Sentença de Julgado de Paz
Processo: 130/2011-JP
Relator: IRIA PINTO
Descritores: INCUMPRIMENTO CONTRATUAL - RESPONSABILIDADE CIVIL
Data da sentença: 11/29/2011
Julgado de Paz de : PORTO
Decisão Texto Integral:
Sentença

Relatório
A, melhor identificada a fls. 2, intentou em 15/09/2011, contra a demandada B, melhor identificada a fls. 2 e 65, acção declarativa nos termos do artigo 9º, nº 1, alínea i) e h) da Lei 78/2001 de 13 de Julho, formulando os seguintes pedidos:
Ser a demandada condenada a pagar à demandante o montante em divida de €2.900,00, correspondentes quer ao valor de pagamento inicial de €1.200,00, quer ao valor de €1.200,00, legalmente imposto pelos nºs. 1 e 2 do artigo 19º do DL 82/2008, de 20/05 e ao pagamento de juros comerciais no valor de €500,00.
Tendo, para tanto, alegado os factos constantes do requerimento inicial, de folhas 2 a 4 dos autos, que se dá por integralmente reproduzido. Juntou 7 (sete) documentos.
A demandante prescindiu de sessão de pré-mediação (fls. 20).
Regularmente citada a demandada apresentou a contestação, de fls. 40 a 43, que se dá por integralmente reproduzida, impugnando parcialmente os factos constantes do requerimento inicial e pugnando pela absolvição do pedido.
Cumpre apreciar e decidir
O Julgado de Paz é competente, as partes têm personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas e não se verificam quaisquer outras excepções ou nulidades de que cumpra conhecer.
Fundamentação da Matéria de Facto
Com interesse para a decisão da causa, são os seguintes os factos provados:
1 – Em 21 de Novembro de 2010, a Demandante celebrou um Contrato de Serviço de Intermediação, na qualidade de segundo contraente, com a Demandada, na qualidade de primeira contraente.
2 - Com a assinatura do Contrato de Serviço de Intermediação, conforme está previsto no ponto Um da cláusula Primeira desse contrato, a Demandante “promoverá, junto de terceiros e em local próprio, a venda do X”.
3 - Tendo por base o previsto no ponto Um da cláusula Sexta, a Demandante, em 21 de Novembro de 2010, procedeu ao pagamento do valor de €1.200 (mil e duzentos euros), com IVA incluído, como contrapartida pela cedência do uso da marca X.
4 – Após essa data, consciente do desinteresse na celebração do presente Contrato de Serviço de Intermediação, a Demandante informou, em 29 de Novembro de 2010, a Demandada da intenção de rescindir o contrato celebrado em 21 de Novembro de 2010 e a solicitar o reembolso da quantia paga.
5 - Nessa carta, enviada em 29 de Novembro de 2010, a Demandante mencionou a devolução da quantia €3.400,00 (três mil e quatrocentos euros), correspondente quer ao valor de inscrição – €2.200,00 (dois e duzentos euros), atinente ao Termo de Adesão (que é objecto de acção independente) – quer ao valor de €1.200,00, com IVA incluído, referente ao Contrato de Serviço de Intermediação celebrado, nesse mesmo dia e objecto dos presentes autos.
6 - Em 20 de Dezembro de 2010, a Demandada, através de Advogado, solicitou à Demandante o envio do NIB de forma a ser-lhe devolvido o valor em causa.
7 - De imediato, a Demandada procedeu ao envio do NIB, reforçando tal envio em 29 de Março de 2011.
8 - Através do recurso ao Centro Municipal de Informação ao Consumidor, a Demandada foi interpelada novamente, em 05 de Maio de 2011, para resolver a situação e advertida, para além da resolução do contrato e da devolução da quantia paga, da cominação legal da devolução, em dobro, da quantia paga pela Demandante, caso esta não fosse liquidada no prazo máximo de 30 dias.
9 - A Demandada, não efectuou qualquer pagamento referente aos valores acima descritos, não obstante a insistência do Centro Municipal de Informação ao Consumidor, em 15 de Junho de 2011.
10 - Estando por isso em falta o pagamento do montante correspondente ao pagamento, que a Demandante peticiona no valor total de €2.400,00, sendo €1.200,00 do valor pago, além do valor em dobro de €1.200,00.
11 - Contudo, nunca obteve qualquer resposta eficaz para solucionar o pagamento em falta, tendo a Demandante sido confrontada com uma resposta do Advogado da Demandada, a solicitar o comprovativo do pagamento realizado.
A fixação da matéria dada como provada resultou da audição das partes, dos factos admitidos, da testemunha apresentada pela demandante, C, que teve uma postura credível, relatando os factos com precisão, demonstrando conhecimento directo dos mesmos, como adiante se exporá, releva igualmente o teor dos documentos de fls. 5 a 19 juntos aos autos, o que devidamente conjugado com as regras de experiência comum alicerçou a convicção do Tribunal.
A testemunha apresentada pela demandante, C, foi considerada isenta e credível, uma vez que esteve presente em várias apresentações da empresa demandada, tendo convidado a demandante para conhecer a empresa e seus produtos, uma vez que a demandante se encontrava em dificuldades económicas, tendo sido ela própria (a testemunha) levada pelo seu filho a conhecer a empresa e os seus produtos, sendo o seu objectivo o de angariação de interessados, afirmando que acompanhou a demandante nas suas deslocações à demandada e que numa delas a demandante, além de assinar os contratos, como de serviço de intermediação, contou e entregou à sua frente o valor total de €3.400,00 em numerário, sendo respeitante a este contrato o valor de €1.200,00, valor total esse que entregou a um funcionário da demandada D, que o voltou a contar, não lhe tendo sido dado recibo de quitação, por, segundo o funcionário, faltar ainda liquidar o valor de €300,00, que seria somado aos €3.400,00 entregues, valor aquele de €300,00 que a demandante acabou por não entregar face ao desinteresse que entretanto demonstrou relativamente aos contratos apresentados pela demandada, tendo solicitado a devolução dos valores pagos.
Não se provaram quaisquer outros factos, com interesse para a decisão da causa, dada a inexistência ou insuficiência de prova nesse sentido, nomeadamente da posição da parte demandada.
Fundamentação da Matéria de Direito
A demandante intentou a presente acção peticionando a condenação da demandada no pagamento da quantia de €2.400,00, sendo que €1.200,00 corresponde ao pagamento efectuado à demandada para, na qualidade de intermediária, promover junto de terceiros a venda de um X comercializado pela demandada e €1.200,00 corresponde ao montante legalmente imposto pelos nºs. 1 e 2 do artigo 19º do DL 82/2008, de 20/05, além da condenação da demandada no pagamento de juros comerciais que contabilizou em €500,00, alegando em sustentação desse pedido ter celebrado com a demandada, em 21.11.2010, um Contrato de Serviço de Intermediação com o nº 0801, para promoção junto de terceiros e em local próprio da venda do X, identificados na Cláusula Primeira do Contrato, como consta de fls. 5 e 6 dos autos, tendo a demandante posteriormente pretendido a resolução do contrato celebrado, de acordo com carta devidamente enviada à demandada, datada de 29.11.2010, dentro do prazo de 14 dias admissível para tal resolução e solicitando a devolução do valor pago de €1.200,00.
A relação material controvertida circunscreve-se a incumprimento contratual, dispondo o artigo 405º do Código Civil sobre o princípio da liberdade contratual, com os limites previstos na lei. No âmbito dos contratos, dispõe o nº 1 do artigo 406º do Código Civil que, uma vez celebrados os contratos devem ser pontualmente cumpridos, e só podem modificar-se ou extinguir-se por mútuo consentimento dos contraentes ou nos casos admitidos na lei, o que reflecte o princípio da força vinculativa ou obrigatoriedade dos contratos. Assim, as obrigações contratuais devem ser cumpridas nos exactos termos em que são assumidas (pacta sunt servanta) e segundo as normas gerais da boa fé (artigo 762º do Código Civil). Ainda nos termos do artigo 227º, nº 1 do Código Civil, quem negoceia com outrem para conclusão de um contrato deve, tanto nos preliminares como na sua formação, proceder segundo as regras de boa fé, sob pena de ter de responder pelos danos que culposamente causou à outra parte, quer no caso das negociações serem interrompidas, quer no caso do contrato se consumar.
O caso dos autos refere-se a responsabilidade contratual, sendo que a culpa do devedor, neste caso, da demandada se presume, incumbindo-lhe nessa medida provar que a falta de cumprimento ou o cumprimento defeituoso da obrigação não procedeu de culpa sua (artigos 798º e 799º do Código Civil).
A demandada apesar de impugnar parcialmente os factos expostos pela demandante, não produziu prova da sua versão, ao invés, veio a demandante produzir prova bastante e suficiente relativamente à entrega à demandada da quantia de €1.200,00, no âmbito do contrato firmado em 21 de Novembro de 2010, como aliás consta da Cláusula Sexta do Contrato de Serviço de Intermediação de fls. 5 e 6, não impugnado pela demandada.
A verdade é que a demandante, no prazo legal para o efeito, 14 dias a partir da data de assinatura do contrato (21.11.2010), pretendeu a resolução do contrato, como está legalmente previsto no artigo 18º do Decreto-Lei nº 82/2008, de 20/05, enviando carta registada com A/R datada de 29.11.2010, para a sede da demandada (fls. 7 a 9) e solicitando a devolução do valor pago de €1.200,00, alem de outro valor objecto de processo autónomo.
É assim admitida a resolução do contrato fundada na lei ou em convenção (artigo 432º do Código civil). Segundo o artigo 436º, nº 1 do Código Civil, a resolução do contrato pode fazer-se mediante declaração feita à outra parte.
O que significa que, no presente caso, operou plenamente a resolução do contrato mediante a declaração da demandante efectuada à demandada, pelo que deveria, em consequência, a demandada proceder à restituição do valor pago de €1.200,00. Além desse valor e considerando que a demandada não procedeu à sua restituição no prazo legal (30 dias), tem a demandante direito ao valor em dobro, neste caso de €2.400,00, como consta de comunicações posteriores enviadas à demandada.
Ora, como a lei prevê, neste tipo de contratos, sendo o direito de resolução exercido pela demandante, tem a demandada um prazo de 30 dias para reembolso dos montantes pagos e se esse reembolso não for cumprido no prazo estipulado de 30 dias, fica neste caso a demandada obrigada a devolver esse valor em dobro, no prazo de 15 dias úteis (artigo 8º, nºs. 1 e 2 do Decreto-Lei nº 143/2001, de 26/04, na redacção dada pelo Decreto Lei nº 82/2008, de 20/05, artigo 19º).
Pelo que, em termos de responsabilidade contratual, considera-se que a demandada não cumpriu culposamente com a obrigação a que estava vinculada, nem o fez posteriormente.
Pelo exposto, deverá a demandada pagar à demandante o valor de €2.400,00 peticionado, a que tem direito.
São ainda devidos os juros à taxa legal de 4%, e, não juros comerciais, já que a demandante é uma pessoa singular, juros a contabilizar desde 24/01/2011 (considerando a carta de 29/11/2010, com dilação de 3 dias, decurso de 30 dias e de 15 dias úteis), até efectivo e integral pagamento.
Decisão
Em face do exposto, julgo a acção procedente, por provada e, em consequência, condeno a demandada a pagar à demandante o valor de €2.400,00 (dois mil e quatrocentos euros), além de juros à taxa legal de 4%, desde 24/01/2011 até efectivo e integral pagamento.
Custas
Nos termos da Portaria nº 1456/2001, de 28 de Dezembro, condeno a demandada no pagamento das custas totais do processo, no valor de €70,00 (setenta euros), pelo que deve pagar o valor de €70,00 (setenta euros) em falta, no prazo de três dias úteis, a contar da notificação desta sentença, sob pena do pagamento de uma sobretaxa de €10,00 (dez euros) por cada dia de atraso.
A sentença (processada em computador, revista e impressa pela signatária - artº 18º da Lei nº 78/2001, de 13 de Julho) foi proferida nos termos do artigo 60º, da Lei nº 78/2001, de 13 de Julho.
Na data de Leitura de Sentença não estiveram presentes as partes demandante e demandada.
Notifique e Registe.
Julgado de Paz do Porto, em 29 de Novembro de 2011
A Juíza de Paz
(Iria Pinto)