Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
43/2001.L1-7
Relator: CRISTINA COELHO
Descritores: DANOS FUTUROS
INDEMNIZAÇÃO
HONORÁRIOS
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 03/20/2012
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE PROCEDENTE
Sumário: I - O montante indemnizatório por danos patrimoniais futuros deve ser fixado por recurso à equidade, podendo as várias tabelas utilizadas servir, apenas, como orientadoras e explicativas do juízo utilizado, e como base de partida, em termos de se chegar a um parâmetro, a partir do qual se possa “sintonizar” a indemnização que for julgada mais adequada, intervindo então o juízo de equidade, alterando a quantia encontrada para mais ou para menos, de acordo com os elementos do caso concreto.
II - Só nos casos especiais previstos na lei é que pode atribuir-se indemnização autónoma, à parte vencedora, a título de honorários a pagar ao seu advogado judicial.
(Sumário da Relatora)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam na 7ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa

RELATÓRIO.
A... intentou a presente acção declarativa de condenação com processo ordinário contra B. e C…, Lda., pedindo a condenação dos RR. a pagarem-lhe: a) a título de indemnização para reparação de danos patrimoniais emergentes e futuros, a quantia de Esc. 559.417.930$00 (€ 2.790.364,87); b) a título de indemnização para reparação de danos morais, a quantia de Esc. 3.788.000$00 (€ 18.894,46); c) a quantia que vier a despender com tratamentos de fisioterapia a que ainda se encontra sujeito e que continuará a ser sujeito até data indefinida; d) a quantia que vier a despender com a remuneração de serviços profissionais contratados para a defesa dos seus direitos, designadamente com honorários dos seus mandatários forenses, a liquidar em execução de sentença, mas que se fixam provisoriamente em Esc. 5.000.000$00 (€ 24.939,89); todas as quantias acrescidas de juros de mora a contar da citação e até integral pagamento.
A fundamentar o peticionado, alegou, em síntese:
No dia 8.01.1997, pelas 9.25 horas, na EN 3, o veículo pesado de matrícula QI… (pertencente à 2ª R., conduzido pelo 1º R. ao serviço daquela, e cuja responsabilidade civil se encontrava transferida para a Companhia de Seguros…SA através de contrato de seguro), devido à velocidade a que seguia, embateu com a frente na traseira do veículo pesado de mercadorias de matrícula FX…, que seguia à sua frente e havia abrandado a marcha com intenção de virar à esquerda, projectando-o para a esquerda, invadindo a faixa de rodagem contrária onde foi embater de frente com o veículo de matrícula EZ…, conduzido pelo A. e pertencente à sociedade D…, S.A.
O acidente ficou a dever-se a culpa exclusiva do 1º R.
Na sequência do embate, o A. sofreu lesões corporais graves, foi transportado ao hospital, foi sujeito a várias intervenções cirúrgicas, fez e continua a fazer tratamentos, padecendo fortes dores.
Em consequência das lesões ficou a padecer de IPP, que lhe reduz as suas capacidades diárias e profissionais como advogado.
O A. recebeu da Companhia de Seguros…, S.A. uma parte dos montantes indemnizatórios a que tem direito, atento o limite do capital seguro e a existência de outro lesado (o condutor do veículo FX), tendo-lhe sido paga a quantia de Esc. 61.000.000$00, sendo os RR responsáveis pelo pagamento do remanescente dos montantes indemnizatórios.
Peticiona o ressarcimento dos danos patrimoniais que sofreu pela perda de rendimentos e pelos tratamentos de fisioterapia a que ainda se encontra sujeito e que continuará a ser sujeito até data indefinida, bem como o ressarcimento dos danos morais sofridos.
Citados os RR., apenas a R. contestou, por impugnação, propugnando pela improcedência da acção.
Procedeu-se a audiência preliminar, na qual foi proferido despacho saneador, e seleccionadas matéria de facto assente e base instrutória, que não sofreram reclamações.
A fls. 500, veio o A. reduzir o pedido formulado sob a al. a) para o montante de Esc. 229.074.899$21 (€ 1.142.620,78), tendo em conta rendimentos que não havia ponderado e a incapacidade fixada pelo IML, o qual foi admitido.
Realizou-se audiência de discussão e julgamento, onde foram aditados quesitos à B.I., e se respondeu à mesma.
Apresentadas, por escrito, alegações de direito pelo A., foi proferida sentença que julgou a acção totalmente improcedente e, em consequência, se absolveram os RR. dos pedidos.
Não se conformando com a decisão, dela apelou o A., formulando, no final das respectivas alegações, as seguintes conclusões, que se reproduzem:
4.1 Foram incorrectamente julgados pelo tribunal a quo os pontos vertidos nos quesitos 21.º e 51.º da base instrutória, os quais deveriam ter sido objecto de respostas positivas, razão pela qual o recte. impugna a decisão relativa à matéria de facto.
4.2 A mera leitura da justificação apresentada pelo tribunal a quo à resposta dada ao
quesito 21.º, permite concluir que o próprio tribunal reconheceu ter sido produzida prova da redução dos rendimentos auferidos pelo a. como sócio da sociedade de advogados durante o período em que esteve totalmente incapacitado para trabalhar (e até posteriormente);
4.3 Sendo o recte. advogado e sócio de uma sociedade de advogados, tendo estado totalmente incapacitado para o trabalho durante um ano e encontrando-se o seu período de
trabalho diário substancialmente reduzido, a redução do seu trabalho como advogado tem
de acarretar uma redução dos rendimentos da sociedade;
4.4 Não podia ser exigida às testemunhas do recte. que concretizassem “exactamente em quanto se traduziu essa perda de rendimentos profissional e societária”, não sendo, aliás, objectivo do quesito a aludida concretização;
4.5 Os depoimentos das testemunhas ouvidas confirmaram a redução dos rendimentos do recte. como sócio da sociedade de advogados, nomeadamente os prestados pelas testemunhas MB (depoimento gravado na cassete n.º 2 da sessão de 21.11.2006, lado B, rotações 0001 a 0545) e A.. (depoimento gravado na cassete n.º 5 da sessão de 10.01.2006, lado A, rotações 0150 a 1500, e lado B, rotações 0000 a 0340);
4.6 Também a resposta ao quesito 51.º foi negativa, devendo ter sido positiva, na medida em que, à semelhança do que se referiu a propósito da resposta ao quesito 21.º, existem nos autos meios probatórios que impunham decisão diversa da que foi proferida;
4.7 A este propósito, haverá de ter em conta, entre outros, o já citado depoimento da
testemunha A…, gravado na cassete n.º 5 da sessão de 10.01.2006, lado A, rotações 0150 a 1500;
4.8 Tal depoimento, para além de outros citados pelo próprio tribunal a quo, conjugado com as declarações de rendimentos do a. juntas aos autos a fls. …, confirmam que (1) já antes do acidente o a. dedicava-se à criação de gado cavalar, sendo seu objectivo vender cavalos e lucrar assim com tal actividade (2) esta actividade gerava lucros até 1996, dando sempre prejuízos nos anos seguintes (3) depois do acidente, e necessariamente em resultado das lesões sofridas, o recte. deixou de ter a disponibilidade que tinha anteriormente para se dedicar a tal actividade;
4.9 Mesmo nos casos em que a IPP se não traduz na perda de remuneração efectiva no momento, nem por isso deixa de ser contemplada em termos de danos futuros;
4.10 A incapacidade parcial permanente fixada ao recte. repercutir-se-á na diminuição da condição física, da resistência, da capacidade de certos esforços e correspondente necessidade de um esforço suplementar para obtenção do mesmo resultado, em suma, numa deficiente ou imperfeita capacidade de utilização do corpo no desenvolvimento das actividades humanas em geral e maior penosidade das laborais.
4.11 Porque é impeditiva da tentativa de obter pleno rendimento na sua vida laboral, significando também que a ascensão na carreira profissional do recte. ficou definitivamente afectada, lesando-o no seu bem-estar geral, físico e mental, de forma grave e permanente, tal dano, real e irreversível, deve ser enquadrado na categoria de dano patrimonial futuro.
4.12 A utilização das fórmulas matemáticas ou tabelas financeiras para cálculo das indemnizações devidas aos sinistrados só podia servir para determinar o “minus” indemnizatório, o qual, tinha posteriormente de ser corrigido com vários outros elementos, quer objectivos quer subjectivos, que pudessem conduzir a uma indemnização justa. Ou seja, em termos de danos futuros previsíveis, a equidade tinha (e ainda tem) a palavra decisiva, correctora, ponderando todos os factores atrás enunciados, nos termos do art. 566.º, n.º 3, do cód. cv., devendo o Juiz atender à natureza da responsabilidade (se ela é objectiva, se fundada na mera culpa, na culpa grave ou no dolo), à eventual concorrência de culpas, à situação económica do lesante e do lesado, e, por fim, às indemnizações jurisprudencialmente atribuídas em casos semelhantes.
4.13 Em Acórdão de 04.12.2007, proferido no âmbito do processo n.º 07A3836, o Supremo Tribunal de Justiça veio utilizar uma tabela “acessível a qualquer jurista ou cidadão”, que permite através de operações aritméticas simples, chegar a resultados muito semelhantes na determinação da indemnização da I.P.P. como dano patrimonial futuro, tendo apenas como suporte a aplicação do programa informático Excell à fórmula utilizada pelo mesmo Supremo Tribunal no citado Acórdão de 1994.05.05 “e que foi construída tendo como referência a atribuição de 3% ao factor aí indicado como taxa de juro previsível no médio e longo e prazo, taxa essa que, apesar dos anos, tem vindo a confirmar-se dada a estabilidade do euro”.
4.14 Seguindo a tabela e a fórmula indicadas no Acórdão de 04.12.2007 do Supremo Tribunal de Justiça, o recte. tem direito a receber dos recdos. uma indemnização no valor de, pelo menos, € 746.225,80, havendo que, sobre este montante, aplicar a equidade, por forma a considerar-se todos os factores que a fórmula não contempla, e que se repercutirão em termos de perdas patrimoniais, indicando-se a título exemplificativo:
· o prolongamento da I.P.P. para além da idade de reforma (sendo importante sublinhar não ser forçoso, sobretudo quando se exerce uma profissão liberal, que se deixe de trabalhar depois dos 70 anos);
· o de ela não contemplar a tendência, pelo menos a médio e longo prazo, quanto à melhoria das condições de vida do país e da sociedade e do próprio aumento de produtividade;
· o de não ter em consideração a tendência para o aumento da vida activa para se atingir a reforma nem o aumento da própria longevidade;
· o de não contar com a inflação;
· o de não contemplar as despesas que o próprio lesado terá de suportar por tarefas que, se não fosse o acidente, ele mesmo desempenharia;
· e o facto de todo o cálculo ser feito na base de que o trabalhador/profissional ficaria sempre a auferir aquele salário e que não teria progressão na carreira, ou seja, num completo congelamento da progressão profissional.
4.15 Ao valor indicado em 4.14 antecedente é forçoso subtrair-se a quantia já paga ao recte. pela Companhia de Seguros…, S.A., € 231.955,99, razão pela qual o mesmo tem direito a receber dos recdos. indemnização não inferior a € 514.269,81;
4.16 A valor ainda superior a € 514.269,81 chega-se por aplicação da Portaria n.º 377/2008, de 26 de Maio, correspondente este valor a € 1.248.957,48 (€ 1.480.913,47 - € 231.955,99), valor este, aliás, muito próximo do peticionado pelo a.;
4.17 Assim, deveriam os recdos. ter sido condenados no pagamento da indemnização reclamada pelo recte. nos autos ou, caso se entendesse ser mais adequada a fórmula utilizada pelo Supremo Tribunal de Justiça no citado e recente Acórdão de 04.12.2007, no pagamento da quantia a que se chega por aplicação da mesma fórmula, acima indicada;
4.18 É dado como provado o facto de que o recte. “continua e continuará sujeito a tratamentos de fisioterapia” (cfr. facto provado n.º 62 da sentença), razão pela qual os recdos. deveriam ter sido condenados no pagamento desses mesmos tratamentos;
4.19 O recte. corre o risco de não conseguir locomover-se num futuro breve, se não realizar os tratamentos de fisioterapia referidos no relatório do Instituto de Medicina Legal;
4.20 Para defesa dos direitos que adquiriu em resultado do acidente, o recte. Constituiu mandatários forenses;
4.21 Compreendendo o dever de indemnizar a obrigação de reconstituir a situação que existiria se não fosse o acidente, deverão os recdos. ser condenados no pagamento dos honorários que forem devidos aos referidos mandatários, a liquidar em execução de sentença.
4.22 Para a ponderação da indemnização a atribuir ao recte. por danos não patrimoniais interessa dissecar as consequências do embate.
4.23 No caso sub judice, a colisão frontal de um veículo pesado de mercadorias com o veículo conduzido pelo recte., constitui situação por si só altamente assustadora.
4.24 Na fixação dos danos morais do recte. o tribunal a quo deveria ter considerado a sequência do tratamento hospitalar com internamento e, de modo muito relevante, a gravidade do estado clínico do recte., que obrigou às várias transferências de hospital, a transfusões sanguíneas, a tratamentos de várias especialidades médicas e a inúmeras intervenções cirúrgicas a que foi submetido, os dolorosos tratamentos de fisioterapia descritos no relatório do Instituto de Medicina Legal, a dependência de terceiros para a vida pessoal e doméstica, durante mais de um ano, sofrendo constantes dores que, não obstante a consolidação, verificada decorridos mais de três anos sobre a data do acidente, o acompanharão até ao fim da vida. Aliadas a incómodos e angústias constantes.
4.25 O Instituto Nacional de Medicina Legal fixou o quantum doloris do recte. no grau sexto numa escala de sete graus de gravidade crescente;
4.26 Ainda para fixação de indemnização por danos morais há que ter em conta o dano estético e o prejuízo de afirmação pessoal do recte., fixados no quarto grau daquela  escala.
4.28 O tribunal a quo não considerou o agravamento do estado de saúde do recte. e o aumento das dores que irá sentir à medida que for envelhecendo;
4.29 Devem os recdos. ser condenados no pagamento da indemnização por danos não patrimoniais reclamada nos autos pelo recte.;
4.30 Ao decidir como decidiu, não condenando nos recdos. no pagamento de uma indemnização ao recte. por todos os danos resultantes do acidente dos autos, e ao não atender a todos os danos, patrimoniais e não patrimoniais, sofridos pelo recte., o tribunal a quo violou o disposto nos arts. 8.º, n.º 3, 483.º, 496.º, 562.º, 564.º e 566.º, todos do cód. cv..
Termina pedindo a revogação da sentença recorrida e a sua substituição por outra que julgue procedente a acção.
Os RR. não contra-alegaram.
QUESTÕES A DECIDIR.
Sendo o objecto do recurso balizado pelas conclusões do recorrente (art. 684º, n.º 3 e 690º, n.º 1 do CPC) as questões a decidir são:
a) Reapreciação da decisão sobre a matéria de facto relativamente aos quesitos 21 e 51 da B.I.;
b) da indemnização pela perda de rendimentos;
c) do ressarcimento dos tratamentos de fisioterapia;
d) do pagamento de honorários;
e) da indemnização pelos danos não patrimoniais.

Corridos os vistos, cumpre decidir.
FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO.
O tribunal recorrido considerou provados os seguintes factos:
1. No dia 08/01/1997, pelas 9h25, ao conduzir o veículo pesado de mercadorias de matrícula QI…, o R. J.  embateu na traseira do veículo pesado de mercadorias de matrícula FX …, conduzido por G  (al. A) dos factos assentes).
2. O veículo de matrícula FX … seguia à frente do veículo de matrícula QI … (al. B) dos factos assentes).
3. Os veículos identificados supra circulavam na EN3, no sentido Carregado-Azambuja (al. C) dos factos assentes).
4. Tendo o embate ocorrido sensivelmente ao km 1,6 daquela via (al. D) dos factos assentes).
5. O acidente ficou a dever-se ao facto do condutor do veículo FX abrandar a marcha do seu veículo com intenção de virar à esquerda, manobra que assinalou (al. E) dos factos assentes).
6. E ao facto do R. J.  não ter regulado a velocidade do veículo QI, de modo a fazê-lo parar em condições de segurança, no espaço livre e visível à sua frente (al. F) dos factos assentes).
7. Vindo a embater na traseira daquele outro veículo, projectando-o para a esquerda da estrada (al. G) dos factos assentes).
8. A colisão ocorreu num cruzamento de boa visibilidade (al. H) dos factos assentes).
9. O estado do tempo era bom e o piso estava seco (al. I) dos factos assentes).
10. O veículo pesado de mercadorias de matrícula QI era propriedade da Ré Transportes, Ld.ª (al. J) dos factos assentes).
11. O veículo pesado de mercadorias FX era pertença da sociedade …, com sede no  (al. L) dos factos assentes).
12. O veículo ligeiro de passageiros de matrícula EZ… era pertença da sociedade, com sede na (al. M) dos factos assentes).
13. Em consequência do embate, o veículo conduzido pelo A. ficou totalmente inutilizado (al. N) dos factos assentes).
14. No momento em que entrou no Hospital …, em …, o A. apresentava as seguintes lesões corporais:
• fractura da hemiface esquerda
• ferida incisa do couro cabeludo
• derrame pulmonar esquerdo
• fractura cominutiva da cabeça e do colo umeral esquerdos
• fractura dupla do rádio e cúbito esquerdos
• parésia do nervo radial esquerdo
• fractura cominutiva explosiva supra e intercondiliana, exposta do fémur esquerdo
• fractura dos pratos tibiais esquerdos sem diastese
• fractura cominutiva explosiva bituberositária proximal da líbia direita
• fractura do colo do perónio direito com luxação tibio-peroneal proximal
• fractura-luxação de Lisfranc, fractura do escafoide, fractura do cuboide, fractura de 2° cuneiforme, no pé direito
• fractura-luxação de Lisfranc, fractura do 1º e 2° cuneiformes, fractura da base do 1° e 2° metatársicos, fractura do colo dos 22°, 3° e 4º metatársicos, no pé esquerdo.
(documentos de fls. 2, 3 e 4 que aqui se dão por integralmente reproduzidos) (al. O) dos factos assentes).
15. O A. foi submetido a transfusões sanguíneas, tratamentos de várias especialidades médicas, intervenções cirúrgicas (documentos de fls. 24 e seguintes, que aqui se dão por integralmente reproduzidos) (al. P) dos factos assentes).
16. Foi operado de urgência no Hospital …, em …, para estabilização provisória da fractura do fémur esquerdo, redução e osteossíntese das fracturas dos pés e imobilização gessada provisória das restantes fracturas (documentos de fls. 24 e seguintes, que aqui se dão por integralmente reproduzidos) (al. Q) dos factos assentes).
17. Decorridos 2 dias, o A. foi transferido para o Hospital …, em … (al. R) dos factos assentes).
18. Tendo sido conseguida a estabilização do seu estado geral, o A. foi de novo operado em 16.01.97 para:
• osteossíntese da fractura do rádio esquerdo e do cúbito esquerdo
• osteossíntese da fractura bituberositária proximal da tíbia direita (al. S) dos factos assentes.
19. Em 24.01.97, seguiu-se novo acto cirúrgico para:
• redução e osteossíntese da fractura da face
• redução e osteossíntese da fractura do fémur esquerdo com placa D.C.S.
• extracção de enxerto cortiço-esponjoso do ilíaco direito que se aplicou na fractura do fémur esquerdo
• osteossíntese da fractura dos pratos tibiais esquerdos com parafuso de esponjosa canulado (al. T) dos factos assentes).
20. O A. foi transferido para residência de familiares no decorrer do mês de Fevereiro, onde permaneceu durante um ano (al. U) dos factos assentes).
21. Desde a data da transferência para residência de familiares e durante um período de dois meses, o A. teve de permanecer na cama e sentado em cadeira de rodas, por não lhe ser possível qualquer tipo de carga (al. V) dos factos assentes).
22. Foi, por esse motivo, indispensável o apoio de enfermagem diária permanente (al. X) dos factos assentes).
23. O A. teve de iniciar de imediato fisioterapia intensiva no domicilio, que se prolongou até iniciar carga parcial (al. Z) dos factos assentes).
24. Só posteriormente foi possível ao A. passar para um gabinete de fisioterapia onde pôde também seguir hidrocinesiterapia (al. AA) dos factos assentes).
25. Os tratamentos de fisioterapia a que o A. foi sujeito incluíam:
• mobilização articular passiva
• técnicas especiais de cinésioterapia
• reeducação motora
• fortalecimento muscular geral
• treino em AVD
• treino de equilíbrio e marcha
• massagem de mais de um membro ou geral
• mobilização articular assistida (al. BB) dos factos assentes).
26. A 14 de Fevereiro de 1998, o A. apresentava as seguintes lesões:
• rigidez do ombro esquerdo com importantes limitações na abdução e rotações
• limitação da supinação do punho esquerdo
• rigidez do joelho direito com flexão limitada a cerca de 100%
• rigidez do joelho esquerdo com flexão ligeiramente acima dos 100%
• rigidez das articulações de ambos os pés
• atrofia muscular marcada da escápula esquerda e de ambas as coxas
(documento de fls. 34 que aqui se dá por integralmente reproduzido) (al. CC) dos factos assentes).
27. A partir de 25.06.1997, até data ainda indeterminada, os tratamentos de fisioterapia passaram a ser:
• hidrocinesioterapia
• hidromassagem manual
• mobilização articular manual
• técnicas especiais de cinésioterapia
• reeducação motora
• reeducação mecânica
• EDIT
• fortalecimento muscular de mais de um membro ou geral
• treino com AVD
• treino de equilíbrio e marcha
• massagem manual de um membro ou geral
• pressões alternativas
• tanque de marcha
(documentos de fls. 32 e 33 que aqui se dão por integralmente reproduzidos) (al. DD) dos factos assentes).
28. Em 17.05.00, o A. foi novamente operado para, sob anestesia epidural, se removerem os implantes introduzidos nas operações a que fora submetido (al. EE) dos factos assentes).
29. Tendo ficado sujeito a internamento hospitalar até 20.05.00 (al. FF) dos factos assentes).
30. Em resultado das lesões sofridas no embate, o A. sofreu uma incapacidade total para o exercício da sua profissão durante 6 meses (al. GG) dos factos assentes).
31. O A. é advogado (al. HH) dos factos assentes).
32. A responsabilidade civil por danos causados a terceiros pelo veículo pesado QI foi transferida pela Ré C…, Ld.ª para a «Companhia de Seguros…, SA» sociedade com sede no (al. II) dos factos assentes).
33. O A. recebeu da mesma companhia de seguros, para ressarcimento de danos patrimoniais o montante de 46.503.000$00 e de 8.285.000$00 e, para ressarcimento de danos não patrimoniais, o montante de 6.212.000$00 (al. JJ) dos factos assentes).
34. O A. nasceu a 10.04.1951 (documento de fls. 46 que aqui se dá por integralmente reproduzido) (al. LL) dos factos assentes).
35. Na sequência do embate e projecção referidos em 7. (G), o veículo FX colidiu frontalmente com o EZ, conduzido pelo A. (resposta ao quesito 1º).
36. O A. circulava na sua via, no sentido Azambuja-Carregado e a velocidade permitida no local (resposta ao quesito 2º).
37. Ao ser embatido, sentiu medo e angústia, ficando em estado de choque (resposta ao quesito 3º).
38. O A. teve incómodos com o transporte em ambulância para o Hospital …, em …, para onde foi imediatamente conduzido (resposta ao quesito 4º).
39. Quando deu entrada no Hospital …, mantinha-se consciente (resposta ao quesito 5º).
40. Com todas as lesões sofreu fortes dores (resposta ao quesito 6º).
41. Em resultado dos tratamentos e intervenções cirúrgicas sofreu grandes dores e desconforto (resposta ao quesito 7º).
42. Um ano após o acidente, o A. deslocava-se com dificuldade e com o auxílio de canadianas (resposta ao quesito 8º).
43. A 31 de Janeiro de 2001, o A. mantinha as seguintes sequelas das lesões sofridas:
- cicatrizes na face, membro superior esquerdo, membro inferior esquerdo, membro inferior direito e no tronco;
- infradesnivelamento do ombro esquerdo;
- atrofia muscular moderada da cintura escapular;
- limitação das articulações do ombro esquerdo;
- limitação dos movimentos do punho esquerdo;
- báscula superior da bacia para a esquerda;
- limitação dos movimentos de ambos os joelhos mais acentuada à direita;
- ligeira limitação dos movimentos da articulação tíbio-társica direita;
- limitação dos movimentos dos 2º, 3º e 4º dedos do pé direito;
- encurtamento clínico de 1 cm do membro inferior esquerdo;
- atrofia muscular de cerca de 3 cms da coxa direita (resposta ao quesito 9º).
44. Sofrendo de uma I.P.P. correspondente a 58,4% (resposta ao quesito 10º).
45. O A. vê reduzidas as suas actividades diárias usuais e profissionais, devido à dificuldade em utilizar o membro superior esquerdo e em subir e descer escadas, para além da evidente claudicação resultante, entre outros motivos, de um padrão de apoio não funcional do pé direito (resposta ao quesito 11º).
46. O facto de se encontrarem limitadas várias articulações do A., gera-lhe dor, especialmente acentuada durante os tratamentos de fisioterapia (resposta ao quesito 12º).
47. E dificuldade no início de cada movimento após posições mantidas (resposta ao quesito 13º).
48. O A. sentiu-se diminuído na sua capacidade física e moral (resposta ao quesito 14º).
49. A sua resistência física ficou debilitada (resposta ao quesito 15º).
50. Durante o período de seis meses supra referido, o A. teve de cancelar todos os seus compromissos profissionais anteriormente assumidos (resposta ao quesito 16º).
51. Cancelando várias reuniões e almoços de negócios (resposta ao quesito 17º).
52. Foram substabelecidos poderes forenses de que o ora A. era titular para acompanhamento, por colegas seus, de inúmeras diligências judiciais a que era forçado faltar (resposta ao quesito 18º).
53. Delegou os poderes de administração na sociedade de advogados de que é sócio (resposta ao quesito 19º).
54. Durante o período em que esteve totalmente incapacitado para trabalhar, o A. deixou de auferir os rendimentos que auferiria do desempenho do seu trabalho como advogado (resposta ao quesito 20º).
55. O A. teve de prosseguir com fisioterapia que continuou, pelo menos, até à data de propositura da presente acção, e que lhe ocupa 4 a 5 horas diárias (resposta ao quesito 22º).
56. Reduzindo-lhe o seu período de trabalho diário (resposta ao quesito 23º).
57. Acarretando-lhe, também, redução nos seus rendimentos (resposta ao quesito 24º).
58. Do acidente dos autos resultaram ferimentos graves para G, condutor do veículo FX e ferimentos ligeiros no ocupante do veículo conduzido pelo A. (resposta ao quesito 25º).
59. Lesões que a companhia de seguros também indemnizou até ao limite do capital do seguro (resposta ao quesito 26º).
60. A Ré Transportes, Ld.ª é dona do veículo QI (resposta ao quesito 27º).
61. O R. J conduzia no exercício das suas funções de motorista, às ordens e por conta daquela (resposta ao quesito 28º).
62. O A. continua e continuará sujeito a tratamentos de fisioterapia (resposta ao quesito 30º).
63. Actualmente, o Autor mostra-se afectado de uma I.P.P. (Incapacidade Parcial Permanente) de 55%, incapacidade essa que é compatível com a sua actividade profissional de advogado, embora lhe exija grandes esforços acrescidos para o seu desempenho (respostas aos quesitos 34º e 35º).
64. Cerca de um ano depois do acidente, o Autor passou a exercer a sua actividade profissional, com as limitações referenciadas em 63 (resposta ao quesito 36º).
65. Decorrido esse período, o Autor passou a intervir em alguns julgamentos e em algumas reuniões de negócios, voltando também a atender clientes, mas sempre nas circunstâncias referenciadas em 63 (respostas aos quesitos 37º, 38º e 39º).
66. De acordo com as respectivas declarações tributárias de I.R.S., os rendimentos líquidos do Autor resultantes quer do seu trabalho como advogado, quer da sua participação nos lucros da sociedade de advogados de que é sócio, foram os seguintes, e nos seguintes anos:
- ano 1996: 20.827.846$00;
- ano 1997: 21.947.350$00;
- ano 1998: 9.174.278$00;
- ano 1999: 22.880.132$00;
- ano 2000: 21.133.535$00, sendo que no ano de 1997, o rendimento referenciado engloba também cobranças de serviços de advocacia prestados no ano de 1996 (respostas aos quesitos 44º e 45º).
67. Na indemnização paga pela Companhia de Seguros…SA ao Autor na sequência do acidente dos autos, foram consideradas as seguintes verbas:
- danos patrimoniais futuros: 46.503.000$00,
- danos patrimoniais emergentes (rendimentos): 8.285.000$00,
- e danos não patrimoniais: 6.212.000$00, verbas estas aceites pelo Autor com a consignação, exarada no respectivo recibo de quitação (junto a fls. 45), do seguinte: “os montantes indemnizatórios recebidos correspondem a uma parte daqueles que tem direito e que reclamará directamente do segurado e condutor em virtude da absorção do capital contratual” (resposta ao quesito 46º).
68. O rendimento referido no ponto 66 (correspondente à resposta aos quesitos 44º e 45º) inclui também a actividade de criação de cavalos, à qual o Autor também se dedicava à data dos factos (50º).

FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO.
Alegando erro na apreciação da prova produzida, pretende o recorrente a sua reapreciação, nomeadamente no que respeita aos quesitos 21 e 51 da BI.
Tendo o recorrente cumprido o estatuído no art. 690º-A do CPC e tendo a prova testemunhal produzida sido gravada, teria esta Relação a possibilidade para proceder, se fosse caso disso, à alteração factual requerida, nos termos do art. 712º do CPC.
Contudo, afigura-se-nos não ser de proceder à reapreciação requerida.
Vejamos.
Na sequência do perguntado no quesito 20 da B.I. (“Durante o período em que esteve totalmente incapacitado para trabalhar [1] (o A.) perdeu a totalidade dos rendimentos que auferia como advogado ?”), perguntava-se no subsequente quesito 21 se “nesse mesmo período viu igualmente reduzidos os rendimentos que teria auferido como sócio da sociedade de advogados” (sublinhados nossos).
O tribunal recorrido deu o referido quesito como “não provado” [2], pretendendo o apelante que a resposta seja alterada para “provado”, quer pelo que resulta da própria fundamentação da resposta dada ao quesito, quer pela confirmação sem reservas do facto constante do quesito 20º, quer do que resulta do depoimento das testemunhas MB e A.
Salvo o devido respeito por opinião contrária, a questão em análise mostra-se irrelevante para a apreciação do mérito do recurso.
Se atentarmos na P.I., o A. peticionava a título de indemnização para reparação de danos patrimoniais emergentes e futuros a quantia de Esc. 559.417.930$00, que correspondia ao montante de Esc. 614.205.930$00 dos invocados danos patrimoniais sofridos, menos o montante de Esc. 54.788.000$00 pago pela companhia de seguros a título de “danos patrimoniais futuros e danos patrimoniais emergentes (rendimentos)”.
E o montante de Esc. 614.205.930$00 mostrava-se concretizado por referência à carta enviada para a companhia de seguros onde se peticionava a referida indemnização, que se dizia baseada nos “seguintes pressupostos: - idade à data do sinistro – 46 anos, desvalorização – 58,4%; rendimento líquido em 1996 – 32.064.678$00; rendimento absorvido em custos da sociedade de advogados – 32.064.678$00; rendimentos perdidos no período de incapacidade a 100% (6 meses) – 13.338.906$00” – cfr. fls. 49.
É na sequência do alegado na P.I. e pedido formulado que se fazem constar da B.I. o mencionado quesito.
Aquando da redução do pedido do montante de Esc. 559.417.930$00 para o montante de Esc. 229.074.899$21 (€ 1.141.620,78), respeitante aos danos patrimoniais sofridos, o A. baseou o novo montante do pedido apenas no cálculo do valor da indemnização a receber por virtude da IPP de que ficou afectado [3], esclarecendo, expressamente, que no novo montante peticionado “não considerou, como podia, quaisquer períodos passados de Incapacidade Temporária Geral e Profissional Absoluta ou Parcial acima de 55%, …”, prescindindo, pois, da indemnização que havia peticionado a outros títulos, nomeadamente a respeitante aos rendimentos que deixou de auferir nos 6 meses de incapacidade absoluta que sofreu imediatamente após o acidente [4].
E a sentença recorrida apenas apreciou a questão da fixação de uma indemnização para compensação de danos futuros resultantes da IPP de que o A. ficou afectado.
E no presente recurso, o apelante questiona o montante que o tribunal de 1ª instância entendeu fixar a tal título.
Assim, nesta matéria, o que está em causa são os danos patrimoniais futuros, tendo em conta a IPP de que o A. ficou a padecer, como melhor se esclarecerá adiante.
O quesito cuja reapreciação se requer reporta-se, apenas, ao período de 6 meses posterior à data do acidente, sendo irrelevante para a fixação daquela indemnização, atento o que se deixa dito.
Assim, perfilhando-se o entendimento seguido no Ac. desta Relação de 21.06.2007, P. 5629/2007-8, rel. Desemb. Salazar Casanova, in www.dgsi.pt, não se justifica a reapreciação requerida nesta matéria.
No que ao quesito 51 respeita, perguntava-se no mesmo se “em resultado do acidente em causa dos autos o A. viu reduzida também a sua capacidade de desenvolver essa actividade [5] e assim os rendimentos da mesma”.
O tribunal recorrido deu o referido quesito como “não provado”, pretendendo o apelante que a resposta seja alterada para “provado”, com base no depoimento da testemunha A..., para além do depoimento das outras testemunhas referidas pelo próprio tribunal recorrido na fundamentação da resposta dada a este quesito.
Mais uma vez se nos afigura que a reapreciação requerida é irrelevante para a decisão de mérito, tendo em conta que no montante indemnizatório a fixar a título de danos futuros [6] se parte dos rendimentos resultantes das declarações de IRS do A., dadas como provadas sob o nº 66 da fundamentação de facto supra (que reproduz a resposta dada aos quesitos 44 e 45 da B.I., que o apelante não impugnou), e nos quais se inclui, também, a actividade de criação de cavalos (resposta ao quesito 50), e sendo certo que, nesta matéria, o A. não formulou qualquer pedido autónomo relativo a perda de rendimentos [7].
Assim sendo, na esteira da posição sufragada no mencionado acórdão, também nesta matéria não se justifica a reapreciação requerida.
Passemos, pois, à apreciação de mérito da apelação.
Da indemnização pela perda de ganho.
O tribunal recorrido entendeu que, embora o grau de incapacidade de que o A. ficou afectado não se traduza em perda de rendimento, deve o A. ser compensado dos danos futuros resultantes da maior dificuldade e grandes esforços suplementares que lhe são impostos para exercer a sua profissão.
E para calcular o montante indemnizatório a tal título seguiu o seguinte raciocínio: “sabendo-se que o rendimento anual do A. no ano anterior à ocorrência do acidente (1996) é de Esc. 20.827.846$00, a diminuição física de 55% equivale à perda anual de 11.455.315$00. Considerando tal perda anual de Esc. 11.455.315$00 na capacidade de ganho do Autor e o seu tempo de vida activa de 20 anos, para lhe dar este rendimento anual seria necessário um capital de Esc. 229.106.300$00. Importa fazer intervir neste momento a equidade para evitar que o lesado enriqueça injustamente à custa do lesante, uma vez que tal montante, correspondente à perda de capacidade de ganho, reporta-se a toda a vida activa do lesado e será recebido por este de uma só vez (em vez de receber uma parcela por ano de tal montante), que poderá investi-lo e rentabilizá-lo. Ora, tendo em conta que o grau de incapacidade de que o A. ficou afectado não se traduziu em perda de rendimento (à excepção do valor supra mencionado não auferido no ano de 1998), continuando, pois, a trabalhar como advogado sem perda de rendimento (embora a sua incapacidade parcial deva ser compensada), a inexistência de correspectividade entre o grau de incapacidade do A. e o esforço que precisa de fazer para obter rendimentos, e a sua idade à data do acidente – 45 anos -, considera-se equitativo reduzir a 1/5 o valor de Esc. 229.106.300$00, obtendo-se o valor de Esc. 45.821.260$00 (ou € 228.555,48)”.
Questiona o apelante as premissas sobre que assentou tal raciocínio, e seguindo de perto o raciocínio sustentado no Ac. do STJ de 4.12.2007, P. 07A3836, rel. Cons. Mário Cruz, in www.dgsi.pt para a fixação da indemnização compensatória por danos patrimoniais futuros, sustenta que a indemnização deverá ser fixada no montante por si reclamado (€ 1.142.620,78) - valor próximo daquele a que se chegaria por aplicação da Portaria nº 377/2008 de 26.05 -, ou, pelo menos, no montante calculado pela aplicação da fórmula referida naquele acórdão.
Dispõe o art. 562º do CC que “quem estiver obrigado a reparar um dano deve reconstituir a situação que existiria, se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação”.
Por seu turno, o art. 563º do mesmo diploma legal estatui que “a obrigação de indemnização só existe em relação aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão”.
E o art. 564º do CC estabelece que “1. O dever de indemnizar compreende não só o prejuízo causado, como os benefícios que o lesado deixou de obter em consequência da lesão. 2. Na fixação da indemnização pode o tribunal atender aos danos futuros, desde que sejam previsíveis; se não forem determináveis, a fixação da indemnização correspondente será remetida para decisão ulterior”.
A indemnização em dinheiro tem como medida a diferença entre a situação patrimonial do lesado na data mais recente que puder ser atendida pelo tribunal e a que ele teria então se não tivesse ocorrido o dano, e, não podendo ser determinado o seu valor exacto, o tribunal julgará equitativamente dentro dos limites que tiver por provados (art. 566º do CC).
 Em consequência das lesões que sofreu no acidente, o A. ficou afectado de uma IPP de 55% - mais correctamente, o A. ficou afectado de um Incapacidade Geral Permanente Parcial fixável em 55% [8]-, incapacidade que é compatível com a sua actividade profissional de advogado, embora lhe exija grandes esforços acrescidos para o seu desempenho.
Como escreve o Cons. Salvador da Costa no Ac. do STJ de 10.05.07, P. 07B1341, in www. dgsi. pt, “a incapacidade permanente é, além do mais, susceptível de afectar e diminuir a potencialidade de ganho por via da perda ou diminuição da remuneração ou da implicação para o lesado de um esforço acrescido para manter os mesmos níveis de ganho ou para exercer as tarefas e actividades gerais quotidianas. No primeiro caso, procurando atingir a justiça do caso, têm os tribunais vindo a acolher a solução de a indemnização do lesado por danos futuros dever representar um capital que se extinga ao fim da sua vida activa e seja susceptível de lhe garantir, durante ela, as prestações periódicas correspondentes à sua perda de ganho. ... Mas na segunda das supra citadas hipóteses, em que a afectação da pessoa do ponto de vista funcional não se traduz em perda de rendimento de trabalho, deve todavia relevar o designado dano biológico, porque determinante de consequências negativas a nível da actividade geral do lesado. O referido dano biológico, de cariz patrimonial, justifica, com efeito, a indemnização, para além da valoração que se imponha a título de dano não patrimonial...”.
Este, aliás, vem sendo o entendimento dominante da jurisprudência do STJ [9].
Como se escreveu no Ac. da RP de 04.04.06, P. 0620599, Rel. Desemb. Henrique Araújo, in www.dgsi.pt “a incapacidade permanente geral (IPG) corresponde a um estado deficitário de natureza anatómico-funcional ou psicosensorial, com carácter definitivo e com impacto nos gestos e movimentos próprios da vida corrente, comuns a todas as pessoas, influenciando, por conseguinte, as actividades familiares, sociais, de lazer e desportivas. Pode ser valorada em diversos graus ou percentagens, tendo como padrão máximo o índice 100, que equivale à integridade psicossomática plena. Esse prejuízo funcional pode, porém, projectar-se na profissão do sinistrado, como acontece, de resto, na grande maioria dos casos. Aí, o défice funcional tem um reflexo directo na capacidade profissional originando uma concreta perda de capacidade de ganho”.
Da análise dos vários acórdãos dos tribunais superiores que se têm debruçado sobre esta matéria, verifica-se que vem sendo maioritariamente aceite que na indemnização por danos patrimoniais futuros haverá sempre que ponderar a incapacidade permanente geral de que o lesado ficou a padecer.
Mas essa IPG não se repercute sempre da mesma maneira no montante indemnizatório, porque as repercussões dessa IPG não são sempre iguais.
Efectivamente, umas vezes a IPG de que o lesado ficou afectado, não tem qualquer reflexo na actividade profissional daquele, mas nem por isso deixa de ter relevância e ser ponderada como limitação funcional para a vida normal; noutros casos, a IPG de que o lesado ficou a padecer, não o impede de exercer a sua profissão habitual, mas exige-lhe um esforço acrescido para a executar e obter os mesmos resultados; noutros casos, ainda, a IPG interfere com o exercício da profissão, impedindo-o de a exercer, com ou sem perda de rendimentos [10].
No caso sub judice, não estamos perante uma situação de incapacidade para o trabalho em geral, nem para o exercício pelo A. da sua profissão habitual, do que se trata é de uma incapacidade funcional geral, com repercussões na sua actividade profissional na medida em que lhe vai exigir maior esforço do que aquele que lhe seria exigido se não fosse essa incapacidade.
No caso, o dano patrimonial não se reconduz, apenas, à perda funcional geral, determinante de um dano biológico, mas também à perda efectiva de capacidade de ganho, pelo esforço físico acrescido requerido para obter os mesmos rendimentos.
Como se escreveu no Ac. do STJ de 09.07.1998, P. 52/98-2, in Sumários dos Acórdãos, n.º 23, pág. 52, “uma incapacidade permanente parcial reflecte-se de duas formas no património do lesado: ou provoca uma diminuição efectiva de remuneração porque o lesado produz menos e, por via disso, recebe menos; ou não há qualquer diminuição sensível da remuneração do lesado, mas este tem de efectuar um esforço sobrecarregado para manter os mesmos níveis de produtividade que tinha antes da lesão. No primeiro caso há uma diminuição visível e palpável de proventos; no segundo caso um desgaste anormal do lesado como ser produtivo que, no futuro, se irá reflectir na sua condição de máquina produtiva. (...) De qualquer modo (...) sempre danos patrimoniais efectivos que nada têm a ver com o dano moral que a incapacidade permanente também provoca”.
A questão coloca-se na forma de calcular o montante indemnizatório.
Embora todos os acórdãos, na fixação do montante indemnizatório, ponderem determinados factores – o montante dos rendimentos auferidos pelo lesado à data do acidente, o termo da vida activa e da própria vida, tendo em conta os parâmetros de normalidade, o grau de incapacidade, os dispêndios com necessidades próprias, a depreciação da moeda, a taxa de rendimento do capital, o recebimento de uma só vez do valor indemnizatório, etc. – o que é um facto é que nem todos utilizam, depois, os mesmos métodos de cálculo, recorrendo uns a fórmulas matemáticas, mais ou menos complexas, atendendo outros a métodos mais simplificados, convergindo todos no sentido de que a indemnização deve representar um capital que se extinga no fim da vida do lesado, susceptível de garantir um rendimento compensatório durante aquela.
Certo é, porém, que o montante indemnizatório deve ser fixado por recurso à equidade, podendo as várias tabelas utilizadas servir, apenas, como orientadoras e explicativas do juízo utilizado, e como base de partida [11].
A partir dos elementos de facto, por reporte às fórmulas matemáticas de cálculo de cariz instrumental (meramente orientadoras), deve calcular-se o montante da indemnização em termos de equidade, no quadro de juízos de verosimilhança e de probabilidade, tendo em conta o curso normal das coisas e as particulares circunstâncias do caso.
No caso sub judice, o tribunal recorrido, partiu do montante que corresponderia à perda anual de rendimento atenta a desvalorização física sofrida, tendo depois reduzido o montante apurado a 1/5, por não haver perda efectiva de rendimento.
Não podemos sufragar inteiramente este raciocínio, por se nos afigurar que o mesmo não pondera integralmente todos os elementos de facto constantes dos autos, sendo certo que, no caso concreto, a perda de capacidade de ganho implicará, de certa forma, a perda de rendimentos, atenta a actividade profissional exercida pelo A., por conta própria, e as sequelas de que ficou a padecer [12], pelo que, seguindo o método de cálculo referido, nunca seria de reduzir o capital apurado a apenas 1/5 como o fez o tribunal recorrido, mas a um valor entre 1/5 e 2/5.
A conclusão semelhante se chegará se se partir da fórmula de cálculo proposta no Ac. do STJ de 4.12.2007, P. 07A3836, rel. Cons. Mário Cruz, in www.dgsi.pt a que faz referência o apelante [13], e que, igualmente nos tem servido de base de partida, entendendo-se, porém, e ao contrário do sufragado no referido acórdão, que o valor a que se chega pelos referidos cálculos não é um minus indemnizatório mas uma base de trabalho com vista a “tentar encontrar um menor múltiplo comum, isto é, um factor que seja mais ou menos constante para a determinação da indemnização, em termos de se chegar a um parâmetro, a partir do qual se possa “sintonizar”  a indemnização que for julgada mais adequada, intervindo então o juízo de equidade, alterando a quantia encontrada para mais ou para menos, de acordo com factores de ordem subjectiva, como a idade, a progressão na carreira, etc.” (Cons. José de Sousa Dinis, “Dano Corporal em Acidentes de Viação” in CJASTJ, Tomo I – 2001, pág. 9).
Haverá, assim, que ponderar: as lesões sofridas e o grau de incapacidade permanente geral fixada (55%); a idade do A. (que tinha 45 anos à data do acidente); a profissão exercida; a maior penosidade no exercício dessa profissão, na proporção do grau de incapacidade atribuído, presumindo o desenrolar da vida profissional até aos 65 anos.
E não deve, apenas, atender-se ao limite da vida activa, uma vez que, atingido este, isso não significa que a pessoa não continue a trabalhar ou a viver por muitos anos, sendo a perspectiva de vida média dos homens de 74 / 75 anos.
            Pondera-se, também, o facto do valor indemnizatório ser recebido de uma só vez.
Assim, ponderadas as circunstâncias do caso [14], afigura-se-nos equilibrado e justo, por mais conforme à equidade e justiça do caso concreto,  fixar o montante da indemnização pelos danos patrimoniais futuros em € 400.000,00 [15], ao qual haverá de abater o montante já pago pela seguradora (€ 273.281,39), estando os RR. obrigados a pagar ao A. o remanescente - € 126.718,61.
Procede, pois, em parte a apelação no que a esta matéria respeita.
Do ressarcimento dos tratamentos de fisioterapia.
Pediu o A. que os RR. fossem condenados a pagarem-lhe a quantia que vier a despender com tratamentos de fisioterapia a que ainda se encontra sujeito e que continuará a ser sujeito até data indefinida, a liquidar em execução de sentença.
Sobre esta matéria entendeu a sentença recorrida que “Quanto ao pedido de condenação dos RR.  a pagar ao A. a quantia que este vier a despender com tratamentos de fisioterapia a que ainda se encontra sujeito e a que continuará sujeito até data indefinida, a liquidar em execução de sentença, cumpre referir que não resultou provado que o A. necessite de realizar tais tratamentos, mencionando-se apenas no relatório pericial a fls. 447, em resposta ao quesito 10º “o A. teve de prosseguir tratamento de fisioterapia até à data de 31/01/2001?”, que “segundo informação clínica até meio de 2001”, e, em resposta ao quesito 11º “e posteriormente até à actualidade?”, que “é aconselhável efectuar tratamentos de fisioterapia para manter a sua actual condição física”. Assim, não resultando demonstrado que o A. necessite actualmente e por tempo indeterminado de realizar tratamentos de fisioterapia em consequência das lesões físicas que sofreu, sendo apenas aconselhável que os realize para manter a sua actual condição física, afigura-se-nos que tais eventuais danos não podem ser imputados à conduta ilícita do lesante (não se verifica o nexo causal entre os eventuais tratamentos de fisioterapia e as lesões físicas que sofreu em consequência da conduta ilícita do 1º Réu) e que, como tal, não existe fundamento legal para condenar os RR. no presente pedido, termos em que se julga o mesmo improcedente”.
Insurge-se o apelante contra o decidido, sustentando que se se atentar na factualidade dada como provada sob os pontos 43, 44, 55, 62 e 63 da fundamentação de facto e no que consta do relatório do INML de fls. 439 a 441, conclui-se que a expressão “manter a sua condição física” utilizada no relatório significa que o apelante corre o risco de não conseguir locomover-se se não realizar os referidos tratamentos, pelo que deveria o tribunal recorrido ter condenado os RR. nos termos requeridos.
Afigura-se-nos que assiste razão ao apelante.
Da factualidade provada resulta que o A., em 31.01.2001, sofria de várias sequelas resultantes das lesões sofridas, nomeadamente as atrofias musculares e limitações descritas no ponto 43 da fundamentação de facto supra, resultando do relatório do INML, elaborado em 30.11.2005, que à data do exame o A. apresentava as mesmas sequelas (cfr. fls.434 e 444), tendo-lhe sido atribuída uma IPG de 55%.
Mais resultou provado que:
- o A. vê reduzidas as suas actividades diárias usuais e profissionais, devido à dificuldade em utilizar o membro superior esquerdo e em subir e descer escadas, para além da evidente claudicação resultante, entre outros motivos, de um padrão de apoio não funcional do pé direito (ponto 45 da fundamentação de facto);
- o facto de se encontrarem limitadas várias articulações do A., gera-lhe dor, especialmente acentuada durante os tratamentos de fisioterapia, e dificuldade no início de cada movimento após posições mantidas (factos 46 e 47 da fundamentação de facto);
- a sua resistência física ficou debilitada (facto 49 da fundamentação de facto);
- o A. teve de prosseguir com fisioterapia que continuou, pelo menos, até à data de propositura da presente acção (ou seja, 31.01.2001), e que lhe ocupa 4 a 5 horas diárias (facto 55 da fundamentação de facto);
- o A. continua e continuará sujeito a tratamentos de fisioterapia.
As sequelas sofridas, o grau de IPG fixado, e as dificuldades que o A. apresenta, deixam já intuir que ao dar-se como provado que o A. continua e continuará sujeito a tratamentos de fisioterapia, se aponta no sentido de que tais tratamentos são necessários, essenciais, e não apenas aconselháveis.
É certo que na resposta ao quesito 11º que lhe foi formulado [16] a Sra. Perita Médica escreveu que “é aconselhável efectuar tratamentos de fisioterapia para manter a sua actual condição física”, mas para plena interpretação do que escreveu, necessário se torna atentar no que a mesma escreveu na “discussão”.
A fls. 444 e 445 dos autos (fls. 15 e 16 do relatório), depois de descrever as sequelas que o A. apresenta no exame que lhe faz (e já supra referidas), escreve que “as sequelas resultantes do acidente de viação, a nível das articulações dos joelhos e da tíbio-társica direita, irão, seguramente, sofrer um agravamento da sua situação actual, agravamento este habitual e previsível com o decorrer do tempo conduzirá ao agravamento das alterações degenerativas até à artrose, com repercussão não só na função articular como no agravamento das queixas álgicas. Pelo anteriormente referido justifica-se que periodicamente e ciclicamente o sinistrado tenha necessidade de efectuar tratamentos de fisioterapia e o recurso a analgésicos” (sublinhado nosso) [17].
Assim, ao contrário do referido pelo tribunal recorrido, resulta dos autos que o A. necessita, actualmente [18] e por tempo indeterminado, de realizar tratamentos de fisioterapia em consequência das lesões físicas que sofreu, sendo, inquestionavelmente, tais danos imputáveis à conduta ilícita do lesante, pelo que deverão os RR. ser condenados no peticionado, procedendo, nesta parte, a apelação.
Do pagamento de honorários a mandatário forense.
Pediu o A. a condenação dos RR. a pagarem-lhe a quantia que viesse a despender com a remuneração de serviços profissionais contratados para a defesa dos seus direitos, designadamente com honorários dos seus mandatários forenses, a liquidar em execução de sentença, mas que fixou, provisoriamente, em Esc. 5.000.000$00 (€ 24.939,89).
O tribunal recorrido julgou improcedente tal pedido, desde logo, porque improcederam os pedidos formulados pelo A. [19], e, em todo o caso por entender que “o regime de pagamento das despesas com honorários a advogado que move e/ou acompanha uma acção judicial tem um regime específico bem afastado do geral da responsabilidade civil no que à parte contrária respeita. Pensando na especificidade da situação, o legislador criou a figura da procuradoria, destinando-se a mesma a reembolsar o vencedor do dispêndio com o mandato judicial. Depois, veio consignar que a procuradoria tinha destino, em alguma parte, alheio a este (cfr. art.ºs 40.º e 95.º do Código das Custas Judiciais). Mas, apesar de certa adulteração dessa finalidade da procuradoria, não deve entender-se que reverteu para o regime geral esta questão dos honorários ao mandatário judicial da parte contrária.   Já em 28/03/1930, o S.T.J. lavrou o seguinte Assento (transcrito na Colecção Oficial dos Acórdãos Doutrinais do Supremo Tribunal de Justiça, vol. XXVIII, 74): “Na indemnização por perdas e danos em que as partes vencidas sejam condenadas não podem ser incluídos os honorários dos advogados das partes vencedoras, salvo estipulação expressa em contrário”.        Posteriormente, manteve-se sempre em vigor, com ligeiríssimas alterações, o art.º 454.º do Código de Processo Civil, no qual se consigna que os mandatários judiciais (além do mais) podem requerer que o seu crédito por honorários, despesas e adiantamentos seja, total ou parcialmente, satisfeito pelas custas que o seu constituinte tem direito a receber da parte vencida. Está aqui a ideia de que o mandatário não tem crédito sobre a contraparte e que esta não fica vinculada, mesmo que perca, ao pagamento àquele. O crédito dele tem como sujeito passivo o seu próprio constituinte, de acordo com o que resulta da relação de mandato oneroso que criaram e só através do direito deste aquele alcança o que o preceito lhe confere. Acresce que, tal como acima se assinalou, só nos casos expressamente previstos na lei uma parte pode ser responsabilizada pelo pagamento dos honorários do advogado da contraparte. São os casos: a) de litigância de má fé (art.º 457.º, nºs 1, al. a) e 3, do Código de Processo Civil), e b) de inexigibilidade da obrigação no momento da propositura da acção (art.º 662.º, nº 3, do Código de Processo Civil). Tais hipóteses (em que a procuradoria é, em princípio, abatida) são excepcionais e, fora delas, aplica-se o regime comum da procuradoria como único meio de ressarcimento das despesas com mandatário judicial. Neste sentido, vide Acórdãos do S.T.J. de 15/03/2007, relatado pelo Sr. Conselheiro João Bernardo, in www.dgsi.pt, e de 15/06/1993, relatado pelo Sr. Conselheiro Martins da Fonseca, in BMJ nº 428, ps. 530 a 539”.
            Se transcrevemos tudo o que sobre a matéria foi escrito na sentença recorrida é porque sufragamos, inteiramente, o que aí se consignou [20], afigurando-se-nos que nenhuma razão assiste ao apelante quando sustenta que o dever de indemnizar e de reconstituir a situação que existiria se não fosse o acidente compreende os honorários que o A. terá de despender com o mandatário forense.
Improcede, pois, nesta parte, a apelação.
Da indemnização pelos danos não patrimoniais.
A propósito da avaliação do prejuízo corporal, escreveu Dário Martins de Almeida, in Manual de Acidentes de Viação, pág. 126 e ss. que “..., dentro da perspectiva legal, importa que o dano não patrimonial chegue a reflectir em gravidade tudo quanto baste para merecer a tutela do direito. Quer dizer, o dano só será indemnizável quando atingir uma gravidade que o torne digno de protecção e tutela. ... Há que ponderar, sobretudo, as circunstâncias que acompanham as diferentes situações de dano moral. ... O sofrimento começará a ser grave sempre que o seu diagnóstico, em termos razoáveis, possa revelá-lo como inexigível, do ponto de vista da resignação. As circunstâncias concretas serão normalmente sintomas dessa gravidade e até dos escalões que esta comporta, desde o grave ao gravíssimo. Para as dores físicas é possível compreendê-las sobretudo através da extensão e gravidade das lesões e da complexidade do seu tratamento clínico. Também a dor moral, traduzida de maneira multiforme, pelas aflições, desgostos, angústias e inquietações, pode atingir intensidade psíquica bastante e revelá-la exteriormente. Mas em geral terá de ser aferida pelos dados da experiência comum, exceptuados os casos anómalos de “cegueira afectiva”, quando devidamente comprovada. Daqui decorre que todas as situações de dor física ou moral têm de ser apreciadas e valoradas em concreto e não em abstracto. A sua gravidade estabelece-se em função da sua intensidade, isto é, do impacto ou mal estar ou ressonância que produzam sobre a sensibilidade anímica do lesado; mas há que atender também à sua duração ”.
E na mesma obra, em anotação ao artigo 496º do CC, pág. 270 e ss. escreve, ainda, que “O dano não patrimonial não se pode avaliar em medida certa. ...Mas a dor pode pagar-se com o prazer; e o prazer, quando se encontra na satisfação de necessidades, pode obter-se com dinheiro. ... A lei, porém, manda atender sempre a um critério de equidade na fixação do montante da indemnização correspondente a esta espécie de dano, devendo fazer-se uso dos factores previstos no artigo 494º; haverá mesmo que ter em conta a possível con-culpabilidade da vítima, observando-se o disposto no art. 570º. ... A indemnização equitativa transforma-se assim em mera compensação pela dor sofrida”.
Na fixação da indemnização por danos não patrimoniais há-de ponderar-se a natureza e grau das lesões, as sequelas (físicas e psíquicas), a hospitalização, os dias de internamento, o número e natureza das intervenções cirúrgicas realizadas, os tratamentos realizados e respectiva duração, o quantum doloris, os períodos de incapacidade, os sentimentos sofridos perante o acidente, as lesões e sequelas, a situação anterior e posterior do ofendido no meio social, apresentação e auto-estima, a idade, a esperança de vida, etc.
Feitas estas apreciações preliminares, atentemos no caso sub judice.
Resulta provado que, em consequência do acidente, o A., à data com 45 anos de idade:
- sofreu múltiplas facturas na face, no couro cabeludo, nos membros e nos pés, conforme melhor descrito sob o ponto 14 da fundamentação de facto, derrame pulmonar e parésia do nervo radical esquerdo;
- recebeu transfusões sanguíneas;
- foi intervencionado cirurgicamente por 4 vezes, uma delas de urgência;
- esteve internado entre 8.01.1997 e 5.02.1997 [21] e entre 17.05.2000 e 20.05.2000;
- permaneceu acamado e sentado em cadeira de rodas durante 2 meses;
- fez e continua a fazer tratamentos de fisioterapia, bem como foi sujeito a tratamentos de várias especialidades;
- esteve totalmente incapacitado para o exercício da sua profissão durante 6 meses, para além de ter sofrido vários períodos de incapacidade profissional temporária parcial, como melhor resulta do relatório do INML a fls. 430 e ss. dos autos;
- o A., ao ser embatido, sentiu medo e angústia, ficando em estado de choque;
- ficou consciente após o acidente, tendo padecido incómodos com o transporte em ambulância para o Hospital Reynaldo dos Santos em Vila Franca de Xira;
- sofreu fortes dores com as lesões, tratamentos e intervenções cirúrgicas, bem como sentiu desconforto com os tratamentos e intervenções;
- um ano após o acidente, o A. deslocava-se com dificuldade e com o auxílio de canadianas;
- 4 anos após o acidente, o A. mantinha as sequelas constantes do ponto 43 da fundamentação de facto, sofrendo de uma IPP correspondente a 58,4%;
- o A. vê reduzidas as suas actividades diárias usuais e profissionais devido à dificuldade em utilizar o membro superior esquerdo e em subir e descer escadas, para além da evidente claudicação;
- o facto de se encontrarem limitadas várias articulações do A., gera-lhe dor, especialmente durante os tratamentos de fisioterapia, e dificuldade no início de cada movimento após posições mantidas;
- o A. ficou diminuído na sua capacidade física e moral e a sua resistência física ficou debilitada;
- o A. continua e continuará sujeito a tratamentos de fisioterapia, devendo ter-se em atenção o que sobre esta questão já supra ficou dito.
Deverá, ainda, atentar-se que, de acordo com o relatório do INML, elaborado em 30.11.2005, e como já supra referido, à data do exame o A. apresentava as sequelas referidas no ponto 43 da fundamentação de facto supra, a saber: cicatrizes na face, membro superior esquerdo, membro inferior esquerdo, membro inferior direito e no tronco; infradesnivelamento do ombro esquerdo; atrofia muscular moderada da cintura escapular; limitação das articulações do ombro esquerdo; limitação dos movimentos do punho esquerdo; báscula superior da bacia para a esquerda; limitação dos movimentos de ambos os joelhos mais acentuada à direita; ligeira limitação dos movimentos da articulação tíbio-társica direita; limitação dos movimentos dos 2º, 3º e 4º dedos do pé direito; encurtamento clínico de 1 cm do membro inferior esquerdo; atrofia muscular de cerca de 3 cms da coxa direita.
Deverá, ainda, atentar-se nos valores atribuídos no relatório do INML relativos ao quantum doloris [22], ao dano estético [23] e ao prejuízo de afirmação pessoal [24].
O tribunal recorrido entendeu que tais danos deveriam ser ressarcidos no valor de Esc. 6.212.000$00 / € 30.985,33 – ponderando, também, que a jurisprudência dos tribunais superiores vem considerando que o dano morte deverá ser ressarcido no valor de Esc. 10.000.000$00 / € 49.879,79 [25] -, montante esse já atribuído ao A. pela seguradora, pelo que, necessariamente, julgou improcedente o pedido nesta parte.
Insurge-se o apelante contra o decidido sustentando que a jurisprudência mais recente [26] já não cifra as indemnizações em quantias diminutas, como antes acontecia, “sobretudo, quando os sinistrados, para além de terem ficado com mazelas muito graves, mantêm-nas igualmente por toda a sua vida com um sofrimento muito intenso, como sucede no caso do recorrente”.
Efectivamente a jurisprudência evoluiu muito nesta matéria, quer nos montantes indemnizatórios fixados, quer até entendendo (o STJ) que em certas situações, o valor indemnizatório arbitrado por danos não patrimoniais não tem como limite as quantias geralmente arbitradas a título de compensação da lesão do direito à vida, podendo excedê-las largamente, mas tal só ocorrendo “em situações limite de numerosas lesões físicas, de elevada gravidade e sofrimento para o lesado, acarretando profundíssimos sofrimentos e sequelas” [27].
Mas, por um lado, a indemnização fixada pelo tribunal recorrido não pode ser considerada diminuta, nem, por outro lado, a situação em apreço se pode considerar uma das situações de elevada gravidade e sofrimento a que se fez referência.
Reconhece-se, contudo, que os danos nesta matéria, acima elencados, são graves, as sequelas muito debilitantes e não só se manterão como se agravarão no futuro.
Assim sendo, face a toda a factualidade apurada, tem-se por mais adequada e conforme à equidade, enquanto justiça do caso concreto, fixar o montante indemnizatório pelos danos não patrimoniais sofridos pelo A. em € 40.000,00.
A este montante haverá de abater o montante já pago pela seguradora (€ 30.985,33), estando os RR. obrigados a pagar ao A. o remanescente - € 9.014,67.
Procede, pois, em parte a apelação no que a esta matéria respeita.
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Sobre os montantes indemnizatórios quantificados são devidos juros de mora (art. 804º do CC), à taxa legal, desde o trânsito em julgado da decisão, porque devidamente actualizados à presente data.

DECISÃO.
Pelo exposto, acorda-se em julgar parcialmente procedente a apelação, revogando-se, em parte, a sentença recorrida, que se substitui por outra condenando os RR. a pagarem, solidariamente, ao A.:
a) a quantia de € 126.718,61 (cento e vinte e seis mil, setecentos e dezoito euros e sessenta e um cêntimos), a título de indemnização para reparação de danos patrimoniais futuros;
b) a quantia que o A. vier a despender com tratamentos de fisioterapia a que ainda se encontra sujeito e que continuará a ser sujeito até data indefinida, a liquidar em execução de sentença;
c) a quantia de € 9.014,67 (nove mil e catorze euros e sessenta e sete cêntimos), a título de indemnização por danos não patrimoniais;
d) juros de mora sobre os montantes em a) e c) referidos, à taxa legal, desde a data do trânsito em julgado desta decisão e até integral pagamento,
mantendo-se o demais decidido.

Custas pelo recorrente e recorridos na proporção do respectivo decaimento, em ambas as instâncias (art. 446º do CPC).                                                

Lisboa, 20 de Março de 2012

Cristina Coelho
Maria João Areias
Luís Lameiras
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[1] Ou seja, nos 6 meses seguintes ao acidente - al. GG) dos factos assentes reproduzida sob o ponto 30 da fundamentação de facto supra.
[2] Dando resposta restritiva ao quesito 20, como resulta do ponto 54 da factualidade dada como provada supra.
[3] Explicando que a redução assenta, para além do mais, no facto de no rendimento indicado na P.I. (indicado de acordo com a declaração de IRS) não se ter, por lapso, deduzido os rendimentos do cônjuge e rendimentos prediais, e por a Incapacidade Geral Permanente Parcial fixada pelo INML ser inferior à fixada pela companhia de seguros, e com base na qual se tinha feito o cálculo anterior – fls. 500 e ss..
[4] O que resulta, também, da forma de cálculo do montante, por referência ao parecer que juntou aos autos.
[5] A de criação de cavalos a que se aludia no quesito 50.
[6] Âmbito no qual se encaixa a questão em apreço.
[7] Cfr. o requerimento de fls. 511 e 512 dos autos.
[8] Nos termos constante do relatório do INML – ver fls. 446.
[9] A título meramente exemplificativo, ver os Acs. do STJ de 16.12.2010, P. 4948/07.3TBVNG.P1.S1, rel. Cons. Alves Velho e de 20.01.2011, P. 520/04.8GAVNF.P2.S1, rel. Cons. Souto de Moura.
[10] Confrontar, com interesse, o Ac. do STJ de 11.11.2010, P. 270/04.5TBOFR.C1.S1, rel. Cons. Lopes do Rego, in www.dgsi.pt.
[11] Havendo quem entenda que, nesta matéria, não devem ser utilizados os parâmetros de avaliação utilizados para cálculo dos lucros cessantes, uma vez que o dano em causa não interfere com a capacidade de produzir rendimentos - cfr., a título de exemplo, o supra referido Ac. do STJ de 10.05.07 e o Ac. do STJ de 22.01.2008, P. 07A4338, rel. Cons. Paulo Sá, in www.dgsi.pt).
[12] Sendo certo que resulta provado que, com os tratamentos de fisioterapia que o A. fez e continua a fazer, reduz o seu período de trabalho, sofrendo redução dos rendimentos, bem como que o A. vê reduzidas as suas actividades diárias usuais e profissionais devido à dificuldade em utilizar o membro superior esquerdo e em subir e descer escadas.
[13] Não sendo de recorrer à Portaria nº 377/2008 de 26.05 cujo âmbito de aplicação é outro.
[14] Nomeadamente a total ausência de culpa do A. na produção do acidente e a sua situação económica, bem como o facto de demandados na presente acção serem a segurada, sobre a qual nada se sabe relativamente à sua situação económica (embora seja facto do conhecimento público a crise económica que atravessa o sector dos transportes), e o seu trabalhador motorista. 
[15] Partindo do seguinte cálculo: 20.827.846$00 (rendimento líquido anual à data do acidente) x 14.87747 (factor correspondente a 20 anos de actividade profissional que o A. ainda trabalhará) x 55% = 170.426.109$72 – ¼ (correspondente às despesas pessoais, tendo em conta que o A. é casado) = 127.819.582$29 – ¼ (indemnização recebida de uma só vez)) = 95.864.686$72 / € 478.171,04.
[16] No qual se perguntava se o A. teve de prosseguir com os tratamentos de fisioterapia posteriormente a 31.01.2001 e “até à actualidade ?”, ou seja, 19.05.2004 – ver fls. 411.
[17] Esta opinião é, também, a da médica que elaborou relatório de fisioterapia, datado de 17.05.2004, que o A. apresentou na data da observação no INML, do qual consta que “… face à gravidade das sequelas do acidente (…) não poderá prescindir de fisioterapia até ao final da sua vida” – cfr. fls. 437.
[18] Com referência à data da sentença.
[19] Entendendo que “a questão do pagamento dos honorários dos mandatários da contraparte só se pode colocar se o trabalho de tais advogados nas acções que se referem não conduziu ao malogro das causas”.
[20] Apenas se fazendo, ainda, referência ao Ac. do STJ de 2.07.2009, P. 5262/05.4TVLSB.S1, rel. Cons. João Bernardo, in www.dgsi.pt, no qual se mantém o entendimento perfilhado no anterior acórdão do mesmo relator referido supra, sublinhando que o Regulamento das Custas Judiciais (que não é aplicável ao caso, tal como não o é ao processo em apreço) serve, no domínio da interpretação, para isentar de dúvidas a construção sustentada.
[21] Ver Relatório do INML.
[22] “6-importante” numa escala de 1 a 7.
[23] “4-médio” numa escala de 1 a 7.
[24] “4-médio” numa escala de 1 a 7.
[25] Atente-se que a sentença data de 19.10.2007.
[26] As alegações também datam de finais de 2007.
[27] Ver o Ac. do STJ de 11.11.2010, referido na nota 10, que versa sobre um caso enquadrável nessas situações e onde se fazem referência a outros acórdãos.