Sentença de Julgado de Paz
Processo: 413/2018 JPLSB
Relator: SOFIA CAMPOS COELHO
Descritores: ARRENDAMENTO URBANO – INDEMNIZAÇÃO FINDO CONTRATO
Data da sentença: 10/12/2018
Julgado de Paz de : LISBOA
Decisão Texto Integral: Processo n.º 413/2018
Objeto: Arrendamento urbano – indemnização findo contrato

Demandante: A.

Demandado: B
Mandatária: Sr.ª Dr.ª C.

RELATÓRIO:
O demandante, devidamente identificado nos autos, intentou contra o demandado, também devidamente identificado nos autos, a presente ação declarativa de condenação, pedindo que este seja condenado a pagar-lhe a quantia de € 11.504,45 (onze mil quinhentos e quatro euros e quarenta e cinco cêntimos). Para tanto, alegou os factos constantes do requerimento inicial, de folhas 1 a 5 dos autos, que aqui se dá por integralmente reproduzido, alegando, em síntese, que em 1 de dezembro de 2008 celebrou com o demandado um contrato de arrendamento do … andar letra “…” do prédio urbano sito na Rua…, n.º .. freguesia de …., concelho de …., contrato que findou, a pedido do inquilino, em abril de 2015. Alega que, durante a vigência do contrato, o inquilino nunca atualizou o montante das rendas, as quais, nos termos do contrato, atualizavam automaticamente, sem necessidade de qualquer comunicação, peticionando, assim, a condenação do demandado no pagamento da quantia de € 4.797,85 (quatro mil setecentos e noventa e sete euros e oitenta e cinco cêntimos), bem como na quantia de € 3.124,72 (três mil cento e vinte e quatro euros e setenta e dois cêntimos) correspondente ao valor das reparações que teve de efetuar nas paredes, pinturas e soalhos do locado, atento o estado das mesmas no momento da entrega do locado, e na quantia de € 3.581,88 (três mil quinhentos e oitenta e um euros e oitenta e oito cêntimos), a título de indemnização pelo “tempo de indisponibilidade da fração face à necessidade de obras de reparação”. Juntou os documentos de fls. 6 a 26 dos autos, que aqui se dão por integralmente reproduzidos.-
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Regularmente citado, o demandado contestou (de fls. 31 a 36 dos autos, que aqui se dão por integralmente reproduzidas), alegando a ilegitimidade do demandante por não estar acompanhado da co-proprietária do locado, bem como que durante os sete anos de vigência do contrato nunca o demandante invocou o incumprimento contratual quanto à actualização das rendas e que peticionar agora (três anos após o termo do contrato) o pagamento dessas actualizações excede os limites da boa fé, já que o senhorio nunca antes o invocou ou solicitou essa atualização, não tendo inclusivamente feito uso da caução para esse efeito. Alega que nunca sublocou o locado e que o demandante conhecia que o locado seria para sua habitação e do fiador, seu amigo. Alega ainda que o locado foi entregue limpo e bem conservado, em bom estado e sem deteriorações. Por último alega que as partes vistoriaram o locado em conjunto, não tendo sido aferida qualquer desconformidade, tendo o demandante aceite a entrega do locado sem qualquer reserva. Juntou procuração forense (fls. 62) e 5 documentos, que aqui se dão por integralmente reproduzidos.
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Foi marcada data para realização da audiência de julgamento, tendo as partes, e mandatária, sido devidamente notificados.
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Iniciada a audiência, na presença das partes, e mandatária, a Juíza de Paz procurou conciliar as partes, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1, do artº 26.º, da LJP, não tendo esta diligência sido bem sucedida.
Foram ouvidas as partes, nos termos do disposto no art.º 57.º da LJP, e realizada a audiência de julgamento, com observância do formalismo legal, como resulta da respetiva ata, tendo sido ouvidas as testemunhas apresentadas por ambas as partes.
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Cumpre analisar a exceção suscitada em sede de contestação: da ilegitimidade ativa -
Alega o demandante que o demandante ´´e parte ilegítima, por não estar acompanhado da co proprietária do locado, que também assinou o contrato de arrendamento.
A legitimidade processual afere-se pelo interesse direto do autor em demandar e pelo interesse direto do réu em contradizer (artigo 30º, nº 1, do mesmo diploma) e, na falta de indicação da lei em contrário, são considerados titulares do interesse relevante para o efeito da legitimidade os sujeitos da relação controvertida, tal como é configurada pelo autor (nº 3 do citado artigo 30º): há que atender à substância do pedido formulado e à concretização da causa de pedir, de tal maneira que partes legítimas na ação são os sujeitos da relação material definida através destes dois elementos. Assim, o autor é parte legítima quando tem interesse direto em demandar, interesse este que se exprime pela utilidade derivada da procedência da ação, e o réu é parte legítima quando tem interesse direto em contradizer, interesse este que se exprime pelo prejuízo que lhe pode advir da procedência da ação.
Nos presentes autos o demandante peticiona a condenação do demandado no pagamento de indemnização derivada de incumprimento de contrato que, em conjunto com a sua mãe F. celebrou com o demandado. No requerimento inicial nada alega quanto a demandar sozinho o demandante. Porém, na sequência de pedido de esclarecimento da Juíza de Paz, informou os autos que a sua mãe, F., faleceu 2 de junho de 2013, no estado de viúva, tendo deixado como seu único herdeiro o ora demandante, alegação, que posteriormente, comprovou.
Assim sendo, atento o comprovado, a legitimidade da demandante é inequívoca, indo consequentemente julgada improcedente, por não provada, a exceção da ilegitimidade ativa.
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Nos termos do n.º 1 do art.º 306.º do Código de Processo Civil, fixa-se à causa o valor de € 11.504,45 (onze mil quinhentos e quatro euros e quarenta e cinco cêntimos).
O Julgado de Paz é competente em razão do valor, da matéria e do território.
As partes são dotadas de personalidade e capacidade jurídica e são legítimas.
Não existem nulidades ou exceções de que cumpra conhecer ou questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito da causa.
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FUNDAMENTAÇÃO – MATÉRIA DE FACTO
Com interesse para a decisão da causa, ficou provado que:
1 – Em 1 de dezembro de 2008, demandante e F., na qualidade de senhorios, o demandado, na qualidade de inquilino, e B. na qualidade de fiador, celebraram o contrato de arrendamento de fls. 6 a 11 dos autos, que aqui se dá por integralmente reproduzido, pelo qual os primeiros deram de arrendamento ao segundo o … andar letra “…” do prédio urbano sito na Rua ….n.º…, freguesia de Carnide, concelho de Lisboa.
2 – Pelo prazo de cinco anos, com início em 1 de dezembro de 2008 e termo em 30 de novembro de 2013, renovável por períodos sucessivos de um ano enquanto não fosse denunciado pelos senhorios ou inquilino (cfr. cláusulas 1.ª e 2.ª do contrato).
3 – Mediante o pagamento da renda mensal de € 750 (setecentos e cinquenta euros), automaticamente atualizada por aplicação da taxa de 3% no início de cada novo ano de vigência do contrato, sem necessidade de quaisquer comunicações – (cfr. cláusulas 5.ª e 7.ª do contrato).
4 – O locado foi arrendado para habitação do inquilino e do fiador, facto que era do conhecimento do demandante.
5 – Por comunicação de 13 de janeiro de 2015 o demandado comunicou ao demandante que pretendia cessar o contrato com efeitos a 1 de abril de 2015, o que o demandante aceitou (cfr. Docs. fls. 37 a 39 dos autos).
6 – Em dia não apurado do final do mês de abril de 2015, o locado foi entregue ao demandante pelo fiador B.
7 – O locado foi entregue com o teto da casa de banho com a sujidade ou humidade visível nas fotografias a fls. 14 e 16 dos autos.
8 – E uma parede com a fissura visível na fotografia a fls. 15 dos autos, inerente à idade do prédio.
9 – Não tendo o demandante denunciado ou solicitado a reparação de qualquer dano existente do locado, a limpeza do mesmo ou o pagamento de qualquer rendas, ou parte de renda.
10 – Em 19 de maio de 2015, o demandante iniciou a execução das obras de remodelação do locado melhor discriminadas no orçamento de fls. 18 a 20 dos autos, que aqui se dá por integralmente reproduzido.
11 – Obras que ficaram concluídas em setembro de 2015.
12 – Em 8 de março de 2018, o demandante remeteu ao demandado a comunicação eletrónica a fls. 22 dos autos, que aqui se dá por integralmente reproduzida, onde solicita o pagamento de indemnização no montante de € 10.000 (dez mil euros) por falta de pagamento das atualizações das rendas nos termos da cláusula 7.ª do contrato, o custo com a pintura do locado e regularização de paredes e soalho, bem como por sublocação do locado.
13 – Nunca em data anterior o demandante havia solicitado o pagamento das atualizações das rendas ou a reparação das paredes e soalho do locado.
14 – Dão-se aqui por integralmente reproduzidas as cópias das cartas de fls. 23 a 26 dos autos.
15 – Dão-se aqui por integralmente reproduzidas as comunicações eletrónicas entre demandante e demandado de fls. 40 a 42 dos autos, datadas de janeiro e março de 2010 e maio de 2015.
16 F. faleceu em 2 de junho de 2013, no estado de viúva, tendo deixado como seu único herdeiro o ora demandante (cfr. Docs. fls. 55 e 67 e 68 dos autos).
Não ficou provado:
Não se provaram mais factos alegados com interesse para a decisão da causa, designadamente:
1 – O locado foi entregue com paredes, pinturas e soalhos danificados, num “estado de lastimável degradação” e, sujo, com “total ausência de limpeza”.
2 – O demandado ou o fiador sublocaram o locado a D. ou a E.
Motivação da matéria de facto:
Para fixação da matéria fáctica dada como provada concorreram os factos admitidos, os documentos juntos aos autos e o depoimento das testemunhas apresentadas. Quanto ao depoimento das testemunhas apresentadas pelo demandante, a primeira sua mulher e o segundo o empreiteiro que executou as obras no locado em maio de 2015, cumpre referir: a primeira, por emocionalmente ligada à causa, não conseguiu depôr com isenção, já que referiu que a casa estava totalmente estragada e que foi entregue de tal modo que o demandante se viu obrigado a fazer as obras de remodelação total discriminadas no orçamento junto aos autos, chegou a referir que a cozinha teve de ser colocada nova e os eletrodomésticos deitados fora, por estragados. À pergunta porque razão só em 2018 o demandante peticiona a indemnização em apreço, nunca em data anterior o tendo solicitado/exigido, responde que tal de deveu a circunstâncias pessoais do demandante e do seu agregado familiar. A segunda testemunha referiu que fez as obras de remodelação totais do apartamento em maio de 2015, e que os danos que eram visíveis no locado eram buracos de pregos de pendurar coisas nas paredes e o teto da casa de banho, que estava escuro, o que até pensaram que seria uma infiltração do andar de cima, mas afinal não era, deveria ser de condensação. Quanto às rachas existentes em uma ou duas paredes do locado referiu serem usuais em prédio com os anos do locado, que não são sujeitos a obras durante vários anos.
A testemunha apresentada pelo demandado, pessoa que figurava no contrato como fiador, referiu que o demandante sempre soube que o locado era para habitação do inquilino e do fiador, sendo que por várias vezes falou com o demandante. Adianta que foi ele que entregou o locado ao demandante, que o mesmo não solicitou qualquer limpeza do mesmo, designadamente do teto da casa de banho, que aceita estava escuro, como é visível nas fotografias juntas aos autos. Refere que comprou ao demandante os eletrodomésticos que estavam no locado, por um preço simbólico, já que o demandante queria desfazer-se dos mesmos devido às obras que ia fazer no locado – facto que o demandante confirmou a este Julgado de Paz. Referiu também que no momento da entrega o demandante não lhe referiu que o locado não estava limpo ou exigiu a limpeza do mesmo, ou parte do mesmo.
Não foram provados quaisquer outros factos alegados pelas partes, dada a ausência de mobilização probatória credível, que permitisse ao tribunal aferir da veracidade desses factos, após a análise dos documentos juntos aos autos e da audição das partes e testemunhas.
Esclareça-se, quanto ao ponto n.º 2 dado como não provado, que o facto de terem sido rececionadas no locado as cartas de fls. 23 a 26 dos autos, em nome de terceiros não é suficiente para, por si só, considerar que o locado foi sublocado aos destinatários das mesmas.
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FUNDAMENTAÇÃO – MATÉRIA DE DIREITO
Nos presentes autos, pretende o demandante ser indemnizado dos danos para si advenientes do incumprimento contratual do demandado, causado por: a) falta de pagamento das atualizações automáticas das rendas, nos termos da cláusula 7.ª do contrato; b) entrega do locado com danos nas suas paredes, pinturas e soalhos, bem como sujo; e c) privação do uso do locado durante as obras de reparação. Considerando a causa de pedir e o pedido, comecemos por referir que no nosso ordenamento jurídico vigora o princípio da liberdade contratual (artigo 405º do Código Civil), nos termos dos quais as partes podem fixar livremente os conteúdos dos contratos que celebram, podendo celebrar contratos diferentes dos previstos na lei ou seja contratos atípicos – desde que dentro dos limites da lei; sendo também outro princípio basilar do ordenamento jurídico português o princípio da força vinculativa ou obrigatoriedade dos contratos, ou seja, uma vez celebrados os contratos devem ser “(…) pontualmente cumprido, e só pode modificar-se ou extinguir-se por mútuo consentimento dos contraentes ou nos casos admitidos na lei.” (cfr. n.º 1 do artigo 406.º do Código Civil), assim como o é o principio da boa fé, previsto tanto no n.º 2 do artigo 762.º, n.º 2, do Código Civil, (“no cumprimento da obrigação, assim como no exercício do direito correspondente, devem as partes proceder de boa fé”). Ou seja, os contraentes têm o dever de agir de boa-fé, agir com diligência, zelo e lealdade, correspondendo aos legítimos interesses da contraparte, devem ter uma conduta honesta e conscienciosa, numa linha de correcção e probidade, não prejudicando os legítimos interesses da outra parte, no cumprimento ou execução do contrato, até ao termo da sua vigência. E, no âmbito do dever de boa-fé no cumprimento das obrigações encontram-se variadíssimos deveres acessórios de conduta, tais como deveres de proteção, de esclarecimento, de informação, de cooperação e de lealdade.
E, é por tal razão que, no âmbito da responsabilidade contratual, a lei estabelece uma presunção de culpa do devedor, sobre o qual recai o ónus da prova, isto é, o devedor terá de provar que “a falta de cumprimento ou o cumprimento defeituoso da obrigação não procede de culpa sua” (artigo 799.º, n.º 1, do Código Civil), sendo que “o devedor que falta culposamente ao cumprimento da obrigação torna-se responsável pelo prejuízo que causa ao credor”. (artigo 798º, do Código Civil). Por outro lado, prescreve o n.º 1 do artigo 342.º, do Código Civil, que Àquele que invocar um direito cabe fazer a prova dos factos constitutivos do direito alegado, ou seja, é sobre a parte demandante que recai o ónus da prova, competindo-lhe provar os factos constitutivos do direito que alega ter; no caso concreto, que o demandado incumpriu o contrato celebrado nos termos alegados, competindo, por sua vez, à parte demandada, nos termos do n.º 2 do mesmo artigo que “A prova dos factos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito invocado compete àquele contra quem a invocação é feita”.
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Da matéria fáctica provada resulta que, em 1 de dezembro de 2008, as partes celebraram o contrato de arrendamento de fls. 6 a 11 dos autos, o qual vigorou até abril de 2015, data em que, por iniciativa unilateral do demandado, inquilino, o contrato cessou, o que o demandante aceitou.
Prescreve a alínea i) do artigo 1038.º, do Código Civil, que o locatário tem a obrigação de restituir a coisa locada findo o contrato, acrescentando o artigo 1081.º, que “a cessação do contrato torna imediatamente exigível, salvo se outro for o momento legalmente fixado ou acordado pelas partes, a desocupação do local e a sua entrega, com as reparações que incumbam ao arrendatário”. Por outro lado, dispõe o n.º 1 do artigo 1043.º, do mesmo Código, que “(…) o locatário é obrigado a manter e restituir a coisa no estado em que a recebeu, ressalvadas as deteriorações inerentes a uma prudente utilização, em conformidade com os fins do contrato”, disposição também constante no contrato outorgado entre as partes.
Como já referimos, competia ao demandante provar que o locado lhe foi entregue com os danos alegados: paredes, pinturas e soalhos danificados, num “estado de lastimável degradação” e, sujo, com “total ausência de limpeza”. E, não o provou, atento os documentos juntos aos autos e depoimentos das testemunhas apresentados (cfr. motivação da matéria fática).
O demandante peticionou também a condenação do demandado no pagamento de indemnização pela privação do uso do locado durante o período de realização das obras de reparação dos danos que causou no locado. Porém, considerando que a análise deste seu pedido dependia da prova da entrega do locado com danos, no âmbito do pedido acima analisado, e não tendo sido feita tal prova, fica, nos termos do disposto no art.º 608.º do Código de Processo Civil, prejudicada a análise deste seu pedido.
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Quanto à pretendia atualização das rendas, refira-se desde logo que estipula o artigo a alínea d) do n.º 2 do art.º 1077.º do Código Civil, que “Na falta de estipulação, (…) a não atualização prejudica a recuperação dos aumentos não feitos, podendo, todavia, os coeficientes ser aplicados em anos posteriores, desde que não tenham passado mais de três anos sobre a data em que teria sido inicialmente possível a sua aplicação”, de onde se retira que não pode o senhorio volvidos três anos do termo do contrato peticionar atualizações que deveriam ter sido efetuadas nove anos antes. Mas, mesmo que assim não fosse, dispõe o artigo 334.º, do Código Civil, que é ilegítimo o exercício de um direito quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito. No segmento desta norma que alude aos “limites impostos pela boa fé” está compreendida a proibição de venire contra factum proprium. Como explica Menezes Cordeiro (Litigância de Má Fé Abuso do Direito de Acção e Culpa “In Agendo”, Almedina, Coimbra, 2006, pág. 50):Estruturalmente, o venire postula duas condutas da mesma pessoa, lícitas em si, mas diferidas no tempo. Só que a primeira – o factum proprium – é contraditada pela segunda – o venire. (…) O venire é positivo quando se traduza numa ação contrária ao que o factum proprium deixaria esperar; será negativo caso redunde numa omissão contrária ao mesmo factum”. A expressão Verwirkung utiliza-se para traduzir as situações em que se veda o exercício de um direito subjetivo ou de uma pretensão, quando o seu titular, por não os ter exercido durante muito tempo, criou na contraparte uma fundada expectativa de que já não seriam exercidos; revelando-se, portanto, um posterior exercício manifestamente desleal e intolerável.
No caso em apreço, temos, por um lado, um contrato que previa a atualização automática da renda sem necessidade de qualquer comunicação por parte do senhorio; durante toda a vigência do contrato o senhorio nunca solicitou ao inquilino que procedesse a esse aumento, nem mesmo no momento em que o contrato findou. O senhorio nunca reagiu ao facto da renda não ter sido automaticamente atualizada, tendo criado no inquilino a convicção de que aceitava esse facto. Por outro lado, a um mês de fazer três anos do termo do contrato interpela o inquilino para efetuar essa atualização retroativamente a nove anos atrás.
Assim, por esta razão, considerar-se-ia ilegítimo o uso do direito ora peticionado, por desconforme com os limites impostos pela boa fé e pelos bons costumes, por consubstanciar uma verdadeira situação de “venire contra factum proprium”.
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CUSTAS
Nos termos da Portaria n.º 1456/2001, de 28 de Dezembro, o demandante é condenado nas custas, que ascendem a € 70 (setenta euros), devendo proceder ao pagamento dos € 35 (trinta e cinco euros) em falta, no Julgado de Paz, no prazo de três dias úteis, a contar da data da notificação desta sentença, sob pena do pagamento de uma sobretaxa diária de € 10 (dez euros) por cada dia de atraso.
Cumpra-se o disposto no número 9 da mesma portaria, em relação ao demandado.
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A presente sentença (processada em computador, revista e impressa pela signatária – art.º 18.º da LJP) foi proferida e notificada ao demandante, nos termos do artigo 60.º, da LJP, que ficaram cientes de tudo quanto antecede.
Notifique demandado e seu mandatário.
Registe.
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Julgado de Paz de Lisboa, 12 de outubro de 2018
A Juíza de Paz,

(Sofia Campos Coelho)