Sentença de Julgado de Paz
Processo: 167/2017-JPSTB
Relator: LILIANA SOUSA TEIXEIRA
Descritores: CONTRATO DE LOCAÇÃO
ARRENDAMENTO
FIANÇA
Data da sentença: 02/21/2018
Julgado de Paz de : SETÚBAL
Decisão Texto Integral: SENTENÇA
I – IDENTIFICAÇÃO DAS PARTES
Demandante: A, portador do número de identificação fiscal 000, residente na Rua X, Setúbal.
Mandatária: Dr.ª B, Advogada com escritório na Av. X, Setúbal.
Demandados: C, portador do número de identificação fiscal 000, residente na Av. X, Palmela e D, portador do número de identificação fiscal 000, residente na Av. X, Palmela.

II- OBJECTO DO LITÍGIO:
O Demandante intentou contra os Demandados a presente acção enquadrável na alínea g) do n.º 1, do art.º 9.º, da Lei n.º 78/2001, de 13 de Julho, alterada pela Lei n.º 54/2013, de 31 de Julho, doravante designada Lei dos Julgados de Paz, peticionando o valor de 1.610,00 euros correspondente às rendas vencidas e não pagas, valor acrescido de juros à taxa legal, desde a citação até integral pagamento bem como as custas do processo.
No requerimento inicial a fls. 4 e 5 o Demandante refere que: no dia 1 de Abril de 2015 outorgou um contrato de arrendamento com os Demandados, nas respectivas qualidades de senhorio, inquilino e fiador; a renda ajustada foi de 230,00 euros; os Demandados não pagaram a renda do mês de Julho de 2016, referente a Agosto de 2016 até Fevereiro de 2017, tendo o arrendatário sido despejado em 4 de Março de 2017, por acção de despejo intentada no Balcão Nacional de Arrendamento; as rendas todas vencidas no mês imediatamente anterior àquele a que respeitam e que totalizam a quantia de 1.610,00 euros; os Demandados interpelados para o pagamento, até hoje nada pagaram ao Demandante;
Os Demandados C e D foram regularmente citados em 08/08/2017 e em 09/08/2017 respectivamente.
Os Demandados não contestaram, tendo faltado à(s) data(s) designada(s) para a Audiência de Discussão Julgamento e não tendo justificado as suas faltas.
Verifica-se que se encontram reunidos os pressupostos de regularidade da instância, pelo que este Julgado de Paz é competente nos termos da Lei dos Julgados de Paz, em razão do objecto, artigo 6.º, n.º 1, em razão da matéria, artigo 9.º, n.º 1 alínea g), em razão do valor nos termos do artigo 8.º, que se fixa em 1644,76 euros, artigos 297.º, nº 1 e 306.º, nºs 1 e 2, ambos do Código de Processo Civil aplicáveis ex vi o artigo 63.º da referida Lei (tal como todos os artigos do Código de Processo Civil adiante referidos) e ainda e em razão do território, artigos 10.º e 12.º n.º 1 da Lei dos Julgados de Paz.
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As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas, nos termos do disposto nos artigos 6.º, 11.º, 15.º, 25.º e 30.º do Código de Processo Civil.
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III- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO:
Atento o disposto no artigo 58.º, n.º 2 da Lei dos Julgados de Paz, julgo confessados os factos alegados pelo Demandante.

IV - FUNDAMENTAÇÃO O DIREITO
Nestes autos a questão decidenda prende-se com o regime do contrato de arrendamento para fins habitacionais de duração determinada, constante dos artigos 1022.º a 1107.º do Código Civil.
O Demandante celebrou com os Demandados um contrato no qual se obrigou a proporcionar a C o gozo temporário de um imóvel mediante retribuição (artigo 1022.º do Código Civil), sendo que o Demandado D, assumiu a qualidade de fiador, pelo que também se chama à colação o regime estatuído nos artigos 627.º e seguintes do Código Civil e o regime do artigo 376.º do Código Civil que dispõe quanto ao regime probatório de documento particular, in casu, o contrato de arrendamento celebrado entre as partes.
O regime do contrato de locação estipula direitos e obrigações para as partes, sendo que as obrigações do locatário constam do artigo 1038.º do Código Civil. Assim de acordo com a alínea a) do referido normativo, é obrigação do locatário pagar a renda ou aluguer, a qual acrescentamos nós, deve ser paga pontualmente, nos termos do disposto no artigo 406.º do Código Civil que prevê que os contratos devem ser pontualmente cumpridos.
A fiança, por sua vez, é uma garantia pessoal das obrigações assim e conforme o artigo 627.º n.º 1 do Código Civil “1. O fiador garante a satisfação do direito de crédito, ficando pessoalmente obrigado perante o credor. 2. A obrigação do fiador é acessória da que recai sobre o principal devedor.”. A fiança possui, portanto, duas características essenciais, a saber: acessoriedade e subsidiariedade. A propósito desta subsidiariedade importa trazer à colação o benefício de excussão que se traduz no direito que o fiador tem de recusar o cumprimento da obrigação enquanto não estiverem executidos todos os bens do devedor principal sem obter a satisfação do seu crédito, podendo ainda, o fiador continuar a recusar o seu cumprimento, mesmo para além dessa excussão, se provar que o crédito não foi satisfeito por culpa do credor (artigo 638.º n.º 1 e n.º 2 do Código Civil).
No que concerne à acessoriedade também com interesse o artigo 628.º n.º 1 do Código Civil que refere que a vontade de prestar fiança deve ser expressamente declarada pela forma exigida para a obrigação principal. A este propósito quanto à forma do contrato de arrendamento, a Lei exige que deva ser celebrado por escrito desde que tenha a duração superior a 6 meses (artigo 1069.º do Código Civil). Nestes autos a forma do contrato de arrendamento foi observada (contrato de arrendamento de um ano).
Nos presentes autos o fiador D não renunciou a esse direito conforme o contrato de arrendamento constante dos autos a fls. 6 a 9.
O Demandante enquanto credor podia demandar o fiador só ou conjuntamente com o devedor (artigo 641.º, n.º 1 do Código Civil). Tendo sido a presente acção interposta também contra o fiador, também sobre ele recai a obrigação de satisfazer o crédito peticionado pelo Demandante, ficando sub-rogado, a posteriori, nos direitos do credor, que venha a satisfazer com o seu património (artigo 644.º do Código Civil).
A obrigação do pagamento de renda traduz-se numa obrigação pura (artigo 777.º, n.º 1 do Código Civil), e trata-se de uma prestação pecuniária periódica (artigo 1075º, n.º 1 do Código Civil).
Nos termos do disposto no artigo 1075.º, n.º 2 do Código Civil, a renda mensal, que era de 230,00 euros, devia ser paga no primeiro dia útil do mês anterior a que respeitasse.
No caso sub judice, os Demandados não procederam até à presente data, ao pagamento do valor das rendas dos meses de Julho de 2016 referentes a Agosto de 2016 até Fevereiro de 2017, no valor que o Demandante computou em 1610,00 euros.
Acresce que o Demandante peticionou também juros à taxa legal em vigor desde a citação até integral pagamento.
A este propósito diga-se o seguinte: é designadamente consequência da mora a obrigação de indemnizar os danos ou prejuízos causados ao credor, nos termos do disposto no artigo 804.º, n.º 1 do Código Civil. A Lei nas obrigações pecuniárias, presume o prejuízo resultante da indisponibilidade do capital e quantifica-o nos termos do artigo 806.º n.º 1 e n.º 2 do Código Civil, dado que estipula que nas obrigações pecuniárias a indemnização por mora é, na falta de convenção em contrário, constituída pelos juros legais, in casu, juros civis nos termos do disposto no artigo 559.º do Código Civil e da Portaria n.º 291/2003 de 08/04, os quais são devidos à taxa de 4% aí prevista.
Perfilhamos o entendimento (controverso) que para efeitos de exigibilidade dos juros relativos às rendas vencidas são devidos juros a partir da citação e que obrigando-se o fiador no contrato de arrendamento também como principal pagador, fica solidariamente responsável pelo pagamento dos juros de mora nos mesmos termos em que o arrendatário. (Neste sentido Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, processo n.º 10385/2006-2, de 15-02-2007, disponível em www.dgsi.pt.)
Aliás tal decorre do artigo 634.º do Código Civil, que estipula que o conteúdo da fiança é o da obrigação principal e cobre as consequências legais e contratuais da mora ou culpa do devedor.
Pelo exposto são ambos os Demandados solidariamente responsáveis pelo pagamento dos valores em dívida.

V – DECISÃO:
Em face do exposto, julgo procedente a presente acção e em consequência, condeno solidariamente os Demandados a pagar ao Demandante:
a) a quantia de 1610,00 euros, relativa a rendas vencidas;
b) juros de mora civis vencidos, à taxa legal de 4%, a contar desde a citação que nesta data perfazem um total de 34,76 euros.
c) juros de mora civis vincendos. à taxa legal de 4%, até integral cumprimento.

VI - RESPONSABILIDADE POR CUSTAS:
Nos termos do artigo 8.º da Portaria n.º 1456/2001, de 28 de Dezembro, na redacção que lhe foi dada pela Portaria n.º 209/2005, de 24/02, os Demandados C e D, são declarados parte vencida para efeitos de custas, pelo que devem efectuar o pagamento de 70,00 euros, relativos às custas neste Julgado de Paz, no prazo de três dias úteis, a contar desta notificação para o efeito, sob pena do pagamento de uma sobretaxa de 10,00 euros por cada dia de atraso.
Reembolse-se o Demandante nos termos do artigo 9.º da mesma Portaria.
Esta sentença foi lida às partes, nos termos do art.º 60.º, n.º 2, da Lei dos Julgados de Paz.
Registe e notifique os Demandados também para efeito de custas.
Setúbal, 21 de Fevereiro de 2018.
A Juíza de Paz
Liliana Patrícia Sousa Teixeira