Sentença de Julgado de Paz
Processo: 104/2017-JP
Relator: GABRIELA CUNHA
Descritores: ACIDENT DE VIAÇÃO - CUMPRIMENTO DAS OBRIGAÇÕES CONTRATUAIS
PRIVAÇÃO DE USO E JUROS DE MORA
Data da sentença: 06/20/2017
Julgado de Paz de : SINTRA
Decisão Texto Integral:

SENTENÇA

Processo n.º 104/2017-JP

RELATÓRIO:
Auto ---., melhor identificada a fls. 1, intentou contra Companhia de Seguros A, S.A., atualmente com a denominação, B, SA, melhor identificada a fls. 1, ação declarativa de condenação, enquadrável na alínea h) do nº 1 do artº 9º da Lei n.º 78/2001, de 13 de julho, alterada pela Lei n.º 54/2013, de 31 de julho (LJP) pedindo a condenação desta a pagar-lhe a quantia de € 5.965,24 (cinco mil novecentos e sessenta e cinco euros e vinte e quatro cêntimos) acrescida de juros à taxa legal em vigor, contabilizados desde a data da recusa de regularização do sinistro.
Para tanto, alegou os factos constantes do Requerimento Inicial de fls. 1 a 7 que aqui se dá por reproduzido, dizendo em síntese que no 06/09/2016, pelas 17.30H, o gerente da Demandante conduzia o veículo de marca Citroen, modelo Berlingo Van, com a matricula (HN), na rua ------------, no Cacém, quando, inesperadamente foi forçado a travar o seu veículo, porque a viatura que circulava imediatamente à sua frente, parou num sinal de STOP; contudo, não efectuou a travagem atempadamente, tendo embatido no veículo Suzuki Vitara, matrícula (HE), conduzido por E; do embate resultaram danos em ambos os veículos; a Demandante tem seguro com cobertura de danos próprios junto da Demandada; a Demandada declinou a responsabilidade pela regularização dos danos alegando que o acidente “não ocorreu conforme participado”; a peritagem orçou a reparação do HN em € 3.235,24 (três mil duzentos e trinta e cinco euros e vinte e quatro cêntimos); montante que, acrescido de dano de privação do uso e juros de mora, a Demandante peticiona. Juntou documentos (fls. 8 a 19, 112) que, igualmente, se dão por reproduzidos, e procuração forense.

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A Demandada regularmente citada apresentou contestação, na qual se defendeu por impugnação quanto à versão dos factos apresentados pela Demandante, concluindo pela absolvição do pedido. Para tanto, alegou os factos constantes da sua contestação de fls. 35 a 42 que se dá por reproduzida, alegando, em síntese, que o acidente não ocorreu como participado. Juntou documentos (fls. 43 a 69, 87 a 96, 103 a 106 e 117 e 118) que, igualmente, se dão por reproduzidos, e procuração.
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O Julgado de Paz é competente em razão do valor, da matéria e do território. As partes são dotadas de personalidade e capacidade jurídica.
Não se verificam quaisquer exceções ou nulidades, nem quaisquer questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito da causa.
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Questão a decidir: Se a Demandante tem direito aos valores peticionados ao abrigo do contrato de seguro celebrado com a Demandada.
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Aberta a Audiência, e estando todos presentes, foram ouvidas as partes nos termos do disposto no Artº 57.º da Lei n.º 78/2001, de 13 de julho, alterada pela Lei n.º 54/2013, de 31 de julho, tendo-se explorado todas as possibilidades de acordo, nos termos do disposto no nº 1 do artº 26.º do mesmo diploma legal, o que não logrou conseguir-se, tendo-se procedido à Audiência de Julgamento, com observância do formalismo legal como da ata se infere.

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OS FACTOS:

Resultaram provados os seguintes factos com relevância para a decisão da causa:

a) A Demandante é proprietária do veículo de marca Citroen, modelo Berlingo Van, com a matrícula (HN);
b) O veículo da Demandante tinha seguro válido junto da Demandada através da apólice n.º -------, com cobertura de danos próprios, que inclui choque, colisão e capotamento, com um capital de € 5.432,00 e uma franquia de € 250,00 e “multi assistência base” com um veículo de substituição em caso de avaria, celebrado em em15/04/2016.
c) A Demandante participou à Demandada um sinistro ocorrido em 06/09/2016, pelas 17.30H, na Rua Cidade do Porto, Cacém, que envolveu a viatura HN e a viatura com matrícula HE, conduzida por E.
d) O veículo HE tinha seguro válido junto da Demandada, no âmbito do contrato de seguro titulado pela apólice n.º ----------.
e) O gerente da Demandante e E assinaram uma declaração amigável de acidente automóvel,
f) O gerente da Demandante assumiu a responsabilidade pelo acidente.
g) A referida declaração amigável foi preenchida nas instalações da Demandante.
h) A peritagem realizada verificou que o veículo HN carecia de substituição de peças, nomeadamente: porta da bagageira, pára-choques traseiro, reforço do pára-choques e aba da ilharga direita;
i) perfazendo o orçamento o montante de € 3.235,24 (três mil duzentos e trinta e cinco euros e vinte e quatro cêntimos).
j) A peritagem ao veículo HE foi realizada na oficina da Demandante.
k) O gerente da Demandante e E acordaram que os veículos seriam reparados na oficina Demandante.
l) Por ofício datado de 18 de outubro de 2016, a Demandada declinou a responsabilidade na regularização dos prejuízos reclamados pela Demandante.
m) Por ofício datado de 18 de outubro de 2016, a Demandada declinou a responsabilidade na regularização dos prejuízos reclamados por Jorge Manuel Brito Garcia.
n) gerente da Demandante participou outro acidente de viação à Demandada, em setembro de 2016.
o) O gerente da Demandante, no ano de 2016, intentou uma ação contra a F – Surcusal em Portugal, na qual peticionou uma indemnização ao abrigo da cobertura de furto ou roubo.

Factos não provados:

Não se provaram quaisquer outros factos alegados pelas partes, com interesse para a decisão da causa, nomeadamente:

A) No dia 06-09-2016, pelas 17.30h, o gerente da Demandante circulava ao volante do veículo de marca Citroen, modelo Berlingo Van, com a matrícula HN, na Rua Cidade do Porto, Cacém, Sintra;

B) quando, inesperadamente, foi forçado a travar o seu veiculo, porque a viatura que circulava imediatamente à sua frente parou num sinal de STOP;

C) O veículo HN embateu contra o veículo HE que se encontrava parado no sinal.

D) Em consequência do embate o veículo HN sofreu danos na parte da frente que impossibilitam a sua circulação;

E) e o veículo HE ficou com danos na parte traseira.

Motivação:
Para fixação da matéria fática dada como provada concorreram os documentos juntos aos autos e os depoimentos testemunhais em sede de audiência final.

Os factos constantes em f), g), k) e n) foi declarado pelo gerente da Demandante em declarações de parte e tem valor de confissão.
O facto assente em a) encontra-se provado por documento (fls. 8 e 9).
O facto assente em b) encontra-se provado por documento (fls. 12 a 16).
O facto assente em c) considera-se admitido por acordo – art. 574.º, n.º 2, do Código de Processo Civil (CPC).
Os factos assentes em d) e e) encontram-se provados por documento (fls. 10 e 11).
Os factos assentes em h) e i) encontram-se provados por documento (fls. 17 e 18).
O facto assente em j) foi provado por depoimento testemunhal.
O facto assente em l) encontra-se provado por documento (fls. 19).
O facto assente em m) encontra-se provado por documento (fls. 118).
O facto assente em o) encontra-se provado por documento (fls. 103 a 106).
As testemunhas apresentadas pela Demandante, G (funcionário) e H (mediador de seguros), revelaram desconhecimento dos factos em discussão, em particular, quanto à dinâmica do acidente, reproduzindo, apenas, o que o gerente da Demandante lhes contou.
As testemunhas apresentadas pela Demandada, todos peritos, aderiram à versão dos factos por esta apresentada, e pese embora sem conhecimento direto dos factos, revelaram-se credíveis, em particular a testemunha I, na sua acareação com a testemunha E.
O depoimento da testemunha E, chamada pelo tribunal para prestar esclarecimentos, subscritor da declaração amigável junta aos autos a fls. 10 e 11, revelou-se confuso e contraditório no que concerne à dinâmica do acidente, nomeadamente aos intervenientes no mesmo, aos danos e quanto às declarações prestadas à Demandada. O seu depoimento não se revelou credível nem isento. Efetivamente, esta seria a testemunha que poderia comprovar a dinâmica do acidente. Não o fez.
Certo é que, o gerente da Demandante em sede de declarações de parte reproduziu o que consta do requerimento inicial. Contudo, tais declarações são insuficientes para demonstrar a dinâmica do alegado acidente, uma vez que estão desacompanhadas de outra prova.
A fixação da matéria fática dada como não provada resultou da ausência de mobilização probatória credível, que permitisse ao tribunal aferir da veracidade desses factos.
Para fixação da factualidade assente não se considerou matéria de teor conclusivo ou de direito.

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O DIREITO:
Visa a Demandante, com a presente ação, a condenação da Demandada no pagamento da quantia de € 5.965,24 (cinco mil novecentos e sessenta e cinco euros e vinte e quatro cêntimos) acrescida de juros à taxa legal em vigor, contabilizados desde a data da recusa de regularização, a título de cumprimento das obrigações contratuais, privação de uso e juros de mora, no âmbito do contrato de seguro celebrado com a Demandada através da apólice n.º ---------------, com cobertura de danos próprios.
Assim, o objecto do litígio dos presentes autos remete para o regime jurídico da responsabilidade civil contratual.
Nos termos do art.º 798.º do Código civil “o devedor que falta culposamente ao cumprimento da obrigação torna-se responsável pelo prejuízo que causa ao credor.”
Por força da referida norma legal, para que se conclua pela existência de responsabilidade civil contratual é, então, necessário que se verifique, cumulativamente: a ilicitude resultante da desconformidade, injustificada, entre a conduta devida (realização pontual da prestação sem vícios ou defeitos) e o comportamento adoptado (a falta de cumprimento da obrigação ou o seu cumprimento defeituoso); a culpa do devedor; a existência de danos ou prejuízos a ressarcir; e o nexo de causalidade entre o não cumprimento/cumprimento defeituoso e o dano, ou seja, devendo aquele ser a causada adequada deste, não havendo lugar a ressarcimento quando assim não seja.
Por outro lado, nos termos do n.º 1 do art. 342.º do Código Civil que compete àquele que invocar um direito fazer a prova dos respectivos factos constitutivos do direito alegado.
Ora, na presente ação, a Demandante não logrou provar, como lhe incumbia, a dinâmica do acidente e a sua responsabilidade no mesmo. Consequentemente, não ocorre qualquer fundamento de responsabilidade contratual da Demandada, ao abrigo do contrato de seguro celerado. E, assim sendo, improcedente na totalidade o pedido formulado pela Demandante.
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DECISÃO
Pelo exposto e nos termos dos fundamentos de Direito invocados, julga-se a presente ação totalmente improcedente, por não provada, e, em consequência, absolve-se a Demandada - B, S.A do pedido contra si formulado.
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Custas pela Demandante, em conformidade com o disposto nos artº 8º e 9º da Portaria nº1456/2001, de 28 de Dezembro, alterada pela Portaria nº 209/2005 de 24 de Fevereiro, devendo este proceder ao pagamento da quantia de € 35,00 (trinta e cinco euros), no prazo de três dias úteis, a contar da notificação desta Decisão, sob pena do pagamento de uma sobretaxa diária de € 10,00 (dez euros) por cada dia de atraso.
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Julgado de Paz de Sintra, 20 de junho de 2017

(Juíza de Paz que redigiu e reviu em computador – artº 131º/5 do C.P.C - Verso em Branco

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Gabriela Cunha