Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
1499/23.2T8LSB.L1-4
Relator: ALDA MARTINS
Descritores: CONVENÇÃO COLECTIVA DE TRABALHO
CADUCIDADE
SUCESSÃO DE INSTRUMENTOS DE REGULAMENTAÇÃO COLECTIVA
TRABALHO NOCTURNO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 02/21/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE PROCEDENTE
Sumário: I.–Atenta a filiação da autora no STAD desde 11 de Julho de 2002, o início do contrato de trabalho em 1 de Outubro de 2010 e a sua transmissão para a ré em 1 de Julho de 2019, conclui-se que, não obstante a caducidade do CCT/STAD 2004 em 17 de Fevereiro de 2014, e por esta não ser oponível à autora – na medida em que não se provou que o empregador, fosse o anterior ou o actual, a informou por escrito, nos termos estabelecidos no art. 109.º, n.º 1 do Código do Trabalho –, o mesmo continuou a ser aplicável à relação laboral em apreço.

II.–Atento o regime do horário de trabalho da autora à luz do CCT/STAD 2004, comportando de modo permanente a prestação de 3 horas de trabalho nocturno por dia que lhe conferia direito a receber um acréscimo de 30% pago mensalmente pelo seu valor médio, incluindo nas férias e subsídios de férias e de Natal, é inegável o seu carácter retributivo e que da aplicação do CCT/STAD/FETESE 2020 resultaria, só por si, a respectiva diminuição, pelo que a cláusula 56.ª, n.º 4 deste impunha que se mantivesse o pagamento em conformidade com o CCT/STAD 2004.

III.–O CCT/STAD 2004 e o CCT/STAD/FETESE 2020 têm semelhante nível de protecção do trabalhador em matéria de: retribuição base correspondente a horário semanal de 40 horas; acréscimo de 16% sobre a retribuição mensal e direito a folgar um sábado e domingo consecutivos de sete em sete semanas, quando o Domingo não é dia de descanso semanal; acréscimo por prestação de trabalho normal em dia feriado.


(Sumário da autoria da Relatora)

Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa:


1.Relatório


AA intentou acção declarativa de condenação, com processo comum, contra Acciona – Facility Services, S.A., alegando, em síntese, que foi admitida ao serviço da ré em 1 de Julho de 2019, por transferência de outra empresa, com a antiguidade reportada a 1 de Outubro de 2010, exercendo as funções de trabalhadora de limpeza nas instalações do Aeroporto de Lisboa. A autora é associada do STAD desde 2002, pelo que a mesma continua a ter direitos retributivos nos ternos do CCT/STAD 2004, já que ambos os outorgantes ressalvaram no CCT 2020 as respectivas posições acerca da caducidade do anterior e a cláusula 56.º, n.º 4 do novo CCT salvaguarda que da aplicação deste não pode resultar prejuízo para os trabalhadores. Ora, a partir de Janeiro de 2020, a ré passou a pagar à autora as horas nocturnas apenas com o acréscimo de 25%, em vez de 30%, e deixou de as considerar nos subsídios de férias e de Natal. Por outro lado, desde Julho de 2019, apenas lhe pagou retribuição com base num horário de trabalho de 35 horas semanais, quando o horário da autora era de 40 horas semanais, devendo-lhe as diferenças, inclusive no acréscimo pelo trabalho aos Domingos. Acresce que pagou-lhe o trabalho prestado em dias feriados com o acréscimo de 75%, em vez de 100%. Finalmente, não lhe pagou os sete sábados e domingos consecutivos a que tinha direito a folgar em cada ano.
Termina, pedindo que:
1Seja a ré condenada a pagar à autora a quantia de 7.711,74 €, acrescida da que se vencer até decisão final, de juros contados à taxa legal desde a data da citação e até integral pagamento;
2–Seja a ré condenada a cumprir nas prestações futuras quanto ao acréscimo de horas nocturnas;
3–Seja a ré condenada a cumprir nas prestações futuras nos termos do CCT/STAD.

A ré apresentou contestação, invocando que o CCT/STAD 2004 caducou em 17 de Fevereiro de 2014, passando a ser aplicável, por força de portaria de extensão, o CCT/FETESE até à publicação do CCT/STAD/FETESE 2020, referido pela autora, globalmente mais favorável, pelo que o primeiro nunca foi aplicável às relações entre as partes. Acresce que, em Janeiro de 2022, as partes outorgaram um acordo específico, com entrada em vigor em 1 de Novembro de 2021.

Após audiência de julgamento, foi proferida sentença, que absolveu a ré do pedido.

A autora interpôs recurso da sentença, formulando as seguintes conclusões:
«1.–Nos termos do nº 1 da cláusula 25ª do CCT de 2004, “Considera – se retribuição do trabalho tudo aquilo que, nos termos do presente contrato, dos usos e costumes da empresa e do contrato individual, o trabalhador tem direito a receber como contrapartida da prestação de trabalho”, e n os termos da clausula 24ª daquele CCT, considera – se trabalho noturno o prestado entre as 20 horas de um dia e as 07 horas do dia seguinte. E, nos termos da cláusula 28ª, nº 1 e 2 do CCT de 2004, o trabalho prestado entre as 0 e as 5 horas será remunerado com um acréscimo de 50% além do trabalho normal e o restante trabalho noturno será remunerado com um acréscimo de 30% além do trabalho normal.
2.–Nos termos do nº 3 da citada cláusula 28ª do CCT de 2004, o acréscimo da remuneração devida pela prestação de trabalho noturno integrará, para todos os efeitos legais e obrigacionais, a remuneração do trabalhador, devendo ser paga mensalmente, pelo valor do seu cômputo médio e devendo integrar a remuneração respeitante ao período de férias, o subsídio de férias e o subsídio de Natal.
3.–No dia 15 de Janeiro de 2020 foi publicado no BTE nº 2/2020, o novo Contrato Colectivo de Trabalho entre a Associação Portuguesa de Facility Services – APFS e o Sindicato dos Trabalhadores de Serviços de Portaria, Vigilância, Limpeza, Domésticas e Actividades Diversas – STAD, e ambos deixaram consignado que nem a APFS, nem o STAD renunciaram às suas posições a respeito da caducidade do CCT de 2004, entendendo a APFS que a caducidade já ocorreu e o STAD defendendo que não.
4.–Na cláusula 26ª do CCT publicado no BTE nº 2/2020 de 15/01/2020, consagra um regime de remuneração do trabalho noturno menos favorável para o trabalhador, uma vez que diminui o período, que entre as 20:0 h e as 07:00h e agora passa a ser entre as 21:00 h e as 06:00h, o valor diminui de 30% para 25%
5.–Como ficou salvaguardado no nº 4 da Cláusula 56ª do CCT publicado no BTE nº 2/2020 de 15/01/2020, da aplicação deste novo CCT não poderá resultar prejuízo para os trabalhadores, pelo que se mantêm o pagamento do trabalho noturno.
6.–No Contrato Colectivo de Trabalho atualmente em vigor, a Associação Empresarial e o STAD mantiveram as suas posições defendendo a primeira que teria ocorrido a caducidade do Contrato Colectivo de Trabalho anterior e defendendo o STAD que essa caducidade não teria ocorrido (ver nesse sentido o acórdão do STJ de 17/11/2016).
7.–Independentemente da controvérsia acerca ou não da caducidade, nos termos do nº 8 do art. 501º do Código do Trabalho, aquele subsídio noturno sempre se manteria ainda que se reconhecesse a caducidade do CTT, uma vez que nos termos da cláusula 28ª, o subsídio noturno passava a integrar a retribuição do trabalhador.
8.–E sem prejuízo do que atrás vem dito, nos termos do art. 503º, nº 4, in fine, do Código do Trabalho, em conjugação com o estabelecido na cláusula 56ª, nº 4 do novo CTT, a vigência da cláusula 26ª não era aplicável aos trabalhadores que já estivessem a auferir aquele subsídio noturno no âmbito das cláusulas 24ª e 28ª
9.–Em todas as abordagens é pacifico o entendimento de que a caducidade das convenções coletivas têm que ser publicada no Boletim do Trabalho e Empego, pois a caducidade é uma das formas de cessação da vigência das convenções coletivas por força das disposições conjugadas dos arts. 502º, nº 1, b), e da parte final do nº 6 do art. 502, do Código do Trabalho na redação anterior a 2019, e do art. 519º, nº 1, do Código do Trabalho. O problema levanta – se porquanto dos autos não decorre qualquer prova dos fatos geradores da veracidade dos fatos invocados na mencionada comunicação.
10.–O que desde logo inviabiliza, no entender da A. a conclusão de que a caducidade teria ocorrido após seguidas as etapas procedimentais previstas nos nºs 2 a 5, do art. 501º, do Código do Trabalho na redação ao tempo vigente.
11.–Mas, independentemente deste aspeto, o ato de publicação no BTE da caducidade do CCT em causa era um ato administrativo condicionante da sua validade e eficácia por força do previsto no art. 268º, nº 3, da Constituição, conjugado com os arts. 502º, nº 1, b), e com a parte final do nº 6 do art. 502, do Código do Trabalho na redação anterior a 2019, e com o art. 519º, nº 1, do Código do Trabalho.
12.–Tratava – se de fato da obrigação de publicação de um ato de que dependiam deveres, criando ou extinguindo direitos legalmente protegidos e afetando as condições do seu exercício.
13.–Nestes termos, ao contrário do decidido no Acórdão do STJ, por força do ordenamento constitucional vigente a eficácia da caducidade dependia da efetiva publicação no BTE, o que não sucedeu.
14.–Nestas circunstâncias, quer por inexistência de prova nos autos de que havia decorrido o procedimento negocial gerador da caducidade, quer por inexistência de qualquer prova sobre a existência ou não do indeferimento formal por parte da DGERT na sequência da comunicação da Associação Empresarial efetuada nos termos do art. 501º, nº 4, do Código do Trabalho, na redação ao tempo vigente, o Acórdão recorrido, devia antes ter reconhecido a ineficácia da caducidade do CCT em causa nos autos por ausência de publicação da mesma no BTE, sendo a R. condenada, nos termos peticionados.
15.–A douta Sentença recorrida ao decidir que a falta de publicação no BTE da caducidade não era um ato constitutivo gerador da caducidade, conheceu de fatos procedimentais não provados nos autos e que eram dependência necessária da existência da caducidade, violando por essa forma os nºs 2 a 5 do art. 501º, do Código do Trabalho, e ao decidir que a publicação no BTE da caducidade do CCT não condicionava a sua eficácia, violou o art. 268º, nº 3, da Constituição, conjugado com os arts. 502º, nº 1, b), e com a parte final do nº 6 do art. 502, do Código do Trabalho na redação anterior a 2019, e com o art. 519º, nº 1, do Código do Trabalho.
16.–A regra geral sobre esta matéria é a de que o CCT novo (no caso o de 2020), substitui integralmente o CCT anterior (o de 2004) principalmente quando no novo CCT se faz constar que este é mais favorável que o CCT anterior (como consta aliás do CCT de 2020). Mas está também previsto na Lei que podem continuar a existir direitos que estavam a ser aplicados e decorrentes do CCT anterior quando no novo CCT tal estiver expressamente previsto;
17.–E no caso do CCT de 2020, está previsto que, da aplicação deste novo CCT não poderão resultar prejuízos para os trabalhadores, e designadamente os seguintes:
-baixa de categoria ou classe
-diminuição da retribuição
-supressão de quaisquer regalias de carater regular ou permanente.
18.–Ou seja, relativamente a estes três itens as cláusulas do CCT de 2020 nada podem fazer, a não ser manter os direitos delas decorrentes ou melhorá-los. A baixa de categoria ou classe está regulada na lei, que só a permite mediante acordo expresso do trabalhador, estando previsto também que, nessas situações a baixa de retribuição só poderá existir, mesmo quando haja acordo do trabalhador, se for autorizada pelo ACT.
19.–A diminuição de retribuição através de convenção coletiva só é admissível desde que essa possibilidade esteja prevista em convenção coletiva, e no caso do CCT de 2020, a convenção coletiva proíbe essa diminuição.
20.–Como tem sido Jurisprudência corrente no que refere ao pagamento do trabalho noturno no caso do CTT da Limpeza, esse acréscimo integra o conceito de retribuição, porquanto com essas características tem reflexo no montante devido nas férias, subsídio de férias e subsídio de Natal como decorre da cláusula 28ª do CTT de 2004. Assim sendo, como é, os trabalhadores que estavam a auferir essa parcela retributiva antes da entrada em vigor do CTT de 2020, mantêm o direito a esse acréscimo como retribuição que é.
21.–E nem se argumente que a lógica utilizada por algumas empresas de que a retribuição não pode ser diminuída tem que ser aferida somente através da retribuição que era auferida na sua globalidade ou quantificação mensal porque a clausula 28ª do CTT de 2004, traduzem a inevitabilidade o aumento do acréscimo retribuitivo sempre que haja um aumento de retribuição base.
22.–Esta cláusula do CCT de 2004, é pois cláusula de definição do modo de pagamento de retribuição de todo e qualquer trabalhador que se encontre no desempenho de funções na categoria funcional a que a que a mesma cláusula se refere.
23.–Estão pois abrangidas pela proibição de diminuição de retribuição da cláusula 56ª do CCT de 2020, garantindo que a maior favorabilidade do CTT não podia ser nunca entendida em detrimento da proibição da baixa de categoria ou classe ou diminuição de retribuição.
24.–Como foi decidido pelo Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 18 de Janeiro de 2023, no proc. 3694/21.0T8LSB.1, “… a nova convenção ressalva certos efeitos, pelo que há necessariamente, um prolongamento a que devemos obediência. E assim, aos trabalhadores nunca abrangidos pela convenção anterior aplicar – se – á necessariamente apenas a nova convenção. Mas àqueles que beneficiaram da anterior não poderão ser negadas as regalias dela resultantes ou a melhor retribuição.
25.–A A. praticava um horário de trabalho das 15 h às 23 h, de 5ª feira a 2ª feira, com folga à 3ª feira e 4ª feira, passando a partir de Novembro de 2021 a ser das 14 h 00 às 23 h 00, com uma hora de pausa e quatro dias e folgando dois.
26.–Nos termos da cláusula 19ª, nº 6 do CCT de 2004, os trabalhadores que prestam serviço em regime de laboração continua têm direito a uma pausa diária de trinta minutos, a definir pela entidade patronal conforme as exigências do serviço, mas de modo que os trabalhadores não prestem mais que cinco horas consecutivas de trabalho diário, e nos termos do nº 7 da cláusula 19º do CCT aplicável, o período de descanso referido no número anterior não determina perda de retribuição nem alargamento de horário
27.–De acordo com o horário de trabalho praticado pelo A. de 40 horas semanais, a R. não pagou ao A. a retribuição correspondente a 40 horas semanais, a R. paga ao A. a retribuição correspondente a 35 horas semanais
28.–A R. deve ser condenada a pagar à A. o direito a diferenças remuneratórias a titulo de retribuição base e acréscimo de 16% que peticiona nos presentes autos.
29.–Nos termos da cláusula 27ª do CCT mencionado, “O trabalho prestado em dia de descanso semanal ou em dia feriado dá direito ao trabalhador a um acréscimo de retribuição de 100% sobre a retribuição normal e a descansar num dos três dias seguintes”.
30.–A R. paga o trabalho em dias feriados com o acréscimo de 75%, e não paga de acordo com a cláusula 27ª do CTT de 2004, e tem o A. direito a receber o trabalho prestado em dias feriados com o acréscimo de 100%
31.–Nos termos da cláusula 38ª, nº 3, al. e) do CCT de 2004, de sete em sete semanas os trabalhadores terão direito a folgar um Sábado e Domingo consecutivos, e nos termos da cláusula 30º, nº 4 al. d) do actual CCT os trabalhadores que exerçam funções no regime horário de 5 dias de trabalho tem direito a folgar de 7 em 7 semanas um sábado e domingo consecutivos.
32.–De acordo com o horário de trabalho da A. das 15 h às 23 h, com folga 3ª e 4ª feira, e passando a partir de Novembro de 2021 a ser das 14h00 às 23 h 00, com uma hora de pausa e quatro dias e folgando dois, a A. tem direito a gozar 7 sábados e 7 domingos por ano.
33.–Deve a R. ser condenada a pagar à A. o direito às diferenças remuneratórias a titulo de folgas que peticiona nos presentes autos.
34.–A douta sentença recorrida decidiu que o acordo subscrito pela Autora em Janeiro de 2022 do qual resulta expressamente a aceitação da aplicação do novo CCT publicado em Janeiro de 2020, este raciocínio só é válido a partir da celebração do acordo em Janeiro de 2022, mas não afecta os anteriores direitos dos trabalhadores até à data da assinatura do acordo em Janeiro de 2022.
35.–Devendo por essa razão ser anulada a decisão recorrida e deve se a R. condenada a pagar à A. o direito às diferenças remuneratórias que peticiona nos presentes autos.»

A ré apresentou resposta ao recurso da autora, pugnando pela sua improcedência, formulando as seguintes conclusões:
«1ª– Relativamente ao período anterior a 1 de janeiro de 2020, não pode a Recorrente invocar a aplicabilidade de um CCT (o CCT/STAD) que, nos termos de jurisprudência estabilizada, caducou em 17 de fevereiro de 2014, deixando de produzir, desde essa data, quaisquer efeitos.
2ª–Era aplicável à relação de trabalho o CCT/FETESE, por força de portaria de extensão, que a Recorrida cumpriu com rigor.
3ª–Nestes termos se pode aceitar que a Recorrente insista na invocação de direitos resultantes da aplicação deste CCT/STAD às relações de trabalho com a Recorrida, porque todas posteriores a 17 de fevereiro de 2014.
4ª– Após a caducidade do CCT/STAD (17 de fevereiro de 2014), a Recorrida aplicou à relação de trabalho o CCT/FETESE, outorgado entre a mesma associação patronal e a FETESE, publicado no Boletim de Trabalho e Emprego, n.º 34, de 15 de setembro de 2015 (doravante designado abreviadamente por “CCT/FETESE”) e sua portaria de extensão.
5ª– E a aplicação do CCT/FETESE à relação de trabalho deu-se até 1 de janeiro de 2020, cumprindo a Recorrida integralmente os pagamentos que do mesmo decorriam à relação de trabalho com a Recorrente.
6ª– E ficou perentória e reiteradamente esclarecido que a partir de 1 de janeiro de 2020 só uma Convenção Coletiva do Trabalho releva no setor da limpeza, uma vez que em 2020 foi publicado um novo Contrato Coletivo de Trabalho (CCT) para o setor da limpeza, publicado no Boletim do Trabalho e Emprego n.º 2, de 15.01.2020, com efeitos reportados a 1 de janeiro de 2020, nos termos da sua Clª 2ª/1.
7ª– Foi, simultaneamente, requerida por todas as partes, a emissão de Portaria de Extensão (cuja aplicação à ora Recorrente não é necessária porque está filiada numa associação sindical outorgante), de modo a garantir que, para o futuro, as relações de trabalho no setor da limpeza sejam uniformemente reguladas por um só instrumento de regulamentação coletiva, nos termos da sua Clª 2ª/2 do novo CCT.

8ª–O novo CCT, no n.º 1 da sua Cláusula 56.ª estabelece o seguinte:
1.–O presente CCT revoga e substitui integralmente o CCT «celebrado entre a Associação Portuguesa de Facility Services e o STAD, Sindicato dos Trabalhadores de S.P.V.L.D. e Actividades Diversas, publicado no Boletim de Trabalho e Emprego, n.º 12, de 29 de março de 2004 e o CCT entre a mesma associação patronal e a FETESE e os sindicatos outorgantes, publicado no Boletim de Trabalho e Emprego, n.º 34, de 15 de setembro de 2015”.
9ª– Paralelamente, e tendo em conta a incorporação no novo CCT de diverso clausulado dos CCT substituídos e revogados, foi estabelecido no n.º 3 dessa cláusula 56.ª que:
3- As disposições do presente contrato coletivo têm um caráter globalmente mais favorável para os trabalhadores por ela abrangidos do que as disposições das anteriores convenções coletivas que lhes foram aplicáveis, incluindo as de caráter administrativo. “
10ª- Face ao disposto no art.º 503.º/3 do Código do Trabalho, os direitos decorrentes de convenção revogada podem ser reduzidos desde que a nova convenção determine, expressamente, o seu caráter globalmente mais favorável, o que é o caso.
11ª- Acresce que em janeiro de 2022 as partes outorgaram um acordo específico para ser aplicado no Aeroporto General Humberto Delgado, em Lisboa, com entrada em vigor em 1 de novembro de 2021 (factos assentes nºs 13 e 14).
12ª- Este é o local de trabalho da Autora (facto assente n.º 4).
13ª- A Autora assinou esse acordo no n.º 26 (facto assente n.º 14).
14ª- Desde essa data (1 de novembro de 2021) a Autora aufere as horas noturnas no subsídio de férias (factos assentes nºs 13 e 15).
15ª- Esse acordo reconhece a aplicação do novo CCT na sua Cláusula 1ª (Âmbito) (facto assente n.º 14).
16ª- Estabelece que este é o CCT aplicável às remunerações relativas a trabalho em dia de descanso semanal obrigatório, dias feriados e em horário noturno (facto assente n.º 14).
17ª- Desde essa data (1 de novembro de 2021) Autora aufere um vencimento referente a 40 horas semanais (factos assentes nºs 13 e 15).
18ª- A Autora está a fazer um horário de 4 dias de trabalho seguidos e dois dias de folga, das 14 horas às 23 horas, com 1 hora de pausa, nos termos do referido acordo (factos assentes n.ºs 13 e 14).
19ª- Não estamos perante prestações retributivas irredutíveis ou indisponíveis, razão pela qual nada há a apontar à Recorrida, e nada deve esta à Recorrente, a quem não assiste razão, estranhando-se, isso sim, a leviandade com que a Recorrente assina acordos com a Recorrida e, posteriormente, demanda-a em Tribunal como se eles não existissem, como bem foi referido na douta sentença, ao referir que o peticionado é feito “raiando a litigância de má-fé”.»

Admitido o recurso, e remetidos os autos a esta Relação, observou-se o disposto no art. 87.º, n.º 3 do CPT, tendo o Ministério Público emitido parecer no sentido da improcedência daquele.

Cumprido o previsto no art. 657.º do CPC, cabe decidir em conferência.

2.Questões a resolver

Tal como resulta das conclusões do recurso, que delimitam o seu objecto, a questão que se coloca a este Tribunal é a de saber se a autora tem direito às quantias reclamadas e vencidas antes e depois da substituição do CCT/STAD 2004 pelo CCT/STAD/FETESE 2020, a título de:
- acréscimo por horas nocturnas;
- diferenças por horário semanal de 40 horas, inclusive no acréscimo por trabalho aos Domingos;
- acréscimo por trabalho em feriados;
- sábados e domingos consecutivos por gozar.

3.Fundamentação

3.1.Os factos considerados provados são os seguintes:
1.A ré é uma empresa que se dedica à prestação de serviços de limpeza.
2.A autora foi admitida ao serviço da ré, em 1 de Julho de 2019, por transferência da empresa ISS, com uma antiguidade que se reporta a 1 de Outubro de 2010.
3.A autora exerce as funções inerentes à categoria profissional de trabalhadora de limpeza, para um horário das 15h00 às 23h00, trabalhando cinco dias, passando a partir de Novembro de 2021 a ser das 14h00 às 23h00, com uma hora de pausa, trabalhando quatro dias e folgando dois.
4.A autora tem como local de trabalho as instalações do Aeroporto General Humberto Delgado, em Lisboa.
5.No ano de 2022, a autora auferia o vencimento base mensal de € 709,00.
6.A autora é associada do Sindicato dos Trabalhadores de Serviços de Portaria, Vigilância, Limpeza, Domésticas e Actividades Diversas, com o n.º 52969, desde 11 de Julho de 2002.
7.(eliminado)[1]
8.A empresa ISS executou a empreitada de serviços de limpeza das instalações do Aeroporto de Lisboa até 30 de Junho de 2019, tendo a autora trabalhado para aquela empresa até àquela data.
9.A partir de 1 de Julho de 2019, e em substituição da empresa ISS, passou a ré a encarregar-se daquela prestação de serviços.
10.Até Dezembro de 2019, a ré pagou à autora as horas nocturnas com o acréscimo de 30%.
11.A partir de Janeiro de 2020, a ré pagou à autora as horas nocturnas com o acréscimo de 25%.

12.A autora recebeu nos seguintes anos as seguintes quantias de horas nocturnas:
- 2019 - € 67,47;
- 2020 - € 41,86;
- 2021 - € 41,71;
- 2022 - € 41,35, com o esclarecimento de que a percentagem retributiva acrescida aplicada às horas nocturnas decorreu da aplicação do CCT/FETESE.

13.A ré pagou à autora as seguintes quantias:
Vencimento base
Ano 2019 - € 525,00
Ano 2020 - € 558,25
Ano 2021 - € 584,50
Ano 2022 - € 709,00
Trabalho domingos 16% CCT
Ano 2019 - € 84,00
Ano 2020 - € 89,32
Ano 2021 - € 89,32
Ano 2022 - € 113,44, com o esclarecimento que, desde Novembro de 2021, a autora passou a receber a retribuição base de € 668,00, correspondente à mudança para quarenta horas, num sistema de 4 dias de trabalho seguidos de dois dias de folga, horário nos termos do Acordo celebrado entre a autora e a ré.

14.Em Janeiro de 2022, a autora subscreveu o “Acordo sobre as condições específicas de trabalho entre o STAD, Sindicato dos Trabalhadores de Serviços de Portaria, Vigilância, Limpeza, Domésticas e Actividades Diversas, e a empresa ACCIONA, Facility Services, S.A., para o local de trabalho ANA, Aeroportos de Portugal no Aeroporto General Humberto Delgado de Lisboa”, junto a fls. 28 vs. a 32 vs. e cujo conteúdo se dá aqui por integralmente reproduzido, assinaladamente o seguinte[2]:
“Cláusula 1ª
(Âmbito)
O presente Acordo é celebrado com os trabalhadores da ACCIONA Facility Services, S.A. (doravante Empresa), representados negocialmente pelo Sindicato dos Trabalhadores de Serviços de Portaria, Vigilância, Limpeza, Domésticas e Atividades Diversas (doravante STAD), vinculados por contrato individual de trabalho, que exercem ou venham a exercer funções no Aeroporto de Lisboa, alvo de empreitada de prestação de serviços de limpeza mantidos pela Empresa e que tenham como atividade profissional a limpeza das instalações da ANA Aeroportos de Portugal no Aeroporto General Humberto Delgado de Lisboa, ficando assim abrangidos os trabalhadores que detenham as categorias profissionais previstas na Tabela A, conforme descritas no Contrato Coletivo de Trabalho celebrado entre a Associação Portuguesa de Facility Services (APFS) e o Sindicato dos Trabalhadores de Serviços de Portaria, Vigilância, Limpeza, Domésticas e Atividades Diversas (STAD) e a Federação dos Sindicatos de Indústria e Serviços (FETESE), publicada no BTE n.º 2 de 15 de janeiro de 2020 (doravante CCT).
Cláusula 2ª
(Aplicação e Vigência)
1– Este Acordo entra em vigor no da 01 de novembro de 2021 e vigorará até à sua revogação.
2– A revogação deste Acordo, bem como a sua alteração, exige a vontade expressa, por escrito, de ambas as partes celebrantes.
Cláusula 3ª
(Laboração contínua)
1–As partes outorgantes acordam em considerar indispensável à atividade desenvolvida pela Empresa, na prestação de serviços de limpeza na ANA Aeroportos de Portugal no Aeroporto General Humberto Delgado de Lisboa, o trabalho em regime de laboração contínua.
2–Considera-se regime de laboração contínua a organização do trabalho consistente na fixação de horário de trabalho sem observância permanente do Domingo como dia de descanso obrigatório, com folga rotativa.
Cláusula 4ª
(Horário de trabalho)
1– Os trabalhadores abrangidos pela organização do trabalho em regime de laboração contínua não poderão cumprir mais que quatro dias consecutivos de trabalho, que serão sempre seguidos de dois dias consecutivos de descanso semanal.
2– Os trabalhadores abrangidos pela organização do trabalho, em regime de laboração contínua, não poderão cumprir mais de oito horas de trabalho diário.
Cláusula 5ª
(Período de refeição)
1– Os trabalhadores integrados na organização de trabalho em regime de laboração contínua, com 4 dias de trabalho consecutivos seguidos de dois de folga consecutivos, têm uma hora de intervalo para refeição após quatro horas e não podendo ultrapassar as cinco consecutivas de trabalho.
2– O período de refeição, referido no número anterior, não é considerado como tempo efectivo de trabalho.
Cláusula 6ª
(Outras Remunerações)
1–Todos os trabalhadores e trabalhadoras, que laboram conforme os termos da cláusula quarta, têm direito às seguintes remunerações:
1.1.-Remuneração por prestação de trabalho em dia de descanso semanal obrigatório, segundo a cláusula 30ª, ponto 3, alínea c, do CCT (descanso semanal).
1.2.-Remuneração do trabalho prestado em dias feriados, segundo a cláusula 21ª, ponto 1, do CCT (trabalho normal em dia feriado).
1.3.-Remuneração do trabalho prestado em horário noturno, segundo a cláusula 26ª, do CCT (remuneração do trabalho noturno).
2–As remunerações referidas nos números 1.1 e 1.3 são consideradas como retribuição para efeitos de pagamento de férias e respetivos subsídios de férias e subsídio de Natal.
(…).”
15.Desde Novembro de 2021, a ré pagou à autora as quantias indicadas nos recibos de vencimento juntos a fls. 33 a 41.
16.Desde Julho de 2019, a autora não prestou trabalho nas seguintes datas:
- De 30.03.2020 a 19.04.2020, por baixa médica;
- A partir de 19.04.2020, a autora esteve em lay-off;
- De 08.10.2020 a 06.11.2020 esteve de férias;
- De 29.01.2021 a 07.02.2021 esteve novamente de baixa;
- De 03.05.2021 a 01.06.2021 esteve de férias;
- De 31.10.2021 a 16.11.2021 esteve novamente de baixa.
3.2.Resulta da factualidade provada que a ré é uma empresa que se dedica à prestação de serviços de limpeza. A empresa ISS executou a empreitada de serviços de limpeza das instalações do Aeroporto de Lisboa até 30 de Junho de 2019, tendo a autora trabalhado para aquela empresa até àquela data. A partir de 1 de Julho de 2019, e em substituição da empresa ISS, passou a ré a encarregar-se daquela prestação de serviços. A autora foi admitida ao serviço da ré, em 1 de Julho de 2019, por transferência da empresa ISS, com uma antiguidade que se reporta a 1 de Outubro de 2010, exercendo funções inerentes à categoria profissional de trabalhadora de limpeza, no referido local de trabalho. Mais se provou que a autora é associada do STAD desde 11 de Julho de 2002.
Atenta a filiação da autora desde data anterior ao início do contrato de trabalho e à data da sua transmissão para a ré, seria aplicável à relação laboral, enquanto vigorasse, o CCT celebrado entre a AEPSLAS, actualmente APFS, e o STAD, publicado no BTE n.º 12, de 29 de Março de 2004, posto que, apesar de nada constar expressamente como assente, as partes aceitam implicitamente que a ISS e a ré são associadas daquela associação patronal outorgante, limitando-se a Apelada a sustentar na sua alegação, tal como na contestação, que a mesma já caducou.
Por outro lado, relativamente à questão da caducidade do CCT/STAD 2004, apesar de também não resultar enunciada factualidade que a evidencie, afigura-se pacífico – como assente na jurisprudência que as partes citam e na que também será citada por nós – que ocorreu em 17 de Fevereiro de 2014, sendo controvertido – isso sim – se logo se tornou eficaz ou não.
Isto é, o busílis da questão reside em saber se é necessária a publicação no Boletim do Trabalho e Emprego de “aviso sobre a data da cessação da vigência de convenção colectiva”, nos termos da norma constante, na aludida data de caducidade do CCT, do n.º 4 do art. 502.º do Código do Trabalho[3], para que produza efeitos tal caducidade, ou se estes efeitos se produzem independentemente dessa publicação, de acordo com o art. 501.º, n.º 4 do mesmo diploma legal, na versão vigente na mesma data[4], segundo o qual, decorrido o período referido no número anterior, a convenção mantém-se em vigor durante 60 dias após qualquer das partes comunicar ao ministério responsável pela área laboral e à outra parte que o processo de negociação terminou sem acordo, após o que caduca.

Ora, sobre esta questão, as ora Relatora e 1.ª Adjunta já perfilharam a posição que vem sendo seguida pelo Supremo Tribunal de Justiça, no Acórdão desta Relação de 13 de Julho de 2023, proferido no processo n.º 27197/20.0T8LSB.L1, e o mesmo sucedeu com o ora 2.º Adjunto no Acórdão desta Relação de 28 de Junho de 2023, proferido no processo n.º 15644/20.6T8LSB.L1[5].
Conforme se fez notar no 1.º aresto, o Supremo Tribunal de Justiça decidiu nos seus Acórdãos de 11 de Dezembro de 2019, proferidos nos processos n.ºs 404/17.0T8STB.EI.S 1 e 14752/16.2T8PRT.P1.S1[6], que a caducidade de Convenção Colectiva de Trabalho não depende da publicação do aviso no Boletim do Trabalho e Emprego, mas, quando o mesmo não for publicado, a caducidade só será oponível aos trabalhadores quando o empregador os informar por escrito, nos termos estabelecidos no art. 109.º, n.º 1 do Código do Trabalho.

Assim, por um lado, salientou-se naquele Acórdão desta Relação que:
“Para além das razões substanciais relacionadas com a indicada natureza híbrida da Convenção Colectiva de Trabalho, com a especificidade dos seus efeitos normativos, com o específico regime da sua formação, celebração e cessação, com a opção clara do legislador em 2003 de permitir a caducidade da Convenção Colectiva de Trabalho (impedindo que a mesma se perpetue), permitimo-nos enfatizar que:
- no caso da caducidade da Convenção Colectiva de Trabalho, a obrigação de depósito e publicação se reporta expressamente “ao aviso sobre a data  da cessação da vigência” (n.º 4 do artigo 502.º, ao invés do que sucede com os outros actos cuja publicação prevê com eficácia constitutiva (vide o artigo 519.º, n.º 1, quanto à própria CCT, e vg. o artigo 502.º, n.º 4 quanto à sua revogação, o artigo 504.º, n.º 4 quanto ao acordo de adesão e o artigo 505.º, n.º 1 quanto à decisão arbitral);
- ao regulamentar o procedimento subsequente à denúncia o n.º 6 do artigo 501.º, dispõe que, decorrido o período de sobrevigência da convenção, ela “mantém-se em vigor durante 60 dias após qualquer das partes comunicar ao ministério responsável pela área laboral e à outra parte que o processo de negociação terminou sem acordo, após o que caduca”, o que indicia que a caducidade opera de imediato, por mero efeito do decurso do prazo ali assinalado quando antecedido dos demais actos anteriormente previstos;
- na economia da lei, o aviso constitui um “aviso sobre a data” da cessação da vigência, o que pressupõe que a data seja já conhecida não dependendo da publicação em si, sendo a publicação posterior ao momento em que se verifica a caducidade;
- não se compreenderia que, sendo a publicação condição da eficácia da caducidade, houvesse no texto da mesma que ser indicada uma qualquer “data”, sendo certo que é esse o único escopo da publicação do aviso (“aviso sobre a data da cessação da vigência”);
- no caso de caducidade da Convenção Colectiva de Trabalho, os serviços administrativos não têm poder fiscalizador (ao invés do que se mostra prescrito no artigo 494.º);
argumentos que, a nosso ver, confortam a tese de que a eficácia da caducidade não depende da publicação do aviso a que se reporta o n.º 4 do artigo 502.º do Código do Trabalho.”

Mas, por outro lado, ressalvou-se que:
“Tal não significa, contudo, que a caducidade da convenção seja oponível aos trabalhadores logo que a mesma caduca “ope legis” nos termos enunciados no artigo 501.º, n.º 4 do Código do Trabalho (na sua versão primitiva, a aplicável ao procedimento de denúncia e caducidade da CCT/STAD de 2004).
(…)
Na verdade, nos termos do preceituado no artigo 106.º, n.ºs 1 e 3, al. l) do Código do Trabalho, “[o] empregador deve informar o trabalhador sobre aspetos relevantes do contrato de trabalho” designadamente “[o] instrumento de regulamentação colectiva de trabalho aplicável, se houver”.
E o artigo 107.º dispõe que essa informação deve ser prestada por escrito, cominando o nº 5 dos artigos 106º e 107º, como contra-ordenação grave a omissão daquela informação e o incumprimento deste formalismo.
Resultando do artigo 109.º, n.º 1 do mesmo diploma que o empregador tem a obrigação de informar o trabalhador sobre “alteração relativa a qualquer elemento referido no n.º 3 do artigo 106.º”, onde se inclui a informação do instrumento de regulamentação colectiva aplicável, tal obrigação inclui a obrigação de comunicar ao trabalhador que aquele instrumento deixou de ser aplicável e partir de quando (nos termos do n.º 2 não se enquadra na referida obrigação a comunicação de alteração de lei, de instrumento de regulamentação colectiva de trabalho ou de regulamento interno da empresa, mas a caducidade não se enquadra nesta excepção).
Daqui se conclui que, ocorrendo a caducidade da convenção, esta apenas será oponível aos trabalhadores quando o empregador cumprir o dever de informação prescrito no art.º 109º, nº 1, ou seja, “quando os informar por escrito que o instrumento de regulamentação colectiva até então aplicável, deixou de o ser”, como se refere no citado Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 2019.12.11 .
Em suma a eficácia da caducidade não depende da publicação do aviso previsto no art. 502º, nº 6, mas a mesma só será oponível aos trabalhadores quando o empregador os informar por escrito, nos termos estabelecidos no art.º 109º, nº 1.”

Em face do exposto, atenta a filiação da autora no STAD desde 11 de Julho de 2002, o início do contrato de trabalho em 1 de Outubro de 2010 e a sua transmissão para a ré em 1 de Julho de 2019, conclui-se que, não obstante a caducidade do CCT/STAD 2004 em 17 de Fevereiro de 2014, e por esta não ser oponível à autora – na medida em que não se provou que o empregador, fosse a ISS ou a Acciona, a informou por escrito, nos termos estabelecidos no art. 109.º, n.º 1 do Código do Trabalho –, o mesmo continuou a ser aplicável à relação laboral em apreço.
De modo semelhante se concluiu, aliás, relativamente às correspondentes partes, no acima citado Acórdão desta Relação de 28 de Junho de 2023, proferido no processo n.º 15644/20.6T8LSB.L1, tendo o resultado divergido no âmbito do mencionado Acórdão de 13 de Julho de 2023, proferido no processo n.º 27197/20.0T8LSB.L1, em virtude de os respectivos pressupostos de facto assim o imporem (o contrato de trabalho iniciou-se e o trabalhador filiou-se, posteriormente, no STAD, após a ocorrência da caducidade do CCT/STAD 2004, sem que este alguma vez tivesse chegado a regular a relação laboral).
Ao contrário do que argumenta a Apelada, é irrelevante para o caso que a mesma apenas tenha sucedido à ISS na relação que esta mantinha com a autora, em 1 de Julho de 2019, quando o CCT já tinha caducado em 17 de Fevereiro de 2014.

A este propósito, e sobre situação de facto que se afigura em tudo equiparável à dos presentes autos, diz-se no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 16 de Dezembro de 2020, proferido no processo n.º 8952/16.2T8STB.E1.S1[7]:
“Em sede de recurso de revista, a Recorrente sustenta que o CCT do STAD caducou em 17.02.2014 e, apesar de a DGERT ter a obrigação legal de publicar aviso de caducidade a ausência de publicação do mesmo não tem efeitos constitutivos.
Acrescenta que tendo as Autoras sido admitidas ao serviço da Recorrente em 01.07.2016, esta não tinha qualquer obrigação de informação para com aquelas ao abrigo do art.º 106.º n.º 3 al. l) do CT, e muito menos ao abrigo do art.º 109.º n.º 1 do CT.
Em defesa da sua posição sustenta que o art.º 106.º n.º 3 al. l) do CT apenas se aplica havendo instrumento de regulamentação coletiva aplicável (“se houver”), o que não sucede em relação ao CCT do STAD, uma vez que este caducou em 17.02.2014.
Em seu entender, o art.º 109º n.º 1 do CT, não lhe é aplicável pois essa disposição pressupõe que o contrato já se encontre em vigor quando surge a obrigação de informação, o que só poderia abranger a ISS, entidade empregadora das Autoras quando caducou o CCT do STAD, mesmo estando em causa nos autos uma sucessão de prestação de serviços de limpeza.
Resulta da matéria de facto provada que as A.A. foram admitidas em 1/5/2013 pela R. ISS, com a categoria profissional de trabalhadoras de limpeza, tendo passado em 1 de julho de 2016  a trabalhar para a R. SGL, quando a primeira perdeu a empreitada da limpeza na empresa V.........., Lda., em …...
As A.A. são associadas do Sindicato dos Trabalhadores de Serviços de Portaria, Vigilância, Limpeza, Domésticas e Atividades Diversas (STAD)e a R. SGL, que é uma empresa que se dedica à prestação de serviços de limpeza, é associada na Associação das Empresas de Prestação de Serviços de Limpeza e Atividades Similares (APFS).
Quando as A.A. foram admitidas em 1/5/2013 pela R. ISS estava em vigor o CCT STAD, pois a própria recorrente aceita no ponto 1 das suas conclusões que o mesmo só caducou em 17/2/2014.
Na verdade, como resulta dos pontos 37 a 43 da matéria de facto provada, em novembro de 2010, a APFS remeteu ao STAD, por correio registado com aviso de receção, uma comunicação por via da qual procedeu à denúncia do CCT STAD, iniciando assim um processo que determinou a caducidade da referida convenção coletiva.
Não resulta da matéria de facto provada que tenha sido publicado o aviso sobre a data da cessação da vigência da convenção coletiva, nos termos do art.º 502.º, n.º 6, do Código do Trabalho ou que alguma das R.R. ISS ou SGL, tenha informado por escrito os trabalhadores, nos termos estabelecidos no art.º 109.º, n.º 1, do diploma legal citado da referida caducidade.
Como se refere no acórdão recorrido, a mais recente jurisprudência do STJ assentou no sentido de que «A caducidade de instrumento de regulamentação coletiva de trabalho não depende da publicação do aviso previsto no art.º 502.º, n.º 6, do Código do Trabalho, mas quando o mesmo não for publicado a referida caducidade só será oponível aos trabalhadores quando o empregador os informar por escrito, nos termos estabelecidos no art.º 109.º, nº 1, do mesmo diploma» (Cfr. Acórdãos do STJ de 11-12-2019, Proc. n.º 404/17.0T8STB.E1.S1 e de 11-12-2019, Proc. n.º 14752/16.2T8PRT.P1.S1).
A argumentação da recorrente no sentido de que tendo as Autoras sido admitidas ao seu serviço em 01.07.2016, não tinha qualquer obrigação de as informar, nos termos do art.º 106.º n.º 3 al. l) do CT, e muito menos ao abrigo do art.º 109.º n.º 1 do CT, uma vez que o CCT tinha caducado em 17/2/2014, não pode proceder, pois como já se referiu a caducidade só será oponível aos trabalhadores quando o empregador os informar por escrito, nos termos estabelecidos no art.º 109.º, nº 1, do CT.
Em 1/7/2016, quando as A.A. passaram a trabalhar para a R. SGL, em virtude da R. ISS ter perdido a empreitada da limpeza na empresa V……, Lda, o CCT STAD ainda estava a produzir efeitos, nomeadamente a sua Cláusula 17.ª, que dispõe nos números 1,  2 e 3:
1 - A perda de um local de trabalho por parte da entidade patronal não integra o conceito de caducidade nem justa causa de despedimento.
2 - Em caso de perda de um local de trabalho, a entidade patronal que tiver obtido a nova empreitada obriga-se a ficar com todos os trabalhadores que ali normalmente prestavam serviço.
3 - No caso previsto no número anterior, o trabalhador mantém ao serviço da nova empresa todos os seus direitos, regalias e antiguidade, transmitindo-se para a nova empresa as obrigações que impendiam sobre a anterior diretamente decorrentes da prestação de trabalho tal como se não tivesse havido qualquer mudança de entidade patronal, salvo créditos que nos termos deste CCT e das leis em geral já deveriam ter sido pagos.
Assim, em 1/7/2016 transmitiu-se  para a R. SGL as obrigações que impendiam sobre a  R. ISS, decorrentes da prestação de trabalho, pelo que tinha o dever de se informar e informar os trabalhadores acerca do instrumento de regulamentação coletiva de trabalho aplicável, bem como, caso fosse essa a sua intenção, informar os trabalhadores de qualquer alteração acerca da matéria em causa.
Acrescente-se ainda, como se refere no Acórdão do STJ, de 11-12-2019, Proc. n.º 404/17.0T8STB.E1.S1, o artigo 109.º, n.º 2 do CT estabelece que o disposto no seu n.º 1 não é aplicável quando a alteração resulte de lei, de instrumento de regulamentação coletiva de trabalho ou de regulamento interno de empresa, no entanto «esta exceção não é aplicável no caso vertente, porquanto a caducidade da convenção coletiva (pelo menos a caducidade que assente em uma denúncia da convenção por uma das partes) não pode ser considerada uma alteração proveniente da lei ou da própria convenção, já que pressupõe uma declaração de vontade extintiva de uma das partes da convenção e a ocorrência de todo um procedimento negocial que fracassou e, ainda, uma comunicação do insucesso do procedimento negocial, nos termos atrás expostos».
A alegação da recorrente no que concerne à inaplicabilidade do disposto no art.º 501.º n.º 6 do Código do Trabalho de 2009, com o fundamento de que  o montante auferido pelas AA., de acordo com o CCT do STAD, a título de trabalho noturno, não integra o conceito de retribuição, por não lhes ter sido pago 11 meses em 12 meses, também não procede,  pois, como já se disse, a caducidade do CCT do STAD só será oponível às A.A. quando o empregador as informar por escrito, nos termos estabelecidos no art.º 109.º, nº 1, do CT da caducidade do CCT, pelo que, como se refere no acórdão recorrido, «… o pagamento do trabalho noturno terá de ser pago às AA. nos termos do CCT do STAD, o qual vigora para as AA. desde maio ou junho de 2013, ou seja, já decorreram vários anos com a regularidade e periodicidade dessas retribuições, pelo que as mesmas integram, sem qualquer dúvida, o conceito de retribuição constante do art.º 258.º, n.ºs. 1 e 2, do Código do Trabalho».
Improcedem assim as conclusões da recorrente, pois atenta a continuidade das relações laborais iniciadas pelas A.A. com a R. ISS e transmitidas à R. SGL em 1/7/2016, por força da cláusula 17.ª do CCT STAD, a caducidade desta convenção coletiva só será oponível aos trabalhadores quando o empregador, agora a R. SGL, os informar por escrito, nos termos estabelecidos no art.º 109.º, nº 1 do CT da caducidade da mesma.”

Em face do exposto, mutatis mutandis, é de entender que, em 1 de Julho de 2019, por força da cláusula 17.ª do CCT STAD/2004, transmitiram-se para a ré Acciona as obrigações emergentes do mesmo que impendiam sobre a ISS, decorrentes da prestação de trabalho pela autora desde 1 de Outubro de 2010, na medida em que não se provou que a ISS havia informado a autora por escrito da caducidade daquele, nos termos estabelecidos no art. 109.º, n.º 1 do Código do Trabalho, sendo certo que também não se provou que a ré Acciona o tenha feito posteriormente.

3.3.Sucede que, em 15 de Janeiro de 2020, foi publicado no BTE n.º 2 o CCT entre a Associação Portuguesa de Facility Services - APFS e o Sindicato dos Trabalhadores de Serviços de Portaria, Vigilância, Limpeza, Domésticas e Actividades Diversas - STAD e outra, com início de vigência em 1 de Janeiro de 2020, e que veio a ser objecto de extensão nos termos da Portaria n.º 72/2020, de 16 de Março.
Estabelece o Código do Trabalho:
Artigo 503.º
Sucessão de convenções colectivas
1A convenção colectiva posterior revoga integralmente a convenção anterior, salvo nas matérias expressamente ressalvadas pelas partes.
2A mera sucessão de convenções colectivas não pode ser invocada para diminuir o nível de protecção global dos trabalhadores.
3Os direitos decorrentes de convenção só podem ser reduzidos por nova convenção de cujo texto conste, em termos expressos, o seu carácter globalmente mais favorável.
4No caso previsto no número anterior, a nova convenção prejudica os direitos decorrentes de convenção precedente, salvo se forem expressamente ressalvados pelas partes na nova convenção.

Por seu turno, consta do CCT/STAD 2020, na respectiva cláusula 56.ª, o seguinte:
Disposições finais e manutenção de regalias anteriores
1O presente CCT revoga e substitui integralmente o CCT celebrado entre a Associação Portuguesa de Facility Services - APFS e o Sindicato dos Trabalhadores de Serviços de Portaria, Vigilância, Limpeza, Domésticas e Atividades Diversas - STAD, publicado no Boletim do Trabalho e Emprego, n.º 12, de 29 de março de 2004 e o CCT entre a mesma associação patronal e a Federação dos Sindicatos da Indústria e Serviços - FETESE e os sindicatos outorgantes, publicado no Boletim do Trabalho e Emprego, n.º 34, de 15 de setembro de 2015.
2Não obstante o acordo alcançado no âmbito da presente convenção, nem a APFS, nem o STAD renunciam às suas posições a respeito da caducidade do CCT de 2004 referido no número 1 (entendendo a APFS que a caducidade já ocorreu e o STAD defendendo que não), e o disposto no número 1 não interfere, nem preclude os efeitos que devam decorrer da eventual publicação do aviso de cessação de vigência dessa convenção.
3As disposições do presente contrato coletivo têm um caráter globalmente mais favorável para os trabalhadores por ela abrangidos do que as disposições das anteriores convenções coletivas que lhes foram aplicáveis, incluindo as de caráter administrativo.
4Sem prejuízo do disposto no número 1 desta cláusula, da aplicação do presente contrato não poderá resultar prejuízo para os trabalhadores, designadamente baixa de categoria ou classe, assim como diminuição de retribuição ou supressão de quaisquer regalias de caráter regular ou permanente.
Tendo-se concluído que, após 1 de Julho de 2019, o CCT/STAD 2004 era ainda aplicável à relação laboral em apreço, tem de entender-se que, sem prejuízo da sua revogação e substituição integral pelo novo CCT, em 1 de Janeiro de 2020, da aplicação deste não pode resultar prejuízo para a autora, designadamente baixa de categoria ou classe, assim como diminuição de retribuição ou supressão de quaisquer regalias de caráter regular ou permanente, nos termos do n.º 4 da citada cláusula 56.ª.

Sobre a interpretação desta cláusula, nomeadamente no que concerne a retribuição do trabalho noturno, dos domingos e dos feriados, pronunciou-se o Acórdão desta Relação de 18 de Janeiro de 2023, proferido no processo n.º 3694/21.0T8LSB.L1[8], nos seguintes termos:
“Decorre do normativo em referência a maior favorabilidade da nova convenção, pelo que é deste modo dada expressão a quanto se dispõe no Artº 503º/3 do CT.
Contudo, a convenção ressalva da aplicação da nova convenção alguma diminuição retributiva que a mesma possa acarretar ou a supressão de regalias, pelo que se têm como expressamente ressalvados pelas partes os direitos decorrentes da convenção precedente. Tudo em conformidade com o disposto no Artº 503º/4 do CT.
Este não é, contudo, o modo de ver as coisas plasmado nas contra-alegações.
Defende a Apelada que à data do encerramento das negociações da nova convenção coletiva, permanecia um diferendo não resolvido entre a APFS e o STAD, quanto à caducidade ou não do CCT de 2004, tendo sido encontrada, entre as Partes, uma solução essencialmente composta pelos Nºs 1, 2 e primeira parte do Nº 4 da Cláusula 56ª, com vista a superar essa dificuldade, bloqueadora do fecho das negociações. Dado que a questão da caducidade apenas relevava para o passado, com a adoção dos referidos textos normativos, ambas as Partes assumiram, desde logo, a existência de dois tempos ou “idades” regulatórias: o “antes” da entrada em vigor da nova Convenção e o “depois” dessa entrada em vigor. Assim, o “antes” ficou contemplado no Nº 2 da Cláusula 56ª, limitando-se ambas as Partes a constatar a divergência e a assumir que os efeitos da caducidade, até à entrada em vigor da nova Convenção, seriam definidos e regulados por terceiros – quer fossem os Tribunais, quer fosse pela publicação do eventual aviso de caducidade reiteradamente prometido pelo Ministério do Trabalho (aliás, com efeitos retroagidos à data em que a DGERT dá por verificados os pressupostos da caducidade). Ou seja, resulta do Nº 2 da Cláusula 56ª que as Partes não deixaram resolvido o passivo decorrente do passado anterior à entrada em vigor da nova Convenção (Janeiro de 2020). Em contrapartida, em relação ao “depois”, as Partes deixaram perentória e reiteradamente esclarecido que, a partir de Janeiro de 2020, só uma Convenção Coletiva do Trabalho releva, só a nova Convenção passa a ser aplicável no setor.
Com o devido respeito não nos parece ser o que resulta do nº 4 da Clª 56ª onde claramente se dispõe que não obstante a revogação da anterior convenção, não poderá resultar prejuízo para os trabalhadores nas matérias ali contempladas.
Donde se nos afigura que o alcance deste nº 4 não é apenas, e como refere a Apelada, a desaplicação para o futuro de qualquer uma das normas das convenções caducadas ou revogadas e integralmente substituídas ou seja, que a segunda parte do nº 4 da Cláusula 56ª, seja qual for o seu teor e a respetiva interpretação, não pode pôr em causa a definitiva extinção das anteriores convenções coletivas, nem pode sustentar o prolongamento, seja sob que pretexto for, de uma qualquer norma das velhas convenções, já caducadas ou revogadas.
Não pomos em dúvida a extinção das anteriores convenções e substituição pela nova. Porém, a nova convenção ressalva certos efeitos, pelo que há, necessariamente, um prolongamento a que devemos obediência. E, assim, aos trabalhadores nunca abrangidos pela convenção anterior aplicar-se-á necessariamente apenas a nova convenção. Mas àqueles que beneficiaram da anterior não poderão ser negadas as regalias dela resultantes ou a melhor retribuição.
Esta é uma decorrência, também, de quanto se dispõe no Artº 503º/4, 2ª parte, do CT.
Efeito que, não obstante a argumentação supra reproduzida, nos parece vir, a final, a ser admitido pela Apelada que também conclui que através da expressão “da aplicação do presente contrato não poderá resultar prejuízo para os trabalhadores, designadamente baixa de categoria ou classe, assim como diminuição de retribuição”, pretendeu dizer-se que, por efeito direto da aplicação da nova Convenção, nenhum trabalhador deverá baixar de categoria ou classe, tal como não deverá ver reduzida a sua retribuição.
Não se compreende, pois, que logo de seguida afirme que a parte final do nº 4, da Cláusula 56ª, não se refere, nem quis referir-se, às regras, benefícios ou regalias emergentes das anteriores Convenções, mas antes àquelas que constem eventualmente de outro tipo de acordo ou regulamento, ao nível individualizado de cada empresa.
Isto posto, cumpriria aferir se a remuneração do trabalho noturno, a dos domingos e feriados constitui retribuição.
Verificamos, todavia, que essa não é uma questão discutida pelas partes, pelo que nenhum outro considerando se nos oferece relatar.
Conclui-se, assim, que no período decorrido após 10/05/2018 é devida a retribuição do trabalho noturno, domingos e feriados conforme previsto na Convenção Coletiva de Trabalho de 2004, pelo que o Apelante tem direito às respetivas diferenças.”

Entendimento semelhante foi acolhido, no que respeita a trabalho nocturno, no acima citado Acórdão desta Relação de 28 de Junho de 2023, proferido no processo n.º 15644/20.6T8LSB.L1, e no Acórdão desta Relação de 24 de Janeiro de 2024, proferido no processo n.º 29711/22.8T8LSB.L1, este relatado pelo ora 2.º Adjunto em acção em que também é ré a Acciona.

Retornando ao caso em apreço, relembra-se que a Apelante peticiona quantias vencidas antes e depois da substituição do CCT/STAD 2004 pelo CCT/STAD/FETESE 2020, relativas a:
- acréscimo por horas nocturnas;
- diferenças por horário semanal de 40 horas, inclusive no acréscimo por trabalho aos Domingos;
- acréscimo por trabalho em feriados;
- sábados e domingos consecutivos por gozar.
Por outro lado, tais quantias são as que se tiverem vencido entre 1 de Julho de 2019 e 31 de Outubro de 2021, posto que a Apelante reconhece no seu recurso que, por força do acordo celebrado entre as partes em Janeiro de 2022, mencionado e reproduzido no ponto 14. da factualidade provada, as prestações retributivas devidas a partir de então são as aí previstas.
Vejamos, então.
No que respeita ao trabalho nocturno, importa ter em conta que, no aludido período que mediou entre 1 de Julho de 2019 e 31 de Outubro de 2021, a autora tinha um horário das 15h00 às 23h00, durante cinco dias por semana. Até Dezembro de 2019, a ré pagou à autora as horas nocturnas com o acréscimo de 30% e a partir de Janeiro de 2020 passou a pagar-lhas com o acréscimo de 25%. Assim, a autora recebeu a tal título € 67,47 em 2019, € 41,86 em 2020, € 41,71 em 2021 e € 41,35 em 2022.
Nos termos do CCT/STAD 2004, considera-se trabalho nocturno o prestado entre as 20 horas de um dia e as 7 horas do dia seguinte (cláusula 24.ª), sendo o trabalho prestado entre as 0 e as 5 horas remunerado com um acréscimo de 50% além do trabalho normal e o restante trabalho nocturno com um acréscimo de 30% além do trabalho normal (cláusula 28.ª, n.ºs 1 e 2). Acresce que, nos termos do n.º 3 da cláusula 28.ª, o acréscimo da remuneração devida pela prestação de trabalho nocturno integrará, para todos os efeitos legais e obrigacionais, a remuneração do trabalhador, devendo ser paga mensalmente pelo valor do seu cômputo médio e devendo integrar a remuneração respeitante ao período de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal. Acrescenta o n.º 4 que, no caso dos trabalhadores cujo trabalho nocturno integra no todo ou em parte o seu período normal de trabalho, aquela média deve ser entendida como a média mensal de horas, sendo a remuneração correspondente considerada retribuição certa.
No CCT STAD/FETESE 2020, considera-se trabalho nocturno o prestado entre as 21 horas de um dia e as 6 horas do dia seguinte, sendo remunerado com um acréscimo de 25% além do trabalho normal, entre as 21 e as 24 horas (cláusula 26.ª).
Atento o regime do horário de trabalho da autora à luz do CCT/STAD 2004, comportando de modo permanente a prestação de 3 horas de trabalho nocturno por dia que lhe conferia direito a receber um acréscimo de 30% pago mensalmente pelo seu valor médio, incluindo nas férias e subsídios de férias e de Natal, isto é, em moldes praticamente similares à retribuição base, é inegável o seu carácter retributivo, aliás como expressamente reconhecido pelos ali outorgantes, e também que da aplicação do CCT/STAD/FETESE 2020 resultaria, só por si, a respectiva diminuição (como os valores pagos confirmam).
Assim, tinha a ré de observar o pagamento do trabalho nocturno prestado pela autora nos termos do CCT/STAD 2004, entre 1 de Julho de 2019 e 31 de Dezembro de 2019 por ser o IRCT aplicável (o que a ré cumpriu) e a partir de 1 de Janeiro de 2020 e até 31 de Outubro de 2021 por força da cláusula 56.ª, nº 4 do CCT/STAD/FETESE 2020.

Relativamente às peticionadas diferenças por cumprimento de horário semanal de 40 horas, inclusive no acréscimo por trabalho aos Domingos, provou-se com relevo que a autora teve no aludido período de 1 de Julho de 2019 a 31 de Outubro de 2021 um horário das 15h00 às 23h00, durante cinco dias por semana, auferindo as seguintes quantias:
Vencimento base
Ano 2019 - € 525,00
Ano 2020 - € 558,25
Ano 2021 - € 584,50
Acréscimo por trabalho aos domingos (16%)
Ano 2019 - € 84,00
Ano 2020 - € 89,32
Ano 2021 - € 89,32
Nos termos da cláusula 19.ª, n.ºs 6 e 7 do CCT/STAD 2004, os trabalhadores que prestam serviço em regime de laboração continua têm direito a uma pausa diária de trinta minutos, a definir pela entidade patronal conforme as exigências do serviço, mas de modo que os trabalhadores não prestem mais que cinco horas consecutivas de trabalho diário, não determinando tal período de descanso perda de retribuição nem alargamento de horário.

Por seu turno, veio estabelecer a cláusula 16.ª do CCT/STAD/FETESE 2020:
(…)
11Os trabalhadores que prestem serviço com obrigação de permanência no local de trabalho em todo o seu horário de trabalho diário e/ou que não possam ausentar-se do local de trabalho por exigências do serviço, têm direito a uma pausa diária de trinta minutos, contando, para todos os efeitos, como período normal de trabalho e não determinando qualquer perda de retribuição nem alargamento do horário de trabalho, em condições a definir pela entidade empregadora conforme as exigências do serviço, mas de modo a que os trabalhadores não prestem mais de 5 horas consecutivas de trabalho.
12Durante as pausas a que se refere o número anterior, deve ficar garantida a continuidade da laboração, contando, para todos os efeitos, como tempo de prestação efectiva de trabalho.
Ora, constatando-se que a autora trabalhava nessas circunstâncias, isto é, praticando um horário de trabalho de 8 horas diárias, sem intervalo para descanso, durante 5 dias por semana, perfazendo 40 horas semanais, conclui-se que a retribuição base que a ré lhe pagava era inferior à retribuição mínima convencional e, inclusive, legal, correspondente a 40 horas semanais.
Assim, tinha a ré de pagar à autora a retribuição base correspondente a 40 horas semanais, nos termos do CCT/STAD 2004 entre 1 de Julho de 2019 e 31 de Dezembro de 2019, por ser esse o IRCT então aplicável, e a partir de 1 de Janeiro de 2020 e até 31 de Outubro de 2021 nos termos do CCT/STAD/FETESE 2020, por ser esse o IRCT então aplicável e/ou por força da sua cláusula 56.ª, nº 4.
Por outro lado, de acordo com a cláusula 38.ª, n.º 3, al. d) do CCT/STAD 2004, a autora tinha direito a um acréscimo mensal de 16% sobre a retribuição mensal auferida pelo trabalho prestado aos Domingos.
A cláusula 30.ª, n.º 3, al. c) do CCT/STAD/FETESE 2020 veio prever idêntico acréscimo retributivo.
Assim, tendo-se entendido que a ré devia ter pago à autora retribuição base de valor superior à que pagou, correspondente a 40 horas semanais, tem também de pagar-lhe as diferenças decorrentes a nível do acréscimo pelo trabalho aos Domingos, nos termos do CCT/STAD 2004 entre 1 de Julho de 2019 e 31 de Dezembro de 2019, por ser esse o IRCT então aplicável, e a partir de 1 de Janeiro de 2020 e até 31 de Outubro de 2021 nos termos do CCT/STAD/FETESE 2020, por ser esse o IRCT então aplicável e/ou por força da sua cláusula 56.ª, nº 4.
Do ora exposto resulta que, ao contrário do sucedido com o trabalho nocturno, o CCT/STAD 2004 não se afigura mais favorável que o CCT/STAD/FETESE 2020 em matéria de pagamento de retribuição base em função da duração do período normal diário e semanal de trabalho e de acréscimo por trabalho aos Domingos, tendo-se mantido o nível de protecção dos trabalhadores: o que sucede é que a ré não observou nem um nem outro nos correspondentes períodos de aplicabilidade.
No que respeita ao trabalho prestado em feriados, estabelecia a cláusula 27.ª do CCT/STAD 2004 que o mesmo conferia ao trabalhador o direito a um acréscimo de retribuição de 100% sobre a retribuição normal e a descansar num dos três dias seguintes.

Por seu turno, estabelece o CCT/STAD/FETESE 2020:
Cláusula 20.ª
Remuneração do trabalho suplementar
1O trabalho suplementar é pago pelo valor da retribuição horária com os seguintes acréscimos:
(…)
b)-75 % por cada hora ou fração, em dia feriado;
(…)
Cláusula 21.ª
Trabalho normal em dia feriado
1O trabalhador que prestar trabalho normal em dia feriado em empresa dispensada de suspender o funcionamento em dia feriado tem direito a um acréscimo de 100 % da retribuição correspondente.
2O regime do número 1 aplica-se igualmente nos casos em que a empresa dispensada de suspender o funcionamento em dia feriado, seja apenas a empresa cliente e a execução do trabalho normal em dia feriado ocorra no âmbito dos serviços prestados pela entidade empregador a esse cliente.
Assim, constatando-se que a situação da autora se reconduz à de prestação de trabalho normal, e não suplementar, em dia feriado, a ré tinha de pagar-lho com o acréscimo de 100%, nos termos do CCT/STAD 2004 entre 1 de Julho de 2019 e 31 de Dezembro de 2019, por ser esse o IRCT então aplicável, e a partir de 1 de Janeiro de 2020 e até 31 de Outubro de 2021 nos termos da cláusula 21.ª do CCT/STAD/FETESE 2020, por ser esse o IRCT então aplicável e/ou por força da sua cláusula 56.ª, nº 4.
Isto é, também neste caso o CCT/STAD 2004 não se afigura mais favorável que o CCT/STAD/FETESE 2020, uma vez que este tutela a situação da autora de modo semelhante na sua cláusula 21.ª.
Finalmente, no que toca aos sábados e domingos consecutivos por gozar, dispõe a cláusula 38.ª, n.º 3, al. e) do CCT/STAD 2004 que, quando o dia de descanso semanal não coincida com o domingo, os trabalhadores terão direito a folgar um sábado e domingo consecutivos de sete em sete semanas.
Por seu turno, nos termos da cláusula 30.ª, n.º 4, al. d)-i) do CCT/STAD/FETESE 2020, quando o dia de descanso semanal não coincida com o domingo, os trabalhadores que laborem 5 dias consecutivos por semana têm direito a folgar um sábado e domingo consecutivos de sete em sete semanas.
Mais uma vez, constata-se que o CCT/STAD 2004 não é mais favorável que o CCT/STAD/FETESE 2020 nesta matéria.
Assim, a autora, na medida em que o seu dia de descanso semanal não coincidia com o Domingo, para além do direito a um acréscimo de 16% sobre a retribuição mensal, nos sobreditos termos, tinha também direito a folgar um sábado e domingo consecutivos de sete em sete semanas.
Ora, não tendo a ré logrado provar que satisfez esse direito da autora, como lhe competia nos termos do art. 342.º, n.º 2 do Código Civil, o trabalho prestado pela mesma naqueles dias tem de ser retribuído como trabalho suplementar em dias de descanso.
Procede, pois, o recurso também nesta parte.
O apuramento das quantias devidas tem de ser relegado para incidente de liquidação por falta de elementos necessários à quantificação dos direitos da autora, atento, designadamente, o provado sob o n.º 16.

4.Decisão

Nestes termos, acorda-se em julgar o recurso parcialmente procedente e, em consequência:
A)-condena-se a ré a pagar à autora as diferenças que se apurarem em incidente de liquidação:
- a título de trabalho nocturno prestado entre 1 de Janeiro de 2020 e 31 de Outubro de 2021, nos termos das cláusulas 24.ª e 28.ª do CCT/STAD 2004;
- a título de retribuição base e acréscimo de 16% pelo trabalho aos Domingos, correspondentes a um horário de trabalho de 40 horas semanais, entre 1 de Julho de 2019 e 31 de Outubro de 2021;
- a título de trabalho prestado em dia feriado, com o acréscimo de 100%, entre 1 de Julho de 2019 e 31 de Outubro de 2021;
- a título de trabalho suplementar prestado em dia de descanso, nos sábados e domingos consecutivos que a autora tinha direito a folgar de sete em sete semanas, entre 1 de Julho de 2019 e 31 de Outubro de 2021;
- juros de mora, à taxa legal, desde a data da citação e até integral pagamento, sobre as quantias antecedentes;
B)-absolve-se a ré do mais peticionado.
Custas pelas partes na proporção do decaimento.


Lisboa, 21 de Fevereiro de 2024


Alda Martins
Maria José Costa Pinto
Leopoldo Soares


[1]Na medida em que só por lapso óbvio e manifesto constava do enunciado.
[2]Aditaram-se algumas cláusulas não transcritas na sentença.
[3]Que se manteve sem alterações de relevo, sob diferentes números, nas versões subsequentes do artigo.
[4]Que se manteve sem alterações de relevo, sob diferentes números, nas versões subsequentes do artigo.
[5]Ao que se julga, não publicados.
[6]O primeiro inédito, tanto quanto sabemos, e o segundo disponível em www.dgsi.pt.
[7]Disponível em www.dgsi.pt.
[8]Acórdão não publicado, ao que julgamos, e que a ora Relatora acompanhou como 1.ª Adjunta, na medida em que, apesar de aí se sustentar a natureza constitutiva da publicação do aviso de caducidade do CCT, o certo é que, ainda que se sustentasse a sua natureza declarativa, a caducidade não seria relevantemente oponível ao aí autor, posto que o empregador apenas o informou da mesma por carta
que aquele recebeu em 23/12/2020.