Sentença de Julgado de Paz
Processo: 281/2017-JPFNC
Relator: JOANA SAMPAIO
Descritores: INCOMPETÊNCIA DO TRIBUNAL
Data da sentença: 07/16/2018
Julgado de Paz de : FUNCHAL
Decisão Texto Integral: DESPACHO

A Demandante atribuiu à ação o valor de 15.000,00€ (quinze mil euros).
Citados, os Demandados A., B., C., D. e E. apresentaram contestação na qual, entre outros, excecionam a incompetência em razão do valor deste Tribunal, atribuindo à ação o valor de €83.640,01 (oitenta e três mil seiscentos e quarenta euros e um cêntimos) por ser esse o valor que resulta do somatório do valor dos diferentes pedidos deduzidos pela Demandante. Alegam, desde logo que, a Demandante em sede dos pedidos formulados sob os números 4 a 7 pedem a condenação dos Demandados no pagamento da quantia de €15.000,00 (quinze mil euros), valor que dão à acção. Desconsiderando, porém, que deduzem outros pedidos, os quais, defendem, têm de ser tidos em conta para efeito de atribuição do valor à causa. Assim, relativamente ao pedido de declaração da nulidade das deliberações tomadas em assembleia de condóminos de 06.09.2017, na qual foi deliberado destituir a Demandante como administradora do condomínio; nomear a sociedade F., Lda. como administradora; aprovar o orçamento do condomínio no valor de €8.440,08, deve ser atribuído um valor de €30.000,01 à primeira e segunda deliberação, o que perfaz €60.000,02, e à terceira €8.440,08. Por último, alegam que tendo sido peticionado a condenação no pagamento de sanção pecuniária compulsória e cláusula penal no valor de €100,00/dia, esse mínimo terá de refletir-se no valor da ação. Assim, atribuem o valor à causa de €83.640,01 (15.000+30.000,01+30.000,01+8440,08+100,00).
Convidada a Demandante para se pronunciar sobre a matéria de exceção alegada, relativamente à questão do valor da ação defendeu obedecer aos critérios do artigo 301º nº 2 e 297º nº 1 do Código de Processo Civil, pelo que deverá improceder.
Cumpre apreciar e decidir.
No presente caso, a Demandante peticiona:
1- declaração de nulidade do aviso convocatório;
2- declaração de nulidade das deliberações tomadas em assembleia extraordinária de condóminos realizada no dia 06.09.2017;
3- condenação dos Demandados a reconhecer que a convocatória é nula tal como as correspetivas deliberações tomadas, e por via disso, a demandante não foi destituída do cargo de administradora;
4- condenação dos Demandados nos danos emergentes e lucros cessantes que venham a decorrer para a demandante da elaboração do sobredito aviso convocatório e da realização da referida assembleia extraordinária;
5- condenação dos Demandados a pagar uma indemnização de €15.000,00;
6- condenação dos Demandados a pagar a sanção pecuniária compulsória a fixar em €100,00/dia;
7- condenação dos Demandados a pagar a cláusula penal a fixar em €100,00/dia;
8- declaração que a sentença condenatória a ser proferida constitui título bastante para o registo de hipoteca sobre quaisquer bens dos Demandados;
9- condenação dos Demandados a pagar custas processuais e a condigna procuradoria.

Trata-se, pois, de uma ação integrada na competência material dos Julgados de Paz nos termos do disposto no artigo 9.º, n.º 1, alínea c) da Lei 78/2001 de 13 de julho.
A toda a causa deve ser atribuído um valor, o qual representa a utilidade económica imediata do pedido e ao qual é atendido para determinar a competência do Tribunal (artigo 296.º, n.º 1 e 2, do Código de Processo Civil (CPC), aplicável ex vi artigo 63.º da Lei 78/2001 de 13 de julho, com as alterações da Lei 54/2013 de 31 de julho).
A lei estabelece critérios gerais e especiais a que deve obedecer a fixação do valor da ação (artigo 296º e seguintes do CPC).
A determinação do valor da causa, quando as partes não tenham chegado a acordo ou quando o juiz o não aceite, faz-se em face dos elementos que constam do processo ou, mostrando-se estes insuficientes, mediante as diligências indispensáveis, que as partes requererem ou o juiz ordenar (cf. artigo 308.º do CPC).
Na determinação do valor da causa deve atender-se ao momento em que a ação é proposta (artigo 299.º, n.º 1 do CPC).
No caso dos autos, entendemos que o valor desta ação não se pode limitar ao valor indicado pela Demandante (€15.000,00), pelas razões que passamos a expor.
Atendendo ao peticionado pelo Demandante, temos que:
Relativamente aos pedidos formulados sob os números 1, 2 e 3: parece-nos que o interesse em causa não é passível de tradução patrimonial ou pecuniária, pelo que terá de ser qualificado, para efeitos de atribuição do valor à ação, como visando a salvaguarda de interesses imateriais (303º do CPC).
Na verdade, as ações sobre interesses imateriais compreendem as ações cujo objeto não tem expressão pecuniária, as ações cujo benefício não pode traduzir-se em dinheiro (ALBERTO DOS REIS, «Código de Processo Civil Anotado, I, 3.ª edição, pág. 414»).
No caso em análise a Demandante põe em causa questões inerentes à validade da convocatória e funcionamento da própria assembleia, pretendendo a anulação de tudo o que nela se terá decidido, ou seja, está em causa a própria assembleia. No mesmo sentido veja-se o acórdão do TRLisboa de 20.09.2012, “I – Numa acção em que é pedida a anulação de todas as deliberações tomadas na Assembleia de Condóminos, onde, entre outras, estão em causa questões inerentes à validade da sua convocatória, terá de se entender, para efeitos de atribuição do valor à acção, estarmos face a situação que visa a salvaguarda de valores imateriais, correspondendo-lhe, por isso, o valor de 30.000,01€.”; em sentido idêntico, embora estando em causa a anulação de deliberações sociais, o Acórdão do TRÉvora de 21.10.2009, proc. 112/06.7TBMRA-G.E1 e o Acórdão do TRPorto de 4.10.2001, proc. nº 0130793, ambos in www.dgsi.pt).
Por conseguinte, consideramos que relativamente a estes pedidos que, no fundo, se resumem a um só - declaração de nulidade das deliberações tomadas em assembleia extraordinária de condóminos realizada no dia 06.09.2017, o valor a atribuir é de €30.000,01 (trinta mil euros e um cêntimo).
Ao valor referido há a acrescer o valor da quantia certa em dinheiro peticionado pela Demandante - €15.000,00 (quinze mil euros), nos termos do disposto no artigo 297º nº 1 do CPC.
Por todo o exposto, consideramos que o valor que deve ser atribuído a esta ação, tendo presente o que dissemos e o que resulta da conjugação dos artigos 296º, 297º, 303º e 310º, todos do Código de Processo Civil, é de €45.000,01 (quarenta e cinco mil euros e um cêntimo).

Face ao exposto, fixa-se à ação o valor de 45.000,01€ (quarenta e cinco mil euros e um cêntimo).
Notifique.
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DA (IN)COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL

Da redação do artigo 8.º da Lei 78/2001 de 13 de julho, com as alterações introduzidas pela Lei 54/2013 de 31 de julho, resulta que o Julgado de Paz tem competência para as ações cujo valor não exceda 15.000,00€ (quinze mil euros).
Com a entrada em vigor a 01.09.2014 do D.L. 49/2014, de 27.03 (Regulamento da Lei da Organização do Sistema Judiciário - RLOSJ) – artigo 118.º RLOSJ - entrou igualmente em vigor a Lei 62/2013, de 26.08 (Lei da Organização do Sistema Judiciário - RLOSJ) – artigo 188.º n.º 1 LOSJ-, a qual, no artigo 187.º revoga, entre o mais a Lei 3/99, de 13.01 (Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais – LOFTJ) e o D.L.186-A/99, de 31.05 (Regulamento LOFTJ – RLOFTJ). Com a entrada em vigor da LOSJ, introduziu-se uma nova orgânica judiciária, sendo que no que respeita à Comarca da Madeira, o Tribunal Judicial passou a integrar, entre o mais, o Juízo Local Cível do Funchal (artigo 90.º n.º 2 al. a) RLOSJ).
Prevê-se no artigo 117.º da LOSJ que “1 — Compete aos Juízos Centrais Cíveis: a) A preparação e julgamento das acções declarativas cíveis de processo comum de valor superior a (euro) 50.000,00; (…)”.
Acrescenta o artigo 130.º, n.º 1 da LOSJ que “1 - Os juízos locais cíveis, locais criminais e de competência genérica possuem competência na respetiva área territorial, tal como definida em decreto-lei, quando as causas não sejam atribuídas a outros juízos ou tribunal de competência territorial alargada.”
Face ao valor destes autos, impõe-se concluir, atento o demais exposto supra, que a competência relativamente aos mesmos cabe ao Juízo Local Cível do Funchal do Tribunal Judicial da Comarca da Madeira.
A incompetência em razão do valor configura incompetência relativa, a qual traduz exceção dilatória, de conhecimento oficioso, que obsta a que o Tribunal conheça o mérito da causa e determina a remessa do processo para o Tribunal competente (artigos 7.º da Lei 78/2001 de 13 de julho, 102.º, 104.º n.ºs 2 e 3, 577.º alínea a), 578.º, 576.º n.ºs 1 e 2 do CPC aplicáveis ex vi artigo 63.º da Lei 78/2001 de 13 de julho, com as alterações da Lei 54/2013 de 31 de julho).
Atento o exposto, julgo a exceção invocada procedente e em consequência, declaro este Julgado de Paz relativamente incompetente, em razão do valor da causa, julgando competente, o Juízo Local Cível do Funchal, do Tribunal Judicial da Comarca da Madeira (artigo 66.º do Código de Processo Civil, aplicável ex vi artigo 63.º da Lei 78/2001 de 13 de julho, com as alterações da Lei 54/2013 de 31 de julho, 117.º n.º 1 alínea a) e 130.º, n.º 1 da LOSJ).

As custas são a suportar pela Demandante, que declaro parte vencida, devendo efetuar o pagamento da quantia de €35,00, a título de custas da sua responsabilidade, num dos três dias úteis subsequentes à notificação da presente decisão, sob pena de incorrer no pagamento de sobretaxa diária por cada dia de atraso no efetivo cumprimento dessa obrigação (artigos 2.º e 10.º da Portaria n.º 1456/2001, de 28 de dezembro, na redação dada pela Portaria n.º 209/2005, de 24.02).

Proceda-se ao reembolso aos Demandados que liquidaram taxa de justiça, nos termos do artigo 9.º da referida Portaria.

Registe e notifique.
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Após trânsito, remeta os autos ao Tribunal competente.

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Funchal, Julgado de Paz, 16 de julho de 2018
A Juíza de Paz

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(Joana Sampaio)
(arts. 131.º n.º 5 CPC e 18.º LJP)