Sentença de Julgado de Paz
Processo: 524/2015-JPFNC
Relator: LUÍSA ALMEIDA SOARES
Descritores: DIREITOS E DEVERES DOS CONDÓMINOS; QUOTAS DE CONDOMÍNIO;
Data da sentença: 12/15/2017
Julgado de Paz de : FUNCHAL
Decisão Texto Integral: SENTENÇA
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I. RELATÓRIO
A) IDENTIFICAÇÃO DAS PARTES
Demandante: A, NIPC 0000, sito na Rua XXX, Câmara de Lobos, devidamente representado pelo seu administrador legal, a sociedade comercial de administração de condomínios, com a firma “B”, portadora do NIPC 000, e com igual número de matrícula na Conservatória do Registo Comercial do Funchal, com sede na Rua X Funchal.
Demandados: C, titular do NIF 000 e D, titular do NIF 0000, ambos residentes na Rua do X, Câmara de Lobos.
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B) PEDIDO
O Demandante propôs contra os Demandados a presente ação declarativa enquadrada na alínea c) do n.º 1 do artigo 9.º da Lei n.º 78/2001 de 13 de julho, peticionando a condenação destes no pagamento de €4.094,85 euros (quatro mil e noventa e quatro euros e oitenta e cinco cêntimos), a título de capital; a quantia de €1.664,80 euros (mil seiscentos e sessenta e quatro euros e oitenta cêntimos), a título de multa; a título de juros de mora vencidos e vincendos, a quantia no montante que se vier a apurar por simples cálculo aritmético à data do encerramento da audiência de julgamento ou em data posterior aquando do efetivo e integral pagamento da totalidade dos valores pecuniários em dívida pelos réus condóminos; as quotas de condomínio que se mostrarem em dívida até à prolação do despacho saneador sentença ou, em alternativa, até ao encerramento da discussão em audiência de julgamento; a quantia de capital, de multa, de juros de mora vencidos os montantes que vierem a ser apurados à data do encerramento da audiência de julgamento ou em data posterior aquando do efetivo e integral pagamento da totalidade dos valores pecuniários em dívida pelos demandados condóminos; a título de honorários de advogado, a quantia de €1.000,00 euros; no pagamento das custas judiciais, e em procuradoria condigna; no pagamento da sanção pecuniária de €20,00/dia ou, subsidiariamente, no pagamento dos 5% de juros ao ano estabelecidos no artigo 829.º-A, n.ºs 1 e 4, do Código Civil. Mais peticionam que o Tribunal reconheça e declare que a sentença condenatória que vier a ser proferida constitui título bastante para o registo de hipoteca sobre quaisquer bens dos réus (artigo 710.º n.º 1 do Código Civil).
Juntou 7 (sete) documentos.
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A fls. 54 a 76, comunicando o falecimento da Demandada D (ocorrido em 06.03.2014), o Demandante deduziu incidente de habilitação de herdeiros, sendo requeridos C (já Demandado), E, titular do nif 00000 e F, titular do nif 0000, ambos menores de idade e residentes no n.º 7 X, Paris.
A fls. 80 a 82 mostra-se junta cópia não certificada de procedimento simplificado de habilitação de herdeiros sob o n.º 10989/2014 por óbito da Demandada D.
Por despacho de fls. 84, foi ordenada a notificação do Demandado C e a citação dos herdeiros da Demandada D, na pessoa da sua procuradora G, tendo a mesma sido concretizada a fls. 99 e 100 e a fls. 101 e 102, em 28.09.2016, tendo a advertência legal sido feita em 21.10.2016.
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Regularmente citados, os Demandados/habilitados C, E e F, não contestaram, não compareceram à audiência de julgamento para a qual foram notificados e cuja ata lhes foi igualmente notificada, não justificaram as suas faltas, pelo que opera a cominação constante do artigo 58.º, n.º 2 da Lei 78/2001 de 13 de julho, considerando-se confessados os factos alegados no requerimento inicial.
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II- SANEAMENTO
Estão reunidos os pressupostos da estabilidade da instância: o Julgado de Paz é competente em razão da matéria, do objeto, do território e do valor. O processo não enferma de nulidades que o invalidem na totalidade. As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas. Não há exceções, nulidades ou quaisquer questões prévias que cumpra conhecer.
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III- VALOR DA AÇÃO
Fixa-se em €6.759,65 (seis mil, setecentos e cinquenta e nove euros e sessenta e cinco cêntimos) o valor da presente causa (artigos 296.º, 297.º n.º 2, 299.º, 300.º e 306.º do Código de Processo Civil ex vi artigo 63.º da Lei 78/2001 de 13 de julho, com a redação da Lei 54/2013 de 31 de julho).
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IV- OBJETO DO LITIGIO
O objeto do litígio entre as partes circunscreve-se ao (in)cumprimento pelos Demandados das suas obrigações enquanto condóminos.
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V – QUESTÕES A DECIDIR
Nos presentes autos importa apreciar do cumprimento dos Demandados das suas obrigações de condóminos, nomeadamente o pagamento das quotas de condomínio e, na negativa, as consequências daí resultantes.
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VI- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
Com relevância para a decisão da causa, de acordo com a prova documental carreada para os autos, e atenta a cominação constante do artigo 58.º, n.º 2 da Lei 78/2001 de 13 de julho, uma vez que, regularmente citados, os Demandados C, E e F, não contestaram, não compareceram à audiência de julgamento, nem justificaram as suas faltas, pelo que, considerando-se confessados os factos alegados no requerimento inicial:
FACTOS PROVADOS
1. Pela AP. 00000, de 02.10.2009, foi inscrita na Conservatória do Registo Predial de Câmara de Lobos, a aquisição pelos Demandados C e D da propriedade da fração autónoma designada pela letra “F”, 1.º Andar, tipologia T3, sita na Rua do X, Câmara de Lobos, descrito sob o número 0000.
2. Resulta da caderneta predial urbana que a fração identificada em 1. se encontra inscrita sob o artigo matricial 0000 no Serviço de Finanças 0000 de Câmara de Lobos, a favor de C e D, com o valor patrimonial de €153.674,50 determinado no ano de 2015 e o valor patrimonial tributário de €148.120,00.
3. A fração identificada em 1. e 2. tem uma permilagem 73,6900.
4. O pagamento mensal de quotas de condomínio vencia-se até ao dia 8 de cada mês a que o pagamento dissesse respeito e era feito na sede da Administradora do Demandante, sita na Rua X, freguesia de Santa Luzia, concelho do Funchal, após o que seria emitido e entregue o correspondente recibo.
5. No ano de 2010 foi aprovado o orçamento anual que vigorou no período de outubro de 2010 a setembro de 2011, sendo a quota mensal a pagar pelos Demandados no ano de 2010/2011 no valor de €55,37 (cinquenta e cinco euros e trinta e sete cêntimos), estando em dívida nesse período o valor global de €664,44 (seiscentos e sessenta e quatro euros e quarenta e quatro cêntimos).
6. No ano de 2011 foi aprovado o orçamento anual que vigorou no período de outubro de 2011 a setembro de 2012, sendo a quota mensal a pagar pelos Demandados no ano de 2011/2011 no valor de €57,27 (cinquenta e sete euros e vinte e sete cêntimos), estando em dívida nesse período o valor global de €687,24 (seiscentos e oitenta e sete euros e vinte e quatro cêntimos).
7. No ano de 2011, na sequência de processo judicial movido contra os Demandados, cabia-lhes liquidar a quantia de €588,94 a título de custas judiciais.
8. No ano de 2012 foi aprovado o orçamento anual que vigorou no período de outubro de 2012 a outubro de 2013, sendo a quota mensal a pagar pelos Demandados no ano de 2012/2013 no valor de €57,27 (cinquenta e sete euros e vinte e sete cêntimos), estando em dívida nesse período o valor global de €744,51 (setecentos e quarenta e quatro euros e cinquenta e um cêntimos).
9. No ano de 2013 foi aprovado o orçamento anual que vigorou no período de novembro de 2013 a outubro de 2014.
10. No orçamento anual referido em 9. foi aprovada a cobrança de uma quota extraordinária de valor idêntico à quota ordinária de cada fração autónoma cujo vencimento ocorreu em janeiro de 2014.
11. A quota mensal a pagar pelos Demandados nos anos de 2013/2014 era no valor de €49,67 (quarenta e nove euros e sessenta e sete cêntimos), estando em dívida nesse período o valor global de €645,71 (seiscentos e quarenta e cinco euros e setenta e um cêntimos).
12. No ano de 2014 foi aprovado o orçamento anual que entrou em vigor no mês de novembro de 2014, sendo a quota mensal a pagar pelos Demandados no ano de 2014/2015 no valor de €58,77 (cinquenta e oito euros e setenta e sete cêntimos), estando em dívida nesse período o valor global de €764,01 (setecentos e sessenta e quatro euros e um cêntimos).
13. Os Demandados não pagaram as quotas e despesa judicial referida em 5. a 12, nem as quotas que se venceram entre dezembro de 2015 e a presente data.
14. No Regulamento de Condomínio prevê-se que o incumprimento do pagamento da quota de condomínio nos primeiros oito dias após a emissão do aviso de cobrança e das despesas, por período superior a 90 dias após a emissão dos avisos de cobrança, determinará o pagamento de uma multa de valor igual a metade da quota mensal do condomínio.
15. Por declaração de 12.11.2015 (fls. 28), a empresa de administração de condomínios, B na qualidade de administradora do Condomínio Demandante, aceitou a proposta de honorários do mandatário subscritor da presente ação, no valor de €1.000,00 (mil euros)
16. Em 31.07.2014, teve lugar na Conservatória de Câmara de Lobos, procedimento simplificado de habilitação de herdeiros sob o n.º 0000, sendo habilitados C, E e F como únicos Herdeiros de D, respectivamente, seus cônjuge e filhos.
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VII – FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO
Com base na matéria de facto provada, cumpre apreciar os factos e aplicar o direito.
A presente ação funda-se no incumprimento de uma obrigação dos condóminos, enquadrando-se, em termos de competência material deste Tribunal, na al. c), do n.º 1, do artigo 9.º, da Lei n.º 78/2001, de 13 de julho.
O n.º 1 do artigo 1420.º do Código Civil, relativo à propriedade horizontal, define que condómino é o proprietário exclusivo da fração e comproprietário das partes comuns.
É função do administrador de condomínio, entre outras, cobrar receitas e exigir dos condóminos a sua quota-parte nas despesas aprovadas, conforme previsto no artigo 1436.º, alíneas d) e e) do Código Civil, enquadrando-se nessa categoria as quotas ordinárias e extraordinárias de condomínio, a pagar por cada condómino.
Resulta da matéria de facto provada que, os Demandados são proprietários da fração autónoma designada pela letra “F”, 1.º Andar, tipologia T3, pertencente ao prédio urbano sita na Rua do X, freguesia e concelho de Câmara de Lobos, constituído em regime de propriedade horizontal, sendo a referida fração inscrita na matriz predial urbana sob o artigo 5855 da freguesia de Câmara de Lobos e descrita na competente Conservatória do Registo Predial do Funchal, sob o número 00000000, da freguesia de Câmara de Lobos.
Decorre do n.º 1 do artigo 1424.º do Código Civil que os condóminos estão obrigados a concorrer para as despesas necessárias à gestão, fruição e conservação das partes comuns do edifício na proporção do valor das suas frações. Conforme se entendeu, entre outros, no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa (processo 6723/2008-6, em www.dgsi.pt) “os condóminos (…) têm a obrigação irrenunciável de comparticipar nos encargos decorrentes da conservação e fruição das partes comuns, bem como relativos ao pagamento de serviços de interesse comum, ou seja, não se podem escusar ou recusar o cumprimento desse dever jurídico, quer em termos totais como parciais.”
No caso sub judicie, os condóminos do prédio em causa deliberaram as contribuições devidas, a cargo dos Demandados nos termos dos orçamentos aprovados. Nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 1.º do Decreto Lei 268/94, de 25.10, as deliberações devidamente consignadas em acta são vinculativas tanto para os condóminos como para os terceiros titulares de direitos relativos às fracções.
Resultou provado que, na qualidade de condóminos, os Demandados não efetuaram o pagamento das quotas ordinárias de condomínio relativas ao período desde outubro de 2010 até novembro de 2015, as custas judiciais no valor de €588,94 e a quota extraordinária com vencimento em janeiro de 2014, de valor idêntico à quota ordinária fixada para o ano de 2013/2014, no valor de €49,67.
Face à alegação do Demandante de que os Demandados não efetuaram o pagamento daquelas quotas, competia aos mesmos, nos termos dos artigos 342.º, n.º 2 e 799.º ambos do Código Civil, provar que a falta de cumprimento ou o cumprimento defeituoso, não procederam de culpa sua ou ainda provar qualquer exceção que obstasse à apreciação do mérito da causa.
Contudo, no presente caso, não foi alegado nem resultou provado pelos Demandados qualquer facto impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor, nomeadamente que tenham efetuado o pagamento daqueles valores, pelo que nos encontramos perante uma situação de incumprimento. Antes sim, os Demandados confessaram os factos alegados no requerimento inicial, nos termos do artigo 58.º n.º 2 da lei 78/2001 de 13 de julho, atendendo a que sendo citados, não contestaram, não compareceram na audiência de julgamento para a qual foram notificados e não justificaram a sua falta.
Pelo exposto, condena-se os Demandados no pagamento ao Demandante da quantia de €4.094,85 (quatro mil e noventa e quatro euros e noventa e oitenta e cinco cêntimos.
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Peticiona ainda o Condomínio Demandante a condenação dos Demandados nos juros de mora vencidos sobre as quotas em dívida e ainda na multa de 50% estipulada no regulamento do condomínio para o atraso pelo pagamento.
Conforme resulta do artigo 805.º, n.º 1 do Código Civil o devedor fica constituído em mora depois de ter sido judicial ou extrajudicialmente interpelado para pagar. Por outro lado o n.º 2, alínea a) do mesmo diploma estabelece que há mora do devedor independentemente de interpelação, se a obrigação tiver prazo certo.
Resulta dos factos provados que as quotas em dívida se venciam até ao dia 8 de cada mês a que o pagamento dissesse respeito.
O artigo 7.º alínea a) do Regulamento do Condomínio estipula que constituem obrigações dos condóminos “pagar a quota de condomínio anualmente aprovada pela assembleia de condóminos, nos primeiros 8 (oito) dias após a emissão do aviso de cobrança”.
Estamos pois perante obrigações com prazo certo, pelo que serão devidos juros de mora desde a respetiva data de vencimento de cada uma das quotas mensais.
Porém, mais peticiona o Demandante a condenação dos Demandados no pagamento da quantia de €1.664,80 (mil seiscentos e sessenta e quatro euros e oitenta cêntimos), a título de multa regulamentar pelo não pagamento atempado das quotas de condomínio.
Estipula o artigo 19.º n.º 1 do regulamento do condomínio que “o incumprimento do disposto na alínea a) e d) do artigo 7.º, por período superior a 90 dias após a emissão dos avisos de cobrança, determinará o pagamento de uma multa de valor igual a metade da quota mensal do condomínio”.
No presente caso estamos perante uma penalização resultante da mora no pagamento das despesas do condomínio, a suportar pelo condómino incumpridor, contrariamente ao que sucede no caso da sanção pecuniária compulsória, prevista no artigo 829.º-A do Código Civil, que por sua vez procura assegurar o cumprimento da obrigação.
Conforme resulta dos artigos 810.º e 811.º do Código Civil, trata-se de uma cláusula penal moratória, que visa ressarcir o condomínio pela mora dos condóminos no pagamento das quotas.
Por sua vez, dispõe o n.º 2 do artigo 811.º do Código Civil que “O estabelecimento da cláusula penal obsta a que o credor exija indemnização pelo dano excedente, salvo se outra for a convenção das partes.”
Logo, uma vez que o Demandante peticiona a cláusula penal moratória estabelecida no artigo 19.º, n.º 1 do Regulamento do Condomínio Demandante e que aí não se prevê a sua cumulação com os juros de mora, não podem, sob pena de duplicação de indemnizações sobre a mesma quantia, os Demandados ser condenados a pagar igualmente os peticionados juros moratórios sobre as quotas em dívida. Acresce que, sendo o pagamento de quotas uma obrigação de cariz pecuniário, o Demandante apenas poderá ter direito aos juros moratórios provenientes da cláusula penal estabelecida no Regulamento, conforme estipula o artigo 806.º, n.º 2, 2.ª parte do Código Civil.
Assim, o pedido de juros de mora vencidos e vincendos sobre a quantia de capital (quotas de condomínio) tem necessariamente de improceder.
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Vejamos agora se o valor a título de penalidade peticionada pelo atraso no pagamento respeita o limite previsto no artigo 1434.º, nº 2 do Código Civil.
No Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 20.06.2011 (processo 1975/08.7TBPRD-B.P1, pesquisável em www.dgsi.pt), decidiu-se que “I- O nº 2 do artigo 1434° do CC, tem carácter imperativo e não supletivo, dado que ali se estipula que o montante das penas em cada ano nunca excederá a quarta parte do rendimento colectável anual da fracção do infractor, sendo que, o uso da expressão nunca, significa que esta meta tem carácter imperativo. II - A aplicação de multas pelo atraso no pagamento das quotizações de condomínio, uma vez que se encontra prevista no Regulamento do Condomínio, a partir da data da respectiva aprovação em Assembleia, é vinculativa para todos os condóminos, mas desde que o Regulamento respeite a lei, no caso, o referido nº 2 do artigo 1434° do CC. III - Para apurar esse rendimento colectável, aplica-se o disposto no artº 6º, nº 1, DL 422-C/88 (Código da Contribuição Autárquica)”.
A norma do artigo 1424.º do Código Civil fixa um limite sancionatório para o condomínio, perante o atraso do condómino no pagamento da contribuição que lhe é devida, mas a expressão “nunca” prevista no n.º 2 não deixar cair no seu puro arbítrio o montante dessa sanção.
Pires de Lima e Antunes Varela (em Código Civil Anotado, vol. III, pág. 450) em anotação a este normativo, explicam que a própria limitação do montante da sanção pecuniária aplicável se insere numa linha geral de orientação do direito civil vigente, sendo o caso do disposto nos artigos 812.º, 494.º e outros.
A aplicação de multas pelo atraso no pagamento das quotizações de condomínio, uma vez que se encontra prevista no Regulamento do Condomínio, a partir da data da respetiva aprovação em Assembleia é vinculativa para todos, mas nunca pode exceder a quarta parte do rendimento coletável anual da fração do infrator.
O Demandante, notificado para o efeito, juntou cópia da caderneta predial da fração dos Demandados, verificando-se que a sua inscrição na matriz é de 2010 e tem um valor patrimonial atual (CIMI) de 153.674,50€, determinado no ano de 2015 e se destina a habitação.
Conforme se decidiu no Acórdão referido, “na caderneta predial já não surge o “rendimento colectável”, mas tão só o “valor patrimonial”, os quais constituem conceitos diversos.
Como explica Sandra Passinhas, em “Assembleia de Condóminos e o Administrador na Propriedade Horizontal”, pág. 273, “a noção de rendimento colectável era dado pelo artigo 3.º, n.º 1 do antigo Código de Contribuição Predial e corresponde ao valor da renda dos prédios arrendados e, quanto aos não arrendados, à utilidade equivalente que deles obtivesse ou tivesse possibilidade de obter quem pudesse usufruir ou usar os mesmos. Com o Código de Contribuição Autárquica, de 1/1/1989, o contribuinte passou a ser tributado pelo seu património e não pelo rendimento que obtinha dos seus prédios, isto é, a base de cálculo do imposto cobrado passou a ser o valor patrimonial atribuído ao imóvel (...). O conceito de rendimento colectável não coincide com o conceito de valor patrimonial tributário e que o legislador – não desconhecendo a diferença conceitual -, não alterou nem acompanhou estas alterações e alterar, por sua vez, a redacção daquele n.º 2, perante as nova normas tributárias entradas em vigor -, pelo que devemos entender que se pretendeu manter o limite das penas por referência ao valor colectável e não ao valor patrimonial tributário. (...) É que esta norma, inserida na ordem jurídica civilística em sede de propriedade horizontal, permitindo que a assembleia de condóminos fixe penas pecuniárias até à quarta parte do rendimento colectável anual da fracção do infractor, contém um conceito aferido a um determinado período de tempo (anual), que não coincide, logicamente, com o valor patrimonial. E sendo assim, então há que atender às normas acima expostas, que estabelecem um critério relacional entre rendimento colectável e valor patrimonial, tanto mais que o CIM sobre Imóveis manteve o conceito de tributação fiscal sobre o valor patrimonial atribuído ao imóvel que havia sido adoptado pelo CCA – conf. art.s 1º e 7º do CIMI e 1º e 7º do CCA”.
No Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 30.09.2014 (em www.dgsi.pt), decidiu-se que “III. O modo mais adequado de proceder ao cálculo do rendimento colectável é multiplicar o valor patrimonial tributário da fracção por 0,15. IV - As penas de que fala o nº 2 do art. 1434.º não podem exceder ¼, ou 25%, desse rendimento”.
Para proceder ao cálculo do limite das sanções dos condóminos, no caso que nos ocupa, da certidão do registo predial consta como valor patrimonial tributário €148.120,00. Operando o cálculo, conclui-se que o rendimento coletável da fração dos Demandantes será de €22.218,00 (€148.120,00 x 0,15), sendo que o valor da penalidade não pode exceder 25% desse rendimento, ou seja, €5.554,50.
Pelo Demandado foi peticionado o montante de €1.664,80 (mil seiscentos e sessenta e quatro euros e oitenta cêntimos), a título de multa prevista no Regulamento do Condomínio, pelo que da equação enunciada conclui-se que o valor peticionado se enquadra no limite do n.º 2 do artigo 1434.º do Código Civil e, em consequência, tem necessariamente de proceder.

Nestes termos, à quantia de quotas em dívida até à presente data, acresce a quantia de €1.664,80 (mil seiscentos e sessenta e quatro euros e oitenta cêntimos), a título de penalidade devida pelo atraso no pagamento, assim como a penalidade entretanto vencida até à presente data.
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O Demandante peticiona ainda a condenação dos Demandados no pagamento das quotas que se mostrarem em dívida até à prolação do despacho saneador sentença ou, em alternativa, até ao encerramento da discussão em audiência de julgamento e a quantia de capital, multa e juros de mora vencidos que vierem a ser apurados à data do encerramento da audiência de julgamento ou em data posterior aquando do efetivo e integral pagamento da totalidade dos valores pecuniários em dívida pelos Demandados.
Tratando-se de prestações periódicas, como é o caso das prestações de condomínio dos autos, a condenação pode compreender as prestações já vencidas e as que se vencerem enquanto subsistir a obrigação (artigo 557.º, n.º 1 do Código de Processo Civil, aplicável ex vi artigo 63.º da Lei 78/2001, de 13 de julho, com a redação da Lei 54/2013 de 31 de julho).
Uma vez que não consta dos autos qual o valor das quotas vencidas no período de dezembro de 2015 até à presente data, não podendo desse modo determinar-se o montante das mesmas e da penalidade a pagar pelos Demandados, relega-se para liquidação ulterior a determinação do valor a pagar pelos Demandados relativamente a quotas e penalidade vencidas desde dezembro de 2015 e até efectivo e integral cumprimento, nos termos do disposto no artigo 609.º, n.º 2 do Código de Processo Civil (aplicável ex vi artigo 63.º da Lei 78/2001 de 13 de julho, com a redação da Lei 54/2013 de 31 de julho).
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Mais peticiona o Demandante a condenação dos Demandados no pagamento de €1.000,00 a título de honorários do seu Mandatário pelo patrocínio na presente ação.
Resultou provado que, por declaração de 12.11.2015 (fls. 28), a empresa de administração de condomínios, B, na qualidade de administradora do Condomínio Demandante, aceitou a proposta de honorários do mandatário subscritor da presente ação, no valor de €1.000,00 (mil euros).
Neste Tribunal o patrocínio por Advogado, Advogado Estagiário ou Solicitador não é obrigatório, salvo nos casos previstos (artigo 38.º da Lei 78/2001 de 13 de julho), porém as partes têm direito a esse patrocínio e a fazer-se representar em juízo, tendo com isso naturalmente gastos.
Atendendo a que por força do disposto no artigo 63.º da Lei 78/2001, de 13 de julho, com a redação da Lei 54/2013 de 31 de julho o Código de Processo Civil é aplicável subsidiariamente nos Julgados de Paz, poderia ponderar-se enquadrar os honorários peticionados no âmbito dos artigos 529.º n.º 4 e 533.º do Código de Processo Civil, onde se encontra previsto que as custas da parte vencedora são suportadas pela parte vencida, discriminando-se no n.º 2 deste ultimo normativo as despesas que se integram nas custas de parte e na alínea d) prevendo-se em concreto os honorários do Mandatário e as despesas por ele efetuadas.
O mesmo se diga quanto ao disposto no artigo 25.º do Regulamento das Custas Processuais, que dispõe no “1 - Até cinco dias após o trânsito em julgado ou após a notificação de que foi obtida a totalidade do pagamento ou do produto da penhora, consoante os casos, as partes que tenham direito a custas de parte remetem para o tribunal e para a parte vencida a respectiva nota discriminativa e justificativa. 2 - Devem constar da nota justificativa os seguintes elementos: (…) d) Indicação, em rubrica autónoma, das quantias pagas a título de honorários de mandatário ou de agente de execução, salvo quando as quantias em causa sejam superiores ao valor indicado na alínea c) do n.º 3 do artigo 26.º; e) Indicação do valor a receber, nos termos do presente Regulamento.
Estaríamos assim no campo das custas de parte, que deveriam ser suportadas pelos Demandados, após o envio da respetiva nota discriminativa.
Sucede porém, que os Julgados de Paz têm uma lei própria quanto a custas, a Portaria n.º 1456/2001, de 28 de dezembro, onde as custas correspondem a uma taxa fixa de 70,00€ por cada processo tramitado, não prevendo outro valor, nem custas de parte.
E será nos termos da Portaria citada, que as custas serão fixadas na presente sentença, não tendo aplicação o Regulamento das Custas Processuais.
Sempre se dirá que não foi junta aos autos prova da liquidação pelo Demandante dos honorários peticionados, nem tão pouco nota discriminativa do cálculo que lhe esteve subjacente, não havendo desse modo prova de que efetivamente a quantia peticionada seja aquela que o Demandante tenha suportado ou venha a suportar a título de honorários, prova que lhe competia fazer (artigo 342.º, n.º 1 do Código Civil).
Pelo exposto, nesta parte, improcede, o pedido.
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Peticiona ainda o Demandante a condenação dos Demandados no pagamento de uma sanção pecuniária compulsória no valor de € 20,00 ao dia, indicando as razões que estiveram subjacentes ao cálculo de tal quantia.
Ora, decorre do artigo 829.º-A, n.º 1 do Código Civil que “Nas prestações de facto infungível negativo ou positivo (…), o tribunal deve, a requerimento do credor, condenar o devedor ao pagamento de uma quantia pecuniária por cada dia de atraso (…).”
Como resulta do n.º 2 deste mesmo normativo, entendemos que o fim da sanção pecuniária compulsória é coagir o devedor ao cumprimento da obrigação e não a indemnização do credor pelo atraso no cumprimento da obrigação.
No caso que nos ocupa, trata-se do pagamento de uma quantia pecuniária, ou seja, prestação fungível, podendo ser realizada por pessoa diferente do devedor, sem que resulte qualquer prejuízo para o interesse do seu credor, não podendo ter lugar a condenação dos Demandados no pagamento de uma sanção pecuniária compulsória nos termos peticionados, ou seja, no valor de €20,00 ao dia, pelo que improcede também nesta parte o peticionado pelo Demandante.
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Mais peticiona o Demandante que este Tribunal declare que a presente sentença constitui título bastante para o registo de hipoteca sobre quaisquer bens dos Demandados.
Vejamos pois se tem acolhimento o seu pedido ou se é de considerar improcedente.
O artigo 710.º, n.º 1 do Código Civil dispõe que “A sentença que condenar à realização de uma prestação em dinheiro ou outra coisa fungível é título bastante para o registo de hipoteca sobre quaisquer bens, mesmo que não haja transitado em julgado.”
Pode concluir-se assim, que para que o credor possa constituir uma hipoteca nestes termos basta apenas uma sentença condenatória, não sendo necessário qualquer ato do juiz, nomeadamente que tal direito seja declarado em sentença, improcedendo nesta parte o pedido do Demandante por falta de fundamento legal.
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VIII – RESPONSABILIDADE POR CUSTAS:
As custas serão suportadas pelo Demandante e pelos Demandados, em razão do decaimento na proporção respetiva de 15% e 85% (Artigos 527.º, 607.º, n.º 6 do Código de Processo Civil - aplicáveis ex vi artigo 63.º da Lei 78/2001, de 13 de julho, com a redação da Lei 54/2013 de 31 de julho - e artigo 8.º da Portaria n.º 1456/2001, de 28 de dezembro).
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IX- DISPOSITIVO
Nos termos e com os fundamentos invocados, julgo a presente ação parcialmente procedente, e em consequência decido:
1. Condenar os Demandados C, E e F no pagamento ao Demandante A da quantia de € 4.094,85 (quatro mil e noventa e quatro euros e oitenta e cinco cêntimos) a título de quotas em dívida desde outubro de 2010 até novembro de 2015.
2. Condenar os Demandados C, E e F no pagamento ao Demandante A, da quantia de €1.664,80 (mil seiscentos e sessenta e quatro euros e oitenta cêntimos) a título de multa prevista no Regulamento do Condomínio por atraso no pagamento das quotas devidas até novembro de 2015.
3. Condenar os Demandados C, E e F no pagamento ao Demandante A na quantia que se vier a apurar em sede de liquidação de sentença, relativamente às quotas de condomínio e multa prevista no Regulamento do Condomínio que se mostram em dívida desde dezembro de 2015 até efetivo e integral pagamento.
4. Absolver os Demandados C, E e F do demais peticionado.
5. Condenar o Demandante e os Demandados nas custas da presente ação na proporção do respetivo decaimento que se fixa, respetivamente em 15% e 85%.
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Em relação ao Demandante A, proceda-se em conformidade com o artigo 9.º da Portaria n.º 1456/2001 de 28/12, devolvendo-se a quantia de 25,50€ (vinte e cinco euros e cinquenta cêntimos), correspondentes ao seu 15% do decaimento na ação.
Deverão os Demandados C, E e F liquidar a quantia de 25,50€ (vinte e cinco euros e cinquenta cêntimos) correspondentes ao seu decaimento em 85% no prazo de 3 (três) dias úteis, comprovando-o junto deste Tribunal sob a cominação de não o fazendo lhe ser aplicada a cominação prevista na Portaria n.º 1456/2001 de 28/12.
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Registe e notifique e após trânsito em julgado, arquive.
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Funchal, 15 de dezembro de 2017


A Juíza de Paz



Luísa Almeida Soares
(Processei e revi. Art.º 31 n.º 5 CPC/Art.º 18 LJP)