Sentença de Julgado de Paz
Processo: 44/2018-JPLSB
Relator: JOÃO CHUMBINHO
Descritores: DIREITO AÉREO
Data da sentença: 04/03/2018
Julgado de Paz de : LISBOA
Decisão Texto Integral:
SENTENÇA

I - IDENTIFICAÇÃO DAS PARTES
Demandante: 1) A, portadora do cartão de cidadão n.º 0, contribuinte fiscal n.º 0;
2) B e 3) C, todos residentes na Urbanização X, Rua X, n.º 5, r/c esquerdo, 000 Mafra
Demandadas: 1) D., Pessoa Colectiva n.º 0000, com sede na Avenida XXX, Edifício XXXXX, n.º 45, 5.ºA, X, 000000 Lisboa e 2) E, Pessoa Colectiva n.º 000, com sede na Rua XXXXX Sintra.

II - OBJECTO DO LITÍGIO
Os Demandantes intentaram contra as Demandadas uma acção declarativa de condenação, enquadrada na alínea h), do n.º 1, do artigo 9.º, da Lei n.º 78/2001, de 13 de Julho, respeitante a responsabilidade civil contratual e extracontratual, pedindo que este Tribunal condene as Demandadas na quantia de €: 2028,25, correspondente à indemnização por cancelamento de voo e a indemnização pelo pagamento de 1/8 do valor da viagem não usufruído.
Alegaram, para tanto e em síntese, que, em 7 de Agosto de 2018, adquiriram à agência de viagens F, um pacote de férias para dois adultos e uma criança com destino a Varadero, com partida no dia 19 de Agosto e regresso a 27 de Agosto de 2017, operado pela segunda Demandada enquanto operadora turística, tendo esta adquirido as passagens aéreas à D, a ora primeira Demandada. Alegou ainda que, em 18 de agosto às 20 horas, receberam um email da agencia de viagens a referir que o voo agendado para dia 19 de Agosto tinha sido cancelado e alterado para dia 20 de agosto, tendo os Demandantes sido prejudicados com tal situação e com o facto de terem perdido um dia de férias apesar do pagamento desse dia à agência de viagens.
A primeira Demandada, regularmente citada, não contestou, não compareceu na data agendada para a realização do julgamento, nem justificou a falta no prazo legal para o efeito.
A segunda Demandada regularmente citada, contestou, alegando em síntese que contratou com a primeira Demandada, nos termos do qual esta disponibilizava a sua aeronave, e assumia os custos pelo transporte e, portanto, alegou, os danos decorrentes do cancelamento devem-se à conduta da segunda Demandada. Alegou ainda que esteve disponível para restituir o custo da noite não usufruída pelos Demandantes, exigindo em contrapartida uma declaração de que os Demandantes abdicavam de qualquer outra indemnização pelos mesmos factos, o que os Demandantes se recusaram a assinar.
Procedeu-se à realização da audiência de julgamento com observância do legal formalismo, como da acta se alcança.
Cumpre apreciar e decidir.

Verificam-se os pressupostos processuais de legitimidade das partes e de regularidade e validade da instância, não existindo questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito da causa.

III – FUNDAMENTAÇÃO
A prova produzida resulta dos documentos apresentados pelas partes juntos a fls. 4 a 33.
Nos termos do artigo 60.º, da Lei n.º 78/2001, de 13 de Julho, da sentença deve constar uma sucinta fundamentação.
Da prova produzida resulta provado que, em 7 de Agosto de 2018, os Demandantes adquiriram à agência de viagens F, um pacote de férias para dois adultos e uma criança com destino a Varadero, com partida no dia 19 de Agosto e regresso a 27 de Agosto de 2017, operado pela segunda Demandada enquanto operadora turística, tendo esta adquirido as passagens aéreas à D, a ora primeira Demandada. Resultou ainda provado que, em 18 de Agosto às 20 horas, os Demandantes receberam um email da agencia de viagens a referir que o voo agendado para dia 19 de Agosto tinha sido cancelado e alterado para dia 20 de Agosto, tendo os Demandados sido prejudicados com tal situação e com o facto de terem perdido um dia de férias apesar do pagamento desse dia à agência de viagens.
Ainda resultou provado que a primeira Demandada celebrou um contrato com a segunda Demandada, nos termos do qual esta disponibilizava a sua aeronave, e assumia os custos pelo transporte e que esteve disponível para restituir o custo da noite não usufruída pelos Demandantes, exigindo em contrapartida uma declaração de que os Demandantes abdicavam de qualquer outra indemnização pelos mesmos factos, o que os Demandantes se recusaram a assinar.
Nos termos do artigo 406.º do Código Civil “O contrato deve ser pontualmente cumprido, e só pode modificar-se ou extinguir-se por mútuo consentimento dos contraentes ou nos casos admitidos por lei.”
Nos termos do artigo 798.º do Código Civil, ”O devedor que falta culposamente ao cumprimento da obrigação torna-se responsável pelo prejuízo que causa ao credor” o que implica a verificação dos pressupostos da responsabilidade civil, a saber: facto ilícito, culpa, dano e nexo de causalidade.
Resultou provado que a agência de viagens ao não cumprir o contrato, garantindo a viagem aérea e todos os dias englobados no pacote, praticou um facto ilícito, cuja ilicitude se presume nos termos do artigo 799.º, n.º 1, do Código Civil.
Resultou provado que a segunda Demandada ao não cumprir o contrato de transporte, garantindo a viagem aérea pelos valores acordados, praticou um facto ilícito, cuja ilicitude se presume nos termos do artigo 799.º, n.º 1, do Código Civil.
A situação em apreço enquadra-se no conceito de viagens organizadas, que são todas aquelas que sejam vendidas com um preço” tudo incluído”, excedam as 24 horas e incluam uma dormida e combinem previamente transporte e alojamento (artigo 15.º, n.º 2, do Decreto-Lei 61/2011, de 6 de Maio) e, por sua vez, “as agências são responsáveis perante os seus clientes pelo pontual cumprimento das obrigações resultantes da venda de viagens turísticas” (artigo 29.º, n.º 1, do mesmo diploma), na medida em que resultou provado que a viagem aérea foi contratada dentro do mesmo programa (“pacote”) de alojamento e outros serviços
Nos termos do artigo 29.º do mesmo diploma – “1. As agências são responsáveis perante os seus clientes pelo pontual cumprimento das obrigações resultantes da venda de viagens turísticas, sem prejuízo do disposto nos números seguintes. 2 - Quando se tratar de viagens organizadas, as agências são responsáveis perante os seus clientes, ainda que os serviços devam ser executados por terceiros e sem prejuízo do direito de regresso. 3 - No caso de viagens organizadas, as agências organizadoras respondem solidariamente com as agências vendedoras”, portanto, a primeira Demandada é solidariamente responsável pelos danos decorrentes do incumprimento das obrigações assumidas pela agência de viagens.”
Quanto aos danos, nos termos do Artigo 5.º do Regulamento (CE) n.º 261/2004 do Parlamento Europeu e do Conselho da União Europeia, de 11 de Fevereiro de 2004, “1. Em caso de cancelamento de um voo, os passageiros em causa têm direito a: a) Receber da transportadora aérea operadora assistência nos termos do artigo 8.º; e b) Receber da transportadora aérea operadora assistência nos termos da alínea a) do n.º 1 e do n.º 2 do artigo 9.º, bem como, em caso de reencaminhamento quando a hora de partida razoavelmente prevista do novo voo for, pelo menos, o dia após a partida que estava programada para o voo cancelado, a assistência especificada nas alíneas b) e c) do n.º 1 do artigo 9.º; e c) Receber da transportadora aérea operadora indemnização nos termos do artigo 7.º, salvo se: i) tiverem sido informados do cancelamento pelo menos duas semanas antes da hora programada de partida, ou ii) tiverem sido informados do cancelamento entre duas semanas e sete dias antes da hora programada de partida e se lhes tiver sido oferecido reencaminhamento que lhes permitisse partir até duas horas antes da hora programada de partida e chegar ao destino final até quatro horas depois da hora programada de chegada, ou iii) tiverem sido informados do cancelamento menos de sete dias antes da hora programada de partida e se lhes tiver sido oferecido reencaminhamento que lhes permitisse partir até uma hora antes da hora programada de partida e chegar ao destino final até duas horas depois da hora programada de chegada. “
Decorre da referida norma que a Demandada enquanto transportadora aérea operadora (“uma transportadora aérea que opera ou pretende operar um voo ao abrigo de um contrato com um passageiro, ou em nome de uma pessoa colectiva ou singular que tenha contrato com esse passageiro…”, cf. alínea b), do n.º 2, do mesmo Regulamento), estava obrigada a assistir os passageiros nos termos do artigo 9.º do Regulamento, o que não se verificou.
Nos termos do artigo 5.º, n.º 1, alínea c), os passageiros têm direito a receber uma indemnização nos termos do artigo 7.º, n.º 1, alínea b), dado que estamos perante um voo superior a 3500 Km e, por isso, cada passageiro tem direito a uma indemnização de €: 600,00, no total de €: 1800,00 (3x €: 600,00). A indemnização prevista no artigo 7.º do regulamento traduz-se numa fixação prévia do valor da indemnização, cabendo aos lesados o ónus de provarem que os danos foram superiores a essa quantia, nos termos do artigo 342.º, n.º 1, do Código Civil, o que não se verificou no presente processo e, por isso, os Demandantes apenas têm direito à quantia de €: 1800,00, quantia que a primeira Demandada está obrigada a suportar, respondendo a segunda Demandada solidariamente no cumprimento de tal obrigação, nos termos do regime acima mencionado.
Assim, os Demandantes são credores das Demandadas na quantia de €:1800,00.

IV- DECISÃO
Em face do exposto, a primeira Demandada, D é condenada na obrigação de pagar aos Demandantes a quantia de €: 1800,00 (mil e oitocentos euros).
A segunda Demandada, E., é solidariamente responsável pelo cumprimento daquela obrigação e condenada na obrigação de pagar aos Demandantes a quantia de €: 1800,00 (mil e oitocentos euros).
As Demandadas, D, e E são absolvidas do restante pedido.

Custas de 28,50 a pagar pela primeira Demandada, D com a restituição de €: 6,50 à segunda Demandada e de €: 22,00 aos Demandantes nos termos dos artigos 8.º e 9.º, da Portaria n.º 1456/2001, de 28 de Dezembro.
A primeira Demandada deverá efectuar o pagamento das custas em dívida num dos três dias úteis subsequentes ao conhecimento da presente decisão, incorrendo numa sobretaxa de € 10,00 (dez euros) por cada dia de atraso no efectivo cumprimento dessa obrigação, conforme disposto nos números 8.º e 10.º, da Portaria n.º 1456/2001, de 28 de Dezembro.
Decorridos dez dias sobre o termo do prazo supra referido sem que se mostre efectuado o pagamento, será enviada certidão para execução por custas aos Serviços do Ministério Público junto da Comarca de Lisboa, pelo valor então em dívida, que será de € 122,00 (cento e vinte e dois euros).
Registe, notifique e arquive após trânsito.
Lisboa, 3 de Abril de 2018

O Juiz de Paz


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(João Chumbinho)