à aquisição do telemóvel ------------- -------- de cor preta, o pagamento de despesas com deslocações e juros vencidos e vincendos a partir da reclamação do equipamento (03/10/017), custas e procuradoria condigna.
A Demandada não apresentou contestação, meio próprio através do qual poderia deduzir a sua defesa, nos termos previstos no artº 574º nº 1 do C. P. Civil, sendo certo que é na contestação que se deve tomar posição definida perante os factos que constituem a causa de pedir invocada pelo Demandante ou seja, era na contestação que a Demandada poderia alegar e provar o mau uso dado ao telemóvel pelo Demandante.
Acresce que, pelo facto do telemóvel ter as pistas danificadas no conector de carga, as quais se situam no interior do mesmo, não permite concluir que tal seja devido a mau uso do equipamento, designadamente que tenha o carregador sido usado com violência ou tenha sido utilizado ao contrário, podendo ter outras causas, como por exemplo, a fraca qualidade do material em causa e daí não ter sido ilidida a presunção de desconformidade deste bem do consumo para o fim a que se destina, dado ter ficado provado que o equipamento não carregava a bateria e quando carregava esta tinha pouca autonomia.
Por sua vez, a resolução do contrato pode fazer-se mediante declaração à outra parte – prescreve o artº 436º do Cód. Civil., tendo efeito retroactivo, salvo se a retroactividade contrariar a vontade das partes ou a finalidade da resolução – nº1 do artº 434º do citado código, prescrevendo ainda o artº 433 do citado código que: “Na falta de disposição especial, a resolução é equiparada, quanto aos seus efeitos, à nulidade ou anulabilidade do negócio jurídico…”, o que vai de encontro ao já referido artº 436º.
Tendo o Demandante optado pela resolução do contrato, deverá ser restituído o que houver sido recebido por ambos os contraentes: no que concerne ao Demandante tem direito a ser reembolsado da quantia paga de € 128,19 contra a entrega do respectivo equipamento, sendo certo que a Demandada poderá exercer o direito de regresso contra o fabricante, previsto no artigo 7º do Decreto-Lei nº67/2003 de 8 de Abril.
No que concerne às despesas de deslocações, nenhuma prova foi produzida nesse sentido, não obstante o ónus da prova nessa matéria competir ao Demandante, nos termos do artº 342º nº1 do Cód Civil, pelo que terá este pedido de improceder.
S/a quantia de € 128,19, incidirão juros de mora à taxa legal de 4% vencidos desde a citação até cumprimento da obrigação, pois só com aquele acto deu o Demandante a conhecer à Demandada a declaração de resolução do contrato (artgs 804º, 805º nº1 e Portaria nº 291/2003, de 08.04.
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DECISÃO
Pelo exposto, julgo a acção parcialmente procedente e, em consequência, declara-se a resolução do contrato de compra e venda do telemóvel ---------- ---- de cor preta, refª A, condenando-se esta a restituir ao Demandante o preço por este pago, no valor de € 128,19, mediante a entrega do mesmo à Demandada, acrescida de juros de mora à taxa legal de 4% vencidos desde a citação até cumprimento da obrigação, absolvendo-a do demais peticionado.
Custas na proporção do decaimento que se fixam em 44% para o Demandante e 56 % para a Demandada, em conformidade com os artº 8º e 9º da Portaria nº 1456/2001 de 28 de Dezembro, não sendo aplicáveis as custas de parte nos julgados de paz, por não estarem previstas na referida Portaria.
Registe e notifique.
Porto, 18 de Julho de 2018
A Juíza de Paz
(Cristina Barbosa)