Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
856/21.3T8ALB.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: JUDITE PIRES
Descritores: REGISTO PREDIAL
PRESUNÇÃO DO REGISTO DE PROPRIEDADE
USUCAPIÃO
POSSE
LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ
Nº do Documento: RP20240307856/21.3T8ALB.P1
Data do Acordão: 03/07/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Indicações Eventuais: 3. ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I - Como é de entendimento unânime na doutrina e na jurisprudência, o registo predial tem como finalidade essencial conferir publicidade à situação jurídica imobiliária, de modo a garantir a segurança nas operações de natureza predial.
II - A presunção que deriva do registo é ilidível.
III - A presunção que emerge do registo não abrange os limites, confrontações, a área e demais elementos próprios da identificação física do prédio
IV - A usucapião comporta uma forma originária de constituição de direitos reais, através do reconhecimento jurídico duma situação de facto, exigindo, para o seu preenchimento, dois requisitos ou pressupostos, cuja verificação cumulativa é necessária para que o instituto possa produzir efeitos.
V - A posse, enquanto facto aquisitivo, pressupõe a reunião de dois elementos: a) um elemento material – o corpus –, traduzido nos actos materiais praticados sobre a coisa, no exercício de poderes sobre a mesma; b) um elemento psicológico – o animus -, consubstanciado na intenção de se comportar como titular do direito real correspondente aos actos materiais praticados.
IV- - Litiga com má fé a parte que deduz pretensão cuja falta de fundamento não podia ignorar, alegando factos que sabia não serem verdadeiros.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo n.º 856/21.3T8ALB.P1
Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro
Juízo de Competência Genérica de Albergaria-a-Velha.

Acordam no Tribunal da Relação do Porto:

I. RELATÓRIO.

AA, BB, CC, DD, EE E FF instauraram acção declarativa de condenação com processo comum contra GG e esposa, HH, concluindo e peticionando que:

1) Deve declarar-se que os AA. são donos e legítimos proprietários e possuidores, com exclusão de outrem, do prédio urbano identificado no artigo 1.º da P.I., e desde a entrada pavimentada com cimento junto à estrada pública a poente do seu prédio, e que constitui o acesso ao seu prédio onde se situa a sua casa de habitação, melhor identificada nos registos fotográficos juntos como documentos 8, 9 e 26, e que serve de acesso à entrada desenhada e representada nas plantas juntas como documentos 24 e 25, para nascente, ao longo da extensão do prédio dos AA., por aquisição originária, decorrente da invocada usucapião, mas também por aquisição derivada e titulada;

2) Devem os RR. ser condenados a reconhecer que, para além dessa entrada com pavimento acimentado, de acesso aos seus prédios, nada mais possuem a sul e nascente desse piso acimentado, e que os limites do seu prédio a sul, na parte em que confronta com o eucaliptal dos RR., e que constitui a sua estrema sul, estão demarcados através desse portão, com o referido pavimento acimentado, na estrema poente desse prédio, e pelo muro identificado no artigo 21.º da P.I.;

3) Devem os RR. serem condenados a tapar o novo portão que construíram, com rasgo no muro supra identificado, e a absterem-se de entrar e sair pelo mesmo, por forma desocuparem o prédio dos AA.;

4) Devem os RR. serem condenados a aterrarem a caixa de águas pluviais que construíram no prédio dos AA., e a retirarem o cimento e o pavimento que construíram para instalar a caixa,  e que serve de acesso ao novo portão, repondo o solo na mesma situação que existia antes destas obras;

5) Devem os RR. serem condenados a abster-se da prática de qualquer ato, lesivo e ofensivo, que colida com o direito de propriedade e posse dos AA. sobre o prédio da sua propriedade, ou que impeçam, diminuam, ou restrinjam a utilização do prédio dos AA., por estes;

6) Devem os RR. serem condenados ao pagamento aos AA., após o trânsito em julgado da sentença que os condene a repor a situação existente até antes do início das obras descritas nos artigos 37.º a 41.º da P.I., isto é, até Setembro de 2020, por cada dia de incumprimento e até efectivo cumprimento, ou desocupação do prédio dos AA., duma indemnização de valor nunca inferior a € 50,00/dia, como sanção pecuniária acessória.

Para o efeito, alegam que são donos e legítimos possuidores, em comum, e sem determinação de parte, ou de direito, de um prédio rústico que lhes adveio por herança de EE, que o adquirira por escritura de compra e venda, e que se encontra registado. Mais invocam que o adquiriram por usucapião.

Já os réus são donos de um prédio rústico e urbano, que confrontam parcialmente com o seu prédio, argumentando que os prédios estão delimitados. Mais mencionam que os réus abriram um portão a dar para o seu terreno e uma caixa de saneamento no seu terreno, assim como ajardinaram um espaço, actos lesivos do seu direito de propriedade.

Os réus contestaram, confirmando o seu direito sobre os prédios rústico e urbano indicados na petição inicial, acrescentando que o terreno não tinha a configuração actual, pois estendia-se do lado sul, e que existiu uma permuta de parcelas de terreno entre EE e esposa, aqui autora, e os réus envolvendo a parcela aqui controvertida.

Desde esse momento, em 1988, os réus edificaram o canteiro no local indicado por EE, usando-o e plantando nesse espaço, sem oposição, de forma ininterrupta, pública.

O portão aberto em 2020 abre diretamente para o canteiro em causa e a caixa de saneamento já estava aberta no local desde a instalação do saneamento público.

Negam, em súmula, qualquer ofensa ao direito dos autores.

Invocam que os autores litigam de má-fé, porque conhecem o canteiro, nunca se opuseram ao mesmo e sabem que um terceiro reivindicou verbalmente a propriedade da parcela, mentiram, ao referir que foram os réus que destruíram o canteiro, bem sabendo que foram eles que o fizeram.

Os autores responderam, mantendo a posição narrada na petição inicial e impugnando a generalidade do alegado, concluindo que, quando os RR. deram entrada ao seu pedido de licenciamento para construção da sua casa de habitação, e do muro, em 1978, delimitaram o seu prédio pelos limites que existem actualmente, a sul do seu terreno, onde construíram o seu muro de vedação, que é o que existe atualmente, e sem o triângulo de terreno, assim representando a sua propriedade, com a mesma configuração que existe atualmente e seguindo o mesmo limite de um muro velho, existente a poente de ambas as propriedades e impugnando a existência de qualquer permuta. Acrescentou que o acesso ao prédio dos RR., e ao portão grande, que constituía a única entrada para a sua propriedade, no limite sul e poente da propriedade destes, na parte em que confronta com o eucaliptal dos AA., estava sinalizado através de pavimento acimentado, perfeitamente visível, à face desse portão, no limite poente do eucaliptal dos AA.. Em 2020, e depois de afetarem o uso do seu anexo a residência estudantil, os RR. decidiram abrir o portão pequeno, ao lado do portão grande, que, durante cerca de 40 anos, constituiu a única entrada de acesso ao seu prédio (dos RR).

Acrescentou que o “canteiro” em frente ao novo portão dos RR., foi construído por estes, com o único objetivo de tapar as obras de abertura do novo portão, e da construção da caixa de saneamento ou águas pluviais que estava a ser executada pelos RR..

Acrescentaram que os AA. não negam que, naquele seu espaço de eucaliptal, que é sobretudo ocupado com erva e relva, ao longo dos anos surgiram algumas flores, que, às vezes limpavam, e, outras vezes, não limpavam e deixavam estar, por embelezarem o local, e associaram sempre o nascimento dessas plantas e flores ao facto de, ao lado do prédio, existir este comércio de flores, e que nasciam naturalmente; e decorrente da infiltração de semente ou, até de arbustos ou raízes na terra, e daí começarem a nascer, como ainda acontece hoje, e nunca decorrente de construção ou ocupação dos RR.

Relativamente à matéria de má-fé, defendem que não estão a alegar factos falsos, nem a exercer qualquer direito contrário à lei, ou de má-fé, estando convictos que o direito lhes assiste.

Simultaneamente, invocam a litigância de má-fé dos réus, por dedução de factos cuja falta de fundamento não deviam ignorar, fazendo um uso manifestamente reprovável do processo, pelo que pretendem a sua condenação em multa e em indemnização não inferior a €2.500,00.

Foi proferido despacho de aperfeiçoamento em relação ao pedido efetuado em 1 e 2, por se entender que a redacção dos mesmos se mostrava dúbia.

Os autores, em resposta, vieram confirmar a existência de lapso na redação, reformulando os pedidos nos seguintes termos:

“1. Deve declarar-se que os AA. são donos e legítimos proprietários e possuidores, com exclusão de outrem, do prédio rústico identificado no artigo 1º da P.I. situado a sul e nascente dos prédios dos RR., identificados no artigo 14º da P.I., e desde a entrada pavimentada com cimento em frente ao portão da casa de habitação dos RR., junto à estrada pública, a poente dos prédios de AA. e RR., e que constitui o acesso à casa de habitação dos RR. até ao limite nascente dos prédios dos RR., ao longo da extensão dos seus prédios, no sentido poente/nascente, por aquisição originária, decorrente da invocada usucapião, mas também por aquisição derivada e titulada;

2. Devem os RR. ser condenados a reconhecer que, para além dessa entrada com pavimento acimentado, de acesso aos seus prédios, a sul/poente do prédio composto pela sua casa de habitação, nada mais possuem a sul e nascente desse piso acimentado, e que os limites do seu prédio identificado no artigo 14.1 da P.I., a sul, na parte em que confronta com o eucaliptal dos AA., e que constitui a estrema sul desse prédio, estão demarcados, através desse pavimento acimentado, em frente ao portão de acesso à sua casa de habitação, e pelo muro identificado no artigo 21º da petição inicial”.

Foi admitida a rectificação dos pedidos, proferiu-se despacho saneador, despacho a identificar o objecto do litígio, a enunciar os temas da prova e a pronunciar-se sobre a admissibilidade dos meios probatórios, admitindo-se os mesmos, inclusive os documentos juntos posteriormente aos articulados.

Os autores reclamaram da não inclusão da matéria referente à litigância de má-fé dos réus no objecto do litígio, pretendendo o aditamento do pedido de condenação dos RR. como litigantes de má-fé, numa indemnização de € .’500,00, com fundamento nas alíneas a) e d) do nº 2 do artigo 542º do C.P. Civil, reclamação essa que mereceu provimento.

Realizado o julgamento, foi proferida sentença com o seguinte dispositivo:

“Por tudo o exposto, DECIDIMOS JULGAR:

1) IMPROCEDENTE A AÇÃO e, consequentemente, ABSOLVEMOS os réus dos pedidos;

2) IMPROCEDENTE o pedido de condenação dos réus como litigantes de má-fé, efetuado pelos

autores;

3) PROCEDENTE o pedido de condenação dos autores como litigantes de má-fé e, consequentemente, condenamo-los solidariamente numa multa processual de 5 UC’s, relegando-se a indemnização a atribuir aos Réus para o momento posterior à pronúncia prevista no art. 543.º/3 do Código de Processo Civil.

Atento o determinado, notifique os réus, nos termos e para os efeitos do art. 543º nº 3 do Código de Processo Civil, para, no prazo de quinze dias, se pronunciarem sobre a indemnização a arbitrar em consequência da má-fé dos autores, devendo para esse efeito e sob pena de serem desatendidos, em idêntico prazo, juntar prova dos seus prejuízos, com a advertência de que, não o fazendo, poderá ser desatendida a sua pretensão indemnizatória quanto aos mesmos.

Advertem-se os autores de que dispõem de idêntico prazo para tomar posição quanto ao que vier alegado e for junto para fixação do quantum da indemnização peticionada.

Custas pelos autores – n.ºs 1 e 2 do art. 527.º do Código de Processo Civil”.

Inconformados com tal sentença, dela interpuseram Autores recurso de apelação para esta Relação, formulando com as suas alegações as seguintes conclusões:

1-A douta sentença recorrida é nula. Porquanto,

2-O tribunal “a quo” Julgou e decidiu em objeto diverso dos pedidos;

3-Os fundamentos da sentença estão em oposição com a decisão; e,

4-O tribunal “a quo” deixou de pronunciar-se sobre questões que devia apreciar, e conheceu de questões de que não podia tomar conhecimento.

5-Nulidade que se invoca para os devidos e legais efeitos, nos termos do disposto no artigo 615, nº1, alíneas c), d) e e) do C.P.C.

Com efeito,

6-O tribunal “a quo” errou no julgamento que fez relativamente ao objeto do litígio.

7-Definiu que o cerne do julgamento deste litígio, isto é, o seu objeto, seria a prova da propriedade, pelos AA., sobre um trato de terreno sem área, limites e configuração, localizado no seu eucaliptal, que os RR. alegadamente e reivindicaram, também, como sua propriedade, por lhes ter sido cedido em 1988, pelo pai e marido dos AA., na sequência de permuta verbal celebrada entre os réus e o pai dos autores, EE e sua esposa, AA, co-autora e mãe dos restantes AA., pois que só com a prova da extensão e limites do seu prédio, alegados nos exatos termos alegados e pedidos nos pedidos formulados, procederia o reconhecimento judicial da propriedade dos AA. e os restantes pedidos.

8-Esse trato de terreno integrava, segundo os AA., o eucaliptal em que se decompunha o seu prédio(eucaliptal e pomar), que se situava a sul da casa de habitação dos RR., fora, para sul, do muro que estes construíram entre 1978 e 1983, antes da aquisição do prédio dos AA. pelo EE e esposa, em 1988, e que agora era reivindicado pelos AA., em representação da herança ilíquida e indivisa aberta por óbito de EE, falecido em 1996.

9-Os RR., por sua vez, reivindicaram a sua propriedade sobre o dito trato de terreno, porque, numa das duas versões que apresentaram na sua contestação, o mesmo lhes tinha sido cedido, por permuta verbal, pelo EE e a esposa, após a aquisição do prédio destes, em 1988, tendo, logo após essa cedência, plantado nele um canteiro, que mantiveram até 2020, exercendo sobre esse trato de terreno todos os atos de posse, que era pública, pacífica e de boa-fé, na convicção de que eram proprietários sobre esse trato de terreno, que nunca mereceu a oposição de EE nem da esposa, aqui co-autora, nem dos AA., até 2020, e, por isso, tinham adquirido o direito de propriedade, sobre esse trato de terreno, por usucapião.

10- Os RR. nunca definiram nem alegaram, na sua contestação, a área, configuração ou limites do trato de terreno alegadamente cedido pelo EE e esposa, em 1988, nem a composição do canteiro que de imediato, segundo alegaram, começaram a plantar após a dita cedência.

Mas, e para além disso,

11-O tribunal “a quo” não deu como provada a área, a configuração e limites dessa parcela alegadamente cedida pelo EE e esposa aos RR., em 1988, nem do canteiro.

12-Sendo essa, de acordo com o tribunal recorrido, a “parcela controvertida”, deixou o tribunal de conhecer de questões de que devia tomar conhecimento, ou, ao julgá-la provada, sem qualquer identificação, conheceu de questões de que não podia tomar conhecimento, sendo assim, a sentença recorrida nula, nos termos do disposto no artº 615º, nº 1, al.c) do C.P.C..

Sucede ainda que,

13-Verificou-se uma errónea decisão sobre a matéria de facto, nos termos do artigo 639º, nº 1 e 640º, nº 1, alíneas a), b) e c) do C.P.C., porque resultam dos elementos carreados para os autos, meios probatórios em sede documental e testemunhal gravada, que impunham uma decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnada diversa da recorrida.

14-O digno Tribunal recorrido não considerou como matéria de facto provada, matéria essencial à boa decisão da causa, não tendo merecido sequer apreciação em sede de motivação da sentença.

15-Em cumprimento o artigo 640º, nº1, al. a) os recorrentes especificam os concretos pontos de facto que consideram incorretamente julgados:

15.1-Entende-se por incorreta a não inclusão da seguinte matéria de facto provada:

“… 40. Os RR. plantaram dois canteiros, fora do muro e do portão grande que construíram entre 1978 e 1983, a sul da sua casa de habitação, na mesma época.

41. O canteiro plantado no trato de terreno junto à estrada, a poente do portão grande da casa dos RR., mantém-se intacto.

42. O eucaliptal dos AA. está e sempre foi delimitado do prédio identificado no Ponto 10.1 dos Factos Provados, propriedade dos RR., no seu lado norte, e no sentido poentenascente, a partir da estrada pública, a poente, que serve de entrada para ambos os prédios, por portão em ferro e por muro, em reboco de cimento, pintado de branco, encimado por gradeamento, em rede, em toda a sua extensão, construídos pelos RR., há mais de 40 anos, numa extensão de cerca de 25 metros.

43. Os prédios dos AA. e RR. são contíguos, e confrontam, entre si, a norte e poente, atenta a localização e configuração do prédio dos AA., e a sul e nascente, atentos os prédios dos RR..

44. O Sr. EE e esposa, e mais tarde, os AA. consentiram na plantação pelos RR., em trato de terreno do seu eucaliptal de um canteiro, durante mais de 20 anos.

45. Os RR. outorgaram em 19/10/2021, no Cartório Notarial do Notário II, em Estarreja, escritura de justificação, na qualidade de justificantes, na qual declararam o seguinte:

- “que são donos e legítimos possuidores, com exclusão de outrem, do seguinte bem imóvel:

- Prédio urbano, sito em Quinta ..., ..., freguesia ..., concelho de Albergaria-a-Velha, composto por casa de habitação, com a superfície coberta de cento e vinte e dois, vírgula cinquenta metros quadrados, logradouro com a área de duzentos metros quadrados e jardim com a área de vinte e cinco metros quadrados, perfazendo, assim, a área total de trezentos e quarenta e sete vírgula cinquenta metros quadrados, a confrontar do norte com JJ, do sul com KK, do nascente com EE e do poente com LL, inscrito na matriz, em nome do justificante marido, sob o artigo número ...30, com o valor patrimonial de IMT de € 69.090,00, omisso na Conservatória do Registo Predial de Albergaria-a-Velha;

- que eles, justificantes, não possuem título formal que legitime o seu domínio sobre este prédio, o qual foi por eles edificado, exclusivamente a expensas suas, num terreno cujo artigo matricial desconhecem, devido à distância temporal e que veio à sua posse por compra verbal que fizeram a MM e a NN, ambas solteiras, maiores, que foram residentes na cidade de Aveiro, em data que não podem precisar, mas que se situa no ano de mil novecentos e oitenta e dois, sem que tenham procedido à titulação desta compra por escritura pública;

-que não obstante isso, eles justificantes, procederam, logo após a sua aquisição, à construção do imóvel atrás identificado, tendo, desde aí, usufruído o mencionado prédio e usando todas as utilidades por ele proporcionadas, desde a sua construção, designadamente, habitando-o, fazendo as necessárias obras de conservação e manutenção, pagando os respetivos impostos, com ânimo de quem exerce direito próprio, sendo reconhecidos como seus donos por toda a gente, fazendo-o de boa-fé por ignorarem lesar direito alheio, pacificamente, porque sem violência, contínua e publicamente, à vista e com conhecimento de toda a gente, sem oposição de ninguém, tudo isto há mais de 20 anos, ininterruptamente, até à presente data;

-que dadas as enunciadas características de tal posse, eles justificantes adquiriram o citado prédio por usucapião, título este que, por natureza, não é suscetível de ser comprovado por meios normais;

-que desconhecem os possuidores do prédio justificado anteriores àquelas MM e a NN, devido à distância temporal e que, apesar das buscas efetuadas no respetivo serviço de finanças, não lhes foi possível estabelecer qualquer proveniência do atual artigo do mesmo.”

46. Com a outorga dessa escritura de justificação os RR. tentaram demonstrar que efetivamente há mais de 20 anos, que usam o trato de terreno situado no eucaliptal dos AA. como sendo sua, porque não conseguiam autonomizar essa parcela de terreno relativa ao canteiro, cientes de que eram proprietários desse canteiro.

47. Foram alguns dos AA. que mandaram um maquinista colocar em frente ao portão pequeno, aberto pelos RR. em setembro de 2020, blocos de pedra pesados e de grandes dimensões.

48. Foi a Junta de Freguesia ... quem arrancou as plantas do canteiro, limpou o canteiro e retirou as pedras ornamentais que nele se encontravam, com exceção do cato (…)”.

16 - Em cumprimento do artigo 640º, nº 1, al. b) do C.P.C., os recorrentes especificam os concretos meios probatórios, constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto, impugnados diversa da recorrida.

16.1. Em sede documental resulta dos autos:

A) Certidão permanente da descrição predial do terreno onde os RR. Construíram a sua casa de habitação;

B) Foi junta aos autos a escritura de justificação de 19/10/2021, que os RR. Deram como integralmente reproduzida para os devidos e legais efeitos – artigo 6º da contestação.

Em sede testemunhal os depoimentos de parte dos RR. GG e HH – CD 20221017-4114325-2870473 e da mandatária dos RR., Dra. OO – CD20221109-4114325-2870473.

Em sede confessória, a confissão dos RR. nos termos do disposto no artigo 574º, nº 3 relativamente ao concluído em 15.1.42; e a confissão dos RR., nos termos do disposto no artigo 574º, nº 2, relativamente ao concluído em 15.1.43.

17 - Em cumprimento do artigo 640º, nº 1, al. c) do C.P.C., os recorrentes especificam que deve ser considerada provada toda a matéria de facto especificada no Ponto 15.1 destas conclusões e considerarem-se não provados os Pontos 28 a 35, 38 e 39 dos Factos Provados pelo Tribunal “a quo”.

18 - Verifica-se uma errónea decisão sobre a matéria de direito, nos termos do artigo 639º, nº 1 do C.P.C., porquanto foi provado o direito de propriedade dos AA., na qualidade de únicos e universais herdeiros da herança aberta por óbito de EE e esposa, por aquisição originária e derivada, e a violação desse direito por parte dos RR., nos termos do disposto no artigo 1305º do C. Civil.

Para além disso, verificando-se a não cedência aos RR., de qualquer trato de terreno do eucaliptal dos AA., nem por estes, nem pelo EE e esposa, e não estando provada a inversão do título da posse, os RR. eram meros detentores ou possuidores precários do trato de terreno onde plantaram o seu canteiro, encostado ao muro, a nascente do portão grande da sua casa de habitação que, como tal, não podem adquirir para si, por usucapião, o direito possuído, pelo que o Tribunal “a quo” ao julgar procedente o direito de propriedade dos RR. sobre esse trato de terreno onde os mesmos plantaram o canteiro, violou o disposto nos artigos 1253º, al. b) e 1290º do C. Civil.

Acresce, ainda que, ao não dar relevância à escritura de justificação junta aos autos que constitui documento autêntico, e faz prova plena dos factos nela atestados, que não foi ilidida, o Tribunal “a quo” violou o disposto nos artigos 371º e 372º, nº 1 do C. Civil.

E ao não julgar como provados os factos que os recorrentes consideram que deviam ser considerados como provados, porque resultam da confissão dos RR., designadamente os referidos em 15.1.41 e 15.1.42, o Tribunal “a quo” violou o disposto nos artigos 574º, nº 3 e 574º, nº 2, respetivamente, do C.P.C..

Assim,

19 - Da audiência de julgamento resultou provado, pelo depoimento da ré mulher, HH, que os RR. plantaram não só um canteiro, mas sim dois canteiros, fora do muro e do portão grande com que tinham vedado e demarcado a sua casa de habitação, a sul, entre 1978 e 1983, desde há mais de 30 anos, um no limite poente da sua casa de habitação, junto à estrada, encostado ao portão grande, que servia de acesso à sua casa de habitação e ao seu anexo, e outro, o único que foi objeto de julgado dos autos, e que foi plantado na alegada “parcela controvertida”, que integrava o eucaliptal dos AA., junto ao muro, a nascente do referido portão grande, e no lugar oposto ao da estrada.

20 -O tribunal “a quo” deu como provado que, na sequência da supra referida permuta verbal, o trato de terreno cedido pelo EE e a esposa aos RR., foi o trato de terreno situado a poente do portão grande que dá acesso à casa de habitação dos RR., junta à estrada, onde estes, de imediato começaram a plantar o canteiro- cfr. pontos 32 e 33 dos factos provados- e não o trato de terreno, onde os RR. plantaram o canteiro junto ao muro, que constituía a dita “parcela controvertida”, situado a nascente do dito portão grande construído pelos réus, no lado oposto à estrada.

21 - Os AA. não reivindicaram, nesta ação, o seu direito de propriedade sobre o trato de terreno situado a poente do portão grande da casa de habitação dos RR., junto à estrada, mas sim sobre o trato de terreno onde estes plantaram o canteiro, junto ao muro que construíram, a nascente do portão grande, situado no lado oposto à estrada.

22 - O tribunal “a quo”, depois de dar como provado, em 32) dos factos provados, que o trato de terreno cedido aos RR., pelo EE e esposa, em 1988, ficava junto à estrada, no limite poente do seu prédio, contraditoriamente, julgou improcedentes os pedidos deduzidos pelos AA., porque considerou, na sentença recorrida, que o trato de terreno cedido pelos EE e esposa, em 1988, onde os RR. iniciaram, de imediato, a plantação do canteiro, era o canteiro situado no lado oposto à estrada, junto ao seu muro, a nascente do portão grande, contrariando, assim, o que julgou como provado em 32) dos factos provados.

23 - O tribunal recorrido deu como provado que o trato de terreno cedido pelo EE e esposa foi o trato de terreno junto à estrada, e, contraditoriamente, fez todo o julgamento, fundamentou a sentença recorrida, e decidiu pela improcedência dos pedidos dos AA., julgando provada a usucapião do direito de propriedade do trato de terreno, invocada pelos réus, que não foi cedido aos RR. pelo EE e esposa, decorrente da já citada permuta verbal.

24 - Existiu, assim, com o devido respeito, uma contradição do Tribunal “a quo” no julgamento do objeto do litígio, porque reconheceu o direito de propriedade dos RR., por usucapião, sobre trato de terreno, que não foi o que deu como provado como cedido aos RR. pelo citado casal, há mais de 30 anos, decorrente da citada permuta.

25 - Os fundamentos de facto estão, assim, em oposição com a decisão, e o tribunal recorrido não conheceu de questões de que devia tomar conhecimento, e conheceu de questões de que não podia tomar conhecimento, decidindo em objeto diverso do pedido, sendo, por isso, a sentença recorrida nula-cfr. artº 615, nº1, alíneas c), d) e e) do C.P.C..

Sem conceder,

26 - A supra referida permuta verbal, celebrada em 1988, não poderia ter sido julgada como provada pelo tribunal “a quo”, porque a mesma nunca poderia ter ocorrido.

27 - Segundo o que alegaram os RR., na sua contestação, a mesmo ocorreu porque o seu prédio tinha uma configuração irregular, em formato triangular, e estendia-se para o eucaliptal dos AA.; e, para configurar uma delimitação mais linear a ambos os prédios, o EE e a esposa, teriam proposto aos RR., e estes teriam aceitado, a troca dessa parcela em formato triangular dos RR., por trato de terreno situado no limite do eucaliptal do citado casal, do seu eucaliptal, onde, de imediato, os RR. começaram a plantar o canteiro.

28 - Do depoimento de parte dos Réus GG e HH, resultou provado, e o tribunal “a quo” deveria ter dado como provado, que, entre 1978 e 1983, muito antes de 1988, data da aquisição do prédio pelo EE e esposa, os RR. já tinham vedado a sua casa de habitação com a construção do portão grande e do muro, demarcando a sua propriedade, a sul, do prédio que veio a ser adquirido pelo EE e esposa, em 1988, o que também foi reconhecido pelos RR., por confissão, nos termos do disposto no artigo 574º, nº 3 do C.P.C..

Por isso,

29 - E porque, em 1988, não existia mais nada a sul, que fosse propriedade dos RR., para além do portão grande e do muro, por si construídos para vedarem a sua propriedade, não existia, assim, fisicamente, a tal parcela irregular, e em formato triangular, alegada pelos RR, a ocupar o eucaliptal do EE e esposa, que determinasse a necessidade de estes realizarem a dita permuta.

30 - Não existia a parcela triangular para os réus permutarem, porque não havia terreno a sul, dos RR., para estes permutarem com o EE e a esposa, e, por isso, também não existia qualquer motivo ou razão para o EE e a esposa cederem, aos RR., qualquer trato de terreno do seu eucaliptal.

Assim,

31 - O tribunal recorrido não conheceu de questões de que devia tomar conhecimento, e conheceu de questões de que não podia tomar conhecimento, sendo também, por este motivo, a sentença recorrida nula, nos termos do disposto no artº 615º, nº 1, al. d) do C.P.C.

Ainda neste sentido, e sem conceder,

32 - O tribunal “a quo” deu como provados factos não alegados pelos RR., e que não poderiam, também, ter sido dados como provados, porque não foi feita prova em julgamento, para os dar como provados.

Com efeito,

33 - O tribunal “a quo” deu como provado que os RR., após a edificação da sua casa de habitação, ficaram convencidos que a mesma, no seu limite sul, se estendia para além do muro que construíram, juntamente com a casa, entre 1978 e 1983, e que construíram para vedar a sua casa e demarcá-la do prédio, a sul, que agora é dos AA.-  cfr. ponto 28 dos factos provados.

34 - E que englobava uma parcela de terreno, em formato triangular, que tinha como base o muro da casa dos RR. e cujos lados eram formados por duas linhas imaginárias, definidas nos pontos 30 e 31 dos factos dados como provados-cfr. pontos 29, 30 e 31 dos factos dados como provados.

Porém,

35 - Para além destes factos não terem sido alegados pelos RR., também não identificou, nem deu como provada a configuração do terreno onde os RR. construíram a sua casa de habitação, isto é, que o terreno se estendia para além dos limites do portão grande e do muro que construíram para o vedar.

Logo,

36 - O tribunal recorrido não poderia dar como provado que, após a construção da casa de habitação, e da vedação, que fizeram, os RR. ficaram convencidos de que a sua casa se estendia para sul, para além da vedação que fizeram, porque os mesmos não fizeram prova da configuração do seu terreno (irregular e em formato triangular),nem da extensão dos seus limites.

Isto é,

37 - O tribunal recorrido construiu um facto novo, o convencimento dos RR. de que a sua propriedade tinha limites, que fisicamente não existiam, e que assentavam em duas linhas imaginárias, baseadas no muro com que vedaram o seu prédio.

Mas,

38-Para além da falta de nexo, e da justificação do tribunal, importa também acrescentar que o tribunal não deu como provado que o EE e esposa conhecessem esse convencimento dos RR., de possuírem terreno no seu terreno.

Por isso,

39-Também por este motivo, e por desconhecerem esse convencimento dos RR., de que possuíam terreno que era terreno do seu eucaliptal, não havia motivo nem justificação para o EE e esposa permutarem com os RR..

40-Para além de que, não existindo qualquer parcela física dos RR., dentro do eucaliptal do EE e esposa, não iriam estes ceder um trato de terreno do seu eucaliptal em troca dum convencimento (que só estava na cabeça dos RR.) que desconheciam.

Pelo que,

41 - Também por estes motivos, a sentença recorrida é nula, invocando-se os mesmos fundamentos aludidos no ponto 31 destas conclusões.

Em consequência,

42 - Atentos os factos dados como provados pelo tribunal “a quo” nos pontos 1 a 9 dos factos provados, na sentença recorrida, e face ao atrás exposto, isto é, que nunca foi cedida aos RR., pelo EE e esposa, qualquer trato de terreno do seu eucaliptal, ou ainda, que tendo sido decidida, a mesma não foi a reivindicada nesta ação, considerando que o trato de terreno cedido, dado como provado pelo tribunal recorrido, não integrava os limites do prédio reivindicado, o tribunal deveria ter julgado provado o direito de propriedade dos AA. sobre o seu prédio, identificado no artº 1º da P.I.

Pois que,

43 -“Presumindo-se que a posse continua em nome de quem a começou (artº 1257º, nº2 do C.C.), e determinando o artº 1255º do mesmo diploma que, por morte do possuidor a posse continua nos seus sucessores, independentemente da apreensão material da coisa, deverá presumir-se que a posse exercida por um sucessor /herdeiro do inicial possuidor, após a morte deste, não é uma posse nova mas mera continuação da posse inicial que, como tal não é exercida em nome próprio, mas sim em nome da herança aberta por óbito do possuidor inicial, ainda que os demais sucessores não tenham praticado qualquer ato material sobre a coisa.

Nestes termos, a posse assim exercida pelo sucessor, sem que tenha sido demonstrado qualquer ato capaz de inverter o título da posse, não terá aptidão para facultar ao sucessor a aquisição do direito por usucapião, e apenas releva para efeitos do direito, por usucapião, a favor da herança aberta por óbito do anterior possuidor.”- cfr. Ac. da Relação de Coimbra de 14/10/2014 (Proc.3173/12.6TBVIS.C1, Relator: Catarina Gonçalves), in www.dgsi.pt.

Por isso, também nessa sequência,

44 - O canteiro plantado pelos RR. junto ao seu muro, a nascente do seu portão grande, de entrada para a sua casa de habitação, no lado oposto à estrada, de que se desconhece a área, composição, configuração e limites, não foi plantado em trato de terreno que tenha sido cedido aos RR. pelo EE e esposa, nem pelos AA., a seguir-se a tese de que teria havido permuta verbal entre o referido casal e os RR., em 1988, o que se não admite atento tudo o supra exposto, mas sim em espaço do eucaliptal do prédio dos AA., detido pelos réus por mera tolerância e mero consentimento do EE e esposa, e dos AA., insuscetível de posse, e insuscetível de aquisição por usucapião.

45 - Tal mera detenção, pelos RR., de uma pequena área do eucaliptal dos AA., foi alegada pelos RR. no artº 69º da sua contestação, nos seguintes termos: “Tanto mais que os AA. sempre souberam, porque sempre viveram e cresceram em frente à casa dos RR., sendo conhecedores, desde sempre, da existência consentida pelo Sr. EE deste canteiro.”

46 - O tribunal “a quo” decidiu, erradamente, como supra se referiu, que este canteiro teria sido plantado no trato de terreno cedido pelo EE e a esposa, na sequência da permuta verbal acima referida, em 1988, e, por isso, os réus teriam adquirido tal trato de terreno por usucapião, porque, na sentença recorrida, o juiz “a quo”, deu como provado que o trato de terreno cedido aos RR. foi junto à estrada, onde os RR. também plantaram um canteiro e não este no eucaliptal dos AA..

47 - Os RR. eram, assim, meros detentores ou possuidores precários desse espaço do eucaliptal onde plantaram o canteiro junto ao seu muro, no exterior deste, porque simplesmente se aproveitaram da tolerância do EE e da esposa e dos AA.-cfr. artº 1253º, al. b) do C.C..

48 - Os detentores ou possuidores precários não podem adquirir para si, por usucapião o direito possuído, exceto achando-se invertido o título de posse-artº 1290º do C.C..

Para além de que,

49 - Não resultou também dos autos, nem foi dada como provada, a inversão do título de posse pelos RR..

50 - O tribunal “a quo” deixou de pronunciar-se sobre questões que devia apreciar, e conheceu de questões de que não podia tomar conhecimento, sendo também, por este motivo, nula a sentença recorrida-artº615, nº 1, al. d) do C.P.C..

Acresce, ainda, que,

50-O tribunal “a quo” considerou que a realidade articulada na contestação dos RR. foi provada, o que se verificou não acontecer, face ao exposto supra.

Mas também,

52 - Os RR. alegaram, na sua contestação, duas realidades de facto diversas, contraditórias entre si, e o tribunal “a quo” não se pronunciou sobre o que os réus alegaram nos artºs 4 a 6 da sua contestação, pronunciando-se apenas sobre o que alegaram nos artºs 7 e seguintes do mesmo articulado.

53 - O tribunal recorrido deixou de se pronunciar sobre factos de que devia tomar conhecimento, e pronunciou-se sobre questões de que não podia tomar conhecimento.

Com efeito,

54 - Os factos de que o tribunal recorrido deixou de se pronunciar, e de que devia tomar conhecimento, foram alegados pelos RR. nos artºs 4 a 6 da sua contestação, e prendem--se com a sua alegação do modo como adquiriram o terreno, onde construíram as suas casas, identificadas nestes autos, e onde plantaram o canteiro junto ao muro, a “parcela controvertida”, considerada pelo mesmo tribunal, reivindicada pelos AA. e sobre o qual os RR. invocaram a aquisição, desse terreno, por usucapião, invocação essa formalizada em escritura de justificação, que outorgaram 3 meses antes da contestação que deduziram nestes autos, e antes da instauração desta ação.

55 - Tratando-se, por isso, de factos relevantes para a boa decisão do mérito desta causa.

56 - O tribunal “a quo” concluiu que tais factos, declarados pelos RR. na escritura de justificação, não mereceriam apreciação judicial, por que a escritura de justificação de 19/10/2021, tendo sido elaborada com base no que os interessados e as suas testemunhas, sem contraditório dos eventuais confinantes e afetados por tais declarações, declararam perante notário, tem pouca relevância!!!

56-E, por isso, limitou-se a apreciar todos os outros factos, alegados pelos RR. na contestação, contrários aos que foram por si alegados nos artºs 4º a 6º da sua contestação, e declarados na escritura de justificação.

Ora,

58 - Os restantes factos alegados pelos RR. na sua contestação, nos artºS 7 e seguintes do seu articulado, relatam um modo de aquisição do terreno, onde os mesmos construíram as suas casas, diferente do modo por si alegado nos artºs 4º a 6º do mesmo articulado.

Com efeito,

59 - Nos artºs 7 e seguintes da sua contestação, os RR. referiram a existência da citada permuta verbal, que existiu em 1988, entre o EE e a esposa e os réus, e as razões da sua ocorrência, para justificarem a aquisição do seu direito de propriedade sobre o trato de terreno onde plantaram o canteiro junto ao muro, trato esse que não foi o que o tribunal “a quo” considerou provado que fosse o trato de terreno que foi cedido pelo citado casal na dita permuta verbal; esse negócio foi omitido pelos RR. nos artºs 4 a 6 do mesmo articulado e na escritura de justificação, em que tentaram justificar a aquisição do direito de propriedade por usucapião sobre o mesmo trato de terreno (os 25 metros da área de jardim), invocando um outro negócio com terceiros.

60 - Com o devido respeito, a justificação dada, pelo tribunal recorrido, para a não apreciação dos factos alegados pelos RR. nos artºs 4 a 6 da sua contestação, e declarados na escritura de justificação para que remetem, é desprovida de fundamento e ilícita. Porquanto,

61 - A escritura de justificação é um documento autêntico, que faz prova plena dos factos que referem como praticados pela autoridade ou oficial público respetivo, assim como dos factos que neles são atestados com base nas perceções da entidade documentadora - cfr. artº 371º do C.C..

62 -E só pode ser ilidida com base na sua falsidade, o que não aconteceu.

63-Todos os factos alegados pelos RR. nos artºs 7 a 24, e seguintes, da sua contestação, porque contraditórios com aqueles factos que constam da escritura de justificação, que fazem prova plena, não poderiam ser dados como provados pelo tribunal recorrido, designadamente os factos dados como provados nos pontos 28 a 35 dos factos provados. Isto é,

64 - Não poderia ter sido dado como provado o convencimento, pelos RR., de que, após a construção da sua casa de habitação, possuíam ou eram proprietários de uma parcela de terreno, em formato triangular, que se estendia para sul, para o eucaliptal reivindicado pelos autores, porque o “jardim” (que corresponde ao canteiro controvertido nestes autos), referido nessa escritura, foi plantado no terreno adquirido por compra verbal, segundo os RR., a MM e a NN, antes da construção do portão grande, e do muro, pelos RR.; nem poderia ter sido dado como provado que tivesse havido permuta verbal, e cedência de parcelas, entre os RR. e o EE e a esposa.

65-Nessa sequência, também por este motivo, não poderia ter sido dado como provada a aquisição do direito de propriedade, pelos RR., por usucapião, sobre o trato de terreno onde plantaram o seu canteiro, junto ao muro da sua casa de habitação.

Por isso,

66 -A sentença recorrida é nula, nos termos do disposto no artº 615º, nº 1, al. d) do C.P.C. Assim,

67 -No seguimento das conclusões supra, ao invés do que concluiu o tribunal “a quo”, ficou provada a violação do direito de propriedade dos AA., pelos RR., sobre o prédio identificado no artº 1º da P.I., que reivindicaram na qualidade de únicos e universais herdeiros, que invocaram, da herança ilíquida e indivisa aberta por óbito de EE.

Pois que,

68 -O portão pequeno, aberto pelos RR., em 2020, foi aberto para o eucaliptal dos autores;

69 -A pavimentação em cimento, que os RR. construíram em frente ao portão pequeno, que serve de acesso ao mesmo, foi executada no eucaliptal dos AA., onde também instalaram uma caixa de águas pluviais.

70 -Tais obras, executadas pelos RR. não foram viradas para o trato de terreno alegadamente cedido pelo EE e esposa, nem foram executadas no trato de terreno, alegadamente cedido pelo EE e esposa.

Pelo que,

71 -O tribunal “a quo” deveria ter julgados procedentes, por provados, os pedidos formulados sob os nºs 3, 4, 5, 6 e 7, pelos AA., na sua P.I..

Acresce ainda que,

72 -Ao contrário do que concluiu o tribunal recorrido e resultou provado, sem dúvida, do depoimento da R. HH, não foram os AA. que destruíram o canteiro plantado pelos RR. junto ao seu muro, no eucaliptal dos AA., consentido por estes, mas sim a Junta de Freguesia .... E,

73 -Os AA/recorrentes não litigaram de má-fé, ao contrário do que concluiu o tribunal recorrido. Pois que,

74 -Deduziram uma pretensão com fundamento, não alteraram a verdade dos factos, nem omitiram factos relevantes para a decisão da causa, não praticaram omissão grave do dever de cooperação, nem fizeram do processo, ou dos meios processuais um uso manifestamente reprovável, com o fim de conseguir um objetivo ilegal, impedir a descoberta da verdade, entorpecer a ação da justiça ou protelar, sem fundamento sério, o trânsito em julgado da decisão.

Para além disso,

75 -Os AA./recorrentes forneceram ao tribunal recorrido todos os elementos e documentos necessários para uma boa decisão de mérito nestes autos, ao abrigo e em respeito pelo princípio da cooperação (artº7º do C.P.C), do dever de boa-fé processual (artº8º do C.P.C) e do dever de recíproca correção (artº 9º do C.P.C), fornecendo, inclusive, ao tribunal documentos que os RR., apesar de protestarem a sua junção, não o fizeram (p.ex., entre outros, a escritura de justificação que outorgaram).

Pelo contrário, e ao invés do que concluiu o tribunal “a quo”,

76-Os RR. deduziram, na mesma contestação, duas oposições, contraditórias entre si.

77 -Alteraram a verdade dos factos, porque uma das oposições que alegaram é totalmente contraditória com a outra.

78 -Omitiram factos relevantes para a decisão da causa, pois que não juntaram documentos comprovativos da identificação do terreno onde construíram os seus prédios; não identificaram, com área, configuração e limites o trato de terreno que, alegadamente, lhes tinha sido pelo EE e esposa, nem identificaram a área, configuração e limites da parcela triangular que, alegadamente cederam ao EE e esposa, decorrentes da alegada permuta verbal que celebraram; rasuraram cópia de registo fotográfico; não alegaram que os RR. construíram o portão grande e o muro para vedarem a sua casa de habitação, nem a data em que o fizeram; nem alegaram que os RR. plantavam dois canteiros na parte exterior da vedação do seu prédio, um em trato de terreno, junto à estrada, e outro, junto ao muro, no lado oposto à estrada, limitando-se a referir a existência de um só canteiro; nem alegaram que o trato de terreno que lhes foi alegadamente cedido pelo EE e esposa, foi onde plantaram o canteiro que existe junto à estrada.

79 -Praticaram omissão grave do dever de cooperação, pois que protestaram juntar aos autos documentos, que nunca vieram a juntar.

80 -Fizeram do processo ou dos meios processuais um uso manifestamente reprovável, com o fim de conseguir um objetivo ilegal, pois que deduziram uma oposição totalmente contrária ao que tinham declarado, 3 meses antes, em escritura de justificação que outorgaram, invocando o direito de propriedade, por usucapião, alicerçada em justificações diferentes, no exercício de uma posse falsa, contraditória, originada em modos de aquisição totalmente distintos.

81 -Com o fim de, para além de conseguir um objetivo ilegal, impedir a descoberta da verdade e entorpecer a ação da justiça.

Pelo que,

82 - São os RR. que litigam de má-fé, devendo, por isso, serem condenados como litigantes de má-fé, em multa e em condigna indemnização a arbitrar em favor dos AA./recorrentes.

83-Devendo ser os AA./recorrentes, absolvidos da condenação como litigantes de má-fé, com as legais consequências.

Termos em que, julgando V. Exas procedentes, por provadas, as razões de recurso invocadas pelos recorrentes, nestas alegações e conclusões de recurso, e, em consequência, julgando nula a sentença recorrida, e revogando-a, condenando os recorridos nos nove pedidos identificados no item I) destas alegações, farão inteira JUSTIÇA!”.

 Os apelados apresentaram contra-alegações, pugnando pela improcedência do recurso e confirmação do decidido.

Colhidos os vistos, cumpre apreciar.

II. OBJECTO DO RECURSO.

A. Sendo o objecto do recurso definido pelas conclusões das alegações, impõe-se conhecer das questões colocadas pelos recorrentes e as que forem de conhecimento oficioso, sem prejuízo daquelas cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras, importando destacar, todavia, que o tribunal não está obrigado a apreciar todos os argumentos apresentados pelas partes para sustentar os seus pontos de vista, sendo o julgador livre na interpretação e aplicação do direito.

B. Considerando, deste modo, a delimitação que decorre das conclusões formuladas pelos recorrentes, no caso dos autos cumprirá apreciar:

- se a sentença é nula;

- se ocorreu erro na apreciação da matéria de facto;

- se alguma das partes litigou de má fé.

III- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO.

III.1. Foram os seguintes os factos julgados provados em primeira instância:

1) Encontra-se inscrita no registo, com fundamento na dissolução de comunhão conjugal e sucessão hereditária, tendo como sujeito passivo, EE, a aquisição, pelos autores, em comum e sem determinação de parte ou de direito, do direito de propriedade sobre o seguinte prédio:

“Rústico, composto de eucaliptal e pomar, com a área de 3.900 m2, sito no lugar ..., freguesia ..., concelho de Albergaria-a-Velha, a confrontar do norte com GG, PP e QQ, do sul com RR e SS, do nascente com TT e SS e do poente com estrada e RR, inscrito na matriz predial rústica da freguesia ... sob o artigo ...46 e descrito na Conservatória do Registo Predial de Albergaria-a-Velha sob o nº ...21.

2) Os AA. são os únicos e universais herdeiros de EE, falecido em ../../2015.

3) EE adquiriu tal prédio a PP e esposa, UU, através de escritura pública de compra e venda outorgada no Cartório Notarial de Albergaria-a-Velha, no dia 6/01/1988, mediante a qual os vendedores PP e esposa UU declararam vender ao falecido EE, o prédio identificado em 1).

4) O prédio referido em 1) é composto por eucaliptal e um pomar.

5) Por si e seus antepossuidores os autores ocuparam o eucaliptal, construindo nele um edifício para guarda de alfaias e arrumos e vedando-o, e ocuparam o pomar, vedando-o, limpando-o, conservando-o, semeando-o e nele colhendo frutos, plantando árvores de fruto e aí explorando e colhendo frutos de sementeiras agrícolas, e outras novidades.

6) Fazendo-o EE e seus antecessores, de forma continuada e ininterruptamente, com a convicção de serem beneficiários do direito de propriedade,

7) E, após a morte de EE, fazendo-o os autores, na qualidade de seus herdeiros.

8) Desconhecendo quaisquer vícios dos seus títulos e ignorando a lesão ou ofensa do direito de outrem, sem oposição, reparo ou disputa de quem quer que seja, à vista de toda a gente, com conhecimento dos proprietários vizinhos e dos RR..

9) De forma ininterrupta, há mais de vinte e trinta anos.

10) Os RR., por sua vez, são donos e legítimos proprietários dos seguintes prédios urbanos:

1. Casa de habitação de cave com uma garagem, dois arrumos, e de rés-do-chão com uma sala, três quartos, duas casas de banho, dois corredores e uma cozinha, sita na Rua ..., lugar de ..., freguesia ..., concelho de Albergaria-a-Velha, inscrito na respetiva matriz predial sob o artigo nº ...30.

2. Casa para arrumos de rés-do-chão amplo e sótão, sita na Rua ..., lugar de ..., freguesia ..., concelho de Albergaria-a-Velha, inscrita na respetiva matriz predial sob o artigo nº ...58.

11) Os prédios dos RR. são compostos por duas construções, uma que é a casa de habitação, onde habitam, e outra que é uma casa anexa, destinada a arrumos, sendo que a casa de arrumos, construída em prédio autónomo, localiza-se no prolongamento a nascente da casa dos RR., com acesso e entrada pelo portão de entrada da casa de habitação dos RR..

12) As casas dos RR., identificadas em 9), foram construídas em momentos distintos e em dois prédios rústicos distintos.

13) O prédio identificado em 10) 1. começou a ser construído em 1978, na sequência de pedido de licenciamento que apresentaram na Câmara Municipal de Albergaria-a-Velha, que teve o processo de obras nº ...8.

14) E a construção anexa, destinada a entreposto de flores e acessórios do ramo, que corresponde ao prédio referido em 10) 2., foi edificada na sequência do pedido de licenciamento, objeto do processo de obras nº ...5, apresentado pelos RR. na Câmara Municipal de Albergaria-a-Velha.

15) Nos referidos processos de obras, os autores representaram um muro e um portão, na parte sul do seu prédio.

16) Naqueles processos de obras, os RR. indicaram que a entrada nos seus prédios seria feita através do portão que se iniciava na parte sul/poente do seu prédio.

17) No processo de obras nº ...5, os RR. pediram o licenciamento para construção, noutro prédio rústico que possuíam a nascente do prédio onde edificaram a sua casa de habitação, de um anexo destinado a entreposto de flores e acessórios do ramo, sendo que não desenharam, nem licenciaram qualquer acesso ou entrada autónoma para este anexo, para além da entrada licenciada no processo nº 186/78, que foi a única que representaram no projeto de construção do anexo.

18) A entrada para o prédio dos AA. e para o prédio dos RR. inicia-se em estrada pública, a poente de ambos os prédios, a denominada estrada de ..., que liga os lugares de ... a ..., na freguesia ..., cuja construção foi concluída, com alcatroamento, há cerca de 25 anos, depois de várias etapas na construção, e depois das sucessivas cedências de parcelas de terreno dos proprietários dos prédios rústicos, que com ela confrontam, para a sua construção, e que nesta parte, em que confronta a poente com o prédio dos AA., o dividiu, pois que este continua a sul e poente para além da estrada.

19) O eucaliptal aludido em 1) e 4) confronta a norte com o prédio dos RR. identificado no artigo em 10) 1, isto é, com a sua casa de habitação.

20) E o pomar aludido em 1) e 4) confronta também a norte e a poente com o prédio dos RR. identificado em 10) .2, isto é, com a construção anexa destinada a arrumos.

21) O eucaliptal confronta também a poente com uma parcela de terreno propriedade de terceiro, RR, tendo aí, pelo menos em parte dessa confrontação, uma vedação em rede com esteios a demarcá-los.

22) O pomar encontra-se vedado, na sua confrontação poente, por um portão e um muro que se estende de norte para sul.

23) Em Setembro de 2020, os RR. procederam à abertura, no seu muro, identificado em 15) e 16) de um portão, em ferro para acesso a pé.

24) E destruíram, para além do muro, a vedação em rede que o encimava.

25) E acimentaram uma parte de terreno situada em frente a esse portão.

26) A partir de Outubro de 2020, os RR. passaram a entrar e a sair, a pé, também por esse portão.

27) O portão construído pelos RR. foi construído e aberto sem o conhecimento, consentimento ou autorização dos AA..

28) Após a edificação da sua casa de habitação, os réus ficaram convencidos que o seu prédio referido em 10) 1. , no seu limite sul, se estendia para além do muro aludido em 15) que construíram,

29) Englobando uma parcela de terreno com forma triangular, que tinha como base o muro de casa dos réus e cujos lados eram formados por duas linhas imaginárias, situadas para sul da base do muro,

30) Uma que se iniciava, no seu lado nascente, junto à interseção entre a parede do pomar referido em 1) e 4) e o limite nascente do muro da casa dos réus supra referido, e que se prolongava, obliquamente, para sul e em direção a poente, até atingir o vértice do referido triângulo, que se encontrava a cerca de dois metros, contados em linha reta, e aproximadamente do meio do muro de casa dos réus,

31) Outra, que, a partir desse vértice, se prolongava obliquamente, em direção ao limite poente do portão da casa dos réus e ao topo sul/nascente do muro do prédio vizinho.

32) No ano de 1988, após EE e AA terem comprado o prédio referido em 1), os réus acordaram com estes que lhes cediam parte da parcela de terreno com forma triangular que diziam ser sua, em particular a aludida em 30) e parte da referida em 31),

33) E que, em troca, os referidos EE e AA cediam aos réus uma parcela de terreno, situada junto à estrada e ao portão de casa dos réus referido em 15).

34) Parcela esta que os réus, desde então, delimitaram e onde criaram um canteiro, nele plantando flores e plantas e cuidando destas, regando-as e adubando-as, limpando-o das ervas daninhas e adornando-o,

35) Tendo-o feito até, pelo menos, Setembro de 2020, sem oposição de quem quer que seja, nomeadamente dos AA., sem interrupção e de forma pública, com conhecimento dos réus.

36) O portão aberto em Setembro de 2020 situa-se ao lado do portão aludido em 15), efetivamente construído pelos réus, e em frente ao espaço referido em 33) e 34),

37) De modo que, quem quisesse ter acesso ao portão aberto em Setembro de 2020, para entrar ou sair de casa dos réus, passava pelo espaço referido em 33) e 34).

38) Foram alguns dos autores, e não os réus, quem arrancou as plantas do canteiro, com exceção do cacto, e retiraram pedras ornamentais que nele se encontravam.

39) Com a ajuda de uma máquina colocaram nesse canteiro vários blocos de pedra pesados e de grandes dimensões em frente ao portão aberto em Setembro de 2020.

III.2. A mesma instância considerou não provados os seguintes factos:

a) Os autores praticassem os actos referidos em 4), em nome próprio e na convicção de serem proprietários do imóvel.

b) O eucaliptal confronta a poente, com estrada pública, e a sul com uma parcela de terreno, em formato triangular, propriedade de terceiro, RR, sendo delimitado deste por vedação em rede com esteios, por um poste de eletricidade e uma pedra, e prosseguindo, para sul, depois da estrada pública.

c) Os réus em Setembro de 2020 abriram uma caixa para onde drenam e encaminham as águas pluviais que caem e recolhem nos seus prédios.

d) E ajardinaram, nessa data, essa parte, no exterior do seu prédio, em frente ao novo portão, que construíram, e ao lado da caixa que abriram, com várias plantas e ornamentos.

e) Os réus limparam as árvores, plantas e vegetação que tinham plantado, sob pressão dos autores e na sequência de denúncia que estes fizeram.

f) O “canteiro” alegado e fotografado pelos RR., de 2020, foi criado e construído, pontualmente, pelos RR., com a dimensão que se vê, e com os cactos, árvores, plantas, pedrinhas e ornamentos, constantes dos registos, com o único intuito de esconder a abertura do novo portão, e da caixa de saneamento, ou águas pluviais, que estavam a ser construídos no prédio dos AA..

g) Foi, aliás, a colocação deste “canteiro” pelos RR. e a sua exuberância, em 2020, que levou os AA. a reagir à sua construção, e verificaram, nessa altura, as obras que estavam a ser levadas a cabo pelos RR.

IV. FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO.


1. Da nulidade da sentença.

Imputam os recorrentes à sentença que impugnam vício de nulidade que reconduzem à previsão das alíneas c), d) e e) do n.º 1 do artigo 615.º do Código de Processo Civil.

Alegam, para tanto, que:

- O tribunal “a quo” julgou e decidiu em objeto diverso dos pedidos;

-Os fundamentos da sentença estão em oposição com a decisão; e,

-O tribunal “a quo” deixou de pronunciar-se sobre questões que devia apreciar, e conheceu de questões de que não podia tomar conhecimento.

Dispõe o n.º 1 do artigo 615.º do aludido diploma:

“ É nula a sentença quando:

a) Não contenha a assinatura do juiz;

b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;

 c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível;    

d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento;

e) O juiz condene em quantidade superior ou em objecto diverso do pedido.

A nulidade da sentença - ou de despacho - constitui vício intrínseco da decisão, desde que ocorra alguma das circunstâncias taxativamente previstas no artigo 615.º, n.º 1 do Código de Processo Civil, que, pela sua gravidade, comprometem a sentença ou o despacho qua tale.

Como o n.º 1 do artigo 668.º do anterior diploma, também o n.º 1 do artigo 615.º do actual Código de Processo Civil contém uma enumeração taxativa das causas de nulidade da sentença[1], nelas não se inserindo o designado erro de julgamento, que apenas pode ser atacado por via de recurso, quando o mesmo for legalmente admissível[2].
No primeiro segmento da alínea c) do n.º 1 do artigo 615.º enquadra-se o vício da sentença em que ocorra oposição entre os seus fundamentos e a decisão. A nulidade resultará dos próprios termos da sentença e está relacionada, por um lado, com a obrigação imposta pelos artigos 154.° e 607.°, n.ºs 3 e 4 do Código de Processo Civil, de fundamentar as decisões e, por outro, pelo facto de a sentença dever constituir um silogismo lógico-jurídico, em que a decisão deverá ser a consequência ou conclusão lógica da norma legal (premissa maior) com os factos (premissa menor). Esta oposição é a que se verifica no processo lógico, que das premissas de facto e de direito que o julgador tem por apuradas, este extrai a decisão a proferir[3].
Não se cuida, no vício contemplado na referida alínea, de indagar se existe contradição/oposição entre a decisão que julga a matéria de facto e os fundamentos que a motivaram, como sucede na hipótese delineada pelo anterior artigo 653.º da lei adjectiva, mas antes de averiguar se essa oposição ocorre entre a decisão que aprecia a matéria controvertida e os fundamentos quer de facto, quer de direito que contribuíram para essa mesma decisão.
 Numa perspectiva silogística da sentença, a decisão nela contida deve estar numa relação lógica e coerente com as respectivas premissas, que a haverão de anteceder, sendo aquela o resultado natural decorrente das mesmas.
Isto é, “a decisão tem como antecedentes lógicos os fundamentos de direito (premissa maior) e os fundamentos de facto (premissa menor), não podendo o sentido da decisão achar-se em contradição ou oposição com os fundamentos, o que sucede sempre que na construção da sentença os fundamentos expressos pelo juiz, necessariamente, haveriam de conduzir a uma solução de sentido antagónico: a proposição final (conclusão) revela-se incompatível com as proposições logicamente antecedentes (fundamentos), o que traduz um vício de raciocínio. A nulidade de oposição entre os fundamentos e a decisão não se confunde com o chamado erro de julgamento, a injustiça da decisão, a não conformidade dela com o direito substantivo aplicável, ou com a inidoneidade dos fundamentos para conduzir à decisão[4].
Configura-se a nulidade tipificada no citado preceito quando “o juiz escreveu o que queria escrever; o que sucede é que a construção da sentença é viciosa, pois os fundamentos invocados pelo juiz conduziriam logicamente, não ao resultado expresso na decisão, mas a resultado oposto”[5].
Ou seja: “…se os fundamentos invocados conduzem logicamente, não ao resultado expresso da decisão, mas a resultado oposto ou pelo menos diferente, em última análise a decisão carece de fundamento[6].
Precisa, também a propósito do vício em análise, Lebre de Freitas[7]: “Entre os fundamentos e a decisão não pode haver contradição lógica; se, na fundamentação da sentença, o julgador segue determinada linha de raciocínio, apontando para determinada conclusão, e, em vez de a tirar, decide noutro sentido, oposto ou divergente, a oposição é causa de nulidade da sentença. Esta oposição não se confunde com o erro na subsunção dos factos à norma jurídica ou, muito menos com o erro na interpretação desta: quando, embora mal, o juiz entende que dos factos apurados resulta determinada consequência jurídica e este seu entendimento é expresso na fundamentação, ou dela decorre, encontramo-nos perante o erro de julgamento e não perante oposição geradora de nulidade; mas já quando o raciocínio expresso na fundamentação apontar para determinada consequência jurídica e na conclusão for tirada outra consequência, ainda que esta seja a juridicamente correcta, a nulidade verifica-se”.
Quanto à “ambiguidade ou obscuridade que torne a sentença ininteligível”, vício a que se refere o segundo segmento do mencionado normativo, ele ocorre “quando não seja percetível qualquer sentido da parte decisória (obscuridade) ou ela encerre um duplo sentido (ambiguidade), sendo ininteligível para um declaratário normal[8].
Segundo o Prof. Alberto dos Reis[9], a “(…) sentença é obscura quando contém algum passo cujo sentido seja ininteligível; é ambígua quando alguma passagem se preste a interpretações diferentes”, explicitando que “(…) num caso não se sabe o que o juiz quis dizer; no outro hesita-se entre dois sentidos diferentes e porventura opostos”, adiantando ainda ser “(…) evidente que em última análise, a ambiguidade é uma forma especial de obscuridade” por “(…) se a determinado passo da sentença é susceptível de duas interpretações diversas, não se sabe ao certo, qual o pensamento do juiz”.
Sinteticamente, poderá afirmar-se que ocorre obscuridade quando não seja perceptível o pensamento do julgador traduzido na parte decisória, verificando-se ambiguidade quando ela comportar mais do que uma interpretação.
Segundo o acórdão do S.T.J. de 11.4.2002,[10]só existe obscuridade quando o tribunal proferiu decisão cujo sentido exacto não pode alcançar-se. A ambiguidade só releva se vier a redundar em obscuridade, ou seja, se for tal que não seja possível alcançar o sentido a atribuir ao passo da decisão que se diz ambíguo [...].
Mas deve ter-se em conta que o haver-se decidido bem ou mal, de forma correcta ou incorrecta, em sentido contrário ao preconizado pela requerente, é coisa totalmente diversa da existência de obscuridade ou ambiguidade do acórdão [...]”.Em todo o caso, a ambiguidade e a obscuridade só invalidam a sentença se e na medida em que qualquer uma daquelas patologias a tornem ininteligível.
O artigo 615.º, n.º 1, alínea d) do Código de Processo Civil correlaciona-se com o estatuído no n.º 2 do artigo 608.º do mesmo diploma legal, onde se determina que “o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras; não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras”. O vício tipificado na primeira parte da alínea d) do n.º 1 do artigo 615.º ocorre quando haja falta de apreciação de questão que o tribunal devesse conhecer, cuja resolução não tenha ficado prejudicada por solução dada a outras.
Exige-se, com efeito, uma correspondência entre a pronúncia e a pretensão deduzida.
Como esclarecia Anselmo de Castro, ainda no âmbito da aplicação da pretérita lei adjectiva[11], «o vício relaciona-se com o dispositivo do art.° 660.°, n.° 2.° e por ele se tem de integrar. A primeira modalidade tem a limitação aí constante quanto às decisões que devam considerar-se prejudicadas pela solução dada a outras; a segunda reporta-se àquelas questões de que o tribunal não pode conhecer oficiosamente e que não tenham sido suscitadas pelas partes, como nesse preceito se dispõe.
A palavra questões deve ser tomada aqui em sentido amplo: envolverá tudo quanto diga respeito à concludência ou inconcludência das excepções e da causa de pedir (melhor, à fundabilidade ou infundabilidade dumas e doutras) e às controvérsias que as partes sobre elas suscitem. Esta causa de nulidade completa e integra, assim, de certo modo, a da nulidade por falta de fundamentação. Não basta à regularidade da sentença a fundamentação própria que contiver; importa que trate e aprecie a “fundamentação jurídica dada pelas partes. Quer-se que o contraditório propiciado às partes sobre os aspectos jurídicos da causa não deixe de encontrar a devida expressão e resposta na decisão”.
E Alberto dos Reis[12] já alertava que não se pode confundir questões suscitadas pelas partes com motivos ou argumentos por elas invocados para fazerem valer as suas pretensões: "São, na verdade, coisas diferentes: deixar de conhecer de questão de que devia conhecer-se, e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzida pela parte. Quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão."
Devendo o juiz conhecer de todas as questões que lhe são submetidas pelas partes, apenas deve conhecer destas e das que oficiosamente lhe caiba conhecer[13].
Também “a sentença não pode condenar em quantidade superior ou em objecto diverso do que se pedir” – artigo 609º, n.º 1 do Código de Processo Civil. O desrespeito por tal limite inquina a sentença de nulidade, conforme previsto na alínea e) do n.º 1 do artigo 615.º.

No caso em debate nos autos nenhum desses limites se mostra ultrapassado.

A sentença não conheceu de pedidos que não tenham sido deduzidos, não apreciou causas de pedir que não hajam sido invocadas, nem excepções não invocadas na exclusiva disponibilidade das partes. Conheceu todas as questões submetidas pelas partes à apreciação do tribunal a quo. E não mais que estas.

Conheceu de todas as pretensões formuladas quer pelos Autores – julgando improcedente a acção, delas absolvendo os Réus -, quer pelos Réus, quanto ao pedido de condenação dos Autores como litigantes de má fé, condenando estes, a esse título, em multa e indemnização cuja quantificação foi diferida para momento posterior, após garantido o necessário contraditório.
Existe, por outro lado, correspondência lógica entre a decisão contida na sentença impugnada e as premissas em que a mesma se apoia e lhe servem de fundamento.
Claramente, não padece a sentença recorrida de nenhum dos vícios apontados pelos recorrentes, que se limitam a esgrimir argumentos expressando a sua inconformidade com a sentença de que recorrem.
Por conseguinte, improcede, nesta parte, o recurso.

2. Reapreciação da matéria de facto.

Dispõe hoje o n.º 1 do artigo 662.º do Código de Processo Civil que “a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa”, estabelecendo o seu nº 2:

A Relação deve ainda, mesmo oficiosamente:

a) Ordenar a renovação da produção da prova quando houver dúvidas sérias sobre a credibilidade do depoente ou sobre o sentido do seu depoimento;

b) Ordenar, em caso de dúvida fundada sobre a prova realizada, a produção de novos meios de prova;

c) Anular a decisão proferida na 1.ª instância, quando, não constando do processo todos os elementos que, nos termos do número anterior, permitam a alteração da decisão proferida sobre a matéria de facto, repute deficiente, obscura ou contraditória a decisão sobre pontos determinados da matéria de facto, ou quando considere indispensável a ampliação desta”.

Como refere A. Abrantes Geraldes[14], “a Relação deve alterar a decisão da matéria de facto sempre que, no seu juízo autónomo, os elementos de prova que se mostrem acessíveis determinem uma solução diversa, designadamente em resultado da reponderação dos documentos, depoimentos e relatórios periciais, complementados ou não pelas regras de experiência”… “afastando definitivamente o argumento de que a modificação da decisão da matéria de facto deveria ser reservada para casos de erro manifesto” ou de que “não é permitido à Relação contrariar o juízo formulado pela 1ª instância relativamente a meios de prova que foram objecto de livre apreciação”, acrescentando que este tribunal “deve assumir-se como verdadeiro tribunal de instância e, por isso, desde que, dentro dos seus poderes de livre apreciação dos meios de prova, encontre motivo para tal, deve introduzir as modificações que se justificarem”.

Importa notar que a sindicância cometida à Relação quanto ao julgamento da matéria de facto efectuado na primeira instância não poderá pôr em causa regras basilares do ordenamento jurídico português, como o princípio da livre apreciação da prova[15] e o princípio da imediação, tendo sempre presente que o tribunal de 1ª instância encontra-se em situação privilegiada para apreciar e avaliar os depoimentos prestados em audiência.

Também é certo que, como em qualquer actividade humana, sempre a actuação jurisdicional comportará uma certa margem de incerteza e aleatoriedade no que concerne à decisão sobre a matéria de facto. Mas o que importa é que se minimize tanto quanto possível tal margem de erro, porquanto nesta apreciação livre o tribunal não pode desrespeitar as máximas da experiência, advindas da observação das coisas da vida, os princípios da lógica, ou as regras científicas[16].
De todo o modo, a construção da realidade fáctica submetida à discussão não se poderá efectuar de forma parcelar e desconexa, atendendo apenas a determinado meio de prova, ou a parte dele, e ignorando todos os demais, ainda que expressem realidade distinta, a menos que razões de credibilidade desacreditem estes.
Ou seja: nessa tarefa não pode o julgador conformar-se com a análise parcelar e parcial transmitida pelos litigantes, mas antes submetê-la a uma ponderação dialéctica, avaliando a força probatória do conjunto dos meios de prova destinados à demonstração da realidade submetida a debate.
Assinale-se que a construção – ou, melhor dizendo, a reconstrução, pois que é dela que se deve falar quando, como no caso, se procede à ponderação dos factos que por outros foram apreendidos e transmitidos com o filtro da interpretação própria de quem processa essa apreensão – da realidade fáctica não pode efectuar-se de forma parcelar e desconexa, antes reclamando o contributo conjunto de todos os elementos que a integram.

Quer isto dizer que a realidade surge de um conjunto coeso de factos, entre si ligados por elos de interdependência lógica e de coerência.

A realidade não se constrói apenas a partir de um depoimento isolado ou de um conjunto disperso de documentos, ainda que confirmadores de uma determinada versão factual, antes se deve conformar com um património fáctico consolidado de forma sólida, coerente, transmitido por elementos probatórios com idoneidade e aptidão suficientes a conferir-lhe indiscutível credibilidade.

Como se escreveu no acórdão da Relação de Lisboa de 21.12.2012[17], “…a verdade judicial traduz-se na correspondência entre as afirmações de facto controvertidas, relevantes e pertinentes, aduzidas pelas partes no processo e a realidade empírica, extraprocessual, que tais afirmações contemplam, revelada pelos meios de prova produzidos, de forma a lograr uma decisão oportuna do litígio. Sobre as doutrinas da verdade judicial como mera coerência persuasiva ou como correspondência com a realidade empírica, vide Michele Taruffo, La Prueba, Marcial Pons, Madrid, 2008, pag. 26-29. Quanto à configuração do objecto da prova e a sua relação com o thema probandum, vide Eduardo Gambi, A Prova Civil – Admissibilidade e relevância, Editora Revista dos Tribunais, São Paulo, Brasil, 2006, pag. 295 e seguintes; LLuís Muñoz Sabaté, Fundamentos de Prueba Judicial Civil L.E.C. 1/2000, J. M. Bosch Editor, Barcelona, 2001, pag. 101 e seguintes.

Por isso mesmo, a “reconstrução” cognitiva da verdade, por via judicial, não tem, nem jamais poderia ter, a finalidade exclusiva de obter uma explicação exaustiva e porventura quase irrefragável do acontecido, como sucede, de certo modo, nos domínios da verdade história ou da verdade científica, muito menos pode repousar sobre uma crença inabalável na intuição pessoal e íntima do julgador. Diversamente, tem como objectivo conseguir uma compreensão altamente provável da realidade em causa, nos limites de tempo e condições humanamente possíveis, que satisfaça a resolução justa e legítima do caso (…)”.

Defendem os recorrentes ter sido incorretamente apreciada a matéria de facto ao não ser incluída nos factos provados a matéria que assim elencam (conclusão 15.1.):

“… 40. Os RR. plantaram dois canteiros, fora do muro e do portão grande que construíram entre 1978 e 1983, a sul da sua casa de habitação, na mesma época.

41. O canteiro plantado no trato de terreno junto à estrada, a poente do portão grande da casa dos RR., mantém-se intacto.

42. O eucaliptal dos AA. está e sempre foi delimitado do prédio identificado no Ponto 10.1 dos Factos Provados, propriedade dos RR., no seu lado norte, e no sentido poentenascente, a partir da estrada pública, a poente, que serve de entrada para ambos os prédios, por portão em ferro e por muro, em reboco de cimento, pintado de branco, encimado por gradeamento, em rede, em toda a sua extensão, construídos pelos RR., há mais de 40 anos, numa extensão de cerca de 25 metros.

43. Os prédios dos AA. e RR. são contíguos, e confrontam, entre si, a norte e poente, atenta a localização e configuração do prédio dos AA., e a sul e nascente, atentos os prédios dos RR..

44. O Sr. EE e esposa, e mais tarde, os AA. consentiram na plantação pelos RR., em trato de terreno do seu eucaliptal de um canteiro, durante mais de 20 anos.

45. Os RR. outorgaram em 19/10/2021, no Cartório Notarial do Notário II, em Estarreja, escritura de justificação, na qualidade de justificantes, na qual declararam o seguinte:

- “que são donos e legítimos possuidores, com exclusão de outrem, do seguinte bem imóvel:

- Prédio urbano, sito em Quinta ..., ..., freguesia ..., concelho de Albergaria-a-Velha, composto por casa de habitação, com a superfície coberta de cento e vinte e dois, vírgula cinquenta metros quadrados, logradouro com a área de duzentos metros quadrados e jardim com a área de vinte e cinco metros quadrados, perfazendo, assim, a área total de trezentos e quarenta e sete vírgula cinquenta metros quadrados, a confrontar do norte com JJ, do sul com KK, do nascente com EE e do poente com LL, inscrito na matriz, em nome do justificante marido, sob o artigo número ...30, com o valor patrimonial de IMT de € 69.090,00, omisso na Conservatória do Registo Predial de Albergaria-a-Velha;

- que eles, justificantes, não possuem título formal que legitime o seu domínio sobre este prédio, o qual foi por eles edificado, exclusivamente a expensas suas, num terreno cujo artigo matricial desconhecem, devido à distância temporal e que veio à sua posse por compra verbal que fizeram a MM e a NN, ambas solteiras, maiores, que foram residentes na cidade de Aveiro, em data que não podem precisar, mas que se situa no ano de mil novecentos e oitenta e dois, sem que tenham procedido à titulação desta compra por escritura pública;

-que não obstante isso, eles justificantes, procederam, logo após a sua aquisição, à construção do imóvel atrás identificado, tendo, desde aí, usufruído o mencionado prédio e usando todas as utilidades por ele proporcionadas, desde a sua construção, designadamente, habitando-o, fazendo as necessárias obras de conservação e manutenção, pagando os respetivos impostos, com ânimo de quem exerce direito próprio, sendo reconhecidos como seus donos por toda a gente, fazendo-o de boa-fé por ignorarem lesar direito alheio, pacificamente, porque sem violência, contínua e publicamente, à vista e com conhecimento de toda a gente, sem oposição de ninguém, tudo isto há mais de 20 anos, ininterruptamente, até à presente data;

-que dadas as enunciadas características de tal posse, eles justificantes adquiriram o citado prédio por usucapião, título este que, por natureza, não é suscetível de ser comprovado por meios normais;

-que desconhecem os possuidores do prédio justificado anteriores àquelas MM e a NN, devido à distância temporal e que, apesar das buscas efetuadas no respetivo serviço de finanças, não lhes foi possível estabelecer qualquer proveniência do atual artigo do mesmo.”

46. Com a outorga dessa escritura de justificação os RR. tentaram demonstrar que efetivamente há mais de 20 anos, que usam o trato de terreno situado no eucaliptal dos AA. como sendo sua, porque não conseguiam autonomizar essa parcela de terreno relativa ao canteiro, cientes de que eram proprietários desse canteiro.

47. Foram alguns dos AA. que mandaram um maquinista colocar em frente ao portão pequeno, aberto pelos RR. em setembro de 2020, blocos de pedra pesados e de grandes dimensões.

48. Foi a Junta de Freguesia ... quem arrancou as plantas do canteiro, limpou o canteiro e retirou as pedras ornamentais que nele se encontravam, com exceção do cato (…)”.

Discordam igualmente os recorrentes da decisão relativa à matéria de facto ao dar como provados os factos incluídos nos pontos 28 a 35, e 38 e 39, que, na sua perspectiva, devem ser considerados não provados.

Indicam os recorrentes os seguintes meios probatórios que, no entender dos mesmos, impunham decisão diversa da proferida, na parte por eles impugnada:

A) Certidão permanente da descrição predial do terreno onde os RR. construíram a sua casa de habitação;

B) Foi junta aos autos a escritura de justificação de 19/10/2021, que os RR. Deram como integralmente reproduzida para os devidos e legais efeitos – artigo 6º da contestação.

Em sede testemunhal os depoimentos de parte dos RR. GG e HH – CD 20221017-4114325-2870473 e da mandatária dos RR., Dra. OO – CD20221109-4114325-2870473.

Em sede confessória, a confissão dos RR. nos termos do disposto no artigo 574º, nº 3 relativamente ao concluído em 15.1.42; e a confissão dos RR., nos termos do disposto no artigo 574º, nº 2, relativamente ao concluído em 15.1.43”.

Satisfatoriamente cumpridos os ónus impostos pelo artigo 640.º do Código de Processo Civil, importa indagar se ocorreu erro na apreciação da matéria de facto submetida a julgamento, devendo, nessa hipótese, ser alterada por esta instância a respectiva decisão[18].

Relativamente à delimitação/confrontações dos prédios de Autores e Réus, relembre-se o que, pertinentemente, refere a sentença recorrida, na parte em que procede à fundamentação da matéria de facto: No caso em mãos, em que os autores pretendem o reconhecimento de um direito de propriedade com uma dada configuração, estando controvertida a propriedade sobre um trato de terreno situado junto ao muro da casa dos réus, que os autores defendem integrar a parte de eucaliptal em que se decompõe o seu prédio e, consequentemente, a linha divisória de terrenos alegadamente confinantes, dar-se como provada uma concreta linha delimitativa dos prédios, na parte que aqui importa, a do eucaliptal, importa a resolução do pleito e, consequentemente, assume natureza conclusiva. Tal matéria está, pois, inequivocamente relacionada com o thema decidendum e encerra uma conclusão que representa a própria solução jurídica de uma questão fundamental a decidir na ação e, por via disso, não pode constar da decisão de facto (isto é, não pode constar quer dos factos provados, quer dos factos não provados).

Sem embargo do exposto, que contende com a não seleção de tal matéria para os factos provados e não provados, o tribunal não deixou de se pronunciar e de tomar concreta posição sobre os alegados limites dos prédios na motivação da matéria de facto, de onde resulta que os autores não convenceram o tribunal quanto à linha que entendem ser a divisória dos prédios.

Mais evidentemente se torna que o tribunal estaria a tomar posição quanto ao mérito do pleito se incluísse na matéria de facto demonstrada factualidade em que assumisse que aquele espaço exterior ao muro dos réus integrava o prédio arrogado pelos autores, sendo manifesto que não poderia dar tal factualidade como demonstrada”.

Mostra-se perfeitamente avisada esta solução perante o objecto do litígio dos autos – a propriedade de uma parcela  de terreno existente junto à estrada e aos portões a que aludem os pontos 15 e 36 dos factos dados como provados, e identificada no ponto 34 dos mesmos factos provados -, que cada uma das partes reclama como sua.

Para além disso, como muito bem alerta a mesma decisão, “…muito embora os réus tenham admitido por acordo na contestação que o seu prédio confina com o arrogado pelos autores, nos moldes preconizados na factualidade a que se aludiu, também não deixaram de sublinhar, tanto na contestação, como oralmente, que, na sequência deste dissídio e da destruição do canteiro, o vizinho KK arrogou-se também proprietário de parte da entrada que dá para a zona do pomar do prédio arrogado pelos autores, pelo que não deram como certo que toda a confrontação sul do seu prédio urbano fosse com o prédio arrogado pelos autores, em particular, na parte que nos ocupa, a designada como “eucaliptal”, porque nenhum dissídio existe relativamente à parte afeta a pomar, em particular, na zona do canteiro e a sul deste, sitas junto à estrada, que se encontra a poente – as orientações cardeais foram baseadas na rosa dos ventos constante das plantas de implantação do processo de licenciamento de obras juntas com a petição inicial, em sintonia também com a posição das partes”.

Segundo o disposto no artigo 574.º, n.º 2 do Código de Processo Civil, “Consideram-se admitidos por acordo os factos que não forem impugnados, salvo se estiverem em oposição com a defesa considerada no seu conjunto [...]”.

No caso em apreço, negando os Réus que o muro por eles construído a partir da estrada pública, e no qual foram rasgados, ainda que em datas não contemporâneas, os dois portões nele existentes, delimita o prédio de que são proprietários, sustentando reiteradamente ao longo da sua contestação que são também proprietários de uma parcela de terreno, exterior ao mencionado muro,  a qual designam por canteiro, onde semearam e cultivaram plantas e colocaram diversos objectos para adorno do referido espaço, justificando que a referida parcela lhes foi cedida, no ano de 1988, por EE, marido da Autora AA, entretanto falecido, em troca da cedência a estes de uma outra parcela, também exterior ao muro, e que pertencia aos Réus, a falta de impugnação de factos alegados pelos Autores que estejam em oposição com a factualidade invocada como defesa pelos Réus não pode operar para efeitos da primeira parte do n.º 1 do citado artigo 574.º.

Da mesma maneira, e por idênticas razões, não ocorre por parte dos Réus qualquer manifestação confessória que permita, com base na confissão, ter como assente a factualidade que os recorrentes elencam nos n.ºs 42 e 43.

Quanto à força probatória da convocada “certidão permanente da descrição predial do terreno onde os RR. construíram a sua casa de habitação” sempre importa notar que as certidões da Conservatória do Registo Predial têm força probatória plena quanto às presunções registrais juris tantum estabelecidas no artigo 7.º, do Código Registo Predial[19], mas essa prova legal plena – ilidível mediante prova do contrário[20] – não abrange os elementos circunstanciais descritivos como as áreas, limites e confrontações.

Com efeito, como é de entendimento unânime na doutrina e na jurisprudência, o registo predial tem como finalidade essencial conferir publicidade à situação jurídica imobiliária, de modo a garantir a segurança nas operações de natureza predial. Todo ele é construído e estruturado na ideia da defesa dos interesses de terceiros, embora prossiga também a tutela dos interesses dos titulares de direitos nele inscritos. Em caso algum o registo tem como função a constituição de direitos, tarefa que não lhe é reconhecida.

Assim, o artigo 7.º do Código de Registo Predial faz presumir que o direito existe e que dele é titular a pessoa em cujo nome o mesmo se acha inscrito. Tal presunção, porém, não abrange os limites, confrontações, a área e demais elementos próprios da identificação física do prédio. Estes derivam quase sempre das próprias declarações dos interessados, escapando à confirmação e controle do conservador, apesar da sua intervenção oficiosa[21].

Desta forma, o facto de constar da descrição do prédio, cujo direito de propriedade se acha registada em nome do respectivo titular, que o imóvel tem determinada área e certas confrontações não atesta por si só que a área efectiva ou as confrontações indicadas são as fisicamente reais, até porque estas últimas podem, com o decorrer do tempo, sofrer mutações – basta pensar na hipótese de a propriedade de um dos prédios confinantes mudar de titularidade – não transpostas para o documento em causa.

Desse entendimento, comummente aceite, também comunga a sentença recorrida quando nela se afirma: “tais documentos autênticos não gozam de força probatória plena relativamente às caraterísticas descritivas e identificativas do prédio, designadamente, quanto à área, limites, composição e confrontações, sendo estes os aspetos, constantes desses documentos, em particular, que, em regra, se mostram mais relevantes para ajudar a esclarecer a dominialidade sobre determinada parcela.

Por um lado, o registo não se destina a garantir a exatidão dos limites prediais, tanto que aspetos como os limites, confrontações, a área e demais elementos próprios da identificação física do prédio, derivam quase sempre das próprias declarações dos interessados, escapando à confirmação e controle do conservador, apesar da sua intervenção oficiosa – art. 110.º/1 e 5 e art. 7.º do Código do Registo Predial”.

Pretendem ainda os Autores que sejam adicionados ao elenco dos factos considerados provados os que descrevem nos pontos 45 e 46 da conclusão 15.1.

Retenha-se, a propósito do valor probatório da escritura de justificação invocada: a força probatória de um documento traduz-se no valor ou fé que, enquanto instrumento de prova, a lei lhe reconhece.

Esse valor pode reportar-se ao próprio documento enquanto tal – e, neste caso, é a sua força probatória formal, a sua genuinidade ou autenticidade que é indagada -, ou ao seu conteúdo, isto é, ao seu valor probatório material.

A determinação da força probatória formal de um documento afere-se em função da sua proveniência, identificando a pessoa ou entidade de que o mesmo emana.

No que concerne aos documentos autênticos, o artigo 370.º, n.ºs 1 e 2 do Código Civil estabelece uma presunção de autenticidade: presume-se que o documento provém da autoridade ou oficial público a quem é atribuído desde que se mostre subscrito pelo autor, com assinatura reconhecida notarialmente ou com o selo do respectivo serviço.

A força probatória material dos documentos autênticos é definida pelo artigo 371.º do mesmo diploma legal: “os documentos autênticos fazem prova plena dos factos que referem como praticados pela autoridade ou oficial público respectivo, assim como dos factos que neles são atestados com base na percepção da entidade documentadora; os meros juízos pessoais do documentador só valem como elementos sujeitos à livre apreciação do julgador”.

De acordo com este normativo, o documento autêntico faz prova plena quanto aos actos nele indicados como tendo sido praticados pela entidade documentadora. Se na escritura consta que o notário a leu em voz alta perante os outorgantes, tem de admitir-se como exacto que o acto em causa foi praticado tal como nela foi exarado: a fé pública atribuída ao documentador garante a veracidade do facto articulado no referido instrumento notarial.

O documento autêntico faz ainda prova plena quanto aos factos que ocorreram na presença do documentador, isto é, os factos que nele são atestados com base nas suas próprias percepções.

Pela fé pública de que goza, o documentador garante que os factos que atesta no documento ocorreram; mas não garante, e nem o pode fazer, que esses mesmos factos reflectem a verdade.

Ou seja: o documentador garante que os outorgantes fizeram na sua presença as declarações exaradas no documento, não dando, todavia, fé que essas declarações sejam verdadeiras. Assim, por exemplo, num escritura de compra e venda de imóvel de onde conste que os outorgantes declararam que o preço já foi pago ou já foi recebido pelos vendedores, o referido instrumento apenas faz prova plena de que tais declarações foram emitidas e percepcionadas pelo notário, mas não podendo este garantir que essas declarações sejam verdadeiras.

Como precisam Pires de Lima e Antunes Varela[22], “O valor probatório pleno do documento autêntico não respeita a tudo o que se diz ou se contém no documento, mas somente aos factos que se referem praticados pela autoridade ou oficial público respectivo (ex. procedi a este ou àquele exame), e quanto aos factos que são referidos no documento com base nas percepções da entidade documentadora. Se, no documento, o notário afirma que perante ele o outorgante disse isto ou aquilo, fica plenamente provado que o outorgante o disse, mas não fica provado que seja verdadeira a afirmação do outorgante, ou que esta não tenha sido viciada por erro, dolo ou coacção, ou que o acto não seja simulado. Um exemplo: numa escritura de compra e venda de imóveis o vendedor declara que recebeu o preço convencionado; o documento só faz prova plena de que esta declaração foi proferida perante o notário, nada impedindo que mais tarde se prove que ela foi simulada e que o preço ainda não foi pago”.

E na mesma linha de pensamento, sustenta Vaz Serra[23]: “Os documentos em que o documentador (v.g., o notário) atesta determinados factos, só provam plenamente o que neles é atestado com base naquilo que o documentador se certificou com os seus sentidos. Assim, o documento não prova plenamente a sinceridade dos factos atestados pelo documentador ou a sua validade e eficácia jurídica, dado que disso não podia o documentador aperceber-se. Daí que o documento, provando plenamente ter sido feito ao notário as declarações nele atestadas, não prova plenamente que essas declarações sejam válidas e eficazes.”

Assim, a invocada escritura de justificação, enquanto documento autêntico apenas faz prova plena que as partes fizeram as declarações que foram exaradas no referido instrumento, não constituindo prova tarifada quanto à existência efectiva do nele declarado.

Neste enquadramento, a mencionada escritura – que sendo elemento de prova, não consubstancia, enquanto tal, nenhum facto - nenhum contributo relevante fornece quanto à equação do objecto nuclear do litígio, ou seja, a propriedade da faixa de terreno designada como canteiro, reclamada por Autores e Réus.

Nesse sentido também se pronunciou a sentença aqui sindicada quando esclarece: “O mesmo se diga em relação ao teor da escritura de justificação sobre o prédio urbano dos réus, junta pelos autores em audiência, porquanto também elaborada com base no que os interessados e as suas testemunhas, sem contraditório dos eventuais confinantes e afetados por tais declarações, declararam perante notório. O teor desta escritura de justificação tem, a essa luz, pouca relevância”.

É de indiscutível evidência que os recorrentes convocam o teor da aludida escritura para dela extraírem o juízo conclusivo que elencam no por eles indigitado ponto 46.º.

Claramente a referida matéria não traduz nenhum facto, tratando-se antes de uma mera conclusão, pelo que nunca poderia integrar matéria de facto, provada ou não.

Além disso, a referida conclusão nem sequer se mostra justificada em termos probatórios.

Surpreendentemente (ou talvez não, dada a forma como têm vindo a litigar...) vêm agora os recorrentes reclamar que seja adicionado ao acervo dos factos provados que “… 40. Os RR. plantaram dois canteiros, fora do muro e do portão grande que construíram entre 1978 e 1983, a sul da sua casa de habitação, na mesma época” e que “41. O canteiro plantado no trato de terreno junto à estrada, a poente do portão grande da casa dos RR., mantém-se intacto”.

Em causa está, como sempre esteve, o espaço de terreno que os Autores alegam ter sido ajardinado e “acimentado” pelos Réus, onde construíram uma caixa de águas pluviais, e para o qual abriram um portão, faixa de terreno que os mesmos alegam integrar o prédio rústico de que são proprietários, e que os Réus defendem pertencer-lhes por lhes haver sido cedida por permuta, no ano de 1988, pela Autora AA e pelo seu marido, EE, à data ainda vivo.

É sobre a propriedade do referido espaço, que os Réus denominam canteiro, que incide o dissídio das partes.

É certo que as fotografias juntas com a petição inicial como documentos n.ºs 8, 9 e 20 documentam a existência de um pequeno canteiro com plantas, situando-se o mesmo a poente do portão dos Réus, descrito nos artigos 29.º e 30.º da mesma peça processual.

Nunca este, porém, esteve em discussão nos autos, a ele não se referindo os articulados, nem acerca dele tendo deposto as testemunhas inquiridas em audiência de julgamento.

É, assim, absolutamente irrelevante para a causa a circunstância de o canteiro situado junto à estrada, a poente do portão grande dos Réus se achar ou não intacto já que, repete-se, não é sobre ele que recai o litígio das partes.

A matéria constante do indigitado ponto 44.º, para além de nunca ter sido alegada por nenhum dos litigantes, incluindo os Autores, achando-se mesmo em oposição com a factualidade por eles alegada na petição inicial (cfr., designadamente, artigo 44.º da petição) e na resposta apresentada a 9.02.2022[24], conforme decorre, nomeadamente dos artigos 46.º a 49.º, colide com a matéria constante dos pontos 32.º a 34.º dos factos provados, matéria que, apesar da impugnação dos recorrentes, deve manter-se inalterada, como infra melhor se esclarecerá.

Quanto à matéria que os recorrentes indicam no ponto 47 da referida conclusão 15.1., ela corresponde, ainda que com ligeiras diferenças de redacção, à constante do ponto 39 dos factos provados (Com a ajuda de uma máquina colocaram nesse canteiro vários blocos de pedra pesados e de grandes dimensões em frente ao portão aberto em Setembro de 2020), que, embora por eles impugnada, será igualmente de manter.

A matéria que os recorrentes pretendem que, sob o n.º 48, seja adicionada aos factos provados, acha-se em clara oposição com o que consta do ponto 38 dos factos provados, que, não obstante ter sido objecto de impugnação, é, desde já se adianta, de manter, como igualmente infra melhor se esclarecerá.

Assim, pelas razões expostas, se considera não existir qualquer fundamento para adicionar aos factos enumerados como provados na sentença recorrida os elencados pelos recorrentes na mencionada conclusão 15.1.

Defendem ainda os recorrentes que deve ser considerada não provada a matéria constante dos pontos 28 a 35, e 38 e 39 dados como provados na sentença que impugnam.

Não indicaram os recorrentes qualquer meio probatório que infirmasse a factualidade vertida naqueles segmentos decisórios.

Ainda assim, se dirá:

Ao contrário dos Réus, que prestaram depoimentos coerentes, coesos, com uma narrativa a que, designadamente, as regras de experiência comum conferem credibilidade, os depoimentos dos Autores – especialmente o da Autora AA, em posição privilegiada para revelar um conhecimento profundo dos factos em discussão – revelaram incongruências, hesitações, contradições entre si, sendo, em algumas partes desmentidos pelos depoimentos das próprias testemunhas que arrolaram, fragilidades bastas vezes assinaladas na rigorosa e extensa fundamentação do julgamento da matéria de facto e que, por isso, fundadamente justificam as dúvidas quanto à sua credibilidade.

Ainda que nenhuma das testemunhas que depuseram em audiência haja mostrado conhecimento directo[25] acerca do acordo de permuta do terreno – pois que, segundo os Réus apenas estavam presentes eles próprios, o EE e a esposa deste, a Autora AA, quando o mesmo foi firmado – a sua existência nos termos relatados pelos Réus afigura-se convincente pois de outro modo dificilmente se acharia explicação para a inação do marido da Autora AA  e desta e, após o falecimento daquele, dos demais Autores sendo o designado canteiro ostensivamente ocupado pelos Réus, que, ao longo de dezenas de anos, cuidaram das plantas que  eles próprios nele cultivaram e procederam à sua ornamentação, facto sobejamente confirmado por várias das testemunhas inquiridas, não logrando os demandantes fornecer nenhum esclarecimento plausível para tão clara e longa usurpação do direito de propriedade dos Autores, na tese por estes defendida.

Quanto às circunstâncias como ocorreu a destruição do aludido canteiro e colocação das pedras em frente do portão de menores dimensões, a versão dos Autores não colheu confirmação noutros meios de prova, além dos seus próprios depoimentos, e ainda assim com registo de assinaláveis contradições, sendo os depoimentos dos Réus confirmados designadamente pelo testemunho de VV, que identificou os Autores que participaram na destruição do jardim e colocação das pedras e relatou a participação de elementos da Junta de Freguesia nessa contenda, bem como de WW.

Pelo exposto, a aludida factualidade impugnada pelos recorrentes encontra suporte probatório bastante para que, como se ajuizou em primeira instância, se considere provada.

Nesta parte, improcede, assim, o recurso dos apelantes, mantendo-se inalterada a decisão sobre a matéria de facto, apenas se rectificando o manifesto erro detectado no ponto 15 dos factos provados, substituindo-se a expressão “autores” pela expressão “réus”.


3. Mérito do julgado.

3.1. Do invocado direito de propriedade - Peticionaram os Autores que:

“1. Deve declarar-se que os AA. são donos e legítimos proprietários e possuidores, com exclusão de outrem, do prédio rústico identificado no artigo 1º da P.I. situado a sul e nascente dos prédios dos RR., identificados no artigo 14º da P.I., e desde a entrada pavimentada com cimento em frente ao portão da casa de habitação dos RR., junto à estrada pública, a poente dos prédios de AA. e RR., e que constitui o acesso à casa de habitação dos RR. até ao limite nascente dos prédios dos RR., ao longo da extensão dos seus prédios, no sentido poente/nascente, por aquisição originária, decorrente da invocada usucapião, mas também por aquisição derivada e titulada;

2. Devem os RR. ser condenados a reconhecer que, para além dessa entrada com pavimento acimentado, de acesso aos seus prédios, a sul/poente do prédio composto pela sua casa de habitação, nada mais possuem a sul e nascente desse piso acimentado, e que os limites do seu prédio identificado no artigo 14.1 da P.I., a sul, na parte em que confronta com o eucaliptal dos AA., e que constitui a estrema sul desse prédio, estão demarcados, através desse pavimento acimentado, em frente ao portão de acesso à sua casa de habitação, e pelo muro identificado no artigo 21º da petição inicial”.

De acordo com o artigo 7.º do Código de Registo Predial, “o registo definitivo constitui presunção de que o direito existe e pertence ao titular inscrito, nos precisos termos em que o registo o define”.       

Se a aquisição do direito de propriedade do prédio se achar registada, beneficia o registrante da presunção de que o direito de propriedade existe e pertence ao titular inscrito, nos termos definidos no registo. Tal como refere o Acórdão da Relação do Porto de 19.12.2005[26], “a função do registo predial é apenas a de definir a situação jurídica dos prédios, exonerando os titulares inscritos de demonstrarem o facto em que assenta a presunção que dimana do registo, ou seja, que o direito registado existe na sua esfera jurídica”[27].

A presunção que deriva do registo é, todavia, ilidível.

Como elucida Oliveira Ascensão[28], “é preciso não esquecer que a base de toda a nossa ordem imobiliária não está no registo, mas na usucapião. Esta em nada é prejudicada pelas vicissitudes registrais; vale por si. Por isso, o que se fiou no registo passa à frente dos títulos substantivos existentes mas nada pode contra a usucapião”.

E relembra-se aqui o que já antes se havia dito a propósito do alcance da presunção do registo: tal presunção não abrange os limites, confrontações, a área e demais elementos próprios da identificação física do prédio.
Tal como esclarece o acórdão da Relação do Porto de 3.02.2009[29], “O art.° 7°, do CRP, faz presumir que o direito existe, que determinado imóvel é propriedade do titular inscrito, mas não abrange os factores descritos do mesmo, ou seja, os limites, as confrontações, se a sua natureza é rústica ou urbana, nem as áreas, do prédio em causa”.
Na situação aqui em análise, os Autores constam no registo como titulares do direito de propriedade, em comum e sem determinação de parte ou de direito, do prédio de que se reclamam proprietários, com fundamento na dissolução de comunhão conjugal e sucessão hereditária, tendo como sujeito passivo, EE, de que os aqueles são herdeiros.
Como assinala a sentença aqui escrutinada, os Autores com base no registo não beneficiam da presunção de propriedade do prédio que reclamam como seu, atestando o registo apenas que o imóvel se integra numa herança indivisa de que aqueles são herdeiros.
Também não se mostra comprovado que a aquisição do imóvel tivesse sido registada a favor de EE, autor da referida herança.
Como resulta do ponto 3) dos factos provados, mostra-se comprovado que EE adquiriu tal prédio a PP e esposa, UU, através de escritura pública de compra e venda outorgada no Cartório Notarial de Albergaria-a-Velha, no dia 6/01/1988, mediante a qual os vendedores PP e esposa UU declararam vender ao falecido EE, o prédio em causa.
Mas, como também adverte a mesma sentença, “sendo esta uma modalidade de aquisição derivada, pressupõe a demonstração e prova da eventual cadeia de aquisições derivadas anteriores à aquisição por compra e venda, o que não foi alegado, dado que a compra e venda não é constitutiva do direito de propriedade, apenas transmite o direito que existia na esfera jurídica do alienante [nemo plus juris ad alium transfere potest, quam ipse habet].
Mas essa necessidade de alegação e demonstração apenas sucede nos casos em que não se verifica a presunção legal da propriedade, como a resultante da posse ou do registo”.
No caso, para além de alegada aquisição derivada por efeito do contrato de compra e imóvel do imóvel, invocaram os Autores a usucapião como forma aquisitiva do direito de propriedade de que se arrogam titulares.
Segundo o artigo 1287.º, do Código Civil, “a posse do direito de propriedade ou de outros direitos reais de gozo, mantida por certo lapso de tempo, faculta ao possuidor, salvo disposição em contrário, a aquisição do direito a cujo exercício corresponde a sua actuação: é o que se chama usucapião”.
Ou seja, a usucapião comporta uma forma originária de constituição de direitos reais, através do reconhecimento jurídico duma situação de facto, exigindo, para o seu preenchimento, dois requisitos ou pressupostos, cuja verificação cumulativa é necessária para que o instituto possa produzir efeitos.
O primeiro desses requisitos pressupõe uma situação de posse relativamente a um direito real de gozo, designadamente direito de propriedade. O segundo requisito reporta-se ao decurso dessa situação de posse por um certo lapso temporal, variável de acordo com verificação concreta das circunstâncias previstas nos artigos 1294.º e seguintes do Código Civil. A posse caracteriza-se pelo “poder que se manifesta quando alguém actua por forma correspondente ao exercício do direito de propriedade ou de outro direito real”[30]. Adquire-se, designadamente, “pela prática reiterada, com publicidade, dos actos materiais correspondentes ao exercício do direito”[31] e “pode ser titulada ou não titulada, de boa ou de má fé, pacífica ou violenta, pública ou oculta”[32].
Para o preenchimento da usucapião como facto aquisitivo, a posse tem de ser pública e pacífica[33], apenas influindo as demais características no prazo necessário para a sua constituição.
A posse, enquanto facto aquisitivo, pressupõe a reunião de dois elementos: a) um elemento material – o corpus –, traduzido nos actos materiais praticados sobre a coisa, no exercício de poderes sobre a mesma; b) um elemento psicológico – o animus -, consubstanciado na intenção de se comportar como titular do direito real correspondente aos actos materiais praticados.
A circunstância da lei fazer depender a existência da posse destes dois elementos, confronta o possuidor com a necessidade de comprovar o preenchimento dos mesmos. Só a posse assim demonstrada releva para efeitos aquisitivos através do instituto da usucapião.
Note-se, porém, que o exercício dos actos materiais que se traduzem no corpus faz presumir a existência do animus[34].
Trata-se, todavia, de uma presunção legal tantum juris, susceptível, por isso, de ser ilidida pela prova do contrário[35].
É, de resto, o entendimento que se extrai do Assento do STJ de 14/05/96[36], e que continua em vigor, agora com a natureza de acórdão uniformizador de jurisprudência. Como se defende no mencionado Acórdão do STJ, de 24.10.2006, “…como nos casos de aquisição unilateral do direito não há causa, ou antes, não há um negócio jurídico que defina a vontade, não há uma causa concreta, o Código estabeleceu uma presunção de causa, dizendo que "em caso de dúvida, presume-se a posse naquele que exerce o poder de facto" (art. 1252.º, n.º 2, do C.Civil). Esta presunção da existência do animus só pode ser ilidida pela demonstração de que os actos praticados são por sua natureza insusceptíveis de conduzir à posse – são actos facultativos ou são actos de mera tolerância. (Cfr. MANUEL RODRIGUES, A Posse – Estudo de Direito Civil Português, 4.ª edição, revista, anotada e prefaciada por FERNANDO LUSO SOARES, Coimbra, 1996, pp. 192 e 195)”.
O artigo 1263.º, alínea a) do Código Civil determina que “a posse adquire-se pela prática reiterada, com publicidade, dos actos materiais correspondentes ao exercício do direito”.
Com isso se significa que “exige-se, em primeiro lugar, uma prática reiterada dos actos materiais (…). O essencial (…) é que os actos aquisitivos, variáveis de caso para caso, se dirijam ao estabelecimento de uma relação duradoura com a coisa, não bastando um contacto fugaz, passageiro (Henrique Mesquita, Lições cit., pág. 97[37].
A aquisição da posse pode ser originária ou derivada: no primeiro caso por apossamento ou inversão do título e, no segundo, por tradição, sucessão ou constituto possessório[38]
De acordo com o artigo 1256.º, n.º 1 do Código Civil, “Aquele que houver sucedido na posse de outrem por título diverso da sucessão por morte pode juntar à sua a posse do antecessor.”.
No caso, a mesma sentença aqui sindicada destaca, com pertinência: “como é entendimento pacífico, um herdeiro só é considerado titular de um direito concreto sobre bem ou bens da herança após ter sido efetuada a partilha, sendo certo que esse direito retroage ao momento da abertura da sucessão e o direito que assiste aos herdeiros de defesa e proteção dos bens da herança contra terceiros nos termos do art.º 2078º do Código Civil não se confunde com o direito de propriedade ou compropriedade nos termos do art.º 1403º do mesmo código – Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 9 de Julho de 2014, relatado pelo sr. Desembargador Jorge Vilaça, disponível em www.dgsi.pt.
No caso, portanto, existe uma situação de contitularidade decorrente do direito dos autores sobre a herança onde se integra o imóvel.
Acresce ainda que, dispõe o art. 1255 do Código Civil que: “Por morte do possuidor, a posse continua nos seus sucessores desde o momento da morte, independentemente da apreensão material da coisa”.
Porém, a posse em nome próprio típica do direito de propriedade só começa a partir da inversão do título de posse e da cessação da situação de indivisão do património hereditário.
Conforme escreve Vaz Serra, em RLJ Ano 91, p. 181, “enquanto não houver inversão do título da posse, cada um dos consortes possui por si e pelos outros, não podendo, portanto, adquirir por prescrição bens certos e determinados do património indiviso”.
No caso, inexiste qualquer ato de inversão do título da posse.
Presume-se que a posse continua em nome de quem a começou, de acordo com o art. 1257.º/2 do Código Civil.
Pelo que deverá presumir-se que a posse exercida por um sucessor/herdeiro do inicial possuidor, após a morte deste, não é uma posse nova mas mera continuação da posse inicial que, como tal, não é exercida em nome próprio, mas sim em nome da herança aberta por óbito do possuidor inicial, ainda que os demais sucessores não tenham praticado qualquer ato material sobre a coisa.
No caso, nada foi alegado no sentido de ilidir tais presunções e de se entender verificada uma posse em nome próprio e conjunto dos herdeiros; pelo que temos que a posse exercida pelos Autores é mera continuação da posse que era exercida pelo falecido comprador e possuidor –  porventura, em relação à esposa não seja integralmente rigoroso o expendido, porém, na petição inicial não se fez qualquer especificação entre os herdeiros, nem quanto aos direitos, nem quanto à posse exercida - e que, como tal, é exercida em nome da respetiva herança.
Pelo que não se encontra demonstrada, em favor dos autores o início de uma nova posse exercida em nome próprio e exclusivo, presumindo-se a sua posse exercida em nome da herança aberta pelo óbito do comprador e possuidor do imóvel.
Pelo que, em rigor, os autores não são proprietários do imóvel, este integra a universalidade da herança e comunhão conjugal dissolvida por óbito.
Pelo que não é rigoroso o impetrado relativamente ao reconhecimento do direito de propriedade, não podendo ser reconhecido aos herdeiros o direito de propriedade em nome próprio que pretendem”.
Os Autores reclamam ser proprietários do prédio que identificam na petição inicial, descrito no ponto 1) dos factos provados, com fundamento na aquisição derivada – por compra e venda – pelo antecessor na posse, EE, e em aquisição originária, através do instituto da usucapião, invocando a presunção resultante da sua inscrição no registo.
O que realmente importa esclarecer e definir é se o prédio em causa tem a configuração e confrontações por eles alegadas, já que é indesmentível a controvérsia que divide as partes quanto a esses elementos, particularmente quanto ao ponto que delimita, a norte e poente, o prédio que os Autores reivindicam como seu e o prédio dos Réus.
De facto, na tese dos Autores o prédio que dizem pertencer-lhes estende-se até ao muro construído pelos Réus, defendendo os mesmos que é este muro que delimita os dois prédios confinantes, enquanto sustentam os Réus que o seu prédio não se confina ao muro em causa, sendo eles proprietários de uma parcela de terreno que se situa na parte exterior do dito muro, e que corresponde ao espaço que os mesmos designam por “canteiro”, onde sempre cultivaram  e cuidaram de plantas e flores, desde 1988 até ao ano de 2020, altura em que os Autores procederam à destruição do mesmo, e colocaram pedras de grandes dimensões em frente do portão pequeno que aqueles abriram para o referido espaço.
Ou seja: é sobre essa específica parcela de terreno ocupada pelos Réus até à acção empreendida pelos Autores em 2020, que incide a concreta disputa das partes, reclamando-a cada uma delas como sua propriedade.
Sendo inquestionável que o ónus de prova da factualidade alegada pelos Autores como fundamento da pretensão pelos mesmos deduzida era sobre eles que recaía, como resulta do n.º 1 do artigo 342.º do Código Civil, ter-se-á de concluir, face à prova produzida, que esse ónus não foi satisfatoriamente conseguido, porquanto, segundo a sentença recorrida, “...os autores, apesar de onerados com a alegação e prova dos factos constitutivos do seu direito sobre o espaço em disputa ou, se assim pretendem, pela linha que demarca o prédio que integra/integrou a herança de EE, não alegaram atos específicos de posse sobre a parte de terreno ocupada pelos réus, mas sim sobre o prédio em geral, em particular, sobre uma parte que designaram ser de pomar e outra de eucaliptal, sendo certo que a parte sob disputa, como se pode verificar das fotos juntas, não tem tal feição, pois que não se destina nem a pomar, nem tem eucaliptos.
Assim, temos que a alegação de uma posse genérica sobre o prédio, como se fez, e a alegação de que os prédios confrontam e são delimitados, naquela confrontação específica, por muro é insuficiente [...].
Já os réus demonstraram que exerciam o poder de facto sobre uma dada parcela de terreno, exterior aos seus muros, delimitando-a, fazendo nela um canteiro, com plantas, flores e adornos e, mais recentemente, abrindo nela uma caixa de saneamento, acimentando parte dela e abrindo para ela um portão, por onde passam.
Pelo que são eles que beneficiam da presunção da posse e não os autores.
Acresce que tais atos foram praticados desde 1988, de forma pacífica até 2020, pública e de boa fé, presumindo-se destes atos o animus possessório [art. 1268.º di Código Civil]”.
Perante este constatado circunstancialismo teria de improceder, como improcedeu, as pretensões formuladas pelos Autores na sua petição inicial.
Como tal, não merece qualquer reparo a decisão que, julgando improcedente a acção, absolveu os Réus dos pedidos nela formulados pelos Autores.

3.2. Da litigância de má fé.
Tendo cada uma das partes pedido a condenação da parte contrária por litigância de má fé, entendeu o tribunal recorrido absolver desse pedido os Réus, condenando os Autores a esse título.
Também nesta parte não se conformaram os recorrentes com o decidido.
Importa, assim, aferir se, em concreto e em relação à actuação processual de cada uma das partes, se mostram preenchidos os pressupostos da litigância de má fé. De acordo com o n.º 1 do artigo 542.º do Código de Processo Civil, “tendo litigado de má fé, a parte é condenada em multa e numa indemnização à parte contrária, se esta a pedir”.
Por sua vez, o n.º 2 do mesmo dispositivo legal delimita o conceito de litigante de má fé nos seguintes termos: “diz-se litigante de má fé quem, com dolo ou negligência grave:
a) Tiver deduzido pretensão ou oposição cuja falta de fundamento não devia ignorar;
b) Tiver alterado a verdade dos factos ou omitido factos relevantes para a decisão da causa; Tiver praticado omissão grave do dever de cooperação;
d) Tiver feito do processo ou dos meios processuais um uso manifestamente reprovável, com o fim de conseguir um objectivo ilegal, impedir a descoberta da verdade, entorpecer a acção da justiça ou protelar, sem fundamento sério, o trânsito em julgado da decisão”.

Os pressupostos da litigância de má fé encontram-se, assim, regulados no artigo 542.º do Código de Processo Civil, podendo distinguir-se aqueles que têm natureza subjectiva daqueles que têm natureza objectiva. Há litigância de má fé quando estão simultaneamente reunidos pressupostos das duas mencionadas naturezas.

Relativamente aos pressupostos subjectivos da litigância de má fé, exigiam tradicionalmente a actuação dolosa de uma das partes para o seu preenchimento e para justificar a condenação a esse título.

A litigância de má fé surge como um instituto processual, de tipo público que visa o imediato policiamento do processo. Não se trata de uma manifestação de responsabilidade civil, que pretenda suprimir danos, ilícita e culposamente causados a outrem, através de atuações processuais. Antes corresponde a um subsistema sancionatório próprio, de âmbito limitado e com objetivos muito práticos e restritos.

No essencial, não relevam todas e quaisquer violações de normas jurídicas, mas apenas as atuações tipificadas nas diversas alíneas do citado art.º 542º, nº 2; não é requerido dano: a conduta é punida em si, independentemente do resultado; exige-se dolo ou grave negligência, e não culpa lato sensu, em moldes civis; as consequências são apenas multa e, nalguns casos, indemnização calculada em moldes especiais (art.ºs 542º, nº 1 e 543º).

Depois de 1 de Janeiro de 1997 - e como corolário da maior relevância atribuída aos deveres de cooperação aquando das alterações introduzidas pela Reforma de 1995/1996 - os pressupostos subjectivos da litigância de má fé alargaram-se, passando a abarcar também a actuação a título de negligência grosseira.

Como se afirma no Acórdão da Relação do Porto de 15.12.2010[39], “o regime instituído após a última reforma do direito processual civil traduz uma substancial ampliação do dever de boa fé processual, alargando-se o tipo de comportamentos que podem integrar má fé processual, quer substancial, quer instrumental, tanto na vertente subjectiva como na objectiva. A condenação por litigância de má fé pode fundar-se, além de, numa situação de dolo, em erro grosseiro ou culpa grave”.

Quanto aos pressupostos objectivos da condenação por litigância de má fé, é de distinguir a má fé substancial da má fé instrumental: existe má fé substancial se "o litigante usa de dolo ou má fé para obter decisão de mérito que não corresponde à verdade e à justiça" e má fé instrumental se "a parte procura sobretudo cansar e moer o seu adversário, ou somente pelo espírito de fazer mal, ou na expectativa condenável de o desmoralizar, de o enfraquecer, de o levar a uma transacção injusta"[40].

Como elucidam Lebre de Freitas, Montalvão Machado e Rui Pinto[41],”é corrente distinguir má fé material (ou substancial) e má fé instrumental. A primeira relaciona-se com o mérito da causa: a parte, não tendo razão, actua no sentido de conseguir uma decisão injusta ou realizar um objectivo que se afasta da função processual. A segunda abstrai da razão que a parte possa ter quanto ao mérito da causa, qualificando o comportamento processualmente assumido em si mesmo”.

A litigância de má fé pode levar à aplicação de duas sanções: a multa e a indemnização.

Dará lugar à aplicação de uma multa processual, que pode ser decidida oficiosamente ou a requerimento da contraparte.

Tal multa deve ser fixada pelo juiz, ponderando, designadamente, os efeitos sancionatórios por ela prosseguidos em função da violação da lei na regular tramitação do processo, a situação económica do sujeito passivo e as repercussões da sanção no seu património.

Por outro lado, a litigância de má fé pode também conduzir à condenação no pagamento de uma indemnização.
A indemnização atribuída pode assumir duas modalidades distintas.
Numa primeira modalidade, usualmente designada por indemnização simples, quem for condenado como litigante de má fé deverá liquidar à contraparte o valor das despesas originadas pela litigância de má fé, incluindo os honorários dos advogados e dos técnicos; e
Numa segunda modalidade, normalmente designada por indemnização agravada, a indemnização deverá abarcar essas despesas e os demais prejuízos sofridos pela parte contrária como consequência directa ou indirecta da má fé[42].
Tanto num caso como noutro só serão indemnizáveis as despesas e os prejuízos em que se tenha incorrido em virtude de um comportamento gravemente negligente ou doloso da contraparte.
O juiz deve optar entre as duas modalidades de indemnização referidas com base na gravidade da infracção perpetrada, sendo irrelevante nesta sede a condição económica do litigante de má fé.
Quando haja negligência grosseira, o juiz deve atribuir a indemnização simples e quando se demonstre que houve dolo, o juiz deve optar pela indemnização agravada[43].
Os Autores deliberadamente deturparam a realidade de factos que não podiam desconhecer, sustentando a prática, por si e antecessores, de actos materiais sobre todo prédio rústico de que se reclamam proprietários, incluindo a parcela de terreno objecto de litígio, negando, em contrapartida, que os Réus viessem, desde 1988, a exercer actos de posse, sobre a parcela em causa, durante 32 anos, de forma pacífica, e à vista de todos, incluindo dos próprios Autores.
Falseiam a realidade dos factos, designadamente, ao negarem qualquer intervenção na destruição do canteiro cultivado e cuidado pelos Réus.
Não está em causa realidade factual em sentido diverso do alegado pelos Autores por insucesso na demonstração probatória dos factos por eles alegados, mas antes de notória alegação de factos deturpados e falseados pelos mesmos, deliberadamente, conhecendo eles que não correspondiam à verdade.
Diz-se na sentença sob recurso:
“A materialidade de facto permitiu concluir pela verificação do essencial da versão dos réus e pela não demonstração da tese dos autores.
A realidade provada é, pois, antagónica à que nos foi trazida pelos autores. Já os autores não demonstraram o essencial da sua versão.
Acresce ainda dizer que, se ainda poderíamos admitir, com algumas reservas, é certo, ante a duração dos atos praticados pelos réus e o acordo que os antecedeu, que os autores pretendessem que o tribunal se pronunciasse sobre o direito da herança sobre o trato de terreno implicado nos autos, manifesto é que o que não é processualmente admissível é que tenham submetido a sua pretensão em juízo com omissão de factos ostensivamente relevantes para apreciação da titularidade do direito sobre aquele espaço e, ademais, com o falseamento da realidade.
Da postura processual dos autores resulta, então, que eles omitiram qualquer acordo com os réus no sentido da cedência do espaço que estes ajardinaram e que se encontrava controvertido nos autos, matéria essa que os réus demonstraram. Não obstante a apelidada “exuberância” do canteiro implantado, que, aponta que este não lhes poderia passar despercebido, como, efetivamente, se demonstrou, os autores faltaram à verdade quando alegaram que ele apenas foi criado em 2020, posto que os factos patenteiam que o dito canteiro já teria mais de vinte e trinta anos.
A existência de um canteiro é um sinal objetivo, perfeitamente apreensível para o homem comum, pelo que não gera equívocos a sua existência, ao contrário do que pretenderam fazer crer os autores quando aludiram, na sua resposta, a flores crescidas naturalmente naquele espaço.
E, igualmente, os autores falsearam a realidade quando disseram que foram os réus que “limparam as árvores, plantas e vegetação que tinham plantado” e que o fizeram “na sequência da denúncia dos autores e sob pressão dos autores – art. 53.º da petição inicial.
Notificados do teor da contestação, os autores ainda persistiram e, em nossa ótica, aprofundaram a falsidade da sua alegação, invocando, factos ostensivamente incompatíveis com a matéria de facto provada, designadamente:
 46.º O “canteiro” em frente ao novo portão dos RR., foi construído por estes, com o único objetivo de tapar as obras de abertura do novo portão, e da construção da caixa de saneamento ou águas pluviais que estava a ser executada pelos RR..
47º Os AA. não negam que, naquele seu espaço de eucaliptal, que é sobretudo ocupado com erva e relva, ao longo dos anos surgiram algumas flores, que, às vezes limpavam, e, outras vezes, não limpavam e deixavam estar, por embelezarem o local, e associaram sempre o nascimento dessas plantas e flores ao facto de, ao lado do prédio, existir este comércio de flores, e que nasciam naturalmente.
 48ºE, decorrente da infiltração de semente ou, até de arbustos ou raízes na terra, e daí começarem a nascer, como ainda acontece hoje, e nunca decorrente de construção ou ocupação dos RR. –  cfr. doc. 1.
Com efeito,
49º O “canteiro” alegado e fotografado pelos RR., de 2020, foi criado e construído, pontualmente, pelos RR., com a dimensão que se vê, e com os cactos, árvores, plantas, pedrinhas e ornamentos, constantes dos registos, com o único intuito de esconder a abertura do novo portão, e da caixa de saneamento, ou águas pluviais, que estavam a ser construídos no prédio dos AA.. Aliás,
50º
Se bem se reparar, o “canteiro” está construído, desenhado e configurado, obedecendo a sequência, e respeitando a área pavimentada para a construção da caixa de saneamento dos RR..
Ou seja, os autores pretenderam negar a prática continuada e remota de qualquer ato material dos réus sobre aquele canteiro, quando se demonstraram tais atos, nomeadamente, que os réus delimitaram o espaço cedido por EE, nele criaram um canteiro, nele plantando flores e plantas e cuidando destas, regando-as e adubando-as, limpando-o das ervas daninhas e adornando-o e que o fizeram com o conhecimento dos autores, de forma pacífica até 2020 e durante mais de vinte e trinta anos.
Ademais, de forma genérica, é certo, os autores invocaram a usucapião para fundarem o seu direito e elencaram atos de posse sobre o eucaliptal, pretendendo, com isso, obter a delimitação do terreno de forma a abarcar o terreno ajardinado pelos réus, não obstante não terem demonstrado qualquer ato praticado sobre o mesmo.
Parece-nos, pois, ostensiva a falsidade do alegado pelos autores e grave tal falsidade, porquanto vai toda no sentido de rejeitar qualquer direito dos réus sobre aquele espaço, aproveitando-se do facto de estes terem murado o terreno onde implantaram a sua casa e, como assim, de fazer valer a pretensão dos autores. Portanto, estes comportamentos são idóneos a equivocar o tribunal e a fazer vingar uma pretensão com base em factos manifestamente contrários à realidade.
Os autores, portanto, deturparam a realidade dos factos do seu conhecimento pessoal e isto com vista a obterem do processo o vencimento da sua pretensão.
Fizeram-no também em relação aos próprios atos de destruição do canteiro, invocando que os réus cederam à sua pressão e retiraram as plantas e vegetação recentemente colocadas naquele espaço.
Porém, na sua própria resposta, já vieram alterar a sua versão, dizendo que foi a Junta de Freguesia que o fez. Mas, mesmo assim, não foram integralmente transparentes, posto que se demonstrou que, ao contrário dos réus que nada fizeram, foram alguns dos autores quem arrancaram as plantas do canteiro, com exceção do cato, e que retiraram pedras ornamentais que nele se encontravam.
Ora, novamente, a alegação de que os réus cederam à sua pressão e retiraram dali o canteiro, facto que teriam de saber não ser verdadeiro, poderia ser interpretada como um reconhecimento do direito dos autores sobre aquele trato de terreno, pelo que, novamente, esta factualidade falsa tem um claro pendor interessado, em prol dos interesses dos autores.
Assim, toda esta alegação era idónea a fazer convencer o Tribunal de que os réus não teriam qualquer direito sobre aquele espaço e que eram os autores, ou a herança de EE, os titulares daquele espaço.
Ademais, ao terem invocado a litigância de má-fé dos réus, invocando a falsidade da sua alegação, nomeadamente, quanto ao acordo de terrenos e uso dado àquele espaço, aludindo ainda a flores nascidas naturalmente e que associaram apenas ao comércio de florista da ré, os autores tornaram ainda mais evidente o seu dolo na deturpação dos factos que fizeram e, simultaneamente, de forma absolutamente censurável, pretenderam o sancionamento da conduta processual dos réus com a argumentação de que são eles que falseiam a realidade.
Assim, o juízo de censura elaborado pelos autores à conduta processual dos réus é, sim, passível de ser dirigido à conduta dos autores e retratam um uso manifestamente reprovável do processo, inclusive, na parte em que implica o conhecimento da postura processual da contraparte.
Tudo isto faz-nos concluir que os autores intencionalmente, ou seja, com dolo, omitiram e falsearam factos relevantes para sustento da sua pretensão, preenchendo, em particular, o comportamento previsto na alínea b) n.º 1 do art. 542.º do Código de Processo Civil, tendo litigado de má-fé”.

De resto, persistem os recorrentes nessa actuação reprovável, mesmo em sede de recurso, moldando a realidade e alterando-a em função dos objectivos que perseguem, sustentando, designadamente, terem os Réus construído dois canteiros fora do muro e do portão grande – quando apenas o espaço ocupado pelo canteiro construído em frente do portão mais pequeno esteve sempre em causa, nunca tendo a discussão incidido sobre um segundo canteiro, cuja existência nem sequer havia sido alegada -, referindo que “O Sr. EE e esposa, e mais tarde, os AA. consentiram na plantação pelos RR., em trato de terreno do seu eucaliptal de um canteiro, durante mais de 20 anos”, adulterando a realidade com o único propósito de tentarem convencer que a ocupação pelos Réus do espaço do canteiro não traduz qualquer acto de posse por parte destes, devendo apenas à tolerância do EE e esposa e, mais tarde, dos demais Autores, afirmando ter sido a Junta de Freguesia ... quem arrancou as plantas do canteiro, o limpou e retirou as pedras ornamentais que nele se encontravam, sabendo que tal não corresponde à verdade.

Neste contexto, acertadamente foram os Autores condenados por litigância de má fé e absolvidos os Réus de condenação a esse título.

Também nesta parte não merece qualquer censura a sentença recorrida.


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Síntese conclusiva:

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Nestes termos, acordam os juízes desta Relação, na improcedência do recurso, em confirmar a sentença recorrida.

As custas do recurso serão suportadas pelos recorrentes - artigo 527.º, n.º 1 do Código de Processo Civil.

Notifique.

[Acórdão elaborado pela primeira signatária com recurso a meios informáticos]




Porto, 07.03.2024
Judite Pires
António Carneiro da Silva
Ana Vieira

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[1] Cf. Alberto dos Reis, “Código de Processo Civil anotado”, vol. V, pág. 137.
[2] Antunes Varela, Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, “Manual de Processo Civil”, 2ª ed., pág. 686.
[3] Rodrigues Bastos, Notas ao Código de Processo Civil”, vol. III, página 246.
[4] Acórdão do STJ, 07.05.2008, processo nº 3380/07, www.dgsi.pt.
[5] Alberto dos Reis, ob. cit., vol. V, pág. 141; cf. Antunes Varela, Miguel Bezerra, ob. cit., pág. 690.
[6] Anselmo de Castro, ob. cit., pág. 142.
[7] “A Acção Declarativa Comum – À Luz do Código do Processo Civil de 2013”, 3ª ed., pág. 333.
[8] Lebre de Freitas, “A Acção Declarativa Comum – À Luz do Código do Processo Civil de 2013”, 3ª ed., pág. 333.
[9] Obra citada, pág. 151.
[10] Processo n.º 01P3821, www.dgsi.pt.
[11] “Direito Processual Civil Declaratório”, vol. III, pág. 142.
[12] Código de Processo Civil Anotado, Volume V, Reimpressão, 1981, pág. 143.
[13] Artigo 608.º, n.º 2 do Código de Processo Civil.
[14]Recursos no Novo Código de Processo Civil”, 2013, Almedina, pág. 224 e 225.
[15]Artigos 396º do C.C. e 607º, nº5 do Novo Código de Processo Civil.
[16] Anselmo de Castro, “Direito Processual Civil”, Vol. 3º, pág. 173 e L. Freitas, “Introdução ao Processo Civil”, 1ª Ed., pág. 157.
[17] Processo nº 5797/04.2TVLSB.L1-7, l1-7, www.dgsi.pt.
[18] Embora os recorrentes não formulem expressamente pedido de reapreciação da matéria de facto, pode considerar-se implícito tal pedido, como tal o aceitando.
[19] A presunção de que o direito existe tal como o registo o revela, e a presunção que o direito pertence a quem está inscrito como seu titular
[20] Cfr. artigo 350.º, n.º 2, do Código Civil.
[21] Cfr. artigos 60.º, 90.º e 46.º do Código do Registo Predial, Acórdãos do STJ de 11 de Maio de 1995, 17 de Junho de 1997, 25 de Junho de 1998, 11 de Março de 1999, 10 de Janeiro de 2002 e 28 de Janeiro de 2003,  CJ/STJ, respectivamente, III-II-75, V-II-126, VI-II,134, VII-I-150; Sumários/2002, 28 e 249; Sumários/Janeiro, 2003; Acórdãos do STJ de 30.09.2004, Proc. 04B2578, de 15.05.2008, Proc. 08B856, ambos em www.dgsi.pt.
[22] “Código Civil Anotado”, Volume I, 4.ª edição, páginas 327 e seguintes.
[23] RLJ, 111.º, pág. 302.
[24] Composta de 88 artigos, ao longo dos quais os Autores exorbitam claramente os objetivos da mesma – resposta ao pedido contra eles formulado pelos Réus de condenação por litigância de má fé.
[25] A ele se referiram as testemunhas XX que, apesar de filha dos Réus, prestou um depoimento desapaixonado e objetivo, e YY, que trabalhou para a Ré, e também prestou um depoimento descomprometido com o litígio que separa as partes, as quais ouviram a Ré falar nesse acordo
[26] Processo nº 0556452, www.dgsi.pt.
[27] Conferir, neste sentido, abundante jurisprudência, designadamente: Ac. da Relação de Évora, de 4 de Outubro de 1977, Colectânea de Jurisprudência, 1977, IV, pp. 905 e segs.; Ac da Relação do Porto, de 27 de Junho de 1989, na referida Col. Jur., 1989, Tomo III, p. 224; Ac. da Relação do Porto, de 2-4-1981, Col. Jur., Ano IV, Tomo II, p. 103; Ac. do S.T.J., de 22-11-1978, B.M.J., n.° 281, p. 342; Ac. da Relação do Porto, de 16-9-1991, Col. Jur., Ano XVI, 1991, Tomo IV, p. 249; Ac. do S.T.J., de 27-1-1993, CJSTJ, Ano I, 1993, Tomo I, p. 100; Ac. da Relação do Porto, de 19-5-1994, Col. Jur., Ano XIX, 1994, Tomo III, p. 213; Ac. do S.T.J., de 11-5-1995, Col. Jur., Ano III, 1995, Tomo II, p. 75; Ac. da Relação do Porto, de 16-1-1995, Col. Jur., Ano XX, 1995, Tomo I, p. 197; Ac. do S.T.J., de 17-6-1997, Col. Jur., Ano I, Tomo II - 1997, p. 126 e Ac. da Relação do Porto, de 10-7-1997, Col. Jur., Ano XXII, Tomo IV 1997, p. 181.
[28] “Direitos Reais”, 5ª ed., pág. 382.
[29] Processo 0820136, www.dgsi.pt.
[30] Artigo 1251º do Código Civil.
[31] Artigo 1263º, a) do Código Civil.
[32] Artigo 1258º do Código Civil.
[33] Artigo 1297º, a contrario, do Código Civil.
[34] Neste sentido, acórdãos do STJ de 25/02/93, Proc. 82887, da 2.ª secção e de 05/05/2005, Proc. 1078/05, da 7.ª secção.
[35] Acórdãos do STJ, já citados, de 10.11.2005 e de 24.10.2006.
[36] Publicado no DR, II S, de 24/6/96.                  
[37] Pires de Lima/Antunes Varela, “Código Civil anotado”, vol. III, pág. 26; cf. ainda Menezes Cordeiro, “A Posse – Perspectivas Dogmáticas Actuais”, pág. 103, 104
[38] Cfr. artigos 1263.º e seguintes do Código Civil.
[39] Processo nº 225/08.0TBVLC-A.P1, www.dgsi.pt.
[40] Cfr. Alberto dos Reis, “Código de Processo Civil anotado”, vol. II, págs. 263-264.
[41] “Código de Processo Civil anotado”, Coimbra Editora, vol. 2º, 2ª ed., págs. 220, 221.
[42] Artigo 543º, n.º 1, al. b), do Código de Processo Civil.
[43] Cfr. Abrantes Geraldes, “Temas Judiciários”, vol. I, pág. 335.