Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
32/22.8YGLSB.S1
Nº Convencional: 5.ª SECÇÃO
Relator: LEONOR FURTADO
Descritores: ACORDÃO DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
ARGUIÇÃO DE NULIDADES
OMISSÃO DE PRONÚNCIA
EXCESSO DE PRONÚNCIA
INDEFERIMENTO
Data do Acordão: 02/29/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: NEGADO PROVIMENTO.
Sumário :
I - Do mesmo modo que não subsiste nulidade por omissão de pronúncia quando se decide que o conhecimento de determinada questão fica prejudicado pela solução dada a outra, também não há nulidade por excesso de pronúncia quando expressamente se decide que a questão suscitada é de conhecimento obrigatório.
II - O excesso de pronúncia é nulidade de sentença de sentido inverso da omissão de pronúncia. Qualquer deles ocorre quando não existe congruência entre o objecto do processo ou do recurso – tal como as partes e a lei o delimitam –, e a decisão proferida.
III - No caso, o acórdão reclamado analisou as questões que foram colocadas pelo assistente tendo sido proferida decisão expressa que conheceu de todas as questões postas no recurso.
Decisão Texto Integral:

Recurso Penal


Incidente de arguição de nulidade


Processo: n.º 32/22.8YGLSB.S1.S1


5ª Secção Criminal





Acordam, em conferência, no Supremo Tribunal de Justiça

I. RELATÓRIO

1. 1. AA, arguiu a nulidade do acórdão do STJ, proferido nestes autos em 31/01/2024, por omissão de pronúncia, nos termos do disposto no art.º 379.º, n.º 1, al. c), do CPP, considerando que “Por requerimento apresentado ao abrigo do disposto no artigo 123º do Código de Processo Penal (CPP), já arguiu a nulidade do acórdão de 31-01-2024, por efeito de IRREGULARIDADE DO PROCESSO. Não se vê que tal requerimento já tenha sido decidido. Pelo que, impõe-se, de forma cautelar, arguir os vícios de conteúdo de que o mesmo acórdão padece.” – sublinhado nosso e, conforme requerimento de 15/02/2024, Ref.ª Cítius n.º 201914 –.

2. Apontando os vícios que considera verificados por referência à fundamentação do acórdão em causa, ora indicando a pronúncia efectuada sobre os aspectos abordados ora sublinhando que no acórdão se recusou a pronúncia sobre as nulidades por si arguidas em outras peças processuais, alega que se verifica a irregularidade processual determinante da nulidade dos actos processuais praticados no processo, após o requerimento por si apresentado em 14/03/2023 e que consistiria numa irregularidade que resultaria da alegada falta de notificação ao Recorrente da resposta apresentada pelo Ministério Público ao recurso – tudo conforme alegado em requerimento apresentado a 06/02/2024, sob a Ref.ª Cítius 201481.


Por via disso apresentou requerimento de arguição da nulidade do Ac. do STJ de 31/01/2024, nos seguintes termos:


1. No seu nº 1.2, recusa pronúncia sobre as nulidades imputadas ao ato recorrido. Tal omissão é cominada de nulidade pelo artigo 379º, nº 1, alínea c), primeiro segmento, do CPP.


2. No seu nº 1.2, pronuncia-se sobre o disposto no artigo 414º nº 4, do CPP. Tal pronúncia é cominada de nulidade pelo artigo 379º, nº 1, alínea c), segundo segmento, do CPP, por o recurso não conter alegação de violação de tal norma.


3. No seu n? 1.2, pronuncia-se sobre a aplicação do disposto no artigo 617º, nº 5, do


Código de Processo Civil (CPC). Tal pronúncia é cominada de nulidade pelo artigo 379º, nº 1, alínea c), segundo segmento, do CPP, por o recurso não conter alegação de violação de tal norma, e por tal norma não ser aplicável. A inaplicabilidade de tal norma resulta do disposto no artigo 4º do CPP, no segmento em que faz depender a aplicação subsidiária de normas do CPC, da sua harmonização com as normas do CPP, e do estatuído no artigo 204º da Constituição, em virtude de a norma do artigo 617º, nº 5, do CPC, com o sentido aí invocado, padecer dos vícios previstos no artigo 277º, nº 1, da Lei Fundamental.


4. No seu nº 1.3, pronuncia-se sobre incidente de falsidade com a finalidade de afastar a força probatória atribuída por lei a determinado documento, subsumível ao disposto nos artigos 341º e 362º do Código Civil (CC). Tal pronúncia é cominada de nulidade pelo artigo 379º, nº 1, alínea c), do CPP, por o incidente de falsidade deduzido por requerimento de 14-03-2023, ser o do artigo 451º nºs 2 e 3, do CPC, e 372º nºs 2 e 3, do CC, e não ser o dos artigos 341º e 362º do CC.


5. No seu nº 1.3, pronuncia-se sobre acusação deduzida contra BB. Tal pronúncia é cominada de nulidade pelo artigo 379º nº 1, alínea c), segundo segmento, do CPP, por tal acusação não constar do requerimento de abertura de instrução nem do recurso interposto do despacho de 13-01-2023.


6. No seu nº 2.1, recusa conhecer das nulidades imputadas ao despacho de 13-01-2023, invocando que não lhe é aplicável o disposto no artigo 379º nº 2, do CPP. Tal pronúncia é cominada de nulidade pelo artigo 379º nº 1, alínea c), primeiro segmento, do CPP, em virtude de a norma aplicada para o efeito padecer dos vícios do artigo 277º nº 1, da Constituição, de que não houve conhecimento.


7. No seu nº 2.2, omite pronúncia sobre a alegação do recorrente de que o elemento subjetivo dos crimes imputados aos arguidos se encontra explicitado na qualificação


da sua conduta como recusa em remeter à Exma. Senhora Procuradora-Geral da República a certidão de 15-12-2021, e como recusa em abrir Inquérito relativamente a factos que foram acolhidos em promoções dos Procuradores da República intervenientes no proc. nº 2189/14.2..., como ilícitos criminais praticados pelos Juízes de Direito intervenientes no mesmo processo desde setembro de 2014, e, nele, denunciados como tal. Tal pronúncia é cominada de nulidade pelo artigo 379º nº 1, alínea c), primeiro segmento, do CPP.


8. No seu nº 2.2, pronuncia-se sobre nulidade prevista no artigo 309º do CPP. Tal pronúncia é cominada de nulidade peto artigo 379º, nº 1, alínea c), segundo segmento, do CPP, em virtude de inexistir despacho de pronúncia.


9. No seu nº 3, pronuncia-se sobre ato praticado pelo arguido. Tal pronúncia é cominada de nulidade peio artigo 379º nº 1, alínea c), segundo segmento, do CPP, em virtude de inexistir ato praticado por arguido no processo.


10. No seu nº 3, pronuncia-se sobre abandono de acusação pelo crime de denegação de justiça do artigo 369º nºs 1 e 2, do Código Penal. Tal pronúncia é cominada de nulidade pelo artigo 379º, nº 1, alínea c), segundo segmento, do CPP, em virtude de nunca ter havido denúncia ou acusação por esse crime.


11. No seu nº 3, pronuncia-se sobre crime do artigo 367º, nº 2, do CPP. Tal pronúncia é cominada de nulidade peto artigo 379º nº 1, alínea c), segundo segmento, do CPP, em virtude de nunca ter havido denúncia ou acusação por esse crime.


12. No seu nº 3, pronuncia-se sobre teor da conclusão 1ª do recurso. Tal pronúncia é cominada de nulidade pelo artigo 379º nº 1, alínea c), segundo segmento, do CPP, em virtude de tal conclusão não ter esse teor,


13. No seu nº 4.1, pronuncia-se sobre acesso aos tribunais e ao direito "de qualquer modo". Tal pronúncia é cominada de nulidade pelo artigo 379º , nº 1, alínea c), segundo segmento, do CPP, em virtude de inexistir tal pretensão.


14. No seu nº 4.2, pronuncia-se sobre a incumbência dos Tribunais de assegurar a defesa dos direitos dos cidadãos "desde que reúnam condições para isso", e omite pronúncia sobre a incumbência dos Tribunais de assegurarem a defesa dos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos. Tal pronúncia é cominada de nulidade pelo artigo 379º, nº 1, alínea c), do CPP.


Termos em que também requer seja declarada e suprida a invalidade/nulidade do acórdão de 31-01-2024.”.

3. O Exmo. Magistrado do Ministério Público, junto deste Supremo Tribunal pugnou pelo indeferimento da arguida nulidade, emitindo parecer nos seguintes termos:


-- Requerimentos do assistente com as referências ....81 e ....14:


A dado momento, no douto acórdão proferido nos presentes autos em 31.01.2024 é referido, com reporte a uma das questões que haviam sido levantadas pelo recorrente, que se afastava a má fé pois que ficava «um resquício de dúvida sobre se este modo de litigar é produto de um propósito de suscitar incidentes inúteis».


Entende o Ministério Público que, através dos requerimentos que antecedem, o Ilustre Advogado responde cabalmente pela positiva a esta questão\dúvida.


Na verdade:


a)No requerimento com a referência ....81 vem alegar que não existiu resposta quanto a irregularidade processual que invocou em requerimento de 14.03.2023.


Ora, isso não é verdade: o acórdão de 31.01.2024 debruçou-se especificamente acerca desse pedido no ponto II.1.1.


Entendemos que nada haverá mais a apreciar quanto a tal aspeto.


b)Também no que se refere ao requerimento do assistente com a referência ....14 entende o Ministério Público que as nulidades invocadas inexistem.


Com efeito, numa postura que traduz o acima referido propósito de suscitar incidentes inúteis, vem o assistente qualificar como omissão de pronúncia tudo o que lhe desagradou na decisão tomada no acórdão: como não pode deste recorrer, usa aquela figura como fundamento para a invocação de (inexistente) nulidades.


É assim que vai, ao longo do seu requerimento, dizendo que não existiu pronuncia acerca dos diversos aspetos, quando claramente tal pronúncia existiu, só que foi desfavorável aos seus interesses.


Assim sendo, para além de verificada a inexistência de qualquer nulidade ou irregularidade, estamos perante requerimentos que traduzem a formulação de incidentes inúteis, devendo ser adequadamente sancionados.”.

4. Cumpre decidir se ocorrem as arguidas irregularidades e nulidade da sentença.

II. FUNDAMENTO

1. A arguição é manifestamente improcedente.


A nulidade por omissão de pronúncia ocorre quando o tribunal deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar, conforme art.º 379.º, n. º1, al) c), do CPP, isto é, suscitadas ou de conhecimento oficioso e não estejam prejudicadas pela solução dada a outras.


Ora, como salienta o Digno Magistrado do Ministério Público, o acórdão enuncia de modo claro e suficiente as razões pelas quais o tribunal entendeu e fundamentou as razões para a decisão proferida.


Com efeito, sobre a designada irregularidade processual invocada nos termos do requerimento de 14/03/2023, do acórdão sob censura resulta claramente a irrelevância dos argumentos do reclamante que, devidamente ponderados, nada de novo acrescentaram ao já decidido e cujo teor e apreciação se mostram explicitados no ponto 1.1., da fundamentação de direito do acórdão, do qual ora se argui a nulidade por omissão de pronúncia.


Efectivamente, para a eventualidade de tal não ter sido devidamente entendido dada a manifesta confusão em que se encontra o requerente sobre os conceitos de irregularidade e nulidade, transcreve-se o que se referiu, sobre este tema, naquele aresto:


“1.1. Privilegiando na ordem de conhecimento a possibilidade de repercussão na marcha do processo, a primeira dessas questões consiste na irregularidade, arguida pelo requerimento de 14/03/2023, que resultaria da alegada falta de notificação ao Recorrente da resposta apresentada pelo Ministério Público ao recurso, em cumprimento do disposto pelo n.º 3, do art.º 413.º, do CPP.


Em si mesma, essa afirmação do Recorrente não é exacta. A notificação ocorreu em 01/03/2023, Ref.ª Cítius n.º ......53. O acto foi praticado mediante comunicação electrónica dirigida ao Senhor Advogado, Dr. CC, que é o primeiro dos mandatários constituídos pela procuração junta aos autos, Ref.ª Cítius n.º ....75, de 09/11/2022, em que o ora assistente confere poderes forenses tanto a esse advogado como ao subscritor das peças do presente recurso, Dr. DD, sendo que, segundo a procuração, os mandatários têm o mesmo domicílio profissional, sito na Av. ...., em ....


Assim, a questão que poderia colocar-se, não seria, em bom rigor, a da inexistência do acto comunicativo, mas a da sua validade. Dito de outro modo e pondo de lado a consideração de hipóteses que não vem ao caso, importa saber se, perante a outorga de poderes forenses a uma pluralidade de mandatários sem que tenha sido designado um deles para receber as comunicações, a notificação dos actos processuais tem de ser necessariamente efectuada ao mandatário que seja subscritor do acto que imediatamente tenha determinado a prática do acto a notificar, ou pode ser validamente efectuada em qualquer dos mandatários constituídos.


A questão, na sua essência, já se colocou a este Supremo Tribunal que lhe respondeu neste último sentido pelo acórdão de 04/12/2007, Proc. 07B3967, em www.dgsi.pt . O entendimento adoptado, num caso em que a pluralidade de mandatários resultava de substabelecimento com reserva, tem a seguinte fundamentação:


“1.1- [ …]


Em caso de substabelecimento com reserva, assumindo ambos os advogados plenos poderes de representação, as notificações a fazer no processo poderão ser feitas a qualquer deles, nos respectivos escritórios.


Só assim não acontecerá se tiver sido escolhido domicílio específico para recebimento das notificações, situação em que as mesmas serão então dirigidas para esse domicílio.


Na situação vertente, o primitivo mandatário substabeleceu com reserva num outro advogado, substabelecimento não direccionado para a prática de qualquer acto judicial específico. Depois e como se consignou no acórdão recorrido, não foi escolhido domicílio próprio para recebimento das notificações.


Assim sendo, as notificações podiam ser feitas a qualquer dos advogados, tanto ao primitivo como ao substabelecido.


A notificação do acórdão proferido na Relação foi correctamente efectuada quando dirigida para o escritório do primitivo mandatário, pelo que de nenhuma irregularidade padece”.


1.2- Sustenta ainda a recorrente que, ao admitir-se que apenas um dos advogados devia ser notificado, está-se a limitar a escolha de mandatário para a prática de actos específicos no âmbito do processo e, como tal, a violar o princípio constitucional vertido no art. 20º da Constituição da República.


O art. 20º da Constituição da República reconhece vários direitos, direitos esses que integram o direito geral de protecção jurídica.


Esse direito abarca normativamente, desde logo, o direito que a todos é reconhecido de se fazer acompanhar por advogado perante qualquer autoridade – nº 2 do citado art. 20º.


Este direito não foi cerceado à recorrente que, em vez de um só mandatário forense, passou a ter mais do que um com o substabelecimento com reserva. E a todos eles foi reconhecido o direito de intervirem processualmente.


Agora o que a lei ordinária impõe é que só um desses advogados seja notificado dos actos processuais. E isto para evitar a anarquia processual relacionada com a verdadeira contagem de prazos que resultaria da notificação a todos e cada um desses advogados.


Este entendimento mostra-se perfeitamente razoável e proporcionado, não podendo ver-se na notificação dos actos processuais apenas a um desses advogados uma limitação do direito de acompanhamento pleno por advogado.


E este direito fundamental não foi afectado, na sua essência, por essa regra processual, porquanto a recorrente não viu cerceado o direito à escolha de mandatário, nem à intervenção no processo de qualquer um dos advogados escolhidos.


Daí que a interpretação dos arts. 36º e 254º do CPC com aquele sentido não enferme de qualquer inconstitucionalidade”.


É este entendimento, que veio a ser confirmado na vertente de constitucionalidade pelo acórdão n.º 357/2008, do Tribunal Constitucional, que mutatis mutandis se mantém. A tanto não obsta a diferença na situação fáctica que consiste em, no caso presente, a pluralidade de mandatários ser originária e no precedente invocado ser sucessiva, tendo resultado de substabelecimento com reserva. Efectivamente, no que releva para a questão jurídica colocada, essa diferença é irrelevante. O que importa é que, no momento da notificação, se verifica existir pluralidade de advogados com mandato activo, ambos investidos no poder processual e no dever profissional de exercer o mandato forense e não foi manifestada no processo a escolha de um deles para receber as notificações.


Nem se diga que esta interpretação coloca sobre o mandante o risco de o destinatário imediato da comunicação não cumprir o seu dever profissional de transmitir diligentemente a comunicação processual àquele advogado que, na distribuição do trabalho entre mandatários, se ocupa do caso ou de determinada fase do caso. Essa possibilidade pertence ao âmbito das relações internas entre o mandante e os mandatários, ou entre estes. E não se trata de um risco desproporcionado porque estava sempre ao seu alcance preveni-lo sem dificuldade, bastando para tanto declarar no processo que as notificações deviam ser efectuadas na pessoa de um dos mandatários.


Aliás, o Dr. CC tem efectuado intervenções diversas no processo, designadamente apresentando requerimentos em representação do assistente e recebendo as notificações em causa – entre outras, vd. Ref.ªs Cítius n.º ....96, ....15, ......46, ....75, ....64 e ......63 – e não deixa de ser contrário à lealdade processual que o Recorrente tenha aceite, sem qualquer reparo ou advertência, que as sucessivas notificações fossem efectuadas na pessoa desse advogado e venha agora pretender tirar efeito de uma suposta irregularidade que se insere nessa prática consensual ao longo do processo.


Tanto basta para julgar improcedente esta arguição de nulidade e os pedidos consequentes de retorno do processo à fase anterior e de anulação da distribuição com este fundamento.”.


Ou seja, nada se ignorou quanto à invocada tese inovatória do requerente, cujo argumento é o de que tendo arguido uma irregularidade processual a mesma determina a nulidade de todos os actos processuais posteriores, incluindo a do acórdão decisório que, expressamente, decidiu a questão que o mesmo já havia colocado ao tribunal.


Assim, proferida que seja a sentença fica esgotado o poder jurisdicional quanto à matéria da causa, não sendo a apreciação do requerimento em que se arguem nulidades momento idóneo para o tribunal da causa conhecer de quaisquer outras questões, designadamente as alegadas inconstitucionalidades, salvo, obviamente as que respeitem às normas disciplinadoras do próprio incidente, o que não é o caso.


Termos em que, na parte respeitante, se indefere a arguida nulidade do acórdão de 31/01/2024.

2. Importa notar que o reclamante sustenta a arguição da nulidade do acórdão proferido, com uma argumentação dilemática, que pode resumir-se do seguinte modo: por um lado, alega que a falta de conhecimento do mérito da questão da irregularidade processual por si suscitada constitui uma nulidade por omissão de pronúncia, nos termos do disposto no art.º 379.º, n.º 1, al. c), do CPP; por outro, sem que indique qualquer fundamento e limitando-se a indicar os pontos analisados na decisão proferida que em seu entender merecem tal cominação, conclui que a pronúncia efectuada no acórdão sobre as próprias questões que havia colocado, é cominada com a nulidade.


Reconhece-se a argúcia da retórica argumentativa, mas o dilema é falso na perspectiva da arguição de nulidade, que é o que cabe agora resolver. E, para a questão da nulidade só releva a questão da cognoscibilidade das questões suscitadas no recurso pelo reclamante.


A nulidade do acto, tal como referenciado em comentário de Henriques Gaspar, ao art.º 118.º, do CPP, em Código de Processo Penal comentado, Almedina, 3.ª edição revista, pág. 329/330, “A violação ou inobservância das condições ou dos pressupostos do acto, que não constituam nulidade, determina apenas a «irregularidade» do acto.”, enquanto que “As meras irregularidades resultam da inobservância das leis de processo que a lei não considera nulidades; o acto irregular produz efeitos se não for invalidado, e a invalidade tem de ser requerida pelos interessados”, conforme aliás dispõe o art.º 123.º, do CPP.


Ora, no caso, não só não foi praticada qualquer irregularidade processual nem se verifica que a mesma tenha existido como, não estando reunidos os pressupostos processuais para que a mesma seja conhecida e declarada a sua reparação, se decidiu julgar improcedente a arguição de nulidade e os pedidos consequentes de retorno do processo à fase anterior.


Portanto não se ignorou a questão que agora o reclamante configura como nulidade. O que sucede é que se tratou de modo diferente daquele que o assistente sustenta que deveria ter sido. Evidentemente que, do mesmo modo que não subsiste nulidade por omissão de pronúncia quando se decide que o conhecimento de determinada questão fica prejudicado pela solução dada a outra, também não há nulidade por excesso de pronúncia quando expressamente se decide que a questão suscitada é de conhecimento obrigatório. O excesso de pronúncia é nulidade de sentença de sentido inverso da omissão de pronúncia. Qualquer deles ocorre quando não existe congruência entre o objecto do processo ou do recurso – tal como as partes e a lei o delimitam –, e a decisão proferida.


E, no caso, o acórdão reclamado analisou as questões que foram colocadas pelo assistente tendo sido proferida decisão expressa que conheceu de todas as questões postas no recurso.


Tanto basta para que, na parte respeitante, improceda a alegação do requerente.

II. DECISÃO


Termos em que acordam os Juízes da 5.ª Secção, do Supremo Tribunal de Justiça, em:

a. Indeferir o requerido;

b. Condenar o Requerente em custas pelo incidente, fixando-se a taxa de justiça em 6 UC – artigos 513.º do CPP e 8.º, n.º 9, e Tabela III, do Regulamento das Custas Processuais.


Lisboa, 29 de Fevereiro de 2024 (processado e revisto pelo relator)


Leonor Furtado (Relator)


Agostinho Torres (Adjunto)


António Latas (Adjunto)