Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
178/2009-5
Relator: MARGARIDA BLASCO
Descritores: ALCOOLÍMETRO
CONDUÇÃO SOB O EFEITO DE ÁLCOOL
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 03/17/2009
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: PROVIDO
Sumário: I. Sendo de 10 anos o prazo de validade da aprovação do aparelho Drager Alcotest 7110 MKIII, actualmente utilizado para fiscalização do estado de condução sob influência do álcool (cfr. art.2º., nº.2 do Regime Geral do Controlo Metereológico aprovado pelo DL nº.291/90, de 20 de Setembro e art.7º., nº.2 do Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros aprovado pela Portaria nº.748/94, de 13 de Agosto), a questão que se coloca reside em saber se tal prazo se conta a partir da publicação em Diário da República do despacho de aprovação do Instituto Português da Qualidade (cfr. art.12º. do Decreto Regulamentar nº.24/98, de 30.10) ou do despacho da Direcção Geral de Viação que aprovou a utilização de tal aparelho, nos termos do art.5º., nº.5 do DL nº.44/05, de 23 de Fevereiro.
II. Entende-se, assim, ser de atender, para tal efeito, à data em que foi proferido o despacho da Direcção Geral de Viação, nos termos daquele último normativo (neste sentido, cfr. ACRL de 31.10.07, P.7087/07-3).

(Sumário da Relatora)
Decisão Texto Integral:
TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA
Acordam, em conferência, na 5ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Lisboa

I.

1- No âmbito do p. nº 917/06. 9SDLSB, que correu seus termos no 2º juízo do Tribunal de Instrução Criminal, foi proferida em 10/10/2008, a seguinte DECISÃO INSTRUTÓRIA:

(…)

O arguido (A) veio requerer a abertura de instrução por não se conformar com o teor da acusação deduzida pelo MP que lhe imputou a prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez previsto e punido pelo artº. 292º nº.1 CP.
Alegou, em síntese, que as autoridades policiais não poderiam ter utilizado o aparelho Drager Alcotest 7110 MKIII P, conforme análise do talão de alcoolimetria de fls. 2.
Na verdade tal aparelho foi objecto de aprovação pelo IPQ mediante despacho nº. 211.06.96.3.30, junto na fls. 40, e publicado no DR, III série, nº. 223 em 25/9/1996.
Não houve qualquer espécie de renovação do aparelho.
Na data em que foi utilizado para medir a TAS do arguido-7/12/2006 a sua validade já havia expirado há 3 meses.
Não se procederam a diligências de instrução.
Procedeu-se ao debate instrutório com observância do formalismo legal, tendo o Ministério Público pugnado pela não pronúncia do arguido e a defesa em sentido contrário por inexistência de indícios.
*
O Tribunal é competente.
Não existem nulidades, excepções ou questões prévias a conhecer.
*
Cumpre, agora, proferir decisão instrutória que será de pronúncia ou de não pronúncia, conforme o juízo que se faça sobre a suficiência ou insuficiência dos indícios de verificação dos pressupostos de que depende a aplicação ao arguido de uma pena.
A finalidade e âmbito da instrução, definida no artº. 286º nº 1 do CPP, consiste em deslocar a investigação sob a égide e direcção de um juiz, para obter “a comprovação judicial da decisão de deduzir acusação ou de arquivar o inquérito, em ordem a submeter ou não a causa a julgamento”.
Finda a instrução, a decisão de pronunciar tem na sua génese, um juízo sobre os elementos colhidos nos autos, sobre o conjunto da prova indiciária. Resume-se ao conjunto de indícios dos quais possa resultar uma possibilidade razoável de ao arguido vir a ser aplicada, por força deles, em julgamento, uma pena.
Não se exige, por conseguinte, o juízo de certeza do julgamento, subjacente à condenação, mas antes um juízo de probabilidade séria e razoável, de modo a que os factos indiciários sejam suficientes e bastantes por forma a que formem um todo persuasivo de culpabilidade do arguido, impondo um juízo de probabilidade da sua condenação.
*
O aparelho Drager Alcotest 7110 MKIII foi aprovado pelo Despacho n.º 211.06.97.3.50, de 23 de Dezembro de 1997, publicado no Diário da República n.º 54, III Série, de 5 de Março de 1998 e devidamente aprovado pelo IPQ in DR nº 223 – III Série de 25.09.96 e DR nº 54-III Série de 5.03.1998 e foi ainda autorizada a sua utilização nas operações de fiscalização pelo Despacho nº 001/DGV/98 de 6.08.1998, pelo que é um aparelho que reunirá todas as condições técnicas para ser utilizado nas operações de fiscalização de condutores de veículos com motor.
Temos assim que tal aparelho, como o dos presentes autos já que trata do aparelho Drager Alcotest 7110MKIII, tem um prazo de validade para uso nas acções de fiscalização despistagem de álcool no sangue de condutores de veículos na via pública de 10 anos.
Este prazo de 10 anos que se iniciou na data da publicação do despacho em DR e datado de 25/09/1996 terminou em 25/09/2006.
Considerando que os factos imputados ao arguido quando submetido ao teste de alcoolémia através do aludido aparelho quantitativo de despistagem de álcool no sangue ocorreram em 7/12/2006 tal significa que o talão junto aos autos não tem qualquer força probatória face à invalidade do aparelho Drager Alcotest MKIII.
Assim, sendo e por não podermos tomar em consideração o teste de alcoolémia efectuado pelo aparelho Drager Alcotest MKII, os indícios nos autos são manifestamente insuficientes para submeter o arguido a julgamento, já que se assim fosse seria mais provável a sua absolvição do que a sua condenação.
Nestes termos a decisão instrutória só pode ser a prolação de um despacho de não pronuncia.
*
Procedendo à comprovação judicial da decisão de acusação, através da sua aferição jurídica e para efeito de formulação de um juízo indiciário positivo ou negativo, ter-se-á de concluir que não existem elementos suficientes nos autos que permitam sustentar tal acusação em sede de julgamento.
Fazendo um juízo crítico sobre os indícios constantes dos autos terá que se concluir que eles são insuficientes para poder imputar, mesmo nesta fase processual, o cometimento do crime ao arguido.
*
Pelo exposto, e ao abrigo dos artºs. 307º e 308º nº.1 CPP não pronuncio o arguido (A) pela prática de um crime de crime de condução de veículo em estado de embriaguez previsto e punido pelo artº. 292º nº.1 CP.
(…)

2- O Ministério Público, veio interpor recurso desta decisão apresentando as seguintes conclusões que se transcrevem:

(…)

1.° O presente recurso é interposto da decisão do Meritíssimo Juiz de Instrução Criminal que não pronunciou o arguido (A) pela prática de um crime de condução em estado de embriaguez, previsto no art. 292°, n.° 1 do Código Penal, por ter decidido que a prova resultante do alcoolímetro Drager Alcotest 7110 MKIII não é válida;

2.° O despacho recorrido interpretou o despacho do I.P.Q. n.° 211.06.96.3.50, publicado no D.R. III Série, n.° 223, de 25/9/96, no sentido de que decorridos 10 anos sobre a aprovação do modelo do alcoolímetro Drager Alcotest 7110 MKIIl a sua força probatória caducou;

3.° Porque o prazo de 10 anos que se iniciou na data da publicação do despacho em DR e datado de 25/09/1996 terminou em 25/09/2006.

4.° Considerando que os factos imputados ao arguido quando submetido ao teste de alcoolémia através do aludido aparelho quantitativo de despistagem de álcool no sangue ocorreram em 7/12/2006 tal significa que o talão junto aos autos não tem qualquer força probatória face à invalidade do aparelho Drager Alcotestm 7110 MKIII.

5.° Porém, salvo o devido respeito por opinião contrária, tal entendimento não é o mais correcto.

6.° Efectivamente, refere o artigo 12.° do Decreto Regulamentar n.° 24/98, de 30/10, que "Só podem ser utilizados nos testes quantitativos de álcool no ar expirado analisadores que obedeçam às características fixadas em portaria conjunta dos Ministros da Administração Interna, da Justiça e da Saúde e que selam aprovados por despacho do director-geral de Viação.

7.° E, por sua vez o art. 5°, n.° 5 do DL n.° 44/05, de 23/2, que aprovou a versão em vigor, à data dos factos, do Código da Estrada, diz que, cabe à D.G.V. aprovar os aparelhos utilizados na fiscalização do trânsito, a qual deve ser precedida pela aprovação do modelo no âmbito do regime geral do controlo metrológico.

8.° O aparelho em causa foi aprovado pelo Instituto Português da Qualidade através do despacho n.° 211.06.96.3.50, publicado no D.R. III Série, n.° 223, de 25/9/96, e do despacho complementar n.° 211.06.97.3.50, publicado no D.R. III Série, n.° 54, de 5/3/98.

9.° E foi aprovado pela D.G.V. através do despacho n.° 001/D.G.V./ALC/98, de 6/8/98, pelo que só em 05/08/2008, caducou a sua autorização de validade.

10° Pelo que o despacho recorrido deveria ter interpretado as disposições legais atrás citadas no sentido de que a medição operada pelo alcoolímetro Drager Alcotest 7110 MKIII (arma 0079), no dia 07/12/2006, nestes autos, é válida como meio de prova de que o arguido conduzia com a T.A.S. de 1,67 g/l;

11° E ter pronunciado o arguido pela prática de um crime de condução em estado de embriaguez, previsto no art. 292°, n.° 1 do Código Penal.

Termos em que se requer que o despacho recorrido seja substituído por outro em que se decida pela validade da medição do alcoolímetro como meio de prova e em consequência seja o arguido (A) pronunciado pela prática do mencionado crime.

(…)


3- O arguido apresentou a seguinte resposta:


(…)
1-Vinha o Arguido indiciado da prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, crime p. e p. nos termos do Artigo 292.° cio Código Penal.
2-O alegado estado alcoólico foi detectado mediante utilização do alcoolímetro de marca Drager Alcootest 7110 MKIII.
3-Por considerar que o mencionado aparelho, à data dos factos, não se encontrava válido, não podendo, por isso, qualquer resultado dele proveniente, ser relevado para efeitos de censura penal, requereu o arguido, ora Recorrido, Abertura de Instrução, com base nos fundamentos que importa, nesta sede, reproduzir.
4-Para que um instrumento de medição, neste caso, de álcool possa ser utilizado tem que se verificar, em primeira linha, uma aprovação de modelo por parte do Instituto Português de Qualidade, entidade que vai atestar da conformidade do aparelho para os fins a que se destina.
A mencionada aprovação é válida pelo período de 10 anos, conforme o estatuído no n° 2 do Artigo 2.° do Decreto-Lei 291/90 que estabelece o Regime do Controlo Metrológico, e no n° 3 do Artigo 6.° da Portaria n° 1556/2007 de 10 de Dezembro que institui o Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros.
5- O prazo de 10 anos conta-se a partir da data de publicação em Diário da Republica do despacho de aprovação emitido pela referida entidade.
Tecidas estas considerações importa atender ao caso concreto.
6- O alcoolimetro utilizado no caso que originou os presentes autos foi aprovado pelo despacho 211.06.96.3.30, publicado em Diário da Republica no dia 25 de Setembro de 1996, III a Série, n° 223, estabelecendo no seu final que "a validade de aprovação do modelo é de 10 anos, a contar da data de publicação em Diário da República".
7. Assim, atendendo às supra citadas disposições e, não constando do despacho de aprovação qualquer elemento em contrário, o prazo de validade para o seu uso na acção de fiscalização de despistagem de álcool no sangue nos condutores de veículos na via publica expirara no dia 25 de Setembro de 2006, sensivelmente 3 meses antes da data em que fora utilizado no arguido, daí tendo que ser retiradas as necessárias consequências legais.
8. Este entendimento defendido pelo arguido, foi pela Juíza de instrução corroborado.
9.Defende o Recorrente que o prazo de 10 anos a que se alude supra se inicia, não da aprovação emitida pelo IPQ, mas sim da aprovação realizada pela DGV, fundamentando a sua posição em duas disposições legais que mais não dizem além de que: somente podem ser utilizados nos testes quantitativos de álcool os analisadores que tenham sido objecto de aprovação por parte da DGV, a qual tem que ser precedida pela aprovação emitida pelo IPQ - artigo 12.° do Decreto Regulamentar n° 24/98 de 30 de Outubro e n° 5 do artigo 5.° do Decreto-lei n° 44/05 de 23 de Fevereiro.
10- Das disposições de que o Recorrente se socorre nada de infere no sentido desse prazo se iniciar do despacho da DGV, aliás, nem sequer atribuem um prazo de validade a essa autorização, ao contrário do que sucede com a aprovação realizada pelo IPQ, essa sim com uma validade de 10 anos, expressa quer na letra da lei, quer no próprio despacho de aprovação, pelo que não se vislumbra qualquer fundamento legal para que o prazo de validade se não inicie na data de publicação em DR da aprovação dessa entidade.
11- Acresce que, é o IPQ, e não a DGV, quem atesta da conformidade dos instrumentos de medição de álcool, da sua fiabilidade, do seu bom funcionamento, de que se encontra dotado de condições técnicas que permitam uma avaliação o mais fiei possível da realidade dos factos, neste caso, da existência de álcool no sangue num individuo, e da respectiva quantidade, e, por isso, faz todo o sentido que o prazo conte dessa certificação.
12- É o IPQ, através do Departamento de Metrologia que desenvolve todas as actividades relacionadas com "calibrar padrões de referência e instrumentos de medição (..) realizar ensaios de controlo metrológico e instrumentos de medição e produzir e certificar materiais de referência" — Artigo 5.° da Portaria n° 540/2007 de Abril.
13- Esse prazo funciona, pois, como limite a partir do qual, o aparelho é considerado como desprovido de qualidades que permitam a sua utilização viável e sem margens para erros, como exigível.
14- Desta feita, e estando ultrapassado o prazo de vigência do aparelho objecto deste Recurso, o talão emitido por esse analisador quantitativo encontra-se desprovido de qualquer força probatória
15- Ademais, além de não se poder atender ao talão, pelas razões supra expostas, o facto de se encontrar fora de validade faz-nos duvidar, por si só, da sua fiabilidade, designadamente da fiabilidade do resultado.
16-Por conseguinte e, carecendo os presentes autos, qualquer elemento probatório que suporte a tese de que no dia 7 de Dezembro de 2006, se encontrava o arguido, ora Recorrido, a conduzir um veiculo com uma taxa de álcool no sangue de 1,54 g/1, inexistem indícios suficientes da prática do crime de que vinha o acusado, devendo manter-se o despacho de não pronuncia. Nestes termos, nos melhores de Direito e sempre com mui douto suprimento de V.Exas deverá ser negado provimento ao Recurso interposto pelo Ministério Publico, confirmando-se, assim, o despacho proferido pelo Meritíssima Juíza do Tribunal a quo que decidiu não pronunciar o Arguidos (A) pelo Crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. nos termos do Artigo 292.° do Código Penal.
(…)
4- O recurso foi admitido a subir imediatamente e nos próprios autos, tendo sido fixado efeito meramente devolutivo.
5- Subiram os autos a este Tribunal, onde o Exmo. Procurador-Geral Adjunto acompanhou o recurso do MP.
6- Cumprido o art.417º, nº2 do CPP, nada foi dito.
7- Efectuado exame preliminar, foram os autos remetidos para conferência.

8- Colhidos os vistos, cumpre apreciar.


II.

1- De harmonia com o disposto no n°1, do art. 412°, do CPP, e conforme jurisprudência pacífica e constante (designadamente, do STJ - Ac. de 13/5/1998, B.M.J. 477/263, Ac. de 25/6/1998, B.M.J. 478/242, Ac. de 3/2/1999, B.M.J. 477/271), o âmbito do recurso é delimitado em função do teor das conclusões extraídas pelos recorrentes da motivação apresentada, só sendo lícito ao tribunal ad quem apreciar as questões desse modo sintetizadas, sem prejuízo das que importe conhecer, oficiosamente por obstativas da apreciação do seu mérito (Ac. do Plenário das Secções do STJ, de 19/10/1995, D.R. 1 - A Série, de 28/12/1995).
São apenas as questões suscitadas pelo recorrente e sumariadas nas conclusões, da respectiva motivação, que o tribunal ad quem tem de apreciar – art. 403 °, nº 1 e 412°, n°1 e n°2, ambos do CPP. A este respeito, -e no mesmo sentido, ensina Germano Marques da Silva, "Curso de Processo Penal", Vol. 1, 21 edição, 2000, fls. 335, “Daí que, se o recorrente não retoma nas conclusões as questões que desenvolveu no corpo da motivação (porque se esqueceu ou porque pretendeu restringir o objecto do recurso), o Tribunal Superior só conhecerá das que constam das conclusões”.

Sendo o objecto do recurso delimitado pelas conclusões extraídas da correspondente motivação (arts. 403°, n.º 1 e 412°, n° 1 do CPP), as questões e facto e de direito a conhecer são, em síntese, as seguintes:

-a prova resultante do alcoolímetro Drager Alcotest 7110 MKIII não é válida, ou seja, a medição operada por este aparelho não pode ser considerada como meio de prova válido, uma vez que passaram 10 anos sobre a data da publicação da aprovação daquele aparelho pelo despacho do I.P.Q. n.° 211.06.96.3.50, publicado no D.R. III Série, n.° 223, de 25/9/96, pelo que já tinha caducado quando o arguido foi submetido ao respectivo teste.

2- Apreciemos, adiantando deste já que o recurso merece provimento.
Senão vejamos.

Refere-se no despacho recorrido que:
(…)
" O aparelho Drager Alcotest 7110 MKIII foi aprovado pelo Despacho n.° 211.06.97.3.50, de 23 de Dezembro de 1997, publicado no Diário da República n.° 54, III Série, de 5 de Março de 1998 e devidamente aprovado pelo IPQ in DR n.° 223 – 111 série de 25.09.1996 e foi ainda autorizada a sua utilização nas operações de fiscalização de condutores de veículo com motor.
Temos assim que tal aparelho, como o dos presentes autos já que trata do aparelho Drager Alcotest 7110 MKIII, tem um prazo de validade para uso nas acções de fiscalização despistagem de álcool no sangue de condutores de veículos na via pública de 10 anos.
Este prazo de 10 anos que se iniciou na data da publicação do despacho em DR e datado de 25/09/1996 terminou em 25/09/2006.
Considerando que os factos imputados ao arguido quando submetido ao teste de alcoolémia através do aludido aparelho quantitativo de despistagem de álcool no sangue ocorreram em 7/12/2006 tal significa que o talão junto aos autos não tem qualquer força probatória face à invalidade do aparelho Drager Alcotestm 7110 MKIII.
Assim, sendo e por não podermos tomar em consideração o teste de alcoolémia efectuado pelo aparelho Drager Alcotestm 7110 MKIII, os indícios nos autos são manifestamente insuficientes para submeter o arguido a julgamento, já que se assim fosse seria mais provável a sua absolvição do que a sua condenação.
Nestes termos a decisão instrutória só pode ser a prolação de um despacho de não pronúncia.
... Pelo exposto, e ao abrigo dos artigos 307.° e 308.° n.° 1 do CPP não pronuncio o arguido (A) pela prática ..."
(…)

O DL n.° 291/90, de 20/9 estabelece no seu art. 1º, nº1, o Regime Geral do Controlo Metrológico de todos os métodos e instrumentos de medição.
Por seu turno, dispõe o art. 2°, n.° 2, deste diploma que a aprovação de modelo de um instrumento de medição será válida por um período de 10 anos, findo o qual carece de renovação.
Por outro lado, o Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros actualmente em vigor foi aprovado pela Portaria n.°748/94, de 13/8, "no âmbito do regime jurídico estabelecido no Decreto-Lei n.° 291/90, de 20 de Setembro".

Esta Portaria estabelece, em consonância com o Regime Geral do Controlo Metrológico, no seu art. 7°, n.° 2, que a aprovação de modelo é válida por 10 anos, salvo disposição em contrário no despacho de aprovação.

Refere o art. 12° do Decreto Regulamentar n.° 24/98, de 30/10, que:

(…)
" 1 - Só podem ser utilizados nos testes quantitativos de álcool no ar expirado analisadores que obedeçam às características fixadas em portaria conjunta dos Ministros da Administração Interna, da Justiça e da Saúde e que selam aprovados por despacho do director-geral de Viação.
2 - A aprovação a que se refere o número anterior é precedida de aprovação de marca e modelo, a efectuar pelo Instituto Português da Qualidade, nos termos do Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros.
(…)

Nos termos do art. 5°, n.° 5 do DL n.° 44/05, de 23/2, que aprovou a versão em vigor, à data dos factos, do Código da Estrada, cabe à D.G.V. aprovar os aparelhos utilizados na fiscalização do trânsito, a qual deve ser precedida pela aprovação do modelo no âmbito do regime geral do controlo metrológico:

(…)
"5 - Cabe ainda à Direcção-Geral de Viação aprovar, para uso na fiscalização do trânsito, os aparelhos ou instrumentos que registem os elementos de prova previstos no n.° 4 do artigo 170.° do Código da Estrada, aprovação que deve ser precedida, quando tal for legalmente exigível, pela aprovação de modelo, no âmbito do regime geral do controlo metrológico".

O aparelho actualmente utilizado para fiscalização do estado de condução sob influência do álcool é o DraqerAlcotest 7110 MKIII.

Este modelo foi aprovado pelo Instituto Português da Qualidade através do despacho n.° 211.06.96.3.50, publicado no DR III Série, n.° 223, de 25/9/96, e do despacho complementar n.° 211.06.97.3.50, publicado no DR III Série, n.° 54, de 5/3/98. Foi ainda aprovado pela Direcção Geral Viação através do despacho n.° 001ID.G.V./ALC/98, de 6/8/98.

Pelo que, só em 05 de Agosto de 2008 caducou a validade do uso do aparelho Drager Alcotest 7110 MKIII (cfr. neste sentido o Acórdão deste Tribunal da Relação de Lisboa, de 31.10.2007, no Recurso n.° 7087/07-3.a Secção)

Deste modo, conclui –se que aquele aparelho, aliás como o dos presentes autos, tem um prazo de validade para uso nas acções de fiscalização de despistagem de álcool no sangue de condutores de veículos na via pública de 10 anos.
Sendo a questão a de saber se o prazo de validade da aprovação deste tipo de aparelho se conta a partir da publicação em DR do despacho de aprovação do IPQ, ou do despacho da DGV que aprovou a sua utilização, atendendo ao referido dispositivo legal – art.5°, n° 5 do DL n° 44/05, que atribui a competência à DGV para autorizar a sua utilização nas operações de fiscalização, esse prazo deve ser contado a partir do despacho desta entidade. Como o mesmo foi publicado em 06/08/98, os 10 anos perfizeram-se em 5/08/2008. Assim a validade do modelo aprovado pelo IPQ e cuja autorização pela DGV para o seu uso caducou a 5 de Agosto de 2008, independentemente do alcoolímetro em concreto ter menos de 10 anos ou do seu estado. Com efeito, o aparelho até pode ser novo ou estar em bom estado de conservação, mas se for daquele cujo prazo de validade da aprovação se encontra caducado pelo decurso do tempo, esse aparelho não apresentará um requisito formal à função a que se destina.

Tendo o teste de alcoolémia sido efectuado ao arguido (A) pelo mencionado aparelho, no dia 07.12.2006, não pode, face ao que expusemos, ser o mesmo considerado inválido, conforme cópia do talão constante de fls. 2, uma vez que o aparelho Drager Alcotest 7110 MKIII era à altura daqueles factos válido com a correspondente força probatória.

Nestes termos, revoga-se o despacho recorrido que deve ser substituído por outro que pronuncie o arguido pela prática de um crime de condução em estado de embriaguez, previsto no art. 292°, n° 1 do Código Penal, cometido no dia 07.12.06.

III.

Por tudo o exposto acordam os juízes deste Tribunal da Relação em conceder provimento ao recurso interposto pelo Ministério Público, revogando-se o despacho recorrido que deve ser substituído por outro que pronuncie o arguido pela prática de um crime de condução em estado de embriaguez, previsto no art. 292°, n° 1 do Código Penal, cometido no dia 07.12.06.

Sem tributação.

O presente Acórdão foi elaborado em processador de texto e revisto pela Relatora que rubricou Lisboa, 17 de Março de 2009


Presidente: Desembargador Pulido Garcia
Relatora: Desembargadora Margarida Blasco
Adjunta: Desembargadora Filomena Lima