Sentença de Julgado de Paz
Processo: 364/2017-JP
Relator: MARGARDIA SIMPLÍCIO
Descritores: RESPONSABILIDADE CONTRATUAL E INCUMPRIMENTO CONTRATUAL - INCUMPRIMENTO CONTRATUAL
PAGAMENTO DO SERVIÇO DE FORNECIMENTO DE GÁS
Data da sentença: 05/25/2017
Julgado de Paz de : FUNCHAL
Decisão Texto Integral: SENTENÇA


Processo n.º 364/2016-J.P.
RELATÓRIO:
A Demandante, G.- C. do A., S.A., NIPC. xxxxxxxxx, com sede na rua R. J. G., n.º 53, no concelho do Funchal.
Encontra-se representada por mandatário constituído, com domicílio profissional na rua Dr. B. C., n.º 202, no concelho do Funchal.
Requerimento Inicial: Alega em síntese que é uma sociedade comercial que se dedica á atividades de comércio a retalho de combustíveis para uso domestico, em estabelecimentos especializados. No exercício da sua atividade, o demandado requereu á demandante que lhe fornecesse gás na sua residência, sendo o serviço devidamente facturado, conforme faturas que se junta. Estas perfazem a quantia global de 233,62€, as quais venciam-se no dia certo, aposto em cada fatura, sendo entregues ao demandado na sua residência. O demandado foi instado para proceder ao pagamento das faturas mas nada liquidou, pelo que ao não cumprir com a sua obrigação, venceram-se juros de mora, que ascendem no dia 22/11/2016 á quantia de 68,18€. Conclui pedindo que: seja condenado no pagamento da quantia de 337,10€, que corresponde á divida, acrescida dos juros vencidos e das despesas com o processo, ao que acrescerá os juros de mora que se vencerem, á taxa legal, até efetivo e integral pagamento, bem como na aplicação da sanção pecuniária compulsória nos termos do art.º 829-A, n.º 4 do C.C. Juntou 2 documentos.

MATÉRIA: Responsabilidade contratual e Incumprimento contratual, enquadrada nos termos das alíneas I) e H) do n.º1, do art.º 9 da L.J.P.
OBJETO: Incumprimento contratual, pagamento do serviço de fornecimento de gás.
VALOR DA AÇÃO: 337,10€.

O Demandado, J. L. H. B., NIF. xxxxxxxxx, com residência na rua do L. da B, Apt. J., 2º AA, no concelho do Funchal.
Contestação: Após ser notificado para pagar a fatura no valor de 233,92€, constatou que se refere a consumos efetuados há mais de 6 meses. Ora estes de acordo com o art.º 10, n.º 1 da L. 23/96 estão prescritos, o que se invoca. Motivo pelo qual se opõe ao seu pagamento.
Resposta às exceções: Sucede que o demandada foi interpelado, por carta, no dia 5/09/2013 para pagar a divida, aliás sempre teve conhecimento da divida e do prazo de pagamento. O direito de exigir o seu pagamento foi exercido no prazo legal de 6 meses, e teve conhecimento do corte do serviço por falta de pagamento. Nestes termos deve a contestação ser julgada improcedente e procedente a ação.

TRAMITAÇÃO:
Não se realizou sessão de pré-mediação, por ausência do demandado.
O Tribunal é competente em razão do território, do valor e da matéria.
As partes dispõem de personalidade e capacidade judiciária e são legítimas.
O processo está isento de nulidades que o invalide na sua totalidade.

AUDIÊNCIA DE JULGAMENTO:
Foi iniciada dando cumprimento ao disposto no art.º 26, n.º 1 da L.J.P., sem que as partes tenham chegado a consenso, seguindo-se a produção de prova com a junção de 4 facturas da parte da demandante, e terminando com breves alegações, conforme ata de fls. 48 a 49.

-FUNDAMENTAÇÃO-
I- FACTOS PROVADOS:
1)A demandante é uma sociedade comercial que se dedica á atividades de comércio a retalho de combustíveis para uso domestico, em estabelecimentos especializados
2) No exercício da sua atividade, a demandante prestou serviço ao demandado, nomeadamente o fornecimento de gás na sua residência.
3)O serviço foi faturado e foram emitidas as faturas com os n.º 13/00028727, 13/00044571, 13/00060404 e 13/00076235.
4)Estas têm aposto a data de vencimento.
5) As faturas emitidas perfazem a quantia global de 233,62€.
6) As facturas foram enviadas para a residência do demandado.
7) O demandado não pagou.
8)Os consumos foram efetuados há mais de 6 meses.

MOTIVAÇÃO:
O Tribunal firmou a decisão na análise dos documentos juntos pela demandante.
Teve, ainda, em consideração as declarações de ambas, prestadas voluntariamente, nos termos do art.º 57, n.º 1 da L.J.P.
Os factos que não foram considerados provados, resultam da ausência de prova.

II- DO DIREITO:
O caso vertido prende-se com o incumprimento do contrato de prestação de serviços de gás.
A prestação de serviços essenciais, objecto dos presentes autos, nos quais se incluiu o fornecimento de gás ao domicílio, enquadra-se no nº2 do art.º 1º, alíneas a), f) e g) da Lei 23/96, de 26 de Julho, alterada pela Lei 12/2008 de 26 de Fevereiro, que criou, no ordenamento jurídico, alguns mecanismos destinados a proteger o utente de serviços públicos essenciais.

O demandado e a demandante, são considerados, respetivamente, nos termos da lei supra referida, utente e prestador de serviços, art.º 1º, nº 3 e 4.

Da matéria provada resulta que a demandante forneceu gás natural ao demandado, referente a uma parte do ano de 2013 conforme enumerado na respetiva conta corrente, junta a fls. 20, e devidamente comprovado pelas faturas que foram juntas em audiência, o que perfaz o valor de 233,92€.

Na sequência dos consumos que foram realizados, em momentos distintos, a demandante emitiu as respetivas faturas. Estas possuem os n.º 13/00028727, 13/00044571, 13/00060404 e 13/00076235, as quais foram enviadas para o local de residência do demandado.
Pese embora o demandado tenha recebido as respetivas faturas, não procedeu ao respetivo pagamento, tal como lhe era exigido, pois este é um contrato onde existe uma correspetividade entre o consumo e o pagamento do serviço proporcionado.
Tendo cumprindo a demandante o acordo celebrado com o demandado, e prestando os serviços descriminados nas facturas, é-lhe devido o respetivo pagamento na quantia de 233,92€.

Sucede que o demandado alega a prescrição da divida, sendo esta uma causa da extinção da obrigação pelo seu não exercício, durante um lapso de tempo estabelecido na lei (art.º 298, n.º 1 do C.C.).
Tendo em consideração que se trata de um serviço público essencial, tal como já foi referido, há que ter por referência o disposto no art.º 10, n.º 1 da L. n.º 12/2008, que considera que o direito ao recebimento prescreve no prazo de 6 meses, após a sua prestação.
Não obstante, o prazo para exigir o referido pagamento em juízo, é também, de 6 meses, após a sua prestação art.º 10, n.º4 da L. 12/2008.
Tratam-se de prazos muito curtos, mas que visam, por um lado a defesa do consumidor que não guarda faturas durante muito tempo, e por outro a organização dos serviços, de forma a serem diligentes na cobrança de dividas que eventualmente posam existir.

Cabe á demandante o ónus da prova da realização das comunicações a que se refere o art.º 10, relativas á exigência do pagamento e do momento em que foram efetuadas (art.º 11, n.º 2 da L. 12/2008).


No caso concreto, a demandante provou que as facturas enviadas ao demandado tinham, em todas, aposto o termo do prazo do respetivo pagamento, conforme documentos que juntou em audiência. Provou, ainda, que enviou ao demandado as mesmas, antes de decorrer os 6 meses após o fornecimento do gás.

O facto de numa fatura ser mencionado a data até quando deva ser paga, não pode ser considerado como tratar-se de uma data impreterível, uma vez que a L. 12/2008 exige ao prestador do serviço, para suspender o fornecimento do mesmo, um pré-aviso adequado, realizado por escrito, e dirigido ao utente, de forma a adverti-lo da sua intenção (art.º 5, n.º 1 da L. 12/2008). Em relação a este não foi provado que o tenha realizado.
Para além disso, não provou que tivesse enviado qualquer carta interpelativa que pudesse ser considerada como interruptiva do prazo legal, por expressamente manifestar a intenção de vir a exercer judicialmente o respetivo direito, conforme resulta do art.º 323, n.º 1 e 4 do C.C.
Por outro lado, no prazo de 6 meses após a prestação do último serviço, o qual data de 31/05/2013, conforme fatura junta a fls. 54, não instaurou a competente ação, pois esta apenas deu entrada no dia 22/11/2016, facto que determinaria a caducidade do direito de a propor (art.º e art.º 333, n.º1 do C.C.), apreciada aqui oficiosamente.

Pelo que terei de considerar que o direito de exigir judicialmente o pagamento já não pode ser exercido. Não obstante, reconheço que a divida transformou-se numa obrigação natural (art.º 402 do C.C.), passando a corresponder a um dever de natureza moral ou social.


DECISÃO:
Nos termos expostos, julga-se a ação improcedente, por não provada, absolvendo-se o demandado do pedido.

CUSTAS:
São da responsabilidade da demandante, devendo proceder ao pagamento quantia de 35€ (trinta e cinco euros) no prazo de três dias úteis a contar da notificação da presente sentença, sob pena de lhe ser aplicado a sobretaxa diária na quantia de 10€ (dez euros) pelo atraso no cumprimento desta obrigação legal, art.º 8 e 10 da Portaria n.º1456/2001 de 28/12 na redação da Portaria n.º 209/2005 de 24/02.

Proceda-se ao reembolso do demandado.


Funchal, 25 de maio de 2017

A Juíza de Paz
(redigido e revisto pela signatária, art.º 131, n.º5 C.P.C.)


(Margarida Simplício)