Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
6182/20.8T8LRS-A.L2-2
Relator: PEDRO MARTINS
Descritores: SUSPENSÃO
ALIMENTOS PROVISÓRIOS
TEMPO
GUARDA
DESPESAS
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 02/22/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE PROCEDENTE
Sumário: I – Uma decisão que suspende a instância, sem fixar prazo para o efeito, nem fazer depender a cessação de qualquer acto ou facto, pode ser ultrapassada por decisão posterior, quer por ser irrecorrível, quer por ser discricionária, tanto mais se o tribunal referiu, no anterior despacho, que se aguardava uma decisão a proferir num processo de promoção e essa decisão foi entretanto proferida.
II – Num processo de regulação do exercício de responsabilidades parentais intentado há três anos em que, por variadas razões, ainda não se fixaram alimentos aos filhos, eles devem ser fixados logo que possível, tanto mais se entretanto os progenitores acordaram que os filhos ficassem a viver com um deles (com visitas ao outro).
III – Se o progenitor não residente tem os filhos consigo 31,50% do tempo e o outro 68,50%, a fixação de alimentos deve ter em conta essa repartição de tempo.
IV – Se a frequência do ensino privado não foi decidida de comum acordo é, em princípio (se nada mais houver em sentido contrário), o progenitor que defende essa frequência que deve suportar não só as respectivas mensalidades como também as despesas inerentes.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa os juízes abaixo assinados:

HP e CR casaram um com o outro em 06/03/2010.
Têm dois filhos: NP, nascida em 04/06/2011, e SP, nascido em 21/07/2015.


Ambos consideram que estão separados de facto desde 2018, embora a viver na mesma casa, que é propriedade de CR, a mãe, sendo que, de 2014 até Março de 2020 (Covid-19), HP, o pai, viveu e trabalhou em Inglaterra.
Em 03/06/2020 a mãe faz uma queixa de violência contra ela, praticada pelo pai, que dá origem a um processo de promoção e protecção dos dois filhos menores.
A 21/07/2020, o pai requer a regulação do exercício das responsabilidades parenteais e faz uma queixa de violência da mãe contra ele, junta ao processo de promoção.
Em 05/08/2020, a mãe intentou uma acção de divórcio, querendo, entre o mais, que o pai saísse de casa de morada de família.
A 11/09/2020, no processo de regulação foi fixado, ao abrigo do art.º 28 do RGPTC o seguinte regime provisório:
“1 – Os menores ficam a residir com ambos os progenitores (na casa de morada de família), cabendo a ambos as decisões quanto aos actos da vida corrente dos filhos”.
Na cláusula 2 estabelecia-se o exercício conjunto das responsabilidades parentais relativas às questões de particular importância; nas cláusulas 3 a 9 regulava-se o regime de convívios.
Existiam ainda as seguintes cláusulas:
10 – As despesas de saúde, na parte não comparticipada, as extraordinárias escolares (livros e material escolar) e a mensalidade do colégio (incluindo alimentação no colégio), são a repartir por ambos os progenitores, na proporção de metade.
10.1. Enquanto os pais e os menores se encontrarem a residir juntos na casa morada de família, as despesas com alimentação e vestuário serão repartidas por ambos, na proporção de metade.
10.2. O reembolso de metade de todas as referidas despesas, desde que devidamente documentadas, será feito pelo progenitor que as não realizar, ao outro no prazo de 15 dias a contar do envio do comprovativo de tais despesas.
A 09/11/2020, o pai requereu a alteração do regime provisório, dizendo, entre o mais, que saiu da casa de morada de família (para ir viver na casa dos pais como disse expressamente) logo no mesmo dia em que o regime (provisório) foi fixado, como, aliás, deixara consignado na conferência de pais que faria.
Em nova conferência de pais, a 17/02/2021, passou-se o seguinte, na parte que importa:
Seguidamente, quando eram 11h14h, pese embora os esforços efectuados pelo tribunal, e por não haver entendimento entre as partes, quanto à questão da residência alternada, por sugestão da Sr.ª Juiz foi concedido um tempo, para que os Advogados pudessem conversar com os seus constituintes a fim de chegar a um consenso e por termo ao processo, tendo a Sr.ª Juiz declarado a interrupção da diligência por breves momentos.
Retomados os trabalhos, quando eram 11h16, por não se mostrar possível as partes chegarem a acordo, foi dada a palavra ao Sr. Procurador da República, pelo mesmo foi dito o seguinte:
"No superior interesse dos menores, para o exercício das responsabilidades parentais, promovo que se fixe um regime provisório ao abrigo do que dispõe o art.º 28 do RGPTC, tendo como base a regra geral da residência alternada, nos termos do disposto no art.º 1906/6 do CC.
Promovo ainda, que se comunique à territorialmente competente CPCJ, para o processo já existente, com cópia dos presentes autos, que forem entendidas como adequadas, para que tal Comissão possa debelar o perigo e evitar maiores males para as crianças, que resulta para as mesmas, devido ao prejudicial conflito parental."
Dada a palavra ao Mandatário do pai, pelo mesmo foi dito o seguinte:
"O pai concorda na íntegra com o promovido, requerendo igualmente, que se fixe um regime provisório, ao abrigo do que dispõe o art.º 28 do RGPTC de residência alternada para as crianças".
Dada a palavra ao Mandatário da mãe, pelo mesmo foi dito o seguinte:
"Não se vislumbra, salvo devido respeito, da necessidade de alteração do regime provisório em vigor, sendo certo que, em qualquer caso, não se deveria considerar um regime de residência alternada das crianças.
A conflitualidade entre os progenitores é muito exacerbada, estão em permanente desacordo sobre todos e quaisquer questões atinentes à criação dos filhos.
A pretensão do progenitor de baixar o standard de vida dos filhos, seja em matéria de educação preconizado o ensino público, seja em matéria de saúde, preconizando o recurso ao SNSN é de todo inaceitável e faz presumir que as crianças não terão aos seus cuidados o nível de vida de que sempre beneficiaram.
A vida profissional do pai faz-se fora de Lisboa, nomeadamente no estrangeiro, tendo em conta a sua profissão e habilitações académicas, é de presumir que logre encontrar uma ocupação profissional fora do país, à semelhança do que aconteceu nos últimos 10 anos.
Nessa eventualidade não se vislumbra, como seria, exequível, o regime ora preconizado pelo Sr. Magistrado do Ministério Público.
Deverá, pois, com os indicados fundamentos, manter-se inalterado o regime provisório já fixado nos autos.
[…]”
E depois foi proferido um despacho a alterar o regime provisório, que passou a ser o seguinte:
1. Os menores fixam residência alternada com cada um dos progenitores, passando uma semana com o pai e a semana seguinte com a mãe, fazendo-se as trocas às 6.ª-feiras, na escola, após as actividades escolares, ou outro local a combinar por mútuo acordo.
2. As responsabilidades parentais quanto às questões de particular importância para a vida dos menores serão exercidas em conjunto por ambos os progenitores, sendo que as questões da vida corrente das crianças serão exercidas pelo progenitor com quem estiverem na semana respectiva.
3. Cada um dos progenitores assegurará o sustento dos filhos na semana que estiverem a seu cargo.
4. Todas as demais despesas, referentes aos menores, serão suportadas por ambos os progenitores, por partes iguais, mediante a apresentação de documento comprovativo pelo progenitor que as suportou, a pagar nos 10 dias seguintes e a contar da data de recepção das mesmas.
5. Caso não haja entendimento quanto à frequência escolar dos menores no ensino privado, a mãe suportará as respectivas prestações, sem prejuízo do pai poder vir, igualmente, a assumir tais despesas, quando ou caso retome o exercício da sua actividade profissional.
6. As actividades extracurriculares terão de ter sempre o consenso de ambos os pais.
7. Ambos os pais suportarão de forma repartida o prémio do seguro de saúde, assim como as despesas das consultas realizadas no serviço privado de saúde.
8. As férias dos menores serão repartidas por metade do período para cada um dos progenitores, a combinar entre si o período específico, devendo avisar-se mutuamente e antecipadamente o período pessoal de férias de cada um, até ao final de Março de cada ano civil.
9. Nas férias escolares de Verão o pai passará com os menores a primeira quinzena de Julho e a primeira quinzena de Agosto, e a mãe passará a segunda quinzena de Julho e a segunda quinzena de Agosto, salvo acordo em contrário.
10. Nas férias escolares do Natal, os menores passarão com o pai, do primeiro dia de férias até dia 25 de Dezembro, até às 10:30, passando com a mãe, desde essa data e hora até ao último dia de férias, sem alternância, sendo que a passagem de ano é alternada com o pai e com a mãe.
11. Nas férias escolares da Páscoa, os menores passarão uma semana com cada um dos progenitores, sendo que, este ano, a primeira semana será com a mãe, alternando nos anos seguintes.
12. No dia do pai e no dia de aniversário do pai, os menores passarão o dia com este, sem prejuízo das actividades escolares.
13. No dia da mãe e no dia de aniversário da mãe, os menores passarão o dia com esta, sem prejuízo das actividades escolares.
14. No dia de aniversário dos menores, estes tomarão, com cada um dos progenitores, uma das principais refeições, alternando de ano para ano a refeição com cada um e sempre sem prejuízo das actividades escolares.
A mãe interpôs recurso desta decisão e o Tribunal da Relação de Lisboa, por acórdão de 17/06/2021, determinou que se repristinasse o regime provisório fixado a 15/09/2020.
A 30/06/2021, o divórcio foi decretado, já como divórcio por mútuo consentimento.
No processo de promoção e protecção (que, a partir de 19/11/2021 tinha passado a correr os seus termos no tribunal), foi, numa acta de 16/12/2021, proferido o seguinte despacho, na parte que aqui importa:
[…]
Face ao informado pela Sr.ª técnica mantém-se o acordado por ambos os pais e que se verifica na prática quanto à residência e convívios das crianças aos fins de semana com o progenitor, mantendo-se, no mais, em vigor o regime provisório fixado na conferência de pais realizada no dia 17/02/2021 no âmbito dos autos principais.”
A 17/03/2022, no processo de regulação, foi proferido o seguinte despacho, entre vários outros:
[…]
Por requerimento apresentado em 01/12/2021 veio a mãe com a menção de “muito urgente” requerer a alteração do regime provisório das responsabilidades parentais em vigor relativamente à repartição das despesas relativas às crianças alegando, em síntese, que se verifica um incumprimento no pagamento por parte do pai quanto às despesas adiantando que deveria ser fixada uma pensão de alimentos a favor de cada um dos filhos no valor de 300€.
Por requerimento apresentado em 14/12/2021 o pai respondeu conforme consta dos autos.
Cumpre apreciar e decidir:
Por acórdão proferido em 17/06/2021, o TRL, na sequência do recurso relativamente ao regime provisório fixado em 17/02/2021, revogou o segmento relativo à residência alternada dos menores repristinando o regime provisório de regulação das responsabilidades parentais instituído aquando da conferência de pais realizada em 11/09/2020 e onde havia ficado estipulado que as crianças ficariam a residir com ambos os progenitores.
Por despacho constante dos autos determinou-se o cumprimento do mencionado acórdão, alegando, agora, a mãe que as crianças se encontram a residir com a mãe e com convívios ao pai conforme aí discrimina.
De salientar que todos os segmentos do regime provisório fixado na conferência de pais de 17/02/2021 e à excepção da residência alternada tiveram o acordo de ambas as partes, ou seja, o que ficou estabelecido de forma provisória teve o consentimento de ambos os pais.
Razão porque não vislumbramos fundamento para a peticionada alteração formalizada no âmbito dos presentes autos, pela mãe.
Acresce que na presente data o tribunal não possui quaisquer elementos para apreciar o peticionado não sendo conveniente alterar o regime provisório quanto a tal segmento uma vez que para além do mais se mostra pendente um processo de promoção e protecção no âmbito do qual se aguardam elementos e diligências a realizar para poder ser aplicada medida protectiva a favor das duas crianças.
Face o exposto indefiro o requerimento com o pedido de alteração do regime provisório quanto à alteração do pagamento das despesas estipuladas a favor dos menores nos termos e para efeitos dos artigos 28 e 42 do RGPTC, mantendo-se o que se encontra estipulado, a tal respeito.
*
Uma vez que se mostra pendente o processo de promoção e protecção a favor das duas crianças o qual se encontra a aguardar elementos e as demais diligências que aí foram solicitadas e a realizar pela Técnica gestora do processo, declaro, por enquanto, a partir da notificação do presente despacho, a suspensão da instância nos presentes autos advertindo ambas as partes de que se deverão abster de juntar aos autos requerimentos ou qualquer outra documentação bem como solicitar realização de diligências sob pena de serem condenadas em custas.
[…]”
A 30/11/2022, no âmbito do processo de promoção e protecção, foi aplicada, com o acordo dos progenitores, uma medida de promoção e protecção, nos seguintes termos:
“Aos menores é aplicada a medida de apoio junto dos pais, na pessoa da mãe, com a supervisão de um CAFAP (cf. artigo 35/1-a da LPCJP), pelo prazo de um ano, sem prejuízo de eventual prorrogação ou revisão antecipada, nomeadamente colaborar com a intervenção de um CAFAP no sentido de melhorar as competências parentais no âmbito projecto família.
Os progenitores ficam ainda obrigados a colaborar na realização dos convívios dos menores com o pai aos fins-de-semana quinzenalmente. Para os devidos efeitos o pai irá buscar as crianças à 5.ª-feira à escola, após as actividades escolares e entregá-los-á na 2.ª-feira na escola, antes do início das actividades escolares”.
A 07/06/2023, a mãe, no processo de promoção e protecção, faz um requerimento de revisão da medida, no qual, entre o mais, escreve:
1\ Nos termos do acordo de promoção e protecção ora em vigor, foi aplicada às crianças medida de apoio junto dos pais, na pessoa da mãe, convivendo com o pai por fins-de-semana alternados.
2\ Nada se tendo determinado, nessa sede, quanto à repartição das despesas das crianças, mormente no que respeita à sua formação e educação.
3\ Face ao exposto, continua em vigor o regime provisório de responsabilidades parentais fixado, por acordo entre ambos os progenitores, em conferência de pais realizada a 17/02/2021,
4\ Nos termos do qual a mãe suporta, sozinha, as despesas decorrentes da frequência do ensino privado, por ambas as crianças.
Cita, de seguida, as cláusulas 3 a 5 daquele regime e, entre o muito mais, queixa-se de que se continuam a registar-se graves conflitos entre os progenitores, desde logo relacionados com a comparticipação das despesas das crianças, e da falta de fixação de uma pensão de alimentos para os filhos pelo pai, por se ter entendido que a sede correcta para a sua decisão seria o processo de regulação das responsabilidades parentais, à data já suspenso…
A 27/06/2023, o tribunal, considerando que (i) resultava dos autos que o pai deixou de residir na casa de morada de família no dia da primeira conferência de pais – 11/09/2020 –, e que, por isso, não se afigurava possível, na prática e desde essa data, dar cumprimento ao regime provisório fixado em primeiro lugar no que à residência respeita, e (ii) ademais, a aplicação daquela medida de promoção e protecção, donde se retirava que os menores se encontram actualmente a residir com a sua mãe, convivendo com o pai aos fins-de-semana, quinzenalmente, decidiu que se tornava necessário adequar o regime de regulação do exercício das responsabilidades parentais, fixando um regime provisório que, em articulação com a medida aplicada no processo de promoção e protecção, reflicta a situação fáctica existente, na salvaguarda do interesse das duas crianças.
O tribunal disse então que estavam indiciariamente provados os seguintes factos com relevância para essa fixação:
1\ Os menores são filhos do requerente e da requerida.
2\ Em 15/09/2020, em sede de conferência de pais, foi fixado um regime provisório, determinando-se que os menores ficassem a residir com ambos os progenitores, considerando que estes habitavam na mesma residência.
3\ Nesse dia, o progenitor deixou de residir na casa de morada de família.
4\ Em 17/02/2021, em sede de conferência de pais, foi fixado um regime provisório, determinando-se a residência alternada dos menores.
5\ Posteriormente, em sede de recurso, determinou-se que fosse repristinado o regime provisório anterior, ficando os menores a residir com ambos os progenitores.
6\ Corre termos em benefício dos menores um processo de promoção e protecção, no âmbito do qual, em 30/11/2022, foi aplicada, por acordo entre os progenitores, a medida de apoio junto dos pais, na pessoa da mãe, ficando os progenitores obrigados a colaborar com a intervenção de um CAFAP no sentido de melhorar as competências parentais no âmbito projecto família.
7\ Na presente data, em cumprimento da medida de promoção e protecção aplicada, os menores encontram-se a residir com a mãe, convivendo quinzenalmente aos fins-de-semana com o pai.
8\ Em Maio de 2023, a progenitora auferiu um rendimento mensal ilíquido de 2.551,60€.
9\ Em Maio de 2023, o progenitor auferiu um rendimento mensal ilíquido de 2.723,43€.
E depois, ao abrigo do disposto nos artigos 27/1-2 e 28, ambos do RGPTC, fixou o seguinte regime provisório no que respeita à residência e convívios, alterando-se em conformidade a cláusula 1.ª do regime fixado:
“1\ Os menores fixam a residência junto da mãe, ficando à sua guarda e cuidados, como já se verifica na prática.
2\ Os menores passarão fins-de-semana de 15 em 15 dias com o pai. Para os devidos efeitos, o pai irá buscá-los à 5.ª-feira à escola, após as actividades escolares, e entregá-los-á, na 2.ª-feira na escola, antes do início das actividades escolares”.
Por sua vez, tendo sido alterada a residência dos menores e fixada a mesma junto da progenitora, considerou que se impunha a fixação de uma pensão de alimentos a cargo do progenitor, alterando-se as cláusulas 3.ª, 4.ª, 5.ª e 7.ª do regime provisório fixado, nos seguintes termos (tendo em atenção os rendimentos de cada um dos progenitores e a oposição do progenitor a que as crianças frequentem o ensino privado e em suportar as inerentes despesas), renumerando-se as restantes cláusulas em conformidade:
“3\ O pai contribuirá com o montante de 400€ mensais a título de pensão de alimentos, sendo 200€ para cada menor, que entregará à mãe, por qualquer meio de pagamento, até ao dia 8 de cada mês, sem qualquer encargo para os mesmos.
4\ A quantia supra-referida será actualizada anualmente, de acordo com a taxa de inflação a publicar pelo Instituto Nacional de Estatística, por referência ao ano anterior.
5\ A mensalidade do colégio será suportada exclusivamente pela progenitora, ao passo que todas as restantes despesas de educação (fardamento, livros, material escolar e transporte) e as despesas de saúde, médicas e medicamentosas, na parte não comparticipada, serão suportadas por ambos os progenitores, na proporção de metade, mediante a apresentação de documento comprovativo pelo progenitor que as suportou, procedendo o pai ao pagamento dessas despesas conjuntamente com o pagamento da pensão de alimentos referente ao mês seguinte a que disser respeito”.
Por fim, o tribunal disse que nos demais segmentos de regulação do exercício das responsabilidades parentais, permanecia em vigor o regime actual e determinou a notificação dos progenitores para, no prazo de 10 (dez) dias, se pronunciarem sobre o regime provisório ora fixado, sob pena de, nada dizendo, o mesmo se converter em regime definitivo.
*
O pai recorreu desta sentença, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões:
1 - Ao recurso que é de apelação e com subida em separado, deverá ser atribuído efeito suspensivo […] atenta a forte perturbação que infligirá às crianças uma alteração convivial (por via da supressão de dias de convívio com o pai) que se vem consolidando e desejavelmente alargando, até que, em definitivo, se consagre um regime de guarda partilhada e alternada […].
2\ A instância dos presentes autos de RERP encontra-se suspensa, em cumprimento de quanto ordenado por despacho datado de 17/03/2022 (refª 151944671) – cf. artigo 269/2-c do CPC.
3\ Não tendo, após aquele, sido proferido despacho determinativo da cessação da suspensão, nem definitivamente julgada a causa prejudicial (o PPP), nem ocorrido o prazo fixado – cf. artigo 276/1-c do CPC, não podia o despacho sob sindicância proferir decisão em processo suspenso.
4\ Para o caso de assim se não entender – sem conceder -, deverá o regime provisório ser revogado, por não ter suporte factual e de direito que o sustente.
5\ Por um lado, as crianças, após a formalização do acordo de promoção e protecção, em 30/11/2022, a vigorar durante um ano, até 30/11/2023, convivem com o pai em fins-de-semana alargados, de quinta-feira, desde o final das actividades lectivas, até segunda-feira, ao início dessas mesmas actividades lectivas, nos fins de semana que estão com este quinzenalmente.
6\ Retirando-se o tempo integralmente partilhado de férias de Verão (62 dias dos meses de Julho e Agosto, sensivelmente, 9 semanas), de Natal e de Páscoa (que conjuntamente equivalem a um mês, ou seja, 4 semanas), restam apenas 39 semanas anuais em que as crianças não se encontram com o tempo totalmente partilhado entre os seus progenitores.
7\ Na prática, os filhos fazem, pelo menos, 122 pernoitas por ano com o pai.
8\ Deste modo, a percentagem real anual que as crianças pernoitam em casa do pai e estão ao seu cargo é de 33%, no mínimo, ou seja, os filhos passam pelo menos 1/3 do tempo anual com o pai.
9\ Não correspondendo, portanto, com rigor, à realidade, a matéria dada por indiciariamente provada no ponto 7 do despacho de que se recorre de que «os menores encontram-se a residir com a mãe, convivendo quinzenalmente aos fins-de-semana com o pai».
10\ O pai não pretende que as crianças frequentem o ensino privado, independentemente de se encontrar desempregado, ou não, ou dos maiores ou menores rendimentos que venha a ter, pois é uma questão de opção dogmática, para além de financeira.
11\ O que o pai não faz é opor-se a que a mãe suporte o ónus de tais custos (todos eles, e não apenas o custo das propinas) se fizer questão de ter os filhos no ensino particular, e desde que não seja onerado em mais do que aquilo que teria de despender no ensino público.
12\ Posição que assumiu – e assume - em Tribunal na conferência de pais de 17/02/2021.
13\ Ao invés, a mãe nessa conferência de pais assumiu que queria que as crianças continuassem no ensino privado, declarando aceitar que suportaria sozinha todas as despesas referentes e inerentes à frequência do ensino privado que, no seu conjunto para todas as despesas e, para os dois colégios que os filhos frequentam neste presente ano lectivo, ascende a mais de 16.000€ anuais.
14\ No ensino privado existe uma panóplia de custos que vão muito para além da mensalidade propriamente dita, como sejam, a inscrição anual, os manuais escolares principais (pois no ensino público são gratuitos para todos os anos escolares por decisão governamental), as fardas do colégio obrigatórias, a alimentação com valores exorbitantes que são mais de 6 vezes o preço de uma refeição no ensino público, o transporte escolar caríssimo em carrinha do colégio, para já não falar em outros requisitos menores.
15\ Em face da posição tomada pela mãe na conferência de pais de 17/02/2021, e procurando alcançar um consenso quanto à guarda partilhada semana-a-semana, com residência alternada, o pai, no que diz respeito à educação, declarou não colocar entrave à opção da mãe pelo ensino privado (apesar das suas convicções e de saber que não é a melhor opção para os filhos) desde que não fosse onerado em mais do que aquilo que teria de despender no ensino público.
16\ Sendo, portanto, o ensino privado uma opção da mãe, não pode de forma alguma impor-se a sua exigência ao pai.
17\ Desta forma, todos os custos inerentes à frequência do ensino privado e que estão para lá do que vulgarmente se paga no ensino público, deverá competir à mãe assegurar.
18\ Não aceita, pois, o pai, que o Tribunal venha, agora, impor que o pai suporte «todas as restantes despesas de educação (fardamento, livros, material escolar e transporte)», quando este sempre se opôs à frequência dos filhos do ensino particular, também por conhecer existirem tais despesas que não existem no ensino público.
19\ Tendo, inclusive, advertido a mãe e o Tribunal em sede de Conferência de Pais e nos vários articulados já remetidos aos autos, que não colocaria entrave à opção desta pelo ensino privado (apesar das suas convicções e de saber que não é a melhor opção para os filhos) desde que não fosse onerado em mais do que aquilo que teria de despender no ensino público.
20\ Concluindo, o pai considera que a guarda partilhada é o regime que melhor acautela os superiores interesses dos filhos; decorrentemente, considera que não deverá ser fixado um valor de pensão de alimentos, atendendo ao regime de guarda partilhada a consagrar e à equivalência de rendimentos dos progenitores; e considera que o ensino público é o que traz maiores vantagens para os filhos e é aí que gostaria de os ver, e que apenas face à intransigência da mãe em querer que frequentem o ensino privado (apesar de, pelos vistos, não ter condições financeiras para tal) não se op[ôs] a tal opção, desde que não fosse onerado em mais do que aquilo que teria de despender no ensino público.
A mãe contra-alegou, defendendo a improcedência do recurso e sintetizou assim as suas razões nesse sentido:
[…]
4\ Contrariamente ao que pretende o pai, a suspensão da instância, ordenada pelo despacho de 17/03/2022, não teve como fundamento a pendência de processo de promoção e protecção, sem mais, mas sim a circunstância desse processo estar a aguardar elementos e diligências aí solicitadas, entendidas como relevantes para a decisão da causa,
5\ Tais elementos constam já daqueles autos, tendo por isso cessado a suspensão, nos termos e para os efeitos do disposto no art.º 276/1-d do CPC,
6\ Sendo que, de todo o modo, sendo a faculdade de determinar a suspensão um poder-dever do julgador, nada obsta a que este determine a sua cessação, ainda que tacitamente, através da prática de acto decisório,
7\ Até porque, mesmo durante a suspensão, podem praticar-se validamente os actos urgentes ou os destinados a evitar dano irreparável, como é o caso das medidas tutelares cíveis que se afigurem necessárias à salvaguarda do superior interesse da criança, nos termos das disposições conjugadas previstas nos artigos 274 e 987, ambos do CPC, e no art.º 28 do RGPTC.
8\ Ainda que assim não se entenda, sempre terá de se conceder que nenhum dos motivos que presidiu à consagração do regime legal da suspensão obsta à alteração provisória do regime,
9\ Sendo estas decisões, por natureza, insusceptíveis de transitar em julgado, e tendo tido o julgador o cuidado de as articular com a medida de promoção e protecção em vigor,
10\ Sem prejuízo, ainda, de ser reconhecida ao julgador a faculdade de homologar acordos e proferir decisões provisórias relativas a medidas tutelares cíveis, nos termos do art.º 112.º-A da LPCJP.
11\ O pai não cumpre o ónus relativo à impugnação da decisão quanto à matéria de facto, sempre sendo de rejeitar o seu recurso quanto a essa parte, nos termos do n.º 1 do art.º 641.º do CPC.
12\ Não merecendo, de todo o modo, a decisão recorrida qualquer censura, no que respeita à fixação do montante relativo à pensão de alimentos, sendo este conforme ao disposto nos artigos 1874, 1879, 2003 e 2004 do CC.
13\ Do mesmo modo, não merece a decisão recorrida qualquer censura, no segmento em que estabelece a comparticipação das demais despesas das crianças, com excepção das mensalidades do colégio,
14\ Pois que foram ambos os pais, na constância do casamento e no ano após a separação, que acostumaram os filhos à frequência do ensino privado,
15\ Só tendo a mãe aceitado, no âmbito da conferência de pais, de 17/02/2021, suportar as mensalidades dos colégios, e não todas as despesas inerentes à sua frequência.
O MP também contra-alegou, no essencial aderindo aos fundamentos da resposta da mãe.
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Questões que importa decidir: se a decisão recorrida não podia ter sido proferida, por o processo estar suspenso; no caso de se entender que o podia ter sido, fica por saber se não devia ter fixado uma pensão de alimentos, nem devia ter condenado o pai nas despesas inerentes à frequência do ensino privado.
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Os factos que importam para a decisão destas questões são: os que foram dados como provados supra no despacho recorrido e as ocorrências processuais descritas.
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Quanto à suspensão

Face ao despacho de 17/03/2022, parte final, não há dúvida de que o processo de regulação se encontrava suspenso.
Mas esse despacho não fixava um prazo para a suspensão (art.º 272/3 do CPC), nem previa um acto ou facto (como, por exemplo, a decisão do processo de promoção: art.º 272/1 do CPC) que, verificado, fizesse cessar a suspensão (art.º 276/1 do CPC).
Sendo assim, a forma de fazer cessar a suspensão era um despacho judicial que declarasse cessada a suspensão, sendo que esse despacho não tinha que assumir nenhuma forma especial (por não haver norma que a imponha, como decorre também, a contrario, do art.º 276 do CPC), pelo que podia decorrer tacitamente de um acto a dar seguimento ao processo, como, por exemplo, que foi o que aconteceu no caso, através de uma decisão de uma questão que se entendeu estar por decidir.
Por outro lado, mesmo que a suspensão tivesse sido colocada na dependência de uma acção prejudicial, o juiz podia alterar tal situação [assim, por exemplo, o ac. do TRL de 08/01/2015, proc. 129/03.3TBGDM.P1, sobre um caso de suspensão e com invocação das posições de Alberto dos Reis, Lebre de Freitas e Isabel Alexandre: II – Um despacho proferido no uso legal de um poder discricionário é irrecorrível e não vincula o juiz (arts. 620 e 630 do CPC), que pode proferir, depois disso, um outro, noutro sentido, se se convencer que a alteração é conveniente aos fins do processo.]
Por fim, tendo o tribunal dito que, “não [era] conveniente alterar o regime provisório quanto a tal segmento [alimentos, despesas] uma vez que para além do mais se mostra pendente um processo de promoção e protecção no âmbito do qual se aguardam elementos e diligências a realizar para poder ser aplicada medida protectiva a favor das duas crianças”, tal até apontava, desde logo, que mal existisse, naquele processo, o resultado daqueles elementos e diligências que permitissem aplicar uma medida de protecção, a suspensão cessaria. Pelo que, no momento em que foi aplicada aquela medida, não se justificava que o tribunal continuasse a aguardar para fixar alimentos.
A mãe também invoca todas estas razões para afastar o relevo da suspensão da instância, pelo que, o que antecede, lhe dá razão, embora se discorde de um dos argumentos por ela invocados, qual seja, o de o juiz, mesmo estando suspensa a instância, poder praticar actos urgentes destinados a evitar dano irreparável (art.º 275/1 do CPC), porque, nesse caso, a instância continuaria suspensa e não foi isso que sucedeu, como se vê da parte final da sentença recorrida.
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O pai sugere, na 1.ª conclusão do recurso, que há uma alteração na questão do regime de convívios, mas não existe, já que a decisão recorrida se limitou a reproduzir o que tinha sido decidido, com o acordo dos progenitores, no processo de promoção de protecção. De resto, não há nenhuma conclusão quanto a tal matéria, já que aquela 1.ª conclusão só diz respeito à pretensão de atribuição de efeito suspensivo ao recurso (questão tratada em despacho próprio). 
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Da necessidade de serem fixados os alimentos
O pai entende que não havia que fixar a pensão de alimentos porque, conclusões 4 a 9, (i) a conclusão retirada no facto 7 não corresponde à realidade, ou seja, as crianças não se encontram a residir com a mãe, mas sim 2/3 do tempo com a mãe e 1/3 do tempo com o pai e, conclusão 20, (ii) a guarda partilhada é o regime que melhor acautela os superiores interesses dos filhos e há equivalência de rendimentos entre os progenitores.
Isto posto,
Primeiro há que esclarecer qual era o regime que vigorava quanto aos alimentos imediatamente antes da sentença recorrida.
Ora, esse regime, por força do despacho de 16/12/2021, era, realmente (diz-se realmente porque, embora com pressupostos que aqui se consideram errados, é isso que decorre daquele despacho, tal como a própria mãe assim o entende; e diz-se que os pressupostos estão errados porque, ao contrário do que se refere nesse despacho, (a), o TRL, no ac. de 17/06/2021, não alterou só a decisão relativa à residência alternada, antes repristinou o anterior regime provisório; e (b), os progenitores não estavam de acordo com todos os outros pontos do regime de 17/02/2021, como se vê da respectiva acta), quanto aos alimentos, o que resultava da cláusula 3.ª do regime provisório de 17/02/2021, na qual não se fixavam alimentos pois que tinha sido estabelecida a residência alternada.
Tendo o processo sido instaurado há já mais de 3 anos (à data da decisão recorrida) e dizendo respeito, também, a alimentos a menores (art.º 1905/1 do CC), sendo que alimentos é algo que diz respeito ao sustento, habitação, vestuário, instrução e educação dos menores – art.º 2003 do CC), e sendo substancialmente muito inferior o tempo em que os menores ficam com um dos progenitores, não podem deixar de ser fixados alimentos aos menores a pagar pelo outro, a título provisório, como foi feito, ao abrigo do art.º 28 do RGPTC (mas o art.º 38 do RGPTC também já o impunha há muito: “Se ambos os pais estiverem presentes ou representados na conferência, mas não chegarem a acordo que seja homologado, o juiz decide provisoriamente sobre o pedido em função dos elementos já obtidos, […]”), enquanto não forem fixados alimentos definitivos.
Sendo assim, mesmo que os menores vivessem 33% do tempo com o pai e os rendimentos fossem equivalentes, tal não impediria que se fixassem alimentos provisórios.
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Do relevo da repartição do tempo entre os progenitores
Isto embora a repartição do tempo seja realmente relevante.
Qual é, realmente, a repartição de tempo entre o pai e a mãe na regulação em vigor no caso dos autos?
De novo, a regulação que vigora é a das cláusulas 8 a 14 relativa aos convívios do regime provisório fixado em 17/02/2021 por força do despacho de 16/12/2021, que não foi posto em causa por qualquer dos progenitores, mas tendo em conta o que foi decidido, por acordo, no processo de promoção e protecção de 30/11/2022.
O pai está com a criança, de 15 em 15 dias, de 5.ª-feira após as actividades escolares até ao início das actividades escolares na 2.ª-feira, mas isto tirando um mês de férias de Verão e uma semana de férias de Natal e outra de férias de Páscoa que ficam para a mãe. E está ainda com eles durante um outro mês de férias de Verão, mais 1 semana de férias de Natal e outra de férias da Páscoa. Ou seja, grosso modo, o pai está com os filhos, em cada 15 dias, 3 dias e meio, e isso durante 40 semanas ao ano ou 20 quinzenas. 20 quinzenas x 3,5 = 70 dias. A isto acrescem 1 mês e 2 semanas (= 45 dias). Num total de 115 dias em 365 dias. Ou seja, 31,50% do tempo.
Tudo isto pode ser considerado, sem necessidade de estar a alterar o facto provado 7, pois que resulta da regulação vigente.
E tem que ter inevitáveis reflexos a nível de alimentos, pois que realmente um dos progenitores não está quase 100% do tempo com os filhos e o outro quase nenhum tempo com eles. E o progenitor que está com eles 31,50% do tempo também tem que prover ao sustento dos filhos quando eles estão com ele, tendo este sustento, no caso, o sentido de alimentos em sentido amplo.
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Quanto ao valor dos alimentos quando fixados, no essencial, com base em presunções de mínimos, por falta de prova:
Quanto ao valor dos alimentos, considera-se que ele deve ser fixado, tendo em conta a provisoriedade da decisão e a falta de precisos elementos de facto inerente a este tipo de medidas provisórias, mas também as regras da lógica e da experiência comum das coisas, ou seja, no essencial, que todas as crianças precisam pelo menos de um mínimo para viver, sendo esse mínimo dos mínimos o equivalente a ½ do indexante dos apoios sociais, e tendencialmente será mais elevado quando se sabe, como no caso (tendo em conta o respectivo salário ilíquido), que são mais elevadas as condições económicas dos progenitores no caso dos autos e ainda se sabe que estes não têm, grosso modo, um dos gastos que em geral é mais significativo, qual seja o da habitação, visto que um deles vive em casa própria e o outro vive em casa dos pais.
Neste sentido, por exemplo, no ac. do TRL de 10/10/2019, 3396/16.9T8CSC.L1-2 (de que agora se actualizam alguns elementos), diz-se, quanto à questão da necessidade dos menores, quando nada mais se prova e se tem de decidir de acordo com limites mínimos:
“A nível das prestações alimentares, em que normalmente poderão estar em causa, também, prestações da segurança social, pode-se considerar que um IAS (indexante de apoios sociais, regulado na Lei 53-B/2006, de 29/12, com alterações posteriores – segundo a Portaria n.º 24/2019, de 18/01, o valor do IAS para o ano de 2019 era de 435,76€; segundo a Portaria n.º 298/2022, de 16/12, o valor, em 2023, é de 480,43€; segundo a Portaria n.º 421/2023, de 11/12, o valor para 2024 passa a ser de 509,26€) representa o mínimo económico para uma vida minimamente digna de um adulto. Por uma razão de economias de escala, tem-se considerado que os menores que vivam com um adulto precisam, para esse mesmo nível de vida minimamente digna, de 0,5 IAS (no art.º 5 do DL 70/2010, de 16/06, na redacção actual, dispõe-se que no apuramento da capitação dos rendimentos do agregado familiar, a ponderação de cada elemento é efectuada de acordo com a escala de equivalência seguinte: requerente, peso 1; por cada indivíduo maior, peso 0,7; por cada indivíduo menor, peso: 0,5).
Remédio Marques (Algumas Notas Sobre Alimentos – devidos a menores -, Coimbra Editora, 2.ª edição revista, 2007, nota 270 da página 202) em vez do IAS (que ainda não existia) utiliza o valor muito mais baixo do rendimento social de inserção (em 2019, pelo 1.º adulto 189,66€, pelo 2.º adulto e seguintes: 132,76€; por cada menor: 94,83€), mas considera-se que é mais correcto atender ao valor do IAS porque é a este que a lei tem em conta quando está em causa, por exemplo, a intervenção do Fundo de garantia de alimentos devidos a menores [veja-se o art.º 1/1 da Lei 75/98, de 19/11, na redacção actual, praticamente igual ao art.º 3/1 do DL 164/99, de 13/05 (que regulamenta esta Lei), e o acórdão do TRL de 26/09/2019, proc. 1116/17.0T8SXL-C.L1.L1].”
 Assim, as necessidades mínimas de qualquer menor podem ser consideradas como sendo, no mínimo, de 254,63€ (desconsiderando, por praticamente irrelevante dada a forma como se está a fixar este valor, no caso, a diferença entre o IAS para 2023 e para 2024, tanto mais que a sentença recorrida fixou o valor em Junho de 2023, já a meio do ano, e este acórdão vai datar de Fev2024).
No caso, em que ambos os progenitores têm um salário líquido que é, pelo menos, do dobro do salário mínimo nacional, e têm menos despesas do que as normais (não têm a despesa da habitação como já se disse) o que lhes permite ter um nível de vida de, grosso modo, cerca do triplo do mínimo (nível de vida que os filhos devem poder acompanhar), aquele valor deve ser triplicado ou seja, passar para 763,89€.
Como os salários líquidos dos progenitores serão praticamente equivalentes (ao menos face aos factos provados – os factos provados não permitem saber qual é de facto o salário líquido de cada um deles) e lhes dão possibilidades suficientes para o pagamento destes valores, cada um deles deve pagar metade dos alimentos dos filhos.
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O gasto anual é de 763,89€ x 12 = 9.166,68€.
Cada um dos progenitores deveria pagar: 4.583,34€.
De acordo com o acima apurado, a mãe estará 250 dias por ano com as crianças (= 68,50%), pelo que gastará 6.279,18€.
O pai estará 115 dias (31,50%), pelo que gastará 2.887,50€.
Pelo que a mãe pagará a mais: 3.391,68€.
Se o pai der à mãe metade da diferença, 1.695,84€, os gastos ficarão iguais:
Mãe: 6279,18€ - 1.695,84€ = 4 583,34€
Pai: 2887,50€ + 1.695,84€ = 4.583,34€.
Assim, por cada filho, o pai deve dar 1695,84€ por ano, ou seja, 141,32€ mês.
Para os dois filhos, o pai deve dar um total de 141,32€ x 2 = 282,64€ mês.
Portanto, o valor fixado pela sentença recorrida deve ser reduzido dos 400€/mês para 282,64€/mês, ou seja 141,32€/mês para cada filho.
Note-se que não é costume esta repartição de tempo ser tida em conta, mas isso porque os métodos de cálculo aplicados são normalmente os da guarda/residência única (como se assume, expressamente, em Remédio Marques, obra citada, páginas 192- 193).
Ora, isto não se justifica quando a regulação do regime das responsabilidades leva, na prática, quase a um regime de residência alternada (quando o tempo de residência com um dos pais passa o limite dos 33% - veja-se Jorge Duarte Pinheiro, O direito da família contemporâneo, Gestlegal, 7.ª edição, 2020, pág. 295, nota 558).
Entretanto, lembre-se que estes valores não abrangem as despesas de saúde, médicas e medicamentosas que constam de outra cláusula que, nessa parte, não é alterada.
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Quanto às despesas referentes e inerentes à frequência do ensino privado
Referem-se a isto, as restantes conclusões do pai.
A parte da regulação do despacho recorrido que está em causa é apenas a parte sublinhada seguinte:
5\ A mensalidade do colégio será suportada exclusivamente pela progenitora, ao passo que todas as restantes despesas de educação (fardamento, livros, material escolar e transporte) e as despesas de saúde, médicas e medicamentosas, na parte não comparticipada, serão suportadas por ambos os progenitores, na proporção de metade […]
Quanto a estas despesas a cláusula que vigorava era, de novo, a do regime provisório de 17/02/2021, por força do despacho de 16/12/2021, ou seja:
5. Caso não haja entendimento quanto à frequência escolar dos menores no ensino privado, a mãe suportará as respectivas prestações, sem prejuízo do pai poder vir, igualmente, a assumir tais despesas, quando ou caso retome o exercício da sua actividade profissional.
Ora, face à total ausência de factos dados como indiciariamente provados relativamente a esta matéria, designada e principalmente, o valor delas e em concreto quais as que estão em causa e também tendo em conta que se trata, para já, de um regime provisório, sem que se tivesse produzido toda a prova que as partes arrolaram, considera-se, tendo em conta também o que se diz no parágrafo seguinte, que, não havia elementos de facto que permitissem ou aconselhassem a alteração do regime de tais despesas.
Tanto mais que o regime anterior revela que o pai não estava de acordo com a frequência do ensino privado e que é entendimento quase uniforme, e correcto, e que no caso também foi seguido quer pelo tribunal quer pelas partes, o de que, quando os progenitores não estão de acordo com a frequência do ensino privado é, em princípio, aquele que é a favor dessa frequência, que suporta os respectivos custos (neste sentido, por exemplo, com outras referências, veja-se o ac. do TRL de 28/04/2022, proc. 8811/09.5TBCSC-B) e isto, também em princípio, tem de valer, logica e naturalmente, para todas as despesas inerentes a essa frequência.
Para assim se decidir não se usa o argumento deduzido pelo pai, de que a mãe assumiu tais despesas, pois que não está provado que assim tenha sido.
E a mãe não pode usar contra o decidido os argumentos que usa, pois que estes estavam dependentes de factos que ela utiliza e que não constam dos provados.
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Pelo exposto, julga-se o recurso parcialmente procedente, diminuindo, no n.º 3 do regime fixado na sentença recorrida, o valor de 400€ mensais (200€ para cada filho) para 282,64€/mês (141,32€/mês para cada filho), e revogando, no n.º 5 do regime fixado na sentença recorrida, a parte relativa a “todas as restantes despesas de educação (fardamento, livros, material escolar e transporte) e”. No demais, o recuso é improcedente, mantendo-se os outros pontos do regime fixado.
Custas do recurso, na vertente de custas de parte, em partes iguais pelos progenitores.

Lisboa, 22/02/2024
Pedro Martins
Rute Sobral
Orlando Nascimento