Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | ORLANDO NASCIMENTO | ||
Descritores: | EXECUÇÃO DE SENTENÇA OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS EXCEPÇÃO DILATÓRIA | ||
Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 03/07/2024 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Texto Parcial: | N | ||
Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | IMPROCEDENTE | ||
Sumário: | 1.–A execução para pagamento de quantia certa em que o título executivo é uma sentença condenatória segue a forma sumária, tal como determinado pelo n.º 2, do art.º 626.º, do C. P. Civil, não havendo lugar a citação para os termos da execução, mas apenas a notificação do executado após a realização da penhora. 2.–A citação para a ação não constitui, na perspectiva da sua natureza jurídico processual, um pressuposto processual, cuja ausência se possa classificar como exceção dilatória, tal como previsto no n.º 2, do art.º 576.º e no art.º 577.º, do C. P. Civil, suscetível de integrar o fundamento de oposição à execução para pagamento de quantia certa baseada em sentença condenatória previsto na al. c), do art.º 729.º, do C. P. Civil - Falta de qualquer pressuposto processual de que dependa a regularidade da instância executiva, sem prejuízo do seu suprimento - mas um ato processual cuja omissão tem a natureza jurídico processual de nulidade, com os efeitos previstos na al. a), do art.º 187.º, do C. P. Civil - É nulo tudo o que se processe depois da petição inicial, salvando-se apenas esta. 3.– A penhora da quantia de € 23.526,18 e dois imóveis, um com o valor patrimonial de € 40.735,66 e outro com o valor patrimonial tributário de € 36.405,01 em execução em que a responsabilidade da executada foi liquidada provisoriamente no valor de € 75.741,20, não ofende o princípio da proporcionalidade da penhora consagrado no n.º 3, do art.º 735.º no n.º 1, do art.º 751.º e na parte final da al. a), do n.º 1, do art.º 784.º, do C. P. Civil. SUMÁRIO (do relator) | ||
Decisão Texto Parcial: | |||
Decisão Texto Integral: | Acordam os Juízes que constituem o Tribunal da Relação de Lisboa. 1.–RELATÓRIO. … CONSTRUÇÕES, … LDA., executada na execução para pagamento de quantia certa contra si requerida por …, UNIPESSOAL, LDA, que apresentou como título executivo sentença condenatória, deduziu oposição à execução e oposição à penhora, a qual foi liminarmente indeferida, por manifestamente improcedente, nos termos do disposto no art.º 732º, n.º 1, alínea c), do C. P. Civil, aplicável ex vi do art.º 785º, n.º 2, do mesmo Código, por não ter sido invocado qualquer dos fundamentos de oposição à execução em que o título executivo é uma sentença, previstos no art.º 729.º, do C. P. Civil, nem estar em causa qualquer das situações de impenhorabilidade previstas nos art.ºs 736º a 739º e 743º a 745º, do C. P. Civil. Inconformada com essa decisão, a executada oponente dela interpôs recurso, recebido como apelação, pedindo a sua revogação, formulando para o efeito as seguintes conclusões: A.–O presente recurso tem como objeto o despacho pelo Juízo de Execução de Lisboa – Juiz 4, que julgou improcedentes os embargos e oposição à penhora e consequentemente determinando o prosseguir da execução. B.–O Tribunal a quo decidiu erroneamente ao determinar a improcedência dos embargos de executado e oposição à penhora deduzidos pela executada/recorrente. C.–Alega o Tribunal a quo (fls. 5 a 7 do despacho) que “No que respeita aos fundamentos previstos nas alíneas a) a f), h) e i) do citado artigo 729º do Código de Processo Civil, inexistem quaisquer dúvidas de que os mesmos não foram alegados. E o mesmo se diga no que respeita ao fundamento contemplado na alínea g) do citado artigo 729º do Código de Processo Civil – existência de qualquer facto extintivo ou modificativo da obrigação, desde que seja posterior ao encerramento da discussão no processo de declaração e se prove por documento. Com efeito, atenta a factualidade alegada pela executada/embargante nos presentes embargos de executado não resulta demonstrada a superveniência de qualquer facto extintivo ou modificativo da obrigação e que se prove por documento.”; D.–Mais acrescenta o Tribunal a quo que: “Na verdade, uma vez que o título executivo é uma sentença, devia a executada/embargante alegar e provar documentalmente os factos supervenientes ao encerramento da discussão e julgamento no processo onde foi proferida a sentença exequenda, o que manifestamente não sucede no caso dos autos. A executada/embargante limita-se a alegar que a justificação oferecida pela exequente para contornar a citação prévia é falsa e não consubstancia a alegação de factos que justifiquem o receio de perda da garantia patrimonial do seu crédito, como lhe era legalmente exigido, sendo que em momento algum a exequente apresentou provas que corroborassem tais afirmações, pelo que devem as penhoras realizadas serem declaradas ilegais porque efetuadas sem citação prévia e sem que o Tribunal se pronunciasse quanto à citação prévia, factualidade que, como já se viu, não integra qualquer um dos fundamentos de oposição à execução baseada em sentença previstos no citado artigo 729º do Código de Processo Civil. E.–Concluindo que: “Por conseguinte, não tendo a executada/embargante alegado validamente factualidade consubstanciadora de qualquer causa impeditiva, modificativa ou extintiva do invocado direito da exequente, nem tão pouco invocado qualquer facto que afete a própria validade do título, forçoso é concluir pela manifesta improcedência dos presentes embargos de executado, o que constitui motivo para indeferimento liminar nos termos do disposto no artigo 732º, n.º 1, alínea c) do Código de Processo Civil.” F.–Contudo, tal argumentação do Tribunal a quo não pode proceder. G.–A executada/ recorrente, utiliza, em suma, como fundamento dos seus embargos o facto da justificação oferecida pela exequente para contornar a citação prévia ser falsa e não consubstanciar a alegação de factos que justifiquem o receio de perda da garantia patrimonial do seu crédito, como lhe era legalmente exigido, sendo que em momento algum a exequente apresentou provas que corroborassem tais afirmações, H.–Assim, baseia a executada os seus embargos na ilicitude decorrente do facto da justificação dada pela exequente, ora recorrida, para fundamentar a dispensa da citação prévia ser falsa e não consubstanciar a alegação de factos que justifiquem o receio de perda da garantia patrimonial do seu crédito, como lhe era legalmente exigido, I.–Bem como alega a executada, que também a exequente nunca ofereceu provas que corroborassem tais afirmações. J.–De facto, a argumentação para a dispensa da citação prévia oferecida pela exequente foi a seguinte: “A Exequente, com o intuito de realizar a cobrança extra judicial da dívida, realizou inúmeros contactos, telefónicos e por escrito, para a sede social da Executada, todos sem sucesso. Esta situação prolonga-se desde longa data, o que leva a crer que a Executada já não tem quaisquer instalações físicas ou colaboradores. Atentos os factos ora expostos requer se a dispensa de citação prévia da Executada.” K.–Ora, dispõe o artigo 727.º do Código do Processo Civil que “1-O exequente pode requerer que a penhora seja efetuada sem a citação prévia do executado, desde que alegue factos que justifiquem o receio de perda da garantia patrimonial do seu crédito e ofereça de imediato os meios de prova. 2-O juiz, produzidas as provas, dispensa a citação prévia do executado quando se mostre justificado o alegado receio de perda da garantia patrimonial do crédito exequendo, sendo o incidente tramitado como urgente; o receio é justificado sempre que, no registo informático de execuções, conste a menção da frustração, total ou parcial, de anterior ação executiva movida contra o executado.” (negritos nossos). L.–Assim, facilmente se concluí que a exequente não cumpriu os requisitos legais para o pedido de dispensa prévia da citação da executada. M.–E, por outro lado, compulsados os autos, verifica-se que o Tribunal a quo não se pronunciou sobre tal requerimento realizado pela exequente. N.–Estamos, pois, perante a falta de um pressuposto processual de que depende a regularidade da instância executiva. O.–Ora, tal situação ao contrário do esgrimido pelo Tribunal a quo, constituí fundamento de oposição à execução que tenha com título executivo uma sentença judicial (previsto no artigo 729.º, al .c) do Código do Processo Civil). P.–Conclui-se, pois, perante o supra exposto, que andou mal o Tribunal a quo ao decidir pelo indeferimento liminar dos embargos de executado deduzidos pela executada. Q.–No que concerne à oposição às penhoras deduzida pela executada, também andou mal o Tribunal a quo ao julgar pela seu indeferimento. R.–A oposição às penhoras deduzida pela executada tem como fundamento a excessividade das mesmas (artigo 784º, n.º 1 do Código do Processo Civil). S.–Contudo, decidiu- mal- o Tribunal a quo que: “não está demonstrada qualquer violação dos princípios da proporcionalidade e da adequação da penhora, sendo as penhoras efetuadas na execução admissíveis.” T.–Acrescentando que “a pura discrepância entre o valor do bem penhorado e o da obrigação exequenda não constitui violação do princípio de proporcionalidade, sobrelevando a necessidade de satisfação do direito de crédito do exequente ainda que para tal a penhora tenha de recair sobre bem imóvel que não se adeque, por excesso, ao valor do crédito do exequente, se outros bens não forem conhecidos.” U.–Concluindo que “não estando em causa qualquer uma das situações de impenhorabilidade previstas nos artigos 736' a 739' e 743' a 745', todos do Código de Processo Civil, a pretensão da executada/opoente terá de ser liminarmente indeferida, por manifestamente improcedente, de harmonia com o disposto no artigo 732', n.' 1, alínea c) do Código de Processo Civil ex vi artigo 785', n.' 2, do mesmo diploma.” V.–Tal argumentação do Tribunal a quo terá de soçobrar, porquanto, W.–Como bem refere o despacho, ora em crise, foram penhorados os seguintes bens pertencentes à executada: a)-depósito à ordem com a identificação: 0................20 que a executada detém junto do Banco Santander Totta, no montante de 23.016,16 €; b)-depósito à ordem com a identificação: 5..........01 que a executada detém junto do Banco BPI, no montante de 4,25 €; c)-depósito à ordem com a identificação: 5..........01 que a executada detém junto do Banco BPI, no montante de 505,77 €; d)-prédio urbano em regime de propriedade total sem andares nem nem divisões suscetíveis de utilização independente, sito na Rua …, n.° ..., em A____de C____, correspondente a um imóvel de 3 pisos destinado a comércio, descrito na Conservatória do Registo Predial da Azambuja sob o n.° …, da freguesia de Aveiras de Cima e inscrito na matriz predial urbana sob o n.° … da referida freguesia, com o valor patrimonial tributário de 40.735,66 €; e)-prédio urbano, sito em … A____ de C____, correspondente a um terreno para construção, descrito na Conservatória do Registo Predial da A_____ sob o n.° …, da freguesia de A____ de C____ e inscrito na matriz predial urbana sob o n.° … da referida freguesia, com o valor patrimonial tributário de 36.405,01 €. X.–Aquando da realização da última penhora, a 21 de abril de 2023, a agente de execução liquidou provisoriamente a responsabilidade da executada no valor de 75.741,20 € (68.855,64 € + 6885,56 € de despesas prováveis). Y.–O valor global dos bens penhorados é de 100.666,85€. Z.–De acordo com o artigo 735.°, n.°3 do Código do Processo Civil “ A penhora limita-se aos bens necessários ao pagamento da dívida da exequenda e das despesas previsíveis da execução (...)”. AA.–Assim, é facilmente percetível e patente o excesso das penhoras realizadas em relação ao valor da quantia exequenda e despesas prováveis no caso sub judice. BB.–Aliás, tal atuação provocou graves danos na atividade da executada. CC.–Atendendo, inclusive, que um dos imóveis penhorados é o local de exercício da atividade da executada. DD.–Nesta senda, andou mal o Tribunal a quo ao referir que “a pura discrepância entre o valor do bem penhorado e o da obrigação exequenda não constitui violação do princípio de proporcionalidade, sobrelevando a necessidade de satisfação do direito de crédito do exequente ainda que para tal a penhora tenha de recair sobre bem imóvel que não se adeque, por excesso, ao valor do crédito do exequente, se outros bens não forem conhecidos.” EE.–Cumpre referir que a necessidade de satisfação do crédito da exequente não pode, sempre e impreterivelmente, ser colocada em primazia, sendo realizada às custas de enormes prejuízos provocados na atividade da executada. FF.–Aliás, sempre se diga que “o exequente não pode aproveitar-se da menor incidência do «princípio do contraditório» na acção executiva para causar danos ao devedor que superem aqueles que seria normal suportar-se – de acordo com as regras da boa-fé, na fase da actuação da responsabilidade patrimonial – em função da deslocação patrimonial necessária para satisfazer a sua pretensão...”. vide, Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 06-04-2017, proferido no âmbito do processo n.° 3449.09.0T2SNTA.L1-6, pelo relator António Santos e disponível para consulta em www.dgsi.pt. (negrito nosso). GG.–De facto, no caso em apreço - e violando o princípio da boa fé e da proporcionalidade - a exequente fez uma deslocação patrimonial manifestamente excessiva, causando danos de enorme gravidade à executada. HH.–Por outro lado, também o argumento do Tribunal a quo de que não está em causa qualquer uma das situações de impenhorabilidade previstas nos artigos 736° a 739° e 743° a 745° do Código do Processo Civil não pode ser atendido. II.–De facto, se o princípio da proporcionalidade apenas fosse violado quando a penhora incida sobre bens que cuja impenhorabilidade se encontra legalmente prevista, o próprio princípio não teria autonomia JJ.–E é patente que não foi isso que o legislador pretendeu ao distinguir as situações de impenhorabilidade, de situações de penhora desproporcional. KK.–Conclui-se, pois, perante o supra exposto, que andou mal o Tribunal a quo ao decidir pelo indeferimento liminar da oposição à penhora deduzidos pela executada. LL.–Por outro lado, o despacho ora em crise padece de um vício de falta de pronúncia. MM.–Dispõe o artigo 615.°, n.°1, al. d) do Código do Processo que Civil, aplicável in casu por analogia, que “ é nula a sentença quando: d)- o juiz se deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento.” (negrito nosso) NN.–Nos embargos de executado e oposição à penhora deduzidos pela executada, a mesma coloca em discussão duas questões que não foram alvo de pronúncia por parte do Tribunal a quo. OO.–A saber: a)- A litigância de má fé por parte da exequente; b)-A penhora de créditos da executada, atendendo ao indeferimento do levantamento do sigilo fiscal quanto a terceiros. PP.–Ora, no que concerne à primeira questão, foi levantada pela executada atendendo às informações falsas que a mesma prestou aquando da justificação para a dispensa da citação prévia. QQ.–A verdade é que, efetivamente, a exequente faltou, intencionalmente, à verdade quando expôs -que tentou resolver o litígio extrajudicialmente (não tentou), -que que fez contactos (não fez), -que a executada não tem instalações físicas, -que a executada não tem trabalhadores, RR.–Tal falta à verdade constituí litigância de má fé, de acordo com o disposto no artigo 542.º, n.º2, al. b) do Código do Processo Civil. SS.–O preceito legal suprarreferido dispõe que: “ Diz-se litigante de má fé quem, com dolo ou negligência grave: tiver alterado a verdade dos factos ou omitido facto relevantes para a decisão da causa.” TT.–Tal questão - da litigância de má fé por parte da exequente – não foi alvo de pronúncia por parte do Tribunal a quo, na decisão ora em crise UU.–Por outro lado, o Tribunal a quo não se pronunciou sobre a notificação para penhora de créditos da executada, tendo existido um despacho que indeferiu o levantamento do sigilo fiscal em relação a terceiros. VV.–De facto, compulsados os autos verifica-se que foi requerido, ao Tribunal a quo o levantamento do sigilo fiscal relativo a terceiro, de forma a exequente procedesse a penhoras relativa a créditos de que a executada fosse titular. WW.–Tal requerimento foi indeferido por despacho proferido pelo Tribunal a quo. XX.–Contudo, quer em data anterior, quer em data posterior ao despacho suprarreferido, a verdade é que executada procedeu a notificações a dois clientes da executada para a penhora de créditos de que aquela fosse titular. YY.–Tal atuação constituí uma atuação ilícita por parte da exequente. ZZ.–Não obstante, o Tribunal a quo não se pronunciou, no despacho ora em crise, sobre tal questão. AAA.–Perante o supra exposto conclui-se que o despacho proferido pelo Tribunal a quo padece de um vício – a falta de pronúncia- que tem como consequência a sua nulidade. Nestes termos e nos demais de direito e com o mui douto suprimento de v. exas., requer-se, mui respeitosamente, que seja dado provimento ao presente recurso de apelação, revogando-se assim o despacho proferido, e substituindo-o por outro que, 1.–defira os embargos de executado e oposição à penhora deduzidos pela executada/recorrente ou caso assim não se entenda 2.–requer-se a v.exas. que se dignem a declarar a nulidade do despacho recorrido, ao abrigo no disposto no artigo 615.º, nº1, al. d), 1.ª parte, por a mesma padecer de um vício de falta de pronúncia. * O tribunal a quosustentou a decisão recorrida. 2.–FUNDAMENTAÇÃO. A)–OS FACTOS. A matéria de facto a considerar é a acima descrita, sendo certo que a questão submetida a decisão deste tribunal se configura, essencialmente, como uma questão de direito. B)–O DIREITO APLICÁVEL. O conhecimento deste Tribunal de 2.ª instância, quanto à matéria dos autos e quanto ao objecto do recurso, é delimitado pelas conclusões das alegações da recorrente como, aliás, dispõem os art.ºs 635.º, n.º 2 e 639.º 1 e 2 do C. P. Civil, sem prejuízo do disposto no art.º 608.º, n.º 2 do C. P. Civil (questões cujo conhecimento fique prejudicado pela solução dada a outras e questões de conhecimento oficioso). Atentas as conclusões da apelação, acima descritas, as questões submetidas ao conhecimento deste Tribunal pela apelante consistem em saber se a) a oposição à execução devia ter sido recebida por a executada oponente não ter sido citada para a execução, como pretende a oponente, ou se a mesma podia ser rejeitada liminarmente, como decidiu o tribunal a quo (conclusões A a P), b) o valor global dos bens penhorados é de € 100.666,85 e a agente de execução liquidou provisoriamente a responsabilidade da executada no valor de € 75.741,20 sendo a penhora excessiva e desproporcional (conclusões O a KK), c) a decisão recorrida enferma da nulidade de omissão de pronúncia por não se ter pronunciado sobre a litigância de má-fé por parte da exequente e sobre a penhora de créditos da executada atendendo ao indeferimento do levantamento do sigilo fiscal quanto a terceiros (conclusões LL a AAA). Conhecendo. 1)–Quanto à primeira questão, a saber, se a oposição à execução devia ter sido recebida por a executada oponente não ter sido citada para a execução, como pretende a apelante, ou se a mesma podia ser rejeitada liminarmente, como decidiu o tribunal a quo. O fundamento invocado pela executada apelante na sua oposição à execução consubstancia-se, grosso modo, na falta de citação para a execução a qual, segundo pretende, integra o fundamento de oposição à execução baseada em sentença previsto na al. c), do art.º 729.º, do C. P. Civil - Falta de qualquer pressuposto processual de que dependa a regularidade da instância executiva, sem prejuízo do seu suprimento. Acontece, todavia que, por um lado, na perspectiva da sua natureza jurídico processual, a citação para a ação não constitui um pressuposto processual, cuja ausência se possa classificar como exceção dilatória, tal como previsto no n.º 2, do art.º 576.º e no art.º 577.º, do C. P. Civil, mas antes como um ato processual cuja omissão tem a natureza jurídico processual de nulidade, com os efeitos previstos na al. a), do art.º 187.º, do C. P. Civil - É nulo tudo o que se processe depois da petição inicial, salvando-se apenas esta - e por outro, numa perspectiva da forma de processo aplicável, tal como invocado na decisão sob recurso, que seguindo a execução a forma sumária, tal como determinado pelo n.º 2, do art.º 626.º, do C. P. Civil, no caso sub judice não há lugar a citação para os termos da execução, mas apenas a notificação da executada após a realização da penhora. Nos termos do disposto no n.º 2, do art.º 626.º, do C. P. Civil não é aplicável a esta execução o disposto na al. j), do n.º 1, do art.º 724.º, nos n.º s 1 e 6, do art.º 726.º e no art.º 727.º todos do C. P. Civil, pelo que, não obstante no requerimento de execução ter sido “preenchida” a rúbrica “Pedido de Dispensa de Citação Prévia” que faz parte do respetivo modelo electrónico, o tribunal a quo não tinha que proferir despacho sobre tal matéria, não incorrendo, pois, na nulidade correspondente à omissão de ato processual devido. E tendo a exequente fundamentado o “Pedido de Dispensa de Citação Prévia”, que no caso não era devido por inexistência do ato de citação de que dependia, não tinha o tribunal a quo que se pronunciar, por inútil, sobre a verosimilhança dessa fundamentação para efeitos de eventual recondução da conduta da exequente ao instituto da litigância de má-fé. Nestas circunstâncias, não tendo a apelante invocado na sua oposição à execução qualquer outro fundamento para além da falta de citação, que no caso não cabia, e não constituindo esta o fundamento de oposição à execução baseada em sentença condenatória, previsto na al. c), do art.º 729.º, do C. P. Civil, não podia a oposição deixar ser liminarmente indeferida, por manifestamente improcedente, como determinado pela al. c), do n.º 1, do art.º 732.º, do C. P. Civil Improcede, pois, esta primeira questão. 2)–Quanto à segunda questão, a saber, se o valor global dos bens penhorados é de 100.666,85€ e a agente de execução liquidou provisoriamente a responsabilidade da executada no valor de € 75.741,20 sendo a penhora excessiva e desproporcional. Dispõe o n.º 3, do art.º 735.º, do C. P. Civil que “A penhora limita-se aos bens necessários ao pagamento da dívida exequenda e das despesas previsíveis da execução...”. Em consonância com este principio de proporcionalidade da penhora, por indexação ao valor necessário para pagamento das despesa da execução e da quantia exequenda, a parte final da al. a), do n.º 1, do art.º 784.º, do C. P. Civil, institui como fundamento de oposição à penhora a “extensão com que ela foi realizada”, máxime, o que o mesmo é dizer-se, a desproporcionalidade entre o escopo legal do ato de penhora e o concreto ato praticado. Pretende a apelante que no caso sub judice a penhora realizada está em desconformidade com o fim legal que se propõe, mas tal conclusão não pode ser extraída dos factos que para tanto invoca. Com efeito, como é pacífico nos autos e a decisão recorrida salienta “…Aquando da realização da última penhora, a 21 de abril de 2023, a agente de execução liquidou provisoriamente a responsabilidade da executada no valor de 75.741,20 € …”. Como também é pacífico nos autos e a apelante reproduz nas suas alegações, encontra-se penhorada a quantia (monetária) de € 23.526,18 e dois imóveis, um com o valor patrimonial tributário de € 40.735,66 e outro com o valor patrimonial tributário de € 36.405,01. Ora, considerando-se o diferencial entre a quantia já estimada para pagamento da quantia exequenda e despesas da execução e o valor penhorado, considerando-se que o valor dos imóveis penhorados terá de ser objecto de realização em quantia monetária e que a penhora de qualquer deles, atento o seu valor patrimonial tributário, é insuficiente para, adicionado à quantia de € 23.526,18, garantir os pagamentos que serão devidos nos autos de execução, não se vislumbra fundamento razoável para se concluir que não foi respeitado o principio da proporcionalidade da penhora que se extrai do disposto no n.º 3, do art.º 735.º, no n.º 1, do art.º 751.º e na parte final da al. a), do n.º 1, do art.º 784.º, do C. P. Civil. Improcede, pois, esta segunda questão. 3)–Quanto à terceira questão, a saber, se a decisão recorrida enferma da nulidade de omissão de pronúncia por não se ter pronunciado sobre a litigância de má-fé por parte da exequente e sobre a penhora de créditos da executada, atendendo ao indeferimento do levantamento do sigilo fiscal quanto a terceiros. A primeira parte desta terceira questão, relativa à omissão de pronúncia sobre o pedido de condenação por litigância de má-fé, foi já apreciada no âmbito da primeira questão da apelação, atenta a sua interconexão. De facto, inexistindo no caso sub judice o ato de citação para os termos da execução, cabendo antes a realização de notificação após a realização da penhora, nos termos do disposto no n.º 2, do art.º 626.º, do C. P. Civil, não tinha o tribunal a quo que apreciar, por inúteis, os fundamentos aduzidos pela exequente sob a rúbrica “Pedido de Dispensa de Citação Prévia” e consequentemente também não tinha que apreciar, por igualmente inútil para os termos da execução, a inverosimilhança de tais fundamentos invocados pela apelada, em ordem a apreciar a má-fé por parte da exequente, que a apelante invocou, mas sem consequências, uma vez que não pediu a condenação da apelada a esse título. A segunda parte desta terceira questão resulta compreensível em face do exarado no art.º 26.º do requerimento de oposição à execução e à penhora, no qual se questiona “ Como é que a exequente obteve conhecimento dos clientes da exequente que poderiam possuir crédito em relação àquela? E como é que a exequente e a Exma Sra Dra, agente de execução procederam à penhora de créditos da executada quando precisamente havia sido proferido despacho pelo Tribunal…INDEFERINDO…o pedido de levantamento de sigilo fiscal relativamente a terceiros…”, uma vez que desta matéria, assim abordada, não resulta qualquer questão pertinente para a oposição à penhora e que nessa medida tivesse de ser apreciada e decidida pelo tribunal a quo, quer em face do disposto no n.º 2, do art.º 608.º, quer em face do disposto no n.º 3, do art.º 5.º, ambos do C. P. Civil. Improcede, pois, também esta terceira questão e com ela a apelação. C)–SUMÁRIO 1.- A execução para pagamento de quantia certa em que o título executivo é uma sentença condenatória segue a forma sumária, tal como determinado pelo n.º 2, do art.º 626.º, do C. P. Civil, não havendo lugar a citação para os termos da execução, mas apenas a notificação do executado após a realização da penhora. 2.-A citação para a ação não constitui, na perspectiva da sua natureza jurídico processual, um pressuposto processual, cuja ausência se possa classificar como exceção dilatória, tal como previsto no n.º 2, do art.º 576.º e no art.º 577.º, do C. P. Civil, suscetível de integrar o fundamento de oposição à execução para pagamento de quantia certa baseada em sentença condenatória previsto na al. c), do art.º 729.º, do C. P. Civil - Falta de qualquer pressuposto processual de que dependa a regularidade da instância executiva, sem prejuízo do seu suprimento - mas um ato processual cuja omissão tem a natureza jurídico processual de nulidade, com os efeitos previstos na al. a), do art.º 187.º, do C. P. Civil - É nulo tudo o que se processe depois da petição inicial, salvando-se apenas esta. 3.-A penhora da quantia de € 23.526,18 e dois imóveis, um com o valor patrimonial de € 40.735,66 e outro com o valor patrimonial tributário de € 36.405,01 em execução em que a responsabilidade da executada foi liquidada provisoriamente no valor de € 75.741,20, não ofende o princípio da proporcionalidade da penhora consagrado no n.º 3, do art.º 735.º no n.º 1, do art.º 751.º e na parte final da al. a), do n.º 1, do art.º 784.º, do C. P. Civil. 3.–DECISÃO. Pelo exposto, acordam os juízes deste Tribunal da Relação em julgar a apelação improcedente, conformando a decisão recorrida. Custas pela apelante. Lisboa, 07-03-2024 (Orlando Santos Nascimento) (Inês Moura) (Pedro Martins) |