Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
11510/21.6T8LRS-A.L1.S1
Nº Convencional: 4.ª SECÇÃO
Relator: JOSÉ EDUARDO SAPATEIRO
Descritores: DESPACHO DO RELATOR
RECLAMAÇÃO PARA A CONFERÊNCIA
REJEIÇÃO DE RECURSO
RECLAMAÇÃO
TRIBUNAL DA RELAÇÃO
RECURSO DE REVISTA
NÃO ADMISSÃO DE RECURSO
OPOSIÇÃO DE ACÓRDÃOS
Data do Acordão: 04/17/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: INDEFERIDA A RECLAMAÇÃO.
Sumário :

I - Não há, no regime processual vigente, espaço legal, no âmbito do incidente de reclamação dos artigos 82.º, número 2, do CPT e 643.º do NCPC, para a interposição do recurso de revista ordinário [artigo 671.º] ou excecional [artigo 672.º] de acórdão das relações que tenha reiterado despacho judicial de rejeição de recurso de apelação respeitante a decisão de tribunal de comarca.


II - Quer a factualidade subjacente a dada um dos Arestos, quer as normas jurídicas que são invocadas no seu seio, são muito diversas e exigem apreciações de facto e de direito divergentes que, manifestamente, não nos permitem afirmar que nos deparamos com uma oposição de Acórdãos relativos a uma mesma questão fundamental de direito e no domínio da mesma legislação .

Decisão Texto Integral:

RECURSO DE REVISTA N.º 11510/21.6T8LRS - A.L1.S1 (4.ª Secção)


Recorrente: ODC - ORGANIZAÇÃO, DOCUMENTAÇÃO E CONTABILIDADE LDA


Recorrida: AA


(Processo n.º 11510/21.6T8LRS – Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Norte - Juízo do Trabalho de ... [Juiz 1])


ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES CONSELHEIROS DA 4.ª SECÇÃO SOCIAL:


I – RELATÓRIO

1. A Ré ODC ORGANIZAÇÃO, DOCUMENTAÇÃO E CONTABILIDADE, LDA. vem interpor recurso de Revista do Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa que foi prolatado em 13.09.2023 e que confirmou a Decisão Singular de 11.08.2023 proferida pelo relator no âmbito da Reclamação deduzida pela Ré, nos termos do artigo 643.º do Código de Processo Civil e artigo 82.º, n.º 2 do Código de Processo do Trabalho, que não atendeu a tal Reclamação e reiterou o despacho judicial de 24.06.2023, proferido pelo Tribunal de 1.ª instância e que foi no sentido do indeferimento do justo impedimento invocado e da não admissão, por intempestivo, do recurso de apelação interposto da sentença publicada no âmbito da ação de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento, prevista nos artigos 98.º-B e segs. do Código de Processo de Trabalho, que foi proposta pela trabalhadora AA contra a acima identificada empregadora ODC ORGANIZAÇÃO, DOCUMENTAÇÃO E CONTABILIDADE, LDA [1].


2. O despacho judicial de não admissão do recurso, datado de 24.06.2023 e que não admitiu o recurso de apelação possui o seguinte teor:


«Requerimento c/Ref.ª13741105, de 08-05-2023; e Recurso c/Ref.ª13777528, de 16-05-2023, ambos da Ré.


Está em causa a questão de saber se o recurso é tempestivo, o que implica também pronunciarmo-nos sobre o requerimento em que se alega justo impedimento.


A ré pretende, através do recurso, a reapreciação da prova gravada, pelo que o prazo de recurso da sentença proferida neste processo, que tem natureza urgente, é de 25 (15+10) dias, nos termos do art.º 80.º, n.ºs 2 e 3 do CPT.


A tramitação destes autos apresenta, com relevância para a tempestividade, os seguintes momentos, factos processuais e conclusões jurídicas no que respeita à contagem e ao termo dos prazos pertinentes:


a) 11-04-2023 – Elaboração da notificação da sentença e publicação do aviso prévio da greve dos Senhores Oficiais de Justiça;


b) 14-04-2023 – Considera-se a sentença notificada [2];


c) 15-04-2023 – Primeiro dia da contagem do prazo de recurso [3];


d) 26-04-2023 – Requerimento a solicitar cópia da gravação e primeiro dia de greve dos Senhores Oficiais de Justiça;


e) 27-04-2023 – Envio, por via postal registada, de novo Requerimento, agora acompanhado de um CD;


f) 28-04-2023 (sexta-feira) – Deu entrada física na Unidade Central do Tribunal, o referido requerimento a solicitar cópia da gravação, desta vez com a junção de CD;


g) 02-05-2023 – Termo do prazo simples de recurso [4];


h) 05-05-2023 (sexta-feira) – terceiro dia útil após termo do prazo simples e último dia de greve dos Senhores Oficiais de Justiça;


i) 08-05-2023 (segunda-feira) – entrega do CD ao Ilustre Mandatário da Ré;


j) 08-05-2023 – Requerimento da Recorrente alegando justo impedimento e pedindo a suspensão do prazo de recurso entre 28-04-2023 e 08-05-2023, período que mediou entre a entrega do CD no Tribunal e a devolução do CD já gravado;


k) 09-05-2023 – Termo da contagem do prazo de 25 dias [5];


l) 12-05-2023 – Despacho em que se deixou consignado que o Tribunal só se pronunciaria depois de decorrido o prazo para a Recorrida se pronunciar;


m) 16-05-2023 – Interposição de recurso com vista à reapreciação da prova gravada.


n) A Greve dos Senhores Oficiais de Justiça teve uma adesão de 100% neste Juízo do Trabalho, em todos os dias úteis, de 26-04-2023 a 05-05-2023 (sexta-feira).


Vejamos.


A natureza geral do instituto do justo impedimento, não comporta a suspensão da contagem do prazo, como pretendido, pelo tempo em falta após a cessação do impedimento. O justo impedimento a que se reporta o art.º 140.º do CPC [6] é o que obsta à prática atempada do ato, o que poderia ter relevância se o prazo de 25 dias para interpor recurso tivesse terminado durante a greve, o que não foi o caso. Assim, cessando o justo impedimento, antes do termo do prazo, a parte tem de praticar o ato até esse termo.


A recorrente refere, nos pontos 10. a 13. dos fundamentos do recurso [7], que, perante o seu requerimento de 08-05-2023, o juiz proferiu despacho, em 12-05-2023, no qual se mandava aguardar pelo decurso do prazo para a parte contrária se pronunciar sobre aquele. Na ótica da recorrente, a circunstância de o juiz não ter decidido o seu requerimento de justo impedimento antes do exercício do contraditório, significa que não houve uma decisão judicial atempada. Na ótica deste Tribunal, se tivesse proferido decisão sobre o alegado justo impedimento sem ouvir a parte contrária, violaria o princípio do contraditório e infringiria frontalmente a norma do n.º 2 do art.º 140.º do CPC.


O Tribunal deve agir com lealdade e de boa-fé, mas as partes também têm de agir da mesma forma. A recorrente só entregou o CD para ser gravado com as sessões da audiência no penúltimo dia do prazo normal de recurso, o 14.º, sendo certo que nessa altura já o país inteiro sabia que os Senhores Oficiais de Justiça estavam em greve e o Ilustre Mandatário da ré, enquanto profissional do foro, não poderia deixar de saber com antecipação, lembrando que o pré-aviso de greve é de 11-04-2023, ou seja, 17 dias antes de o CD ter chegado ao Tribunal.


Agindo diligentemente, deveria ter requerido a gravação e junto o CD muito antes do início anunciado da greve, isto porque a gravação estava disponibilizada pela secretaria desde os dias 14-07-2022 (1.ª sessão), 19-10-2022 (2.ª sessão) e 31-10-2022 (3.ª sessão) ou seja, dois dias depois de cada sessão do julgamento, nos termos do n.º 3 do art.º 155.º do CPC.


Se, porventura, a secretaria tivesse omitido essa disponibilização, então, a ré, tinha o dever de assinalar formalmente essa incidência ao Tribunal (rectius, invocar a nulidade dessa não disponibilização), como forma de desencadear o ato pressuposto nesse n.º 3 do artigo 155.º do CPC.


Mesmo concedendo que a ré, nas datas em que as gravações ficaram disponíveis, ainda não sabia se teria interesse em recorrer, pois ainda não conhecia a sentença, então, a interpretação a fazer é a de que após se considerar notificada da sentença que lhe foi desfavorável (14-04-2023 [8]), poderia ter solicitado logo as gravações. Porém, esperou pelo primeiro dia da greve para o fazer e pelo terceiro dia de greve para entregar um suporte digital para a gravação e do primeiro dia após a greve (quando até já lhe tinha sido entregue o CD gravado), para suscitar a questão da suspensão do prazo de recurso, por a gravação não lhe ter sido entregue em momento anterior. Muito convenientemente, fê-lo no penúltimo dia do prazo de recurso (15+10 dias).


Acresce que, como muito bem se assinalou no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 31-07-2015, Proc. n.º 125/14.5TTCSC.L1-4, relatado pelo Dr. José Eduardo Sapateiro, in dgsi.pt: «O prazo de interposição de recurso não se suspende com a formulação do pedido eletrónico de fornecimento de cópia daquele registo-áudio e só se reinicia no dia da efetiva entrega do CD, pois inexiste regra jurídica que, fora das situações excecionais do justo impedimento (artigo 140.º do NCPC) ou do n.º 6 do artigo 157.º do mesmo diploma legal, dê cobertura mínima a uma tal tese, que, aliás, a vigorar, permitiria o alargamento artificial e conveniente do prazo de recurso, dado não poder ser quantificado o tempo que mediaria entre a manifestação de vontade da parte em obter o registo e o efetivo fornecimento dos meios materiais para tal efeito (na exclusiva dependência da parte interessada, sem prejuízo dos casos extremos de abuso de direito ou de uma eventual intervenção do juiz, quando a demora fosse considerada excessiva, ao abrigo dos seus poderes de gestão processual)


Quando o CD lhe foi entregue, a ré ainda estava em prazo para interpor o recurso. Restava-lhe ainda mais um dia até ao termo (09-05-2023) e depois mais 3 dias úteis (12-05-2023). Acabou por interpor o recurso em 16-05-2023, ou seja, 8 dias depois de ter o CD na sua posse e 7 dias depois de o prazo de recurso ter chegado ao fim.


Portanto, não nos parece correta a afirmação da recorrente de que interpôs o recurso nos três primeiros dias úteis subsequentes ao termo do prazo de recurso.


Vejamos, então, a outra norma invocada pela ré, a qual constitui uma emanação do princípio da confiança, i.e., o n.º 6 do art.º 157.º do CPC:


«Os erros e omissões dos atos praticados pela secretaria judicial não podem, em qualquer caso, prejudicar as partes.»


Primeiro, não se vislumbra qualquer erro praticado pela secretaria judicial.


Segundo, não omitiu qualquer ato, pois entregou o CD gravado ao Ilustre Mandatário da ré antes do prazo de recurso terminar, sendo certo que, como vimos, o prazo de interposição de recurso não se suspende entre o pedido eletrónico de fornecimento da gravação da audiência e a efetiva entrega do CD gravado, pois inexiste regra jurídica que sustente tal tese.


O motivo pelo qual não a Secretaria Judicial não entregou o CD na semana anterior (entre 2 e 5 de maio) é perfeitamente legítimo, por se tratar do exercício do direito constitucional à greve, a qual tinha sido anunciada em 11-04-2023.


Por fim, acrescente-se que, mesmo que não tivesse havido greve ou algum dos Senhores Funcionários não tivesse aderido a ela, a recorrente não poderia, razoavelmente, esperar que, enviando o CD pelo Correio em 27-04-2023 (quinta-feira), o qual deu entrada na Unidade Central do Tribunal em 28-04-2023 [9], o mesmo CD já gravado ainda lhe fosse entregue no mesmo dia 28-04-2023, fosse possível (não vemos como, atenta a nota de rodapé n.º 8) proceder à gravação do CD antes das 16:00 horas, momento em que encerra o atendimento na Secretaria Judicial. De resto, não havia ninguém do escritório do Ilustre Mandatário presente no Tribunal para o receber, o que nem sequer vem alegado.


Logo, caso não tivesse havido adesão total à greve, o CD já gravado só poderia ter sido entregue à recorrente no dia útil seguinte, ou seja, na terça-feira, dia 02-05-2023, se ela se tivesse apresentado para o levantar. Porém, a recorrente não alega que se deslocou ao Tribunal para levantar o CD gravado nos dias 2 a 5 de maio, o que poderia ter feito, pois a circunstância de os Senhores Funcionários terem aderido à greve nos dias 26, 27 e 28 de abril, não impedia que fossem trabalhar em qualquer dos dias 2 a 5 de maio. Dentro desta lógica, a entrega pressupõe dois atos praticados por pessoas diferentes: a que entrega e a que recebe. Ou seja, também não se pode falar em omissão da entrega do CD gravado nos dias 2, 3, 4 e 5 de maio, porque também ninguém se apresentou neste Tribunal (que estava aberto no horário de expediente) para o receber.


Neste sentido, veja-se o sumário do Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, de 12/10/2017, Proc.º n.º 1382/14.2TBLLE-A.E1, Sequinho dos Santos, in dgsi.pt:


«1 – A disponibilização, às partes, da gravação da audiência final de ações, incidentes e procedimentos cautelares, nos termos do artigo 155.º, n.º 3, do CPC, consiste na simples colocação, pela secretaria judicial, da referida gravação à disposição das partes para que estas possam obter cópia da mesma.


2 – Tal disponibilização não envolve a realização de qualquer notificação, às partes, de que a gravação se encontra disponível na secretaria judicial, nem se confunde com a efetiva entrega de suporte digital da mesma gravação às partes.»


E, como se diz na fundamentação deste aresto:


«…, em parte alguma a lei impõe que a secretaria realize a notificação referida pelo recorrente. Além de resolver as dúvidas que o regime anterior suscitava, foi intenção do legislador que o procedimento tendente à obtenção de cópia da gravação pelas partes seja o mais simples possível, sem necessidade de realização de qualquer notificação pela secretaria e tendo em vista garantir que algum problema que se verifique com a gravação seja resolvido com rapidez, no tribunal de primeira instância. Se fosse intenção do legislador que a secretaria notificasse as partes de que a gravação está disponível, certamente o teria estabelecido expressamente. Todavia, não é, manifestamente, isso que o n.º 3 do artigo 151.º faz.


Por outro lado, disponibilizar não é entregar o suporte digital da gravação às partes. Desde logo, porque, na língua portuguesa, estas duas palavras não são sinónimas. Disponibilizar é colocar algo à disposição de outrem, ainda que o terceiro assuma uma atitude de inércia e não aproveite tal disponibilidade. Entregar é mais que isso, é transferir algo para o poder, para as mãos de outrem. Na hermenêutica jurídica, tem de se partir do princípio de que o legislador soube exprimir o seu pensamento em termos adequados (Código Civil, artigo 9.º, n.º 3, in fine), pelo que o verbo “disponibilizar” deve ser interpretado em sentido próprio e não como sinónimo de “entregar”.»


Temos, pois, de concluir que o prazo para interpor este recurso terminou em 09-05-2023, mas ele só foi interposto no dia 16-05-2023.


Pelo exposto, decido:


- Indeferir o requerimento de justo impedimento; e


- Não obstante ser legalmente admissível (art.º 79.º-A, n.º 1, al. a) do CPT), não admitir o recurso por ser intempestivo.


Custas pela recorrente.»


***


3. A Ré, quando interpôs o presente recurso de revista, arguiu a nulidade por omissão de pronúncia do acórdão da conferência, tendo o Tribunal da Relação de Lisboa, por acórdão de 22.11.2023, considerado inexistir omissão de pronúncia.


***


O presente recurso é interposto pela Ré como Revista Excecional, invocando para o efeito o disposto no artigo 672.º, n.º 1, alíneas a), b) e c) do Código de Processo Civil (questão com relevância jurídica, interesses de particular relevância social e contradição de acórdãos), face à situação de dupla conforme vivenciada nos autos.


***


4. O relator do presente recurso de revista, entendeu ouvir previamente as partes, nos termos do princípio do contraditório [números 1 do artigo 655.º e 3 do artigo 3.º do NCPC], relativamente às diversas dúvidas que se lhe suscitavam, quer, no plano imediato, da impossibilidade legal da Ré poder interpor recurso de revista do Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa que confirmou a Decisão Sumária que, por seu turno, havia já indeferido a Reclamação deduzida pela aqui recorrente ao abrigo dos artigos 82.º do CPT e 643.º do NCPC, quer no que respeita ao cumprimento dos requisitos reclamados pelo recurso de revista excecional, tendo a ODC ORGANIZAÇÃO, DOCUMENTAÇÃO E CONTABILIDADE, LDA. apresentado Requerimento onde sustentava o que nas suas alegações de recurso havia substancialmente defendido quanto à verificação de uma situação de justo impedimento e ao seu reconhecimento e declaração judiciais, assim como no que respeita à efetiva existência de um cenário de oposição de acórdãos.


*


5. O relator deste recurso de revista proferiu então Decisão Sumária, com data de 4/3/2024, no sentido da rejeição de tal recurso, pelo conjunto de fundamentos que da mesma constam.


*


6. A recorrente, na sequência da notificação de tal Decisão Sumária, veio requerer que a matéria fosse decidida em conferência, por Acórdão proferido por três juízes-conselheiros deste Supremo Tribunal de Justiça [«ODC - ORGANIZAÇÃO, DOCUMENTAÇÃO E CONTABILIDADE LDA, Recorrente nos autos à margem referenciados, notificada da douta decisão singular proferida com a v/ Ref.ª 12221150, vem nos termos do artigo 652º n.º 3 do Código de Processo Civil, por considerar que esse despacho a prejudica, requerer com o devido respeito que sobre a matéria do despacho recaia um acórdão.»]


A reclamante vem, para além do que já consta das suas alegações e conclusões de recurso, complementar o seu pedido de julgamento em Conferência com a seguinte argumentação jurídica:


«1. Entende a Recorrente, com o devido respeito, que o despacho proferido - decisão singular - pelo Exmo. Senhor Juiz Conselheiro, relator nos presentes autos, na parte em que não admite o Recurso por desconsiderar (i) impossibilidade da revista nos termos dos artigos 671.º e 672.º do CPC, (ii) inexistir genuína e verdadeira oposição de julgados e (iii) impossibilidade de conhecimento da arguida nulidade de omissão de pronúncia.


A Recorrente discorda. Vejamos,


2. A problemática dos presentes autos assenta em ter sido coartado à recorrente o direito aos 10 dias adicionais de prazo que a lei processual lhe atribui, por facto de terceiro (greve de funcionários judiciais) a que é alheia e que constitui justo impedimento.


3. Prevê a lei processual laboral para a reapreciação da prova gravada que a parte beneficia no prazo de recurso da sentença, mais 10 dias para além dos 15, nos termos do art.º 80.º n.º 2 e 3 do CPT.


4. Ao reiterar-se a dupla conformidade entre a Relação e a 1.ª instância quanta à questão recursiva submetida à apreciação do tribunal de revista, correspondente ao indeferimento do "justo impedimento" invocado pela Recorrente, o que obstaria ao conhecimento do objeto do recurso.


5. A não ser que a parte recorrente interpusesse recurso no âmbito extraordinário dos «casos em que o recurso é sempre admissível» (art.º 671.º, n.º 3 e 629.º, n.º 2 do CPC).


6. Em particular considerando o âmbito e aproveitamento processual da revista excecional originariamente interposta) na al. d) do art.º 629.º, n.º 2 em que o fundamento de admissibilidade do recurso depende da existência de "contradição jurisprudencial”, sendo ónus do Recorrente a indicação de um só acórdão-fundamento em oposição como acórdão recorrido e, ademais, a junção de certificação do respetivo trânsito em julgado. [10]


7. No que respeita ao vicio invocado e alegadamente resultante da violação das regras do “justo impedimento", expliquemos o que está em causa, atenta a tramitação.


8. Perante a alegação de “justo impedimento” pelos motivos supra explanados, o juiz de 1.ª instância proferiu despacho/sentença de indeferimento do "justo impedimento" - no qual julgou a sua não verificação.


9. A omissão ou violação dos preceitos respeitantes ao "justo impedimento" podem consubstanciar, na verdade, uma nulidade processual, abrangida pela cláusula geral do artigo 195.°, n.º 1 do CPC.


10. Do despacho reclamado na 1.ª instância que decidiu o indeferimento do justo impedimento constam genericamente as seguintes razões que no entendimento do Mm.º Juiz de Direito obstam ao deferimento do justo impedimento, a saber:


(i) “o país inteiro sabia que os Senhores Oficiais de Justiça estavam em greve e o Ilustre Mandatário da ré, enquanto profissional do foro, não poderia deixar de saber com antecipação, lembrando que o pré-aviso de greve é de 11-04-2023, ou seja, 17 dias antes de o CD ter chegado ao Tribunal”;


(ii) que não há omissão da secretaria;


(iii) que a greve terminou antes do prazo judicial e que no dia da devolução do CD ainda a recorrente tinha um dia de prazo;


11. As nulidades processuais são arguidas e conhecidas, em regra, perante o tribunal onde foi cometida, por meio de reclamação, o que aconteceu.


12. A Autora e aqui Recorrente reclamou perante o juiz de 1.ª instância da nulidade.


13. A Recorrente invoca a contradição de julgados entre a decisão em crise e o Acórdão da Relação de Lisboa com n.º de processo 42037/06.5YYLSB-B.L1-2, que decidiu que “IV - Basta a comunicação do impedimento para que a audiência seja adiada, a menos que o mandatário tenha referido expressamente a sua não oposição ao inicio da audiência”.


14. Dissecados os requisitos do art.º 629.°, n.º 2, d), do CPC, o apuramento da contradição jurisprudencial obedecera aos seguintes requisitos (de acordo com a síntese de Abrantes Geraldes) [11]:


(1) incidência de ambos os acórdãos sobre a mesma questão fundamental de direito;


(2) contradição frontal entre as respostas dadas pelo acórdão recorrido e pelo acórdão fundamento;


(3) a questão de direito em causa ser essencial para o resultado das decisões em confronto;


(4) a identidade substantiva do quadro normativo em que se integra a questão de direito.


15. Concluir-se-á que existe oposição de julgados ou contradição jurisprudencial quando - e apenas quando - o acórdão recorrido estiver em oposição frontal com outro proferido no domínio da mesma legislação que respeite a mesma questão de direito, de carácter essencial para a resolução jurídica, e, de todo o modo, apresentem uma identidade factual ("factualidades equiparáveis" para configurar a "identidade do núcleo essencial da situação fáctica" [12] que releve - ou não a contrarie - para a razão de ser da regra jurídica em discussão.


Ora, cremos que a posição da recorrente é positiva quanta a esse preenchimento.


16. Confrontando os dois acórdãos, verifica-se que neles foi decidida «a mesma questão fundamental de direito», «no domínio da mesma legislação», como exige o art.º 629.º, n.º 2 d), do CPC.


17. Ambos lidaram com a interpretação e a aplicação quanto ao instituto do justo impedimento do CPC.


18. Acrescentamos, ainda, que basta a comunicação do impedimento para que o ato processual possa ser adiado.


19. Assim, entendemos que deveria ter sido adiado o prazo de entrega da peça processual de recurso.


20. Não o tendo feito, o tribunal a quo violou o disposto nas normas suprarreferidas.


E na posição da Recorrente cremos que mais do que a letra das decisões, está em causa a natureza do mecanismo.


21. A natureza repentina e impeditiva do justo impedimento carece de um mecanismo processual adequado a tal.


22. Na posição que a Recorrente pretende sustentar quanto ao presente acórdão fundamento (e por extensão aos demais já assinalados nos autos), onde temos “audiência de julgamento” deve quanto ao n/ caso em apreço ler-se “prática de ato processual”.


23. Onde lemos quanto ao justo impedimento apresentado no acórdão fundamento uma “condição de saúde” deve entender-se quanto ao n/ caso em apreço “greve de funcionários judiciais”.


24. Por fim, é evidente que a diferença de soluções sobre a interpretação dos normativos aplicáveis para averiguar do "justo impedimento" mostra-se essencial ou fundamental para a solução do caso, ou seja, integra a verdadeira ratio decidendi dos acórdãos em confronto nos segmentos pertinentes.


25. As situações de facto não são exatamente idênticas - o acórdão fundamento considera o "justo impedimento" a luz de uma causa de saúde relativa à pessoa do mandatário, enquanto o acórdão recorrido analisa o "justo impedimento" em face de uma greve de trabalhadores que o mandatário não controla.


26. Mas podemos afirmar que as situações de facto se equiparam na sua incidência jurídico-normativa, uma vez que ambas são referidas a situações de impedimento, que justificam a ausência e, por essa via, conferem a base para averiguar a legitimidade da invocação do justo impedimento.


27. Embora diferentes, como se referiu no Ac. do STJ de 2110/2014 19 estamos perante "situações materiais litigiosas que, de um ponto de vista jurídico-normativo - tendo em consideração a natureza e teleologia dos específicos interesses das partes em conflito" -, são "análogas ou equiparáveis, pressupondo o conflito jurisprudencial uma verdadeira identidade substancial do núcleo essencial da matéria litigiosa subjacente a cada uma das decisões em confronto";


28. Em suma, situações de facto equiparáveis de um ponto de vista jurídico-normativo para se afirmar a exigida contradição jurisprudencial.


29. Logrando demonstrar-se os pressupostos da admissibilidade do recurso ao abrigo do art.º 629.º, n.º 2, d), o mesmo é admitido e deve o STJ apreciar o mérito da questão e, consequentemente, a procedência ou improcedência do recurso.


30. Em conexão óbvia, acrescentamos que o "justo impedimento" pode radicar em motivo de caso de força maior. E este, como causa justificativa e excludente de incumprimento de dever ou obrigação - nesta hipótese, trata-se (em paralela relevante) de um ónus processual -, consiste num "facto de terceiro" complexo pelo qual não se é responsável - a greve de trabalhadores judiciais .


31. Por isso, a força maior não assenta em facto imprevisível; ao invés, "tem subjacente a ideia de inevitabilidade, será todo o acontecimento natural ou ação humana que, embora previsível ou até prevenido, não se pode evitar, nem em si mesmo nem nas suas consequências".


32. Perante este quadro factual e jurídico, consideramos que, tendo sido comunicado e justificado o motivo de "justo impedimento" antes do final do prazo processual (tempestivamente), a ponderação que se exigia ao juiz implicava um juízo afirmativo de "justo impedimento". Deveria, em consequência, ter sido adiada a prática do ato, numa correta interpretação dos preceitos aplicáveis do CPC.


33. Note-se que é suficiente a comunicação com a indicação do motivo do impedimento para que o ato seja adiado, a fim de ser provocada a ponderação exigida ao juiz.


34. E sublinhe-se que, ao contrário do que se afirma no despacho recorrido de apelação e se segue no acórdão recorrido de revista, a previsibilidade - mesmo que fosse de considerar como tendo acontecido - não acarreta imputabilidade censurável a quem invoca o "justo impedimento".


35. Releva sim a inevitabilidade de facto como sendo de "força maior", justificável objetivamente.


36. A impossibilidade de adiamento da entrega da peça processual de recurso da Autora, uma vez sem fundamento o despacho para indeferir o "justo impedimento" que motivaria o seu adiamento, constitui nulidade processual secundária ou atípica nos termos do art.º 195.°, 1, do CPC:


37. O que implica a anulação do despacho que determinou o indeferimento do "justo impedimento" e assim todos os termos subsequentes da tramitação, de acordo como art.º 195.º, n.º 2 do CPC.


Face ao exposto e porque entende a recorrente que a decisão constante do despacho ora reclamado a prejudica e porque não é de mero expediente, requer que sobre a matéria haja uma apreciação dessa decisão através de um acórdão da conferência depois de ouvida a parte contrária.


Termos em que, e nos melhores de Direito que V. Exas. doutamente suprirão, requer a admissão da presente reclamação para que de seguida, por acórdão da conferência se decida admitir o recurso de apelação para cumprimento do previsto no entendimento dos artigos 80.º n.º 2 e 3 do Código de Processo de Trabalho e 140.º n.º 1 e 3 do Código de Processo Civil, seguindo-se os ulteriores termos decidindo-se pela (i) nulidade do acórdão decorrente da omissão de pronúncia sobre questão que o Tribunal devia conhecer, (ii) deverá o Supremo Tribunal de Justiça determinar a revogação da decisão que indeferiu o justo impedimento, julgando o mesmo verificado e, destarte, revogar todo o processado e fazendo aceitar o interposto recurso de apelação, assim se fazendo a acostumada Justiça!»


*


7. Notificada a Autora de tal Reclamação para a Conferência, nada veio dizer dentro do prazo legal.


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8. Cumpre decidir, em Conferência.


II – OS FACTOS

9. Os factos a considerar encontram-se descritos no Relatório da presente Decisão Singular, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, na parte que releva.


III – OS FACTOS E O DIREITO

10. A Decisão Sumária reclamada possui a seguinte Fundamentação jurídica:


«Determinada a natureza jurídico-processual do presente recurso de revista [excecional], importa saber se o mesmo cumpre os requisitos gerais de admissibilidade dos recursos.


O relator deste recurso, em nome do princípio do contraditório e para evitar decisões-surpresas, mandou dar cumprimento ao disposto no artigo 3.º, números 2 e 3 do NCPC, quanto às diversas dúvidas que se suscitavam nestes autos recursórios relativamente à admissibilidade da presente Revista.


A recorrente, ao contrário do recorrido, veio pronunciar-se sobre tais matérias, dentro do prazo legal de 10 dias, mediante apresentação, no dia 15/2/2024, de Requerimento, cópia do Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 7/02/2019, proferido no processo número 42037/06.5YYLSB-B.L1-2 e pedido eletrónico de emissão de certidão comprovativa do trânsito em julgado do mesmo, datado de 14/2/2024 [13].


Ora, verifica-se que, não obstante o recurso ter sido interposto em prazo e por quem tem legitimidade, já não parece que o tenha sido por referência a acórdão que seja recorrível, pois a presente revista excecional foi interposta de um Aresto proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa no quadro de uma Reclamação deduzida ao abrigo dos artigos 82.º do CPT e 643.º do CPC/2013, cujo regime legal aplicável não prevê a possibilidade de existência de um 2.º grau ou nível de apreciação da decisão judicial proferida a esse título e com tal objeto [indeferimento de reclamação que incide sobre despacho judicial do tribunal da 1.ª instância de rejeição de recurso de Apelação].


Se, como regra, não há lugar à possibilidade de reapreciação por este Supremo Tribunal de Justiça do objeto de um Aresto do tribunal da 2.ª instância que se pronunciou sobre a admissibilidade ou rejeição de um recurso de Apelação, no seio de um incidente processual como o é o da Reclamação requerida ao abrigo dos artigos 82.º do CPT e 643.º do CPC/2013, então parece que não apenas o recurso de revista normal [ou seja, interposto segundo o disposto nos números 1 e 2 do artigo 671.º do NCPC], não é legalmente possível, como também o recurso de revista excecional regulado no artigo 672.º do mesmo diploma legal não poderá ser igualmente interposto no quadro desta mesma Reclamação.


Conforme defende ANTÓNIO SANTOS ABRANTES GERALDES [14], «5.1. A norma do art.º 643.º, associada ao n.º 5 do art.º 652.º, confronta-nos com a questão da admissibilidade do recurso de revista do acórdão da Relação que confirme o despacho do juiz de 1.ª instância de rejeição do recurso de apelação.


Uma interpretação descontextualizada de tais preceitos é suscetível de conduzir a uma solução afirmativa da admissibilidade do recurso de revista, nos termos gerais, atento o teor do n.º 5 do art.º 652.°. Creio, no entanto, que a conjugação dos preceitos e a ponderação da evolução histórica do regime determina solução diversa que se traduz na inadmissibilidade de recurso de revista, sem embargo dos casos em que o recurso é sempre admissível, atento o disposto no n.º 2 do art.º 629.°.


5.2. O atual regime de apreciação da reclamação contra o despacho de rejeição do recurso de apelação sucedeu a um outro em que esse poder estava concentrado no Presidente da Relação cuja decisão era definitiva. No atual regime, a reclamação da decisão do juiz de 1.ª instância de rejeição do recurso de apelação é apreciada pelo relator no Tribunal da Relação e eventualmente secundada por acórdão da Relação (n.º 3 do art.º 652.°), revelando-se manifestamente desajustada a possibilidade de, ainda assim, se admitir, uma impugnação final para o Supremo ao abrigo do n.º 1 do art.º 671.°.


O que se justifica, por resultar da aplicação integrada de regras gerais, é aceitar a intervenção do Supremo nos casos em que o recurso é sempre admissível, ou seja, nas situações previstas no n.º 2 do art.º 629.º [15].


É este regime que impede que possa estabilizar-se com a força de caso julgado um acórdão da Relação (alegadamente) desrespeitador de re­gras de competência em razão da matéria, ofensivo de caso julgado ou que contrarie acórdão de uniformização do Supremo [16] ou outro acór­dão da Relação ou do Supremo.


Esta questão não se confunde com a admissibilidade do recurso de re­vista do acórdão da Relação que, em primeira mão, isto é, fora do in­cidente de reclamação previsto no art.º 643.º, rejeite o recurso de ape­lação interposto de uma decisão de 1.ª instância prevista no art.º 644.º, n.º 1 (por extemporaneidade, irrecorribilidade, ilegitimidade ou qual­quer outro fundamento). Esta situação deve ser equiparada à prevista no n.º 1 do art.º 671.°, já que o acórdão da Relação [confirmativo da deci­são do relator de rejeição do recurso de revista, ao abrigo do art.º 652.°, n.º 1, al. b)] põe efetivamente termo ao processo ou a um segmento do respetivo objeto (cf. adiante em 7.7).»


Sendo assim, há que rejeitar, por legalmente inadmissível, este recurso de revista, nos termos dos artigos 671.º e 672.º do CPC [se não é possível recorrer, em termos ordinários, para o STJ também o não será em termos excecionais, ainda que exista uma situação de dupla conforme], restando-nos saber se será possível convocar para aqui algumas das alíneas do número 2 do artigo 629.º do NCPC.


Ora, confrontando a motivação deste recurso de revista com os cenários previstos nessas quatro alíneas do número 2 do artigo 629.º do Código de Processo Civil de 2013, facilmente caímos no campo de aplicação da sua alínea d), quando nos fala da oposição entre acórdãos da 2.ª instância [admitindo a doutrina que o aresto recorrido possa também entrar em confronto com acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça], no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito.


A ser assim, da contraposição entre o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa que é objeto deste recurso de revista e aquele outro que é oferecido como acórdão-fundamento [ainda que sem certidão comprovativa do seu trânsito em julgado, apesar do prazo concedido de 10 dias já se achar significativamente ultrapassado], é manifesto que a situação vivida neste processo [greve dos oficiais de justiça, dificuldades vivenciadas ao nível da entrega pela secretaria judicial ao advogado da parte recorrente de cópias da gravação da prova produzida em Audiência Final, ocorrência de justo impedimento e alargamento do prazo para a Ré recorrer] é radicalmente distinta daquela apresentada no outro Acórdão, que se reconduz à falta de um ilustre mandatário judicial a uma Audiência Final e ao seu adiamento, com base num cenário de justo impedimento.


Logo, não se pode falar no caso dos autos de uma genuína e verdadeira oposição de julgados em termos da mesma realidade subjacente [factual e/ou processual], da mesma legislação e da mesma questão fundamental de direito.


Importa, finalmente, realçar que a circunstância de a recorrente ter, neste recurso de revista, arguido uma nulidade de sentença do Acórdão recorrido [omissão de pronúncia] não acarreta qualquer modificação ou desvio relativamente à argumentação deixada anteriormente desenvolvida, por tal irregularidade adjetiva do Aresto, invocada ao abrigo dos artigos 666.º e 615.º do NCPC, só poder ser conhecida e julgada por este Supremo Tribunal de Justiça após a admissão de tal recurso, o que não é o caso dos autos [17].


Logo, por tais motivos, entendemos que deve ser liminarmente rejeitado o presente recurso de revista do Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa.


Condena-se a Recorrente nas custas devidas, nos termos do artigo 527.º, número 1 do NCPC.»


***


IV – JULGAMENTO EM CONFERÊNCIA


11. Segundo os Reclamantes, a legislação aplicável ao recurso dos autos e que segundo ele é a adiante indicada e transcrita, impõe uma resposta positiva à questão formulada no Ponto anterior.


Importa chamar, desde já, à colação, tal legislação e que por força da remissão que o número 6 do artigo 81.º e os números 1 e 2 do artigo 87.º do Código de Processo do Trabalho fazem para o regime comum do recurso de revista contido no Código de Processo Civil, em tudo o que não se ache especialmente regulado no Código do Processo do Trabalho [o que nos posiciona fundamentalmente no disposto nos artigos 80.º e número 3 do artigo 87.º do CPT], se reconduz ao disposto nos artigos 671.º, 672.º e 629.º daquele diploma legal, quando estatuem o seguinte [18]:


Artigo 671.º


Decisões que comportam revista


1 - Cabe revista para o Supremo Tribunal de Justiça do acórdão da Relação, proferido sobre decisão da 1.ª instância, que conheça do mérito da causa ou que ponha termo ao processo, absolvendo da instância o réu ou algum dos réus quanto a pedido ou reconvenção deduzidos.


2 - Os acórdãos da Relação que apreciem decisões interlocutórias que recaiam unicamente sobre a relação processual só podem ser objeto de revista:


a) Nos casos em que o recurso é sempre admissível;


b) Quando estejam em contradição com outro, já transitado em julgado, proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça, no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito, salvo se tiver sido proferido acórdão de uniformização de jurisprudência com ele conforme.


3 - Sem prejuízo dos casos em que o recurso é sempre admissível, não é admitida revista do acórdão da Relação que confirme, sem voto de vencido e sem fundamentação essencialmente diferente, a decisão proferida na 1.ª instância, salvo nos casos previstos no artigo seguinte.


4 - Se não houver ou não for admissível recurso de revista das decisões previstas no n.º 1, os acórdãos proferidos na pendência do processo na Relação podem ser impugnados, caso tenham interesse para o recorrente independentemente daquela decisão, num recurso único, a interpor após o trânsito daquela decisão, no prazo de 15 dias após o referido trânsito.


Artigo 672.º


Revista excecional


1 - Excecionalmente, cabe recurso de revista do acórdão da Relação referido no n.º 3 do artigo anterior quando:


a) Esteja em causa uma questão cuja apreciação, pela sua relevância jurídica, seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito;


b) Estejam em causa interesses de particular relevância social;


c) O acórdão da Relação esteja em contradição com outro, já transitado em julgado, proferido por qualquer Relação ou pelo Supremo Tribunal de Justiça, no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito, salvo se tiver sido proferido acórdão de uniformização de jurisprudência com ele conforme.


2 - O requerente deve indicar, na sua alegação, sob pena de rejeição:


a) As razões pelas quais a apreciação da questão é claramente necessária para uma melhor aplicação do direito;


b) As razões pelas quais os interesses são de particular relevância social;


c) Os aspetos de identidade que determinam a contradição alegada, juntando cópia do acórdão-fundamento com o qual o acórdão recorrido se encontra em oposição.


3 - A decisão quanto à verificação dos pressupostos referidos no n.º 1 compete ao Supremo Tribunal de Justiça, devendo ser objeto de apreciação preliminar sumária, a cargo de uma formação constituída por três juízes escolhidos anualmente pelo presidente de entre os mais antigos das secções cíveis.


4 - A decisão referida no número anterior, sumariamente fundamentada, é definitiva, não sendo suscetível de reclamação ou recurso.


5 - Se entender que, apesar de não se verificarem os pressupostos da revista excecional, nada obsta à admissibilidade da revista nos termos gerais, a formação prevista no n.º 3 determina que esta seja apresentada ao relator, para que proceda ao respetivo exame preliminar.


Artigo 629.º


Decisões que admitem recurso


1 - O recurso ordinário só é admissível quando a causa tenha valor superior à alçada do tribunal de que se recorre e a decisão impugnada seja desfavorável ao recorrente em valor superior a metade da alçada desse tribunal, atendendo-se, em caso de fundada dúvida acerca do valor da sucumbência, somente ao valor da causa.


2 - Independentemente do valor da causa e da sucumbência, é sempre admissível recurso:


a) Com fundamento na violação das regras de competência internacional, das regras de competência em razão da matéria ou da hierarquia, ou na ofensa de caso julgado;


b) Das decisões respeitantes ao valor da causa ou dos incidentes, com o fundamento de que o seu valor excede a alçada do tribunal de que se recorre;


c) Das decisões proferidas, no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito, contra jurisprudência uniformizada do Supremo Tribunal de Justiça;


d) Do acórdão da Relação que esteja em contradição com outro, dessa ou de diferente Relação, no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito, e do qual não caiba recurso ordinário por motivo estranho à alçada do tribunal, salvo se tiver sido proferido acórdão de uniformização de jurisprudência com ele conforme.


3 – […]


Será com tal regime legal de cariz adjetivo como pano de fundo que iremos apreciar esta Reclamação.


13. Chegados aqui e tendo como pano de fundo o regime legal aplicável - artigos 82.º do CPT e 643.º, 671.º, 672.º, 674.º e 629.º do Código de Processo Civil de 2013 -, o teor da Decisão Sumária proferida nos autos e a argumentação desenvolvida nas alegações de recurso e na Reclamação da recorrente, importa realçar que a Ré ODC ORGANIZAÇÃO, DOCUMENTAÇÃO E CONTABILIDADE, LDA. vem interpor uma Revista do Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa que foi prolatado em 13.09.2023 e que confirmou a Decisão Singular de 11.08.2023 proferida pelo relator no âmbito da Reclamação deduzida pela Ré, nos termos do artigo 643.º do Código de Processo Civil e artigo 82.º, n.º 2 do Código de Processo do Trabalho, que não atendeu a tal Reclamação e reiterou o despacho judicial de 24.06.2023, proferido pelo Tribunal de 1.ª instância e que foi no sentido do indeferimento do justo impedimento invocado e da não admissão, por intempestivo, do recurso de apelação interposto da sentença publicada no âmbito da ação de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento, prevista nos artigos 98.º-B e segs. do Código de Processo de Trabalho, que foi proposta pela trabalhadora AA contra a acima identificada empregadora ODC ORGANIZAÇÃO, DOCUMENTAÇÃO E CONTABILIDADE, LDA.


Ora, conforme resulta da nossa doutrina e jurisprudência, não há, no regime processual vigente e que deixámos acima transcrito, espaço legal, no âmbito de tal incidente de reclamação dos artigos 82.º, número 2, do CPT e 643.º do NCPC, para a interposição do recurso de revista ordinário [artigo 671.º] ou excecional [artigo 672.º] de acórdão das relações que tenha reiterado despacho judicial de rejeição de recurso de apelação respeitante a decisão de tribunal de comarca.


ANTÓNIO SANTOS ABRANTES GERALDES, PAULO PIMENTA e LUÍS FILIPE PIRES DE SOUSA, em «Código de Processo Civil Anotado», Volume l, PARTE GERAL E PROCESSO DE DECLARAÇÃO [Artigos 1.º a 702.º], 3.ª Edição, junho de 2022, Almedina, página 801 confirmam precisamente tal ideia, ao afirmarem o seguinte:


«3. Da decisão singular do relator de confirmação ou de revogação da decisão do juiz a quo é admissível reclamação para a conferência (art.º 652.º, n.º 3). Já do acórdão da Relação que, em resultado da reclamação para a conferência da decisão do relator, venha a ser proferido não é admissível recurso de revista, salvo se ocorrer alguma situação excecional ressalvada pelo art.º 6719, n9 2 (cf. explicação mais detalhada em Abrantes Geraldes, Recursos no NCPC, 5â ed., pp. 194 e 195). Com efeito, o facto de à decisão do juiz de 1- instância que rejeitou o recurso suceder a decisão do relator, a qual, por sua vez, pode ainda ser submetida à conferência, numa multiplicidade de graus de jurisdição, torna a situação incompatível com a apresentação de um recurso de revista para o Supremo.»


ANTÓNIO SANTOS ABRANTES GERALDES [19]


«5. Entendo que o recurso de revista é inadmissível nesse e em quaisquer outros casos, a não ser que se verifique alguma das situações previstas nos arts. 629.°, n.º 2, e 671.°, n.º 2.


O primeiro argumento, de natureza formal, que pode ser aduzido para sustentar esta resposta assenta diretamente no art.º 643.°, n.º 4, na medida em que a remissão é feita exclusivamente para o n.º 3 do art.º 652.° e não para o seu n.º 5. Mas parece-me mais importante, contudo, o contributo que pode ser extraído dos elementos de natureza histórica e racional, e que apontam para uma interpretação restritiva do art.º 652.°, n.º 5, al. b). [20]


Por via da história do regime da reclamação, é de notar que jamais esteve consagrada a possibilidade intervenção regular do Supremo numa questão em torno da admissibilidade do recurso de apelação. [21] E, de facto, não parece curial atribuir a um acórdão da Relação confirmativo da decisão da 1.ª instância que rejeitou o recurso de apelação um tratamento mais solene do que aquele que é dado à generalidade dos acórdãos da Relação que apreciam decisões interlocutórias e cuja impugnação em sede de revista sofre a grave restrição que decorre do n.º 2 do art.º 671.°.


Ademais, não se encontra nos propósitos do legislador motivo algum para considerar que uma decisão daquele teor (ou seja, decisão de rejeição do recurso de apelação pelo juiz de1.ª instância), que admite reclamação para a Relação (segundo grau de jurisdição, nos termos do art.º 643.°, n.º 1) e que até consente a intervenção da conferência (com elaboração de acórdão, numa espécie de terceiro grau de jurisdição, nos termos do art.º 643.°, n.º 4, in fine), possa ainda justificar a admissibilidade do recurso de revista, nos termos gerais.


Por conseguinte, não é de admitir recurso de revista do acórdão da Relação que confirme a decisão da 1.ª instância de rejeição do recurso de apelação, a não ser quando se verifique alguma das previsões excecionais dos arts. 629.°, n.º 2, e 671.°, n.º 2. [22


14. A nossa jurisprudência, por seu turno e na sua grande maioria, vai nesse mesmo sentido, muito embora existam alguns Acórdãos deste Supremo Tribunal de Justiça [STJ] – que não acompanhamos - que parecem admitir, a contrario sensu, a interposição de recurso normal de revista em situações de não ocorrência de dupla conforme [não obstante as restrições do número 2 do artigo 671.º] [23].


Vejam-se, nessa medida, os seguintes Arestos deste Supremo Tribunal de Justiça:


- Acórdão do STJ de 19/05/2020, Processo n.º 361/04.2TBSCD-S.C1.S, Relatora: ASSUNÇÃO RAIMUNDO, publicado em ECLI:PT:STJ:2020:361.04.2TBSCD.S.C1.S1, com o seguinte Sumário:


I - O acórdão do Tribunal da Relação que se pronunciou em conferência sobre a não admissibilidade da apelação, em sede de reclamação do despacho do juiz da 1ª instancia que não admitiu o recurso interposto, decide em definitivo a questão da admissibilidade ou da subida do recurso de apelação.


II – Nesta conformidade, não é admissível recurso de revista do acórdão da Relação, proferido em conferência, que incidiu sobre reclamação do despacho do relator de não admissibilidade do recurso de apelação (art.º 643.º do CPC).


- Acórdão do STJ de 13/10/2020, Processo n.º 4044/18.8T8STS-B.P1.S1, Relatora: GRAÇA AMARAL, publicado em ECLI:PT:STJ:2020:4044.18.8T8STS.B.P1.S1.34, com o seguinte Sumário:


Não é passível de recurso de revista a decisão do tribunal da Relação, proferida em conferência, ao abrigo do disposto do artigo 643.º, n.º4, in fine, do CPC, confirmativa do despacho do relator de não admissão da apelação.


- Acórdão do STJ de 26/01/2021, Processo n.º 19477/16.6T8SNT-B.L1.S1, Relatora: MARIA OLINDA GARCIA, publicado em ECLI:PT:STJ:2021:19477.16.6T8SNT.B.L1.S.B8, com o seguinte Sumário:


Não admite recurso de revista o acórdão do tribunal da Relação que confirma o despacho do relator de não admissão do recurso de apelação, nos termos do art.º 643.º, n.º 4, in fine, do CPC.


- Acórdão do STJ de 17/11/2021, Processo n.º 8385/16.0T8VNG-H.P1-A.S1, Relator: RICARDO COSTA, publicado em ECLI:PT:STJ:2021:8385.16.0T8VNG.H.P1.A..2D, com o seguinte Sumário:


O acórdão do tribunal da Relação que se pronuncia em conferência sobre a admissibilidade do recurso de apelação, no âmbito do incidente de reclamação do despacho do juiz da 1.ª instância que não admitiu o recurso interposto (arts. 643.º, n.º 4, 2.ª parte, e 652.º, n.º 3, do CPC), julga em definitivo a questão da inadmissibilidade ou da subida do recurso de apelação (únicos resultados decisórios admitidos pelo art.º 643.º, n.º 4, 1.ª parte, do CPC).


- Acórdão do STJ de 09/12/2021, Processo n.º 2290/09.4TJPRT-B.P1.S1, Relatora: CATARINA SERRA, Maioria com Voto de Vencido, publicado em ECLI:PT:STJ:2021:2290.09.4TJPRT.B.P1.S1.BB, com o seguinte Sumário:


I. Da decisão de não admissão do recurso de apelação proferida no Tribunal de 1.ª instância cabe reclamação para o Tribunal da Relação, ao abrigo do artigo 643.º do CPC, e, depois, da decisão sobre esta reclamação cabe reclamação para a conferência, ao abrigo do artigo 652.º, n.º 3, do CPC.


II. Do Acórdão proferido pela conferência que confirma a decisão de não admissão do recurso de apelação não cabe, porém, nem reclamação nem recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, exceto nos casos em que o recurso é sempre admissível.


III. Quando o reclamante se limita a pedir que sobre a matéria recaia um acórdão e a conferência adere in totum à decisão singular é suficiente confirmar esta decisão e remeter para a respetiva fundamentação.


- Acórdão do STJ de 13/09/2022, Processo n.º 23178/09.3YYLSB-G.L1- A.S1, Relatora: MARIA CLARA SOTTOMAYOR, publicado em ECLI:PT:STJ:2022:23178.09.3YYLSB.G.L1.A.97, com o seguinte Sumário:


Os acórdãos, proferidos pela Relação, ao abrigo do artigo 643.º, n.º 1, do CPC, não admitem recurso de revista, uma vez que não se inscrevem no âmbito delimitado pelo artigo 671.º do CPC.


- Acórdão do STJ de 31/05/2023, Processo n.º 14555/15.1T8SNT-AK.L1.S1, Relator: RICARDO COSTA, publicado em ECLI:PT:STJ:2023:14555.15.1T8SNT.AK.L1.56, com o seguinte Sumário:


O acórdão do tribunal da Relação que se pronuncia em conferência sobre a admissibilidade do recurso de apelação, no âmbito do incidente de reclamação do despacho do juiz da 1.ª instância que não admitiu o recurso interposto (arts. 643.º, n.º 4, 2.ª parte, e 652.º, n.º 3, do CPC), julga em definitivo a questão da inadmissibilidade ou da subida do recurso de apelação (únicos resultados decisórios admitidos pelo art.º 643.º, n.º 4, 1.ª parte, do CPC), sem que para contrariar essa definitividade decisória possa ser usada a faculdade admitida pelo art.º 652.º, n.º 5, al. b), na relação com os arts. 670.º, n.ºs1 e 2 (revista normal), e 672.º, n.ºs 1 e 2 (revista excecional), do CPC.


- Acórdão do STJ de 16/11/2023, Processo n.º 17937/16.8T8LSB-G.E1-A.S1, Relator: NELSON BORGES CARNEIRO, publicado em ECLI:PT:STJ:2023:17937.16.8T8LSB.G.E1.A.B9, com o seguinte Sumário:


I – Da decisão de não admissão do recurso de apelação proferida no tribunal de 1.ª instância cabe reclamação para o tribunal da Relação, ao abrigo do artigo 643.º do CPCivil, e, depois, da decisão sobre esta reclamação, cabe reclamação para a conferência, ao abrigo do artigo 652.º/3, do CPCivil.


II – Do acórdão proferido pela conferência que confirma a decisão de não admissão do recurso de apelação não cabe, porém, nem reclamação, nem recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, exceto nos casos em que o recurso é sempre admissível.


III – A jurisprudência constitucional tem expressado o entendimento de que, em matéria cível, o direito de acesso aos tribunais constitucionalmente consagrado não integra forçosamente o direito ao recurso ou ao chamado duplo grau de jurisdição.


15. Resta-nos abordar a matéria respeitante à alínea d) do número 2 do artigo 629.º do Código de porcesso Civil de 2013, que é invocada pela recorrente, para jutificar a admissão do preesente recurso de revista, regra essa que, como sabemos, determina o seguinte: «2 - Independentemente do valor da causa e da sucumbência, é sempre admissível recurso: […] d) Do acórdão da Relação que esteja em contradição com outro, dessa ou de diferente Relação, no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito, e do qual não caiba recurso ordinário por motivo estranho à alçada do tribunal, salvo se tiver sido proferido acórdão de uniformização de jurisprudência com ele conforme.»


A recorrente entende que o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa do qual veio recorrer está em contradição com o Acórdão também do Tribunal da Relação de Lisboa de 7/02/2019 e que, tendo já transitado em julgado, foi proferido no processo número 42037/06.5YYLSB-B.L1-2, em que foi relator o Juiz Desembargador JORGE VILAÇA e que, mostra-se publicado em www.dgsi.pt, com o seguinte Sumário:


«I - Da conjugação dos art.ºs 603.º, n.ºs 1 e 3, e 151.º, n.º 3, do CPC, decorre que a audiência de discussão e julgamento, independentemente de requerimento, deve ser adiada quando ocorra motivo que constitua justo impedimento de algum dos advogados das partes, devendo este comunicar tal circunstância prontamente ao tribunal e justificar até aos cinco dias imediatos à data da audiência.


II - O justo impedimento em causa é aferido segundo o conceito do n.º 1 do art.º 140.º.


III - O despacho que aprecie o motivo invocado pelo mandatário para a sua ausência, deve apenas verificar se o motivo invocado (desarranjo intestinal) constituía ou não justo impedimento nos termos do art.º 140º, n.º 1.


IV - Basta a comunicação do impedimento para que a audiência seja adiada, a menos que o mandatário tenho referido expressamente a sua não oposição ao início da audiência.


V – Considerando que o motivo invocado preenche os requisitos do justo impedimento deve ser adiada a audiência e aguardar-se a respectiva justificação até aos cinco dias subsequentes.»


O recorrido Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa que foi prolatado em 13.09.2023 e que confirmou a Decisão Singular de 11.08.2023 proferida pelo relator no âmbito da Reclamação deduzida pela Ré, nos termos do artigo 643.º do Código de Processo Civil e artigo 82.º, n.º 2 do Código de Processo do Trabalho não se mostra publicado na Base de Dados da DGSI mas possui o seguinte Sumário:


«Não se verifica justo impedimento para a parte de recorrer por falta de acesso ao CD com as gravações das audiências de discussão e julgamento, quando esta o vem solicitar pouco antes de findar o prazo para o efeito e não o obtém imediatamente por os funcionários judiciais terem entrado em greve nesse mesmo dia, no âmbito de uma paralização coletiva publicamente anunciada há mais tempo.


Nessas circunstâncias, a Ré podia e devia ter antecipado tal possibilidade, não se podendo dizer que não houve qualquer descuido seu.»


Ora, embora não se verifiquem obstáculos porcessuais no que toca à admissão do recurso em termos de valor da ação - € 85.816,30 – e da sucumbência da recorrente/reclamante, quer no plano do litígio julgado nos autos principais – a ação foi julgada parcialmente procedente em montantes pecuniários que excedem metade do valor da alçada do tribunal da relação -, como ao nível da Reclamação do despacho de rejeição do recurso de Apelação e que foi confirmado pelo Aresto recorrido [sucumbência total], tendo a Ré legitimidade para recorrer e sendo tal decisão judicial coletiva impugnável judicialmente, entendemos que não se verificam os requisitos legais antes enunciados e que se reconduzem ao domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito.


Naturalmente que não ignoramos que os dois Arestos aqui em confronto se defrontam com o mesmo instituto legal do justo impedimento, conforme se acha definido e regulado no artigo 140.º do CPC/2013, mas essa mera convocação da figura para o cenário particular de cada um dos Acórdãos não é suficiente para se poder falar numa oposição ou contradição ao nível da solução jurídica dada a uma mesma questão fundamental de direito, com base em idêntico quadro normativo.


Sabemos que as diferenças existentes ao nível da situação de facto presente em cada um dos pleitos em comparação podem não justificar, em si e só por si, o afastamento da aplicação da alínea d) do número 2 do artigo 629.º do NCPC mas, nos casos concretos com que aqui nos deparamos, há que fazer notar a factualidade substancialmente distinta que os separa, pois no Acórdão-fundamento é a falta inesperada de um advogado a uma Audiência de Discussão e Julgamento que está em causa, ao passo que no Aresto recorrido é a entrega tardia das gravações da prova e demais intervenções ocorridas em Audiência Final ao mandatário judicial da Ré, por força, segundo a mesma, da greve dos oficiais de justiça que vigorava na altura.


Tal materialidade demanda não apenas a aplicação do aludido artigo 140.º do CPC/2013 como ainda das regras que regulam, por um lado, a realização das Audiências Finais nos incidentes declarativos [embargos de executado] que têm lugar no âmbito das ações executivas e os motivos de adiamento das mesmas [que, grosso modo, coincidem com as previstas no CPT] e, por outro, as que regulamentam o registo das Audiências de Audiência de Julgamento e de outras diligências judiciais [como o da Audiência Prévia], o acesso a tal gravação por parte dos litigantes e as consequências da sua falta ou deficiência, havendo ainda que, no caso especialíssimo do Aresto dos autos, cruzar estas últimas com o regime legal da greve e seus efeitos sobre a atividade dos funcionários judiciais.


Estes dispositivos legais – excluindo o artigo 140.º do NCPC – não se confundem nem sobrepõem, o que implica que também não se possa falar, em rigor, na aplicação da mesma legislação por parte dos dois Acórdãos aqui em análise.


Logo, sendo a factualidade subjacente a dada um dos Arestos, assim como as normas jurídicas que são invocadas no seu seio, muito diversas e exigindo apreciações de facto e de direito divergentes, é manifesto não se poder afirmar que nos deparamos com uma mesma e comum questão fundamental de direito.


A Ré procura centrar o enfoque do seu recurso interposto ao abrigo da alínea d) do número 2 do artigo 629.º do NCPC na problemática do justo impedimento, encarada em termos gerais e abstratos e não por referência, como é imposto pelo legislador, aos casos concretos, específicos e não coincidentes, no que de crucial ou fulcral deles ressalta, que temos entre mãos, não obstante terem ambos reclamado a convocação do regime jurídico do artigo 140.º.


Não ocorre, portanto e nessa medida, uma genuína e real oposição de julgados que motive e justifique a admissão do recurso da empregadora ao abrigo da mencionada norma adjetiva.


Sendo assim, pelos fundamentos constantes da Decisão Sumária reclamada e deste Aresto, não se admite o recurso de revista interposto pela reclamante ODC - ORGANIZAÇÃO, DOCUMENTAÇÃO E CONTABILIDADE LDA do Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, prolatado no âmbito do incidente de Reclamação deduzido por aquela, ao abrigo do artigo 82.º, número 2 do CPT e 643.º do NCPC.


IV – DECISÃO


Em conclusão, pelos fundamentos expostos e nos termos do número 1 do artigo 87.º e número 2 do artigo 82.º do Código do Processo do Trabalho e dos artigos 679.º, 643.º, 655.º, 652.º e 663.º do Novo Código de Processo Civil, acorda-se, em conferência, neste Supremo Tribunal de Justiça, em confirmar a Decisão Sumária do relator e, nessa medida, em rejeitar, por legalmente inadmissível, o recurso de revista interposto pela reclamante ODC - ORGANIZAÇÃO, DOCUMENTAÇÃO E CONTABILIDADE LDA do Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, prolatado no âmbito do incidente de Reclamação deduzido por aquela, ao abrigo do artigo 82.º, número 2 do CPT e 643.º do NCPC.


Custas a cargo da Recorrente – artigo 527.º, número 1 do Novo Código de Processo Civil.


Notifique e registe. D.N.


Lisboa, 17 de abril de 2024


José Eduardo Sapateiro – Juiz Conselheiro Relator


Mário Belo Morgado – Juiz Conselheiro Adjunto


Domingos Morais – Juiz Conselheiro Adjunto





__________________________________________________

1. A sentença proferida pelo Juízo do Trabalho de ... do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Norte, com data de 8 de abril de 2023, decidiu o litígio dos autos nos seguintes termos:

«Pelo exposto, julga-se

 Improcedente a exceção da caducidade do direito de exercício de ação disciplinar;

 Procedente a exceção da prescrição das infrações disciplinares relativamente, apenas, aos factos constantes da Nota de Culpa anteriores a 21-04-2020 e, na restante parte, improcedente;

 Procedente a ação de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento e, por conseguinte,

1. - Declara-se a irregularidade do procedimento disciplinar, por violação dos direitos de defesa da trabalhadora;

2. - Declara-se a ilicitude do despedimento ocorrido em 10-12-2021, por improcedência dos motivos invocados pela empregadora;

3. – Declara-se procedente a Oposição à Reintegração;

4. - A Reconvenção é parcialmente procedente e, em consequência,

4.1- Declara-se que a retribuição base da Autora, à data do despedimento, era de € 1.147,76 (mil, cento e quarenta e sete euros e setenta e seis cêntimos).

4.2 - Condena-se a Ré “ODC ORGANIZAÇÃO, DOCUMENTAÇÃO E CONTABILIDADE, LDA.” a pagar à Autora AA:

4.2.1 - Uma indemnização em substituição da reintegração a pedido do empregador, nos termos do art.º 392.º do Código do Trabalho, correspondente a 45 (quarenta e cinco) dias de retribuição base por cada ano ou fração completos de antiguidade que se vencer até ao trânsito em julgado desta sentença ou outra que a confirme, e que, nesta data, contabilizados 22 anos, 7 meses e 8 dias, já ascende a € 39.597,72 (trinta e nove mil, quinhentos e noventa e sete euros e setenta e dois cêntimos), acrescida de juros de mora, à taxa de legal, a contar do trânsito e até efetivo e integral pagamento;

4.2.2 - As retribuições que a trabalhadora deixou de auferir desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado desta sentença ou outra que a confirme – e que ascendem, à data de hoje, a € 22.224,55 (vinte e dois mil, duzentos e vinte e quatro euros e cinquenta e cinco cêntimos) – sobre as quais incidirão juros de mora vincendos à taxa legal a contar do trânsito em julgado da decisão final até integral pagamento, deduzidas as quantias recebidas pela autora até à data desse trânsito a título de subsídio de desemprego, que venham a ser liquidadas, as quais deverão ser entregues pela ré à Segurança Social;

4.2.3 - A título de indemnização por danos não patrimoniais, decorrentes da conduta ilícita da Ré durante o inquérito prévio, da ilícita suspensão preventiva da trabalhadora e do despedimento, uma quantia a liquidar posteriormente, mas cujo limite é de dez mil euros;

4.3.1 - A quantia de € 2.210,46 (dois mil, duzentos e dez euros e quarenta e seis cêntimos), a título de diferenças entre a retribuição base devida e a efetivamente paga no ano de 2021;

4.3.2 - A quantia de € 3.984,40 (três mil, novecentos e oitenta e quatro euros e quarenta cêntimos), correspondente às diferenças entre as verbas pagas a título de subsídios de férias e Natal entre os anos de 2017 e 2021 e as que deveriam ter sido pagas a esses títulos;

4.3.3 - A quantia de € 965,52 (novecentos e sessenta e cinco euros e cinquenta e dois cêntimos), a título de proporcionais da retribuição de férias e do subsídio de férias;

4.3.4 - A quantia de € 104,94 (cento e quatro euros e noventa e quatro cêntimos), a título de subsídio de refeição do mês de setembro de 2021;

4.3.5 - A quantia de € 714,96 (setecentos e catorze euros e noventa e seis cêntimos), a título de crédito de 108 horas de formação contínua não ministrada.

5 - Absolve-se a Ré do restante peticionado.

*

Valor da causa – € 85.816,30.

*

Condena-se a Autora a pagar 7% das custas e a Ré 93% das mesmas.

*

Após trânsito, comunique a sentença ao ISS, para efeitos de reembolso pela Ré dos montantes pagos pela Segurança Social à Autora – art.º 75.º, n.º 2 do Código de Processo do Trabalho.»↩︎

2. «Art.º 248.º, n.º 1 do CPC, ex vi do art.º 23.º do CPT, bem como os n.ºs 1 e 3 do art.º 24.º deste último código.» - NOTA DE RODAPÉ DO DESPACHO TRANSCRITO COM O NÚMERO 1.↩︎

3. «Art.º 638.º, n.º 1 do CPC, ex vi do art.º 1.º, n.º 2, al. a) do CPT: «O prazo para a interposição de recurso (…) conta-se a partir da notificação da decisão…» - NOTA DE RODAPÉ DO DESPACHO TRANSCRITO COM O NÚMERO 2.↩︎

4. «O décimo quinto dia calhou a 29 de abril, que foi um sábado; na segunda-feira foi ferido nacional, pelo que se fosse esse o último dia do prazo (recurso sem reapreciação da prova gravada), o termo passaria para terceira-feira, dia 2 de maio, nos termos do n.º 2 do art.º 138.º do CPC. Como não foi, o acréscimo de dez dias, previsto no n.º 3 do art.º 80.º do CPT, conta-se a partir de 29 de abril, como sendo um prazo único de 25 dias.» - NOTA DE RODAPÉ DO DESPACHO TRANSCRITO COM O NÚMERO 3.↩︎

5. «Art.º 80.º, n.ºs 2 e 3 do CPT.» - NOTA DE RODAPÉ DO DESPACHO TRANSCRITO COM O NÚMERO 4↩︎

6. «1 - Considera-se «justo impedimento» o evento não imputável à parte nem aos seus representantes ou mandatários que obste à prática atempada do ato.

2 - A parte que alegar o justo impedimento oferece logo a respetiva prova; o juiz, ouvida a parte contrária, admite o requerente a praticar o ato fora do prazo se julgar verificado o impedimento e reconhecer que a parte se apresentou a requerer logo que ele cessou.

3 - É do conhecimento oficioso a verificação do impedimento quando o evento a que se refere o n.º 1 constitua facto notório, nos termos do n.º 1 do artigo 412.º, e seja previsível a impossibilidade da prática do ato dentro do prazo.» - NOTA DE RODAPÉ DO DESPACHO TRANSCRITO COM O NÚMERO 5.↩︎

7. «Pese embora seja uma questão que deveria ter sido tratada no Requerimento de Interposição do Recurso, razão pela qual este tribunal de 1.ª instância tem o dever de se pronunciar (art.º 82.º do CPT).» -NOTA DE RODAPÉ DO DESPACHO TRANSCRITO COM O NÚMERO 6.↩︎

8. «Embora tenhamos, segundo a jurisprudência maioritária, de ficcionar que a notificação da sentença só ocorreu no dia 14-04-2023, na realidade ela foi acedida pelo destinatário – o Ilustre Mandatário da Ré – logo no dia 11- 04-2023, como está certificado no CITIUS.» - NOTA DE RODAPÉ DO DESPACHO TRANSCRITO COM O NÚMERO 7.↩︎

9. «Se verificarmos as propriedades do PDF que constitui a digitalização que foi feita do requerimento que acompanhava o CD, constatamos que essa digitalização (procedimento realizado na Unidade Central) foi realizada às 16h04m, dessa sexta-feira, 28-04-2023.» - NOTA DE RODAPÉ DO DESPACHO TRANSCRITO COM O NÚMERO 8.↩︎

10. «Transitado em julgado desde 25.03.2019 segundo informação prestada pelo TRL cuja certidão ainda aguardamos.» - NOTA DE RODAPÉ DO TEXTO TRANSCRITO, COM O NÚMERO 1.↩︎

11. «ABRANTES GERALDES, Recursos... cit., art.º 628. pág. 39.

Neste contexto jurídico-processual, assim fundamentou o acórdão recorrido: "O despacho que julgou não verificado o justo impedimenta do exmo. mandatário da autora/recorrente foi objeto de recurso pela autora/recorrente, o qual não foi admitido pelo tribunal a quo, por extemporaneidade do mesmo. Trata-se, todavia, de uma decisão (a do despacho que não admitiu o justo impedimento) que pode ser impugnada no recurso que venha a ser interposto da sentença final, nos termos do art.º 644.º, n.º 3, do Código de Processo Civil. Ou seja, a parte que se conformou com a decisão de recusa do recurso por extemporaneidade não fica impedida de interpor recurso da mesma decisão no momento processual adequado, como a recorrente veio a fazer. Pelo que cumpre apreciar a alegada violação «das regras do justo impedimento», agora invocada no recurso interposto da sentença a final."» - NOTA DE RODAPÉ DO TEXTO TRANSCRITO COM O NÚMERO 2.↩︎

12. «Sobre este ponto, para a admissibilidade da revista atípica do art.º 14.º do CIRE, v. os Acs.do STJ de 9/4/2019, processo n. 118/18.3T8STS.P1.S1, Rel. ANA PAULA BOULAROT, in www.dgsi.pt (no âmbito da "incidência fáctico-jurídica decidida em termos contrários"), e de 1/10/2019, processo n.º 824/18.2T8VNF.G1.S1, Rel. MARIA OLINDA GARCIA.» - NOTA DE RODAPÉ DO TEXTO TRANSCRITO COM O NÚMERO 3.↩︎

13. Tal requerimento possui o seguinte teor:

«Do douto despacho constam os seguintes aspetos a abordar:

(i) Da natureza jurídica processual;

(ii) Acórdão fundamento com nota de trânsito em julgado;

(iii) Da realidade factual e/ou processual da questão de fundamental de direito;

1. Expõe-se a V. Exa. que a Recorrente mantém as alegações de recurso apresentadas nos autos, acrescentando-se o seguinte complemento.

2. Relativamente à matéria de violação das regras referentes ao justo impedimento (pontos II. e III. Das alegações de recurso), o recurso poderá ser efetivamente admissível nos termos do artigo 629.º n.º 2 al. d) do CPC, uma vez que a decisão a quo contraria um acórdão proferido por outra Relação, no domínio da mesma legislação e sobre aquela que a Recorrente considera ser a mesma questão fundamental de direito.

3. O Tribunal a quo, ao decidir que não havia verificação dos pressupostos de justo impedimento, contrariou frontalmente o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 07-02-2019, com n.º de processo 42037/06.5YYLSB-B.L1-2, que decidiu que “IV- Basta a comunicação do impedimento para que a audiência seja adiada, a menos que o mandatário tenha referido expressamente a sua não oposição ao inicio da audiência”

4. O objeto da presente sindicância visa a verificação dos pressupostos de justo impedimento.

5. E de facto, o acórdão está em contradição com o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, processo n.º 42037/06.5YYLSB-B.L1-2 de 07.02.2019 [1 - Transitado em julgado desde 25.03.2019 segundo informação prestada pelo TRL cuja certidão aguardamos] ao considerar que a mera comunicação deve ser suficiente, bem como que a prova desse impedimento é feito pelo meio possível e que o Juiz apenas não deve adiar se tiver indícios sérios de que se trata de expediente dilatório.

6. Conforme consta do acórdão fundamento “a audiência de discussão e julgamento deve ser adiada quando ocorra motivo que constitua justo impedimento de algum dos advogados das partes, devendo este comunicar tal circunstância prontamente ao tribunal e justificar até aos cincos dias imediatos à data da audiência”.

7. E na posição da Recorrente cremos que mais do que a letra das decisões, está em causa a natureza do mecanismo.

8. A natureza repentina e impeditiva do justo impedimento carece de um mecanismo processual adequado a tal.

9. Na posição que a Recorrente pretende sustentar quanto ao presente acórdão fundamento (e por extensão ao demais já assinalado nos autos), onde consta “audiência de julgamento” deve quanto ao n/caso em apreço ler-se “prática de ato processual”.

Onde lemos, quanto ao justo impedimento apresentado no acórdão fundamento uma “condição de saúde”, deve entender-se quanto ao n/ caso em apreço “greve de funcionários judiciais”.

10. No entanto, o que a Jurisprudência tem gizado em torno do justo impedimento é que o juízo a ser efetuado pelo Tribunal deve ser perfunctório e não exaustivo.

11. Com efeito, veja-se que, in casu, foi feita imediatamente prova documentada nos autos da data de entrada do CD para gravação que esteve 10 dias sem ação naquele juízo de trabalho, após a notícia do justo impedimento.

12. Enviado por via postal registada para tentar contornar a impossibilidade da receção física pelos funcionários do juízo de trabalho.

13. E esta ocorrência da greve parcial de um tribunal, acabou por subverter o direito de resposta e contraditório da Recorrente que, por força de evento impeditivo e repentino, nem sequer teve alternativa como a que atualmente está disponibilizada pelo acesso às gravações via CITIUS, o que tardava em acontecer.

14. A negação da presente situação é de todo em todo incompatível com a figura do justo impedimento.

15. Assim, dúvidas não restam de que o acórdão recorrido está em contradição com outro acórdão da Relação [2 - Existem outros acórdãos identificados nos autos cujo entendimento é igual quanto à situação factual e de direito do Justo Impedimento], no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de facto e de direito.

16. Estando assim preenchido na íntegra os requisitos previstos no art.º 629.º n.º 2 al. d) do CPC.

Por todas estas razões, não tendo o Tribunal a quo, de forma inexplicável, assim procedido, competirá agora ao Supremo Tribunal de Justiça revogar a decisão que indeferiu o justo impedimento, substituindo-a por outra que julgue verificado o justo impedimento e, em consequência, revogue todo processado, aceitando-se a peça processual de recurso, com todas as legais consequências, atentos os fundamentos legais invocados.»↩︎

14. Em estudo intitulado “Da recorribilidade em processo civil”, publicado na última Revista do Supremo Tribunal de Justiça [número 4], julho a dezembro de 2023, páginas 15 a 55, com especial incidência para o que se afirma nas páginas 33 e 34.↩︎

15. «Como se refere no Ac. do STJ de 31-3-22, 925/12, "o acórdão prolatado em conferência, no Tribunal da Relação, que indefere a reclamação da decisão da 1.ª instância de não admissão de recurso de apelação, confirmando essa decisão, em princípio, não é recor­rível para o Supremo Tribunal de Justiça, com exceção das situações excecionais, em que é sempre admissível recurso previstas nos art.ºs 629.º, n.º 2 e 671.º, n.º 2, uma vez que não nos encontramos perante qualquer uma das situações previstas no art.º 671.º de admissibilidade do recurso de revista".

Neste sentido, cf. também os Acs. do STJ de 24-5-22, 20464/95, de 5-5-22, 9976/16, de 5-5-22, 932/17, de 31-3-22, 925/12, de 9-12-21, 2290/09, de 17-11-21, 8385/16, de 25-1-21, 19477/16, de 12-11-20, 788/12, de 10-11-20, 2657/15, de 3-11-20, 1560/13, de 13-10-20, 4044/18, de 29-10-19, 565/13, de 21-2-19, 27417/16, de 24-4-18, 3429/16, de 11-1-17, 68/13 e de 19-2-15, 3175/07.

Verificada, nas circunstâncias previstas no art.º 629.º, n.º 2, al. d), uma eventual contra­dição entre o acórdão da Relação confirmativo de decisão do juiz de 1.ª instância de rejeição do recurso de apelação e outro acórdão da Relação sobre a mesma questão de direito, deve admitir-se a possibilidade de tal contradição ser sanada pelo Supremo mediante a interposição de recurso de revista. O mesmo se diga quando, porventura, estiver em causa a aplicação do disposto nas als. a) e c).

Minoritária e, no meu entender, injustificada é a tese que foi adotada nos Acs. do STJ de 16-5-23, 393/14 e de 28-4-21, 206/14, de que nunca haverá recurso de revista. Invalidando o que, de âmbito geral, decorre do art.º 629.º, n.º 2, não é concebível, por exemplo, que se negue a admissibilidade desse recurso de um acórdão da Relação que, ao apreciar a reclamação deduzida ao abrigo do art.º 643.º, desrespeite um acórdão de uniformização de jurisprudência.

Já Rui PINTO advoga uma maior amplitude do recurso, equiparando o acórdão recorrido àquele em que a Relação, ex novo, recusa a apreciação do mérito do recurso de apelação admitido na 1.ª instância [Manual do Recurso Civil, vol. I, p. 330, nota 1295, e "Repensando os requisitos da dupla conforme", em Julgar Online, novembro de 2019, p. 7, nota 11), solução que, pelas razões já apresentadas, creio que deve ser rejeitada.» – NOTA DE RODAPÉ DO TEXTO TRANSCRITO, COM O NÚMERO 34.↩︎

16. «Como, por exemplo, o AUJ n.ºs 9/09 ("Os procedimentos cautelares revestem sempre carácter urgente mesmo na fase de recurso") ou o AUJ n.º 1/21 ("Os atos inseridos na tramitação de processos qualificados como urgentes, cujos prazos terminem em férias judiciais, são praticados no dia do termo do prazo, não se transferindo a sua prática para o primeiro dia subsequente ao termo das férias judiciais").» – NOTA DE RODAPÉ DO TEXTO TRANSCRITO, COM O NÚMERO 35.↩︎

17. Cf., entre outros, o Acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça de 30/03/2022, Proc.º n. º 12429/18.3T8LSB.L1.S1, relatado pela Juíza Conselheira Leonor Rodrigues e publicado em www.dgsi.pt, com o seguinte Sumário:

“I - A verificação da dupla conforme impede a admissão do recurso de revista normal, nos termos do artigo 671.º, n.º 3, do Código de Processo Civil.

II - O conhecimento das nulidades imputadas ao acórdão recorrido pressupõe que o recurso de revista seja admissível.

III - A mera arguição de nulidades imputadas ao acórdão recorrido no recurso de revista não impede a verificação da dupla conformidade de decisões impeditivas da admissibilidade do recurso de revista normal.

IV - A limitação do recurso a dois graus de jurisdição nos casos de dupla conforme não viola o direito de "acesso ao direito de tutela jurisdicional efetiva" consagrado no artigo 20.º da CRP.”↩︎

18. Quer os artigos 79.º, 79.ª-A e 82.º do CPT como os artigos 643.º e 644.º do NCPC nada esclarecem qua ntoa esta problemática.↩︎

19. Em “Recursos em Processo Civil - Recursos nos Processos Especiais - Recursos no Processo do Trabalho – Novo Regime», julho de 2020 - 6.ª Edição Atualizada, Almedina, páginas 228 a 230.↩︎

20. «Foi esta a solução adotada no Ac. do STJ, de 24-10-13, 7678/11, www.dgsi.pt, onde se refere, além do mais, que, dentro da lógica do regime estabelecido no art.º 688.º do CPC de 1961 (antes da reforma do regime dos recursos cíveis de 2007), "o incidente da reclamação termina definitivamente de duas formas: ou o recurso é admitido e o relator requisita o processo ao tribunal recorrido; ou o despacho de não recebimento de recurso é mantido e então, o processo incidental é remetido ao tribunal reclamado, para o processo prosseguir aí os seus termos. Sendo a decisão sobre a reclamação definitiva no âmbito do CPC de 1961, do facto de não ter ficado isso expresso na redação introduzida nesse Código pelo referido DL n.º 303/07 não se pode concluir que passou a ser impugnável por via recursiva a decisão proferida em conferência sobre a reclamação, pois tal omissão se ficou a dever apenas ao facto de a decisão ter deixado de ser da competência do Presidente do Tribunal Superior, dela não resultando que a decisão do relator ou da conferência pudesse ser impugnada".» - NOTA DE RODAPÉ DO TEXTO TRANSCRITO, COM O NÚMERO 350.↩︎

21. «LEBRE DE FREITAS e RIBEIRO MENDES, CPC Anot., vol. III, 1.1, 2.ª Ed., p. 76, referem expressamente, a respeito do regime que constava do art.º 688.° do CPC de 1961, que a decisão de indeferimento da reclamação pela conferência era "definitiva". No mesmo sentido, cf. Luís MENDONÇA e HENRIQUE ANTUNES, Dos Recursos, p. 224.» - NOTA DE RODAPÉ DO TEXTO TRANSCRITO, COM O NÚMERO 351.↩︎

22. «Assim foi decidido também nos Acs. do STJ, de 5-2-20, ECLI 2020.17, em https://jurisprudencia.csm.orgpt, de 29-10-19, 565/13, de 21-2-19, 27417/16, de 24-4-18, 3429/16, de 11-1-17, 68/13, e de 19-2-15, 3175/07, em www.dgsipt. A introdução da exceção justifica-se pelos mesmos motivos que levam a admitir a revista em qualquer das demais situações previstas nos arts. 629.°, n.º 2, e 671.°, n.º 2.

Contra: Rui PINTO, "Repensando os requisitos da dupla conforme", Julgar Online, novembro de 2019, p. 7, nota 11.» - NOTA DE RODAPÉ DO TEXTO TRANSCRITO, COM O NÚMERO 352.↩︎

23. Cf., por exemplo, Acórdão do STJ de 29/04/2021, Processo n.º 7066/17.2T8GMR.G1-A.S1, Relatora: MARIA DA GRAÇA TRIGO, publicado em ECLI:PT:STJ:2021:7066.17.2T8GMR.G1.A.S1.04, com o seguinte Sumário:

Na decisão de reclamação apresentada ao abrigo do art.º 643.º do CPC, existindo dupla conforme entre as decisões das instâncias, verifica-se o impedimento à admissibilidade do recurso de revista previsto no n.º 3 do art.º 671.º, do CPC.↩︎